1 - Na conferência de pais deve o juiz fixar provisoriamente um regime de regulação das responsabilidades parentais com base nos elementos de facto de que disponha, constantes do requerimento inicial e das declarações dos progenitores na própria conferência.
2 - Não se pode estabelecer uma regra abstracta no sentido de que essa regulação provisória não pode decidir a fixação provisória dum regime de residência alternada.
3 - Não havendo momento de contraditório prévio à conferência, aos progenitores caberá, na mesma, invocarem todas as razões e argumentos necessários a habilitarem o julgador à fixação do regime provisório.
(Sumário elaborado pelo relator)
Proc. 29009/18.6T8LSB-A.L1 6ª Secção
Desembargadores: Eduardo Petersen Silva - Cristina Neves - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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6ª Secção
Processo n° 29009/18.6T8LSB-A.L1
Apelação
Relator: Eduardo Petersen Silva
1ª Adjunta: Desembargadora Cristina Neves
2° Adjunto: Desembargador Manuel Rodrigues
Acordam os juízes que compõem este colectivo do Tribunal da Relação de Lisboa:
I. Relatório
Tl..., nos autos m.id., veio intentar contra RC..., também nos autos m.id., a presente acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais relativamente à filha comum, AL..., nascida em ....10.2016.
Peticionou a final a regulação das responsabilidades parentais nos termos que propõe, e que aqui se dão reproduzidos, devendo a residência da menor ser fixada alternadamente com ambos os progenitores.
Convocada audiência de pais, nesta e conforme da acta consta, frustrou-se o acordo tentado, uma vez que a mãe não aceita a proposta apresentada pelo pai, de residência alternada e seguidamente prestaram os progenitores as seguintes declarações: que têm estado a seguir um regime de visitas nos seguintes moldes: numa semana a menor fica com um dos progenitores às segundas, quartas e sextas-feiras, bem como ao fim de semana; sendo que, na semana seguinte, alterna o progenitor que fica com a menor nesses mesmos dias. O progenitor declarou que reside com os seus pais e a progenitora que vive só com a menor, mas que tem a ajuda da sua mãe.
Na mesma conferência a Digna Magistrada do Ministério Público promoveu: Não há motivos para que a menor não possa ficar ora com o pai ora com a mãe, uma vez que o pai vive com os seus próprios progenitores havendo, assim, grande suporte familiar pelo que o regime provisório deverá ter esse factor em conta. Mais se promove que se oficie à Segurança Social para que seja realizada audição técnica especializada.
Na mesma conferência e de seguida, proferiu o tribunal recorrido a seguinte decisão:
Considerando que, e nos termos do disposto no art. 38ºdo RGPTC, se torna necessário decidir provisoriamente em face dos elementos obtidos e ouvidos ambos os progenitores, verifica-se que o regime que tem sido posto em prática consiste em fins de semana alternados com o pai e com a mãe, sendo que a menor passa mais dois dias por semana com o progenitor respectivo com o qual não está no fim-de-semana, apenas não pernoitando com o mesmo.
Não foi referenciado por qualquer dos progenitores que o outro não tenha capacidades adequadas para estar com a filha.
Mais foi dito pela mãe que vive sozinha com a filha, tendo apoio da sua mãe e pelo pai que vive com os seus próprios pais tendo apoio destes.
Assim sendo, e porque o regime que tem estado em vigor tem resultados que nenhum dos pais aponta como negativo para a filha sendo já um regime de proximidade não se afigura existir fundamento tendo também em conta a posição assumida pelo pai e pelo MP para não determinar, desde já, a título provisório, um regime de regulação das Responsabilidades Parentais com residência alternada — por ser este desde que não exista conflitualidade específica que neste caso melhor parece salvaguardar os interesses da menor.
Assim, desde logo porque se afigura que a menor poder pernoitar durante a semana, em casa do pai será para esta menos cansativo do que ser deslocada, à noite, para casa da mãe.
Assim sendo em face do acima exposto tomando em conta os elementos que foram fornecidos nos autos até esta fase fixa-se o seguinte Regime provisório de Regulação das Responsabilidades Parentais nos termos obrigatoriamente previstos no citado art. 382 do diploma citado:
1 - A menor AL... fica confiada à guarda e cuidados de ambos os progenitores, com quem residirá alternadamente, sendo as responsabilidades parentais quanto às questões de particular importância para a vida da menor exercidas em conjunto por ambos os progenitores.
2 — Cada um dos progenitores irá, à sexta-feira ao final do dia, buscar a menor à creche, na semana que lhe corresponde, e aí a entregando na sexta-feira seguinte, ao início do dia.
3 - Ambos os progenitores podem contactar diária e directamente a menor (viatelefone, sms, e-mail, skype, etc), devendo o progenitor que tem a guarda nessa semana assegurar a concretização de tal contacto, enquanto a menor não tiver autonomia suficiente para que a menor possa, por sua iniciativa, contactar o progenitor que não tem a guarda, se tal vontade for manifestada pela menor.
4.1. - Os períodos de férias com a menor deverão ser marcados até 30 de março do ano em que serão gozadas. A alternância semanal será de manter, mesmo no período de férias, só sendo interrompida quando os pais estiverem no gozo do seu período férias, altura em que poderão estar com a menor por períodos não superiores a 15 (quinze) dias seguidos. Caso os períodos de férias escolhidos pelos Pais coincidirem, nos anos pares escolhe a Mãe, nos anos impares escolhe o Pai.
4.2 - A menor gozará os feriados com o progenitor com o qual se encontrar a residir na semana em questão;
5 - As despesas de saúde na parte não comparticipada por qualquer seguro ou subsistema de saúde e as despesas com livros e material escolar na parte não compensada pelo SASE serão suportadas pelos pais em partes iguais, mediante apresentação de documento comprovativo pelo que suportou a despesa ao outro, o qual deverá pagar a sua proporção até ao dia 10 do mês seguinte a que a despesa respeita.
Mais se decidiu: Uma vez que se afigura possível ainda consenso entre os pais, determino por se mostrar necessário em face do caso e da referida possibilidade de consenso nos termos do art. 21°, alínea b), 23° e 38°, alínea b) do RGPTC, sejam as partes remetidas para audição técnica especializada, ficando esta conferência suspensa nos termos da última norma legal por um período máximo de dois meses.
Logo após a decisão, encontra-se nos autos resposta da Segurança Social acusando a recepção do pedido mas informando que o Centro Distrital de Lisboa tem-se confrontado com particulares constrangimentos e que não possível operacionalizar a audição no imediato, o que acontecerá assim que possível.
Inconformada com a regulação provisória decidida, a requerida interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões, que aqui vamos sumariar:
1 — deverá ser fixado efeito suspensivo ao recurso, sob risco da decisão favorável do recurso já não vir a produzir efeito útil;
2 — considerando o facto da menor já ter sido retirada da sua guarda e cuidados e transferidas na prática as responsabilidades parentais para os avós paternos;
3 — sem ter sido elaborado primeiro relatório técnico especializado;
4 — o regime provisoriamente fixado foi-o apesar da oposição da progenitora;
5 — e contra a jurisprudência dominante, que sustenta que não deve determinar-se a guarda partilhada em sede de regulação provisória por se carecer de elementos probatórios suficientes, sob pena do tribunal prejudicar irremediavelmente o direito ao bem estar do(a) menor. (Ac. TRC 4.4.2017; Ac. TRP 20.10.2014; Ac.TRL 14.2.2015; Ac. TRC 6.10.2015; Ac. TRP 28.6.2016);
6 — estas decisões deviam ter levado o tribunal a manter o regime que vigorava, não chocando que alargasse os dias de visita do progenitor — homem, podendo este ir buscar a menor na escola por exemplo 3 vezes por semana, Ou um regime transitório até o pai deixar de ter horário laborai;
7 — Assim, tirar a menor a mãe para residir com os avós paternos não faz sentido;
8 — O progenitor pretende a guarda partilhada fundamentalmente para não ter de pagar pensão de alimentos, pois pouco tempo estará com a menor em virtude do seu horário de trabalho nocturno — horário que é facto assente — e nunca pagou qualquer quantia a título de pensão de alimentos;
9 — Um homem que trabalha durante a noite, pela experiência comum, pouco mais estará com a filha que entre o período em que a mesma sai da escola até que ele vai trabalhar. Nunca irá pernoitar com a menor;
10 — questiona-se porque não se disponibiliza ele para alterar o seu horário para diurno, o que nunca fez nem manifestou disponibilidade para fazer;
11 — assim, o tribunal premeia quem demonstrou pouca preocupação com o bem estar da filha e com os custos que isso representa;
12 — deve a decisão ser revogada e mantido o regime anterior pelo menos até estar concluída a audição especializada que comprove que não há riscos para a (a pernoita da) menor provocados pela ausência do pai (em horário de trabalho nocturno), e que entendam que a menor fica melhor a pernoitar com os avós paterno do que a dormir à guarda da mãe no ambiente que sempre conheceu.
Contra-alegou o recorrido logo se opondo à fixação do efeito suspensivo ao recurso, e alinhando que o artigo 38° do RGPTC não veda a possibilidade de se fixar residência alternada na conferência prevista no artigo 35.º do mesmo diploma, na medida dos elementos de que o julgador então dispuser. (Ac. TRG 7.2.2019 e Ac.STJ 4.10.2018). O Tribunal recorrido fundou-se nos elementos de que dispunha e orientou-se por princípios de razoabilidade, actuando com bom senso, prudência e moderação, logrando proteger os interesses da menor. Os regimes provisórios têm o propósito de evitar a agudização dum conflito e possibilitar assim o acordo entre os pais. O regime fixado mostra-se correcto, em face do entendimento que só assim não seria se o tribunal tiver factos concretos da incapacidade dum dos progenitores cuidar do menor, ou elevada conflitualidade entre os progenitores ou quando residam a grande distância um do outro, e nada disso foi alegado na conferência de pais, onde ambos, pelo contrário, se reconheceram mutuamente capacidade para uma parentalidade responsável. Existe bom diálogo, tanto que já tinham na prática instituído um regime que pouco difere do fixado, ambos residem perto um do outro, e com o regime fixado, a menor passará a estar o mesmo tempo com ambos, desenvolvendo com cada um relações de maior intimidade, e a final evita a solução decidida que ocorram conflitos de lealdade.
Pronunciou-se o MP no sentido da não fixação de efeito suspensivo ao recurso e da manutenção da decisão recorrida.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir:
II. Direito
Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação, a questão a decidir é de saber se não devia ter sido fixada provisoriamente a guarda e residência alternada da menor.
III. Matéria de facto
A constante do relatório que antecede.
IV. Apreciação
Se procurarmos sintetizar as razões que sustentam uma e outra posição, vemos que o regime provisoriamente fixado atendeu ao requerimento inicial, em que se pedia a guarda alternada — sem porém nele se encontrar mais que o ponto de partida separação — urge regular as responsabilidades e a proposta de regulação. Portanto, do requerimento inicial nenhuns outros factos se retiram, nem as profissões dos progenitores nem os horários. Da conferência, segundo o que não vem posto em causa no recurso, retirou-se a inexistência de conflitualidade relevante entre os progenitores, do reconhecimento mútuo de capacidade para o exercício das responsabilidades parentais, tanto que o regime que na prática já tinham instituído (numa semana, a menor fica com um dos progenitores às segundas, quartas e sextas, bem como ao fim de semana, e na semana seguinte alternam) era próximo do que se ia fixar, só diferenciado pela questão da pernoita.
E, no fundo, considerou-se que assim sendo, e porque não pernoitar era mais penoso (visto a criança ter de ser deslocada ao final do dia para casa da mãe, nos dias de semana em que ficava com o pai) que pernoitar, em fixar esta pernoita.
A recorrente sustenta, além da jurisprudência sobre a não fixação de guarda alternada em regime provisório até à obtenção de elementos, que o pai trabalha em horário nocturno e que por isso as pernoitas significam que a criança vai pernoitar com os avós paternos, ou visto por outro prisma, que deixa de pernoitar com a mãe, como está habituada, para pernoitar, não com o pai, mas com os avós. E adianta que a motivação do pai para pedir a guarda alternada é a de não pagar pensão de alimentos, que nunca pagou. Dito de outro modo, para não pagar pensão de alimentos pede que a criança lhe seja confiada em guarda alternada, que não servirá assim para estreitar os seus contactos com a criança (porque para eles não estará disponível).
Repare-se que, se bem percebemos, a diferença entre o regime prático e o regime provisório é maior: antes a criança passaria o fim de semana, alternadamente, com o pai (com pernoita, supomos), e depois na semana ainda estaria com ele três dias, e agora passa a estar com ele, e pernoitar, sete dias, ou seja, acrescenta mais dois dias (terça e quinta) e passa a pernoitar em todos eles, donde, em termos de deslocações, em vez de ser levada a casa da mãe 4 vezes por semana (final do fim de semana e segunda, quarta e sexta) passa apenas a ser levada uma vez, quando a semana termina.
Ora, como no recurso a recorrente manifesta que teria sido possível — e portanto a isso não se oporia — que se fixassem mais dias de convívio semanal, então, de facto, o que a opõe é a questão da pernoita, e a questão da pernoita, na perspectiva do tribunal recorrido, está ligada à questão das deslocações e da sua penosidade para a menor.
Bom, é certo que a questão das deslocações deve ser ponderada quando pensamos no melhor interesse da menor, considerando sobretudo os períodos de Inverno e mau tempo, mas a pernoita deve ser vista sob o prisma da sua finalidade essencial, que é a de possibilitar um contacto mais estreito, mais íntimo e mais enriquecedor para a criança, designadamente através dos cuidados do deitar, dos banhos, do adormecimento, das histórias para adormecer que permitem à criança sentir-se segura, adormecer em segurança porque na convicção de que está acompanhada, na possibilidade de atendimento a terrores nocturnos ou doença ou má disposição que acometam a criança durante a noite. O mesmo contacto estreito se obtém no acordar e nos cuidados do levantar e arranjar-se.
Se um regime de guarda alternada assegura um pleno e possível e equitativo período de desenvolvimento de laços, com respeito pela personalidade de cada progenitor, se eventualmente é possível, e por isso os progenitores foram encaminhados para audição especializada, vir a ocorrer um consenso, a questão aqui a decidir é apenas a de saber se de facto os horários do pai não lhe permitem o desenvolvimento da parte mais essencial do relacionamento, qual seja o deitar e o levantar, ou dito de outro modo, se o pai começa a trabalhar antes da menor ser deitada e adormecer, e se não está de volta a casa antes da criança acordar.
No corpo das contra-alegações do recurso afirma o pai: Entra no trabalho de noite, mas tem tempo suficiente para ir buscar a filha à creche às 15h, dar-lhe banho, preparar o jantar e deitá-la, pois vive a 15 minutos do local de trabalho. Se for necessário — facto que não é inédito — sai do trabalho para acudir a uma situação de urgência e levar a AL... ao hospital. De manhã, pelas 9h, deixa-a na creche.
Vamos então à questão de saber se o tribunal não pode fixar residência alternada provisoriamente, na conferência de pais, sem a concordância de ambos, designadamente por falta de elementos, ou se, como é defendido pelo recorrido, se tem de, em face da obrigação legal de fixar ur regime provisório logo na fase inicial do processo, fixar mesmo um regime provisório com base nos elementos que disponha e de acordo com eles, nada impedindo que esse regime seja o da residência alternada.
Em matéria de processo tutelar cível, cabível à regulação das responsabilidades parentais por via do artigo 3.º al. c) do RGPTC, e dominado, além de outros, pelo princípio da simplificação e oralidade, dispõe o artigo 23.º do RGPTC:
1 - O juiz pode, a todo o tempo e sempre que o considere necessário, determinar audição técnica especializada, com vista à obtenção de consensos entre as partes.
2 - A audição técnica especializada em matéria de conflito parental consiste na audição das partes, tendo em vista a avaliação diagnóstica das competências parentais e a aferição da disponibilidade daquelas para um acordo, designadamente em matéria de regulação do exercício das responsabilidades parentais, que melhor salvaguarde o interesse da criança.
3 - A audição técnica especializada inclui a prestação de informação centrada na gestão do conflito.
Dispõe o artigo 35.º do RGPTC, no seu nº 1 que Autuado o requerimento ou a certidão, os pais são citados para conferência, a realizar nos 15 dias imediatos, ou seja, sem que se preveja um momento articulado escrito de apresentação de oposição ao requerimento inicial.
Dispõe o artigo 37º do mesmo diploma:
1 - Estando ambos os pais presentes ou representados, o juiz procura obter acordo que corresponda aos interesses da criança sobre o exercício das responsabilidades parentais. (—)
5 - A conferência já iniciada pode ser suspensa, estabelecendo-se, por período e condições determinados, um regime provisório, em consideração pelos interesses da criança.
Dispõe o artigo 38º do mesmo diploma:
Se ambos os pais estiverem presentes ou representados na conferência, mas não chegarem a acordo que seja homologado, o juiz decide provisoriamente sobre o pedido em função dos elementos já obtidos, suspende a conferência e remete as partes para:
a)(...)
b) Audição técnica especializada, nos termos previstos no artigo 23.º, por um período máximo de dois meses.
Portanto, ainda que na audição técnica especializada intervenha a prestação de informação (ainda que centrada na gestão do conflito) o objectivo essencial desta audição é a obtenção de consenso, de superação de um conflito, mais ou menos grave, e não propriamente a obtenção dos factos relevantes à decisão que o tribunal, na falta de acordo, haja de proferir sobre regulação das responsabilidades parentais, quer o faça a título provisório ou definitivo.
Esta necessidade de fixação de um regime provisório é um imperativo legal que não se sustenta numa produção factual sujeita a contraditório, não depende das provas e das alegações que estão previstas para uma fase subsequente, e esse imperativo revela-se desde logo no artigo 37º que transcrevemos que impõe a fixação de regime provisório em caso de suspensão da conferência, e revela-se ainda mais caracteristicamente pelo referido artigo 38º, na sua conjugação com o artigo 35° nº 1, ou seja, como dissemos, o primeiro passo é marcar a conferência, não dá a lei uma oportunidade do requerido apresentar defesa ou a sua posição, isso reserva-se, por via do princípio da simplificação e da oralidade, para as declarações a prestar na conferência de pais, e é na conferência de pais, sem outro momento para comprovar as declarações, para apurar mais factos sequer, que a lei impõe ao juiz a fixação de regime provisório, o que significa que o juiz terá de decidir com os elementos que os autos lhe fornecem até aí, a saber, o que consta do requerimento inicial e o que os progenitores (ou outros que tenham sido convocados) declarem nessa conferência.
Não consta da lei substantiva ou adjectiva que na conferência a que se refere o artigo 35° e na regulação provisória a que se refere o artigo 38°, ambos já citados e transcritos acima, uma proibição de regulação provisória dum regime de residência alternada.
E não consta, seguramente porque não só em determinados casos os progenitores podem não estar, nas suas vontades, muito longe dele, como pode de facto e em face dos elementos que sejam recolhidos até então, entender-se, na grande diversidade dos casos que há para decidir, que esse é o regime mais conveniente.
Não pode, a nosso ver, independentemente das discussões sobre a maior ou menor valia da residência alternada, estabelecer-se uma regra abstracta no sentido de que a residência alternada é um regime mais gravoso ou excepcional e que portanto o mesmo só deva ser fixado, provisoriamente, quando o tribunal esteja munido de abundantes elementos de facto que o habilitem à conclusão do não prejuízo para a criança na fixação desse regime.
Tudo depende do concreto. É certo que a mais tenra idade das crianças desaconselha o afastamento da mãe, é certo que grandes deslocações e grandes distâncias entre as residências dos progenitores o desaconselham, é certo que é preciso assegurar que cada progenitor tem capacidade para exercer as responsabilidades parentais plenamente, ainda que obviamente cada um as exerça de acordo com a sua natureza e personalidade, é certo que qualquer suspeita de violência, ou hábitos de vida pouco saudáveis e pouco lícitos devem obstar à guarda partilhada. Mas, tirando estas situações, a partir dum certo momento do crescimento da criança e a partir do equilíbrio que se observe entre os progenitores, melhor, entre as competências dos progenitores, nada obsta à residência alternada, enquanto contacto — e crescimento, por isso — com realidades duplas complementares que melhor alargam a compreensão do mundo e são por isso muito relevantes para o crescimento e educação.
Primeira resposta portanto é: o tribunal não tinha de aguardar pelo resultado da audição técnica especializada para decidir provisoriamente, nem tinha que o fazer para aplicar um regime de residência alternada.
Tendo o tribunal para decidir a regulação provisória das responsabilidades parentais com base nos elementos que dispunha, e não vem referido que a acta não corresponda à verdade ou pelo menos a uma súmula das declarações, da referida acta não consta senão que a mãe se opôs à proposta do pai de fixação de residência alternada. Não denunciou então, não declarou a mãe que o pai, por via do seu trabalho nocturno, não iria contactar com a criança, relacionar-se com ela, durante o período da pernoita.
No presente, e para este tribunal de recurso, a questão da possibilidade do pai se relacionar com a filha durante a pernoita é incerta, porque apenas podemos considerar aquilo que disse em contra-alegações, ou seja, sim, trabalha de noite, mas consegue estar com a filha até à deita, consegue vir a casa rapidamente durante a noite se houver alguma urgência, sendo certo que a criança não fica sozinha porque está com os avós, e sim até consegue aparecer de manhã a tempo de a levar à creche, ou seja, parece que os momentos essenciais que decorrem durante o período em que a criança está acordada, estarão garantidos — e nem diverso disto foi alegado no recurso, isto é, no recurso a recorrente limitou-se a dizer, sem especificar, que o pai trabalhava em horário nocturno. Mas entre as alegações de recurso e as contra-alegações, acabamos por não ter factos provados, digamos assim, mesmo que indiciariamente, do que seja realmente a vida laborai do pai e as suas implicações.
Significa isto que o tribunal de recurso não está habilitado com elementos mais sólidos, que lhe permitam concluir que a pernoita só serve para trocar a mãe pelos avós paternos, e que lhe imponham alterar a decisão recorrida.
Significa quanto acima dissemos que a recorrente não habilitou o tribunal recorrido, que tinha o dever de decidir provisoriamente, com os elementos de facto, sequer com meras informações, sobre o trabalho nocturno do pai, e que portanto o tribunal decidiu com base em pressupostos que não são estes que vêm a recurso. E significa isso portanto que, com base nos elementos que o tribunal recorrido tinha para decidir, não vê este tribunal de recurso que tenha sido fixado regime provisório que revele particular erro do tribunal recorrido, não se vê, sob os pressupostos da decisão recorrida, qualquer forma de perigo para a criança, ou que seja uma solução menos boa do que aquela que os progenitores vinham pondo em prática. Pelo contrário, apesar da idade da menor (cerca de 3 anos) afigura-se que a questão das quatro deslocações semanais não faz particular sentido e que, em face das mutuamente reconhecidas capacidades parentais, nada obsta à pernoita, assim e com esta se densificando e intensificando os contactos com o pai, o que está de acordo com o superior interesse da menor.
Nestes termos, improcede o recurso.
Tendo nele decaído, é a recorrente responsável pelas custas — artigo 527º nº 1 e 2 do CPC.
V. Decisão
Nos termos supra expostos, acordam negar provimento ao recurso e em consequência confirmam a decisão recorrida.
Custas pela recorrente.
Registe e notifique.
Lisboa, 04 de Julho de 2019
Eduardo Petersen Silva
Cristina Neves
Manuel Rodrigues
Sumário (a que se refere o artigo 663º nº 7 do CPC):
I - Na conferência de pais deve o juiz fixar provisoriamente um regime de regulação das responsabilidades parentais com base nos elementos de facto de que disponha, constantes do requerimento inicial e das declarações dos progenitores na própria conferência.
II - Não se pode estabelecer uma regra abstracta no sentido de que essa regulação provisória não pode decidir a fixação provisória dum regime de residência alternada.
III - Não havendo momento de contraditório prévio à conferência, aos progenitores caberá, na mesma, invocarem todas as razões e argumentos necessários a habilitarem o julgador à fixação do regime provisório.
Eduardo Petersen Silva
Processado por meios informáticos e revisto pelo relator