Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Cível
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 - ACRL de 26-09-2023   O critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade - Art.º 527.º CPC. Citação de pessoas coletivas - Art.º 246.º do CPC.
I – As pessoas colectivas citadas nos termos dos artigos 246.º, n.ºs 2 e 4, tendo sido cumprido o disposto no n.º 5 do artigo 229.º, beneficiam do prazo de dilação de 30 dias, estipulado pelo artigo 245.º, n.º 3, 3.ª parte (“ou se verifique o caso no n.º 5 do artigo 229.º”), que acresce ao prazo da Contestação (artigos 569.º e 139.º, nº 2, 142.º e 242.º, n.º 2).
II - Os artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, determinam que as decisões que julguem a ação, o incidente ou o recurso devem condenar no pagamento de custas a parte que lhes houver dado causa (considerada vencida e na respectiva proporção), sendo que, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.
III – O critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade (suporta as custas a parte que lhes dá causa, entendendo-se por esta, de acordo com o princípio da sucumbência, a parte vencida ou as partes vencidas na proporção em que o forem) e, subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual obtido.
IV – Ficam a cargo do Autor-Recorrido as custas do recurso (vertente de custas de parte), quando a Ré-Recorrente vence o recurso de uma decisão que julgou extemporânea a sua Contestação, apesar de não ter sido ela a arguir tal putativa extemporaneidade, nem ter apresentado Contra-Alegações, por – apesar disso - ser “parte vencida”.
Proc. 24418/21.6T8LSB-A.L1 7ª Secção
Desembargadores:  Edgar Taborda Lopes - Ana Rodrigues da Silva - -
Sumário elaborado por Gabriela Coelho
_______
Processo n.º 24418/21.6T8LSB-A.L1
Tribunal a quo
Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Juízo Local Cível de Lisboa - Juiz 20
Recorrente
W…, LDA.
Recorrido
C
Relator: Edgar Taborda Lopes
1.ª Adjunta: Ana Rodrigues da Silva
2.ª Adjunta: Cristina Maximiano


Sumário :
I – As pessoas colectivas citadas nos termos dos artigos 246.º, n.ºs 2 e 4, tendo sido cumprido o disposto no n.º 5 do artigo 229.º, beneficiam do prazo de dilação de 30 dias, estipulado pelo artigo 245.º, n.º 3, 3.ª parte (“ou se verifique o caso no n.º 5 do artigo 229.º”), que acresce ao prazo da Contestação (artigos 569.º e 139.º, nº 2, 142.º e 242.º, n.º 2).
II - Os artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, determinam que as decisões que julguem a ação, o incidente ou o recurso devem condenar no pagamento de custas a parte que lhes houver dado causa (considerada vencida e na respectiva proporção), sendo que, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.
III – O critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade (suporta as custas a parte que lhes dá causa, entendendo-se por esta, de acordo com o princípio da sucumbência, a parte vencida ou as partes vencidas na proporção em que o forem) e, subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual obtido.
IV – Ficam a cargo do Autor-Recorrido as custas do recurso (vertente de custas de parte), quando a Ré-Recorrente vence o recurso de uma decisão que julgou extemporânea a sua Contestação, apesar de não ter sido ela a arguir tal putativa extemporaneidade, nem ter apresentado Contra-Alegações, por – apesar disso - ser “parte vencida”.

Decide-se, na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
RELATÓRIO
C… intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo contra W…, Lda..
A 25 de Outubro de 2021 foi remetida à Ré carta registada com aviso de recepção para citação, a qual foi devolvida com a menção “Objeto não reclamado”:
Na sequência de requerimento do Autor para ser dado cumprimento ao artigo 246.º, nº 4, do Código de Processo Civil, foi remetida - a 16 de Novembro de 2021 - carta registada com aviso de recepção “2.ª Via”, para a morada da sede da Ré - Rua -------Lisboa, a qual, na impossibilidade de entrega, ficou depositada no receptáculo, no dia 18 de Novembro de 2021:
A Ré apresentou Contestação, a qual foi remetida e deu entrada nos autos, através da plataforma electrónica “CITIUS”, no dia 31 de Janeiro de 2022, às 23h 23m 41s.
A 20 de Março de 2023 o Tribunal a quo, depois de historiar a situação, proferiu o seguinte Despacho:
“Desta forma, sendo a Ré pessoa colectiva e nos termos das disposições conjugadas dos artigos 246.º, n.º 4, 229.º, n.º 5 e 230.º, n.º 2, do Código de processo Civil, a citação da Ré tem-se por efectuada em 18/11/2021, não sendo aplicável ao prazo de contestação qualquer das dilações previstas no artigo 245.º, do Código de Processo Civil.
O prazo de contestação inicia-se no dia seguinte ao da citação, é contínuo, suspende-se nas férias judiciais (em processos não urgentes), e quando terminar em dia que os tribunais estiverem encerrados, o seu termo é transferido para o primeiro dia útil seguinte – Artigos 279.º, al. b), do Código Civil, e 138.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
No caso concreto o prazo de contestação da Ré iniciou-se no dia 19 de Novembro de 2021 (dia seguinte ao da citação) e terminou em 20 de Dezembro de 2021; sendo que o prazo de três dias úteis seguintes ao do termo do prazo previsto no artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil em que é ainda válida a prática do acto mediante pagamento de multa terminou em 5 de Janeiro de 2022, correspondente ao terceiro dia útil após o término do prazo de contestação e considerando o período de férias judiciais de Natal de 22/12/2021 a 3/1/2022.
Tendo a contestação sido remetida e dado entrada em juízo no dia 31 de Janeiro de 2022, verifica-se que a mesma é extemporânea (artigo 139.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).
Em razão de todo o exposto, considero extemporânea e sem qualquer efeito a contestação deduzida pela Ré, pelo que a declaro como não escrita no processo electrónico e determino o respectivo desentranhamento do processo físico.
Notifique”.
É desta Decisão que a Ré veio apresentar Recurso, juntando Alegações, que culminam com as seguintes Conclusões:
“I - O douto despacho que considerou extemporânea e sem qualquer efeito a contestação deduzida pela Recorrente, declarando-a como não escrita no processo eletrónico e determinando o respetivo desentranhamento do processo físico, faz errada interpretação da lei;
II – Designadamente, quando considerou, no caso em apreço, não ser aplicável ao prazo da contestação qualquer das dilações previstas no artigo 245º, do Código de Processo Civil.
III – De igual modo, o ofício de citação no seu teor, confere à R. uma dilação de 30 dias, acrescidos de 30 dias para a apresentação da contestação.
IV - Ocorre efetivamente uma dilação de 30 dias, nos termos das disposições conjugadas do Art. 229º nº5 aplicável por força do disposto no Art. 246º nº1 e 245º nº3, do NCPC.
V - Tratando-se a ré de pessoa coletiva e ocorrendo a citação em segunda tentativa, por depósito na caixa de correio, é-lhe concedida uma dilação de 30 dias, a que acrescerá o prazo para a defesa.
VI - No caso dos autos, a citação da Ré ora recorrente, ocorreu na data do depósito da carta de citação, ou seja, em 18/11/2021.
VII - A partir da referida data de 18/11/2021 iniciou-se a contagem do prazo de 30 dias de dilação, como indicado no próprio ofício e nos termos do disposto no nº2 do Art. 242º do C.P.C..
VIII - O referido prazo de dilação terminou a 18/12/2021, data a partir da qual se iniciou a contagem do prazo da defesa, ou seja, o prazo de 30 dias.
IX - Contudo, esse prazo foi interrompido entre 22 de dezembro de 2021 e 3 de janeiro de 2022, em virtude das férias judiciais, reiniciando-se a contagem a 4 de janeiro de 2022, o prazo terminaria a 30 desse mês, que por ser domingo, se transferiu para o primeiro dia útil seguinte, ou seja, para dia 31 de janeiro de 2022, segunda-feira, data em que foi efetivamente submetida a contestação da Ré ora recorrente, através da plataforma Citius.
X – Fez, assim, o meritíssimo juiz “a quo” errada interpretação da lei, ao não aplicar o preceituado sob o artigo Arts. 229º nº5 aplicável por força do disposto no Art. 246º nº1 e 245º nº3, do NCPC.
Nestes termos e nos mais de direito que o Venerando tribunal da Relação de Lisboa queira suprir, deve ser julgado procedente e presente recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituída por douto despacho que admita a contestação apresentada pela Ré ora recorrente. Assim se fazendo a necessária justiça, como é o estilo do Venerando Tribunal, mas V.Exas, Senhores Doutores Juízes Desembargadores, superiormente melhor decidirão”.

Não foram apresentadas Contra-alegações.
QUESTÕES A DECIDIR
São as Conclusões da Recorrente que, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, delimitam objectivamente a esfera de actuação do Tribunal ad quem (exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial, como refere, Abrantes Geraldes ), sendo certo que, tal limitação, já não abarca o que concerne às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do Código de Processo Civil), aqui se incluindo qualificação jurídica e/ou a apreciação de questões de conhecimento oficioso.
In casu, e na decorrência das Conclusões da Recorrente importa verificar da tempestividade da Contestação apresentada em função do entendimento espelhado na decisão do Tribunal a quo, quanto ao prazo de dilação aplicável.
Cumpre decidir, cumpridos que foram os Vistos.
OS FACTOS
A factualidade a considerar é a que resulta do Relatório.

O DIREITO
O Código de Processo Civil dedica os artigos 219.º a 258.º (que constam do Livro I-“Processo em geral”, Título I-“Actos processuais”, Capítulo II-“Actos especiais”, Secção II-“Citação e notificações”), à matéria das citações e notificações.
Em três subsecções, são definidas as regras gerais (Subsecção I-“Disposições comuns” – entre os artigos 219.º e o 224.º), as que relevam para citação das pessoas singulares (Subsecção II – entre os artigos 225.º e o 245.º) e as que se aplicam à citação de pessoas colectivas (Subsecção III – apenas com o artigo 246.º ).
Para resolver a situação recursal que se coloca a este Tribunal importa ter em consideração que:
- a Ré-Recorrente é uma pessoa colectiva e tem sede na morada em que foi citada, mostrando-se cumprida, desde logo, a regra que decorre do n.º 2 do artigo 246.º , de acordo com a qual a carta registada com aviso de recepção destinada a citar a pessoa colectiva é endereçada para a sede inscrita no Registo Nacional de Pessoas Colectivas;
- a carta inicialmente enviada (a 21/10/2021) foi devolvida e enviada uma nova em cumprimento do n.º 4 do artigo 246.º, fazendo as devidas advertências (para o que ao caso releva “a citação considera-se efectuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal”), tendo-se observado o disposto no n.º 5 do artigo 229.º;
- a citação considera-se feita no dia 18/11/2021;
- o prazo para contestar era de 30 dias a contar da citação, começando o prazo a correr desde o termo da dilação, quando a esta houver lugar, como decorre do disposto no n.º 1 do artigo 569.º e do n.º 2 do artigo 242.º ;
- o artigo 245.º (Dilação) determina e define os prazos de dilação que acrescem ao prazo de defesa dos/as citandos/as:
- cinco dias
– quando a citação tenha sido realizada em pessoa diversa do/a Réu/Ré, nos termos dos n.ºs 2 do artigo 228.º e 2 e 4 do artigo 232.º (n.º 1, alínea a));
– quando o/a Réu/Ré tenha sido citado fora da área da comarca sede do tribunal onde pende a acção (sem prejuízo do prazo especial, para as causas que correm termos no Continente e nas Regiões Autónomas ou noutras ilhas) (n.º 1, alínea b));
- quinze dias – quando o/a Réu/Ré haja sido citado/a para a causa no território das Regiões Autónomas, correndo a acção no continente ou em outra ilha (n.º 2);
- trinta dias
– quando o/a Réu/Ré haja sido citado/a para a causa no estrangeiro;
– quando a citação haja sido edital;
– quando se verifique o caso do n.º 5 do artigo 229.º ;
Do aqui exposto resulta que é o próprio artigo que regula a citação das pessoas colectivas (o artigo 246.º) que – expressamente – no seu n.º 4, remete para o 229.º, n.º 5 , o qual - por seu turno e por via do 245.º, n.º 3, 3.ª parte - implica que as citações que ocorram com recurso à sua utilização beneficiem de uma dilação de 30 dias.
Da conjugação destas normas é o que resulta e é por isso que também Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa concluem que nesta “eventualidade, há uma dilação de 30 dias (art. 245.º, n.º 3)” .
Assim sendo não nos restam dúvidas que o tribunal a quo, por lapso induzido por uma concatenação de normas menos feliz, concluiu que não era “aplicável ao prazo de contestação qualquer das dilações previstas no artigo 245.º, do Código de Processo Civil”, não relevando (como devia) a remissão que a 3.ª parte do n.º 3 do artigo 245.º faz para o artigo 229.º, n.º 5, por via do artigo 246.º, n.º 4.
Nestas circunstâncias, verificando a situação concreta dos autos e “porque, como resulta dos art. 139.o, n.º 2, e 142.º, não é o prazo de dilação que acresce ao prazo de defesa, mas antes o início do prazo de defesa que é determinado pelo fim do prazo de dilação” (cfr., também o n.º 2 do artigo 242.º), tendo a citação ocorrido a 18 de Novembro de 2021, a partir desta data iniciou-se a contagem do prazo de dilação (30 dias), iniciando-se a 19 de Dezembro de 2021 a contagem do prazo para a apresentação da Contestação (30 dias).
Uma vez que, por força das férias judiciais de Natal, entre os dias 22 de Dezembro de 2021 e 3 de Janeiro de 2022, tal contagem se tem como interrompida, a sua retoma ocorreu a 4 de Janeiro de 2022, terminando no dia 30.
Sendo o dia 30 de Janeiro de 2022, um Domingo, o fim do prazo – nos termos do artigo 138.º, n.º 2 – ficou transferido para primeiro dia útil seguinte, ou seja, para segunda-feira, dia 31 de Janeiro de 2022.
A Contestação da Ré foi apresentada a 31 de Janeiro de 2022.
A Contestação da Ré foi apresentada em tempo.
A Decisão sob recurso tem de ser revogada, julgando-se procedente o recurso.

O artigo 1.º do Regulamento das Custas Processuais é claro quando afirma que “Todos os processos estão sujeitos a custas, nos termos fixados pelo presente Regulamento”, sendo que, como referem Abrantes Geraldes-Paulo Pimenta-Luís Filipe Pires de Sousa em anotação ao artigo 527.º do Código de Processo Civil, salvo “quando exista alguma isenção objetiva (artigo 4.º, nº 2, do RCP), todas as ações (incluindo incidentes ou recursos) implicam o pagamento de custas (art. 1.º do RCP)” .
Os artigos 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, determinam que as decisões que julguem a ação, o incidente ou o recurso devem condenar no pagamento de custas a parte que lhes houver dado causa (considerada vencida e na respetiva proporção), sendo que, não havendo vencimento, quem do processo tirou proveito.
A interpretação desta disposição legal, no contexto dos recursos, deve atender ao elemento sistemático da interpretação, desde logo porque o conceito de custas assume sentido amplo (que abarca a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte - artigos 529.º, n.º 1, e 3.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais-RCP) e um mais restrito (reportado à taxa de justiça, sendo esta devida pelo impulso do processo, em qualquer instância - artigos 529.º, n.º 2 e 642.º, e 1.º, n.º 1, e 6.º, n.ºs 2, 5 e 6, do RCP).
Assim sendo, a condenação em custas a que se reportam os artigos 527.º, 607.º, n.º 6, e 663.º, n.º 2, respeita unicamente aos encargos, quando devidos (artigo 532.º e artigos 16.º, 20.º e 24.º, n.º 2, do RCP), e às custas de parte (artigo 533.º e artigos 25.º e 26.º do RCP).
In casu, estarão em causa apenas as custas de parte, sendo certo que o Autor, não só não contribuiu para o “incidente”, como nem sequer contra-alegou, importando verificar quem terá de assegurar as custas do processo nos termos definidos.
Ora, como ressalta do citado artigo 527º, está a lei imbuída de dois princípios: o da Causalidade e, subsidiariamente, o do Proveito.
Quanto ao princípio da Causalidade, o pagamento da taxa de justiça previsto pelos artigos 529.º, n.º 2 e 530.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, dá o mote no que concerne o impulso processual de uma parte (com a petição inicial, a contestação, o requerimento executivo, a petição de embargos de executado ou de terceiro, um requerimento de implementação de incidente ou de resposta, uma interposição de recurso ou uma apresentação de contra-alegações ).
Abordando esta matéria, o Conselheiro Salvador da Costa escreveu o seguinte:
“Na base da referida responsabilidade pelo pagamento das custas relativas às ações, aos incidentes e aos recursos está um de dois princípios, ou seja, o da causalidade e o do proveito, este a título meramente subsidiário, no caso de o primeiro se não conformar com a natureza das coisas (a responsabilidade pelo pagamento das custas com base no princípio do proveito ocorre, por exemplo, nos processos especiais de inventário de partilha ou de divisão de coisa comum).
Grosso modo, a causalidade consubstancia-se na relação entre um acontecimento (causa) e um posterior acontecimento (efeito), em termos de este ser uma consequência daquele.
Considerando o disposto na primeira parte do n.º 1 deste artigo, o primeiro evento é determinado comportamento processual da parte e o último a sua responsabilização pelo pagamento das custas.
Nesta perspetiva, do referido princípio da causalidade emerge a solução legal de dever pagar as custas relativas às ações, aos incidentes e aos recursos a parte a cujo comportamento lato sensu o ajuizamento do litígio seja objetivamente imputável.
A dúvida revelada pela doutrina e pela jurisprudência ao longo do tempo sobre quem devia ser responsabilizado pelo pagamento das custas processuais com base no princípio da causalidade levou o legislador a intervir por via da inserção do normativo que atualmente consta do n.º 2 do artigo, em termos de presunção iuris et de iure, ou seja, de que se entende sempre dar causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for.
Consequentemente, o referido nexo de causalidade tem como primeiro evento o decaimento nas ações, nos incidentes e nos recursos, e o último na responsabilização pelo pagamento das custas de quem decaiu, conforme o respetivo grau.
Assim, a parte vencida nas ações, nos incidentes e nos recursos é responsável pelo pagamento das custas, ainda que em relação a eles não tenha exercido o direito de contraditório, o que se conforme com o velho princípio que envolve esta matéria, ou seja, o da justiça gratuita para o vencedor.
Em suma, o recorrido que não acompanhou o recurso procedente interposto pela parte contrária é responsável pelo pagamento das custas nas suas vertentes de encargos, se os houver, e das custas de parte” .
E é com base nestas pertinentes considerações, que formula as seguintes conclusões:
“1.ª – É responsável pelo pagamento das custas nos recursos a parte que lhes tenha dado causa;
2.ª – Dá causa às custas dos recursos a parte que neles ficar vencida na respetiva proporção;
3.ª – A circunstância de o recorrido não ter contra-alegado no recurso interposto pela parte contrária, que foi julgado procedente, não exclui a sua responsabilidade pelo pagamento das custas respetivas”.
Num texto posterior, datado de 22 de Outubro de 2020 , o mesmo Autor reafirma o seu entendimento, quando refere que a parte recorrida não contra-alegou no recurso,
“mas podia nele ter contra-alegado, opondo-se à pretensão do recorrente”, pelo que no “âmbito da relação jurídica processual relativa ao recurso”, se configura “como parte vencida, porque a decisão da Relação de procedência lhe é potencialmente desfavorável.
Face ao disposto no n.º 2 do artigo 527.º do mencionado Código, porque é parte vencida no recurso, apesar de neste não ter contra-alegado, (…) é responsável pelo pagamento das custas respetivas em sentido estrito.
As custas em sentido estrito relativas ao recurso abrangem os encargos que nele tenham ocorrido, nos termos dos artigos 529.º, n.º 3, e 532.º, e as custas de parte, estas em conformidade com o estatuído no artigo 529.º, 4, e 533.º, n.ºs 1 e 2, todos do supramencionado Código, e no artigo 26.º, n.º 3, do Regulamento das Custas Processuais.
No caso vertente, porém, o recorrente nada despendeu no recurso a título de encargos, mas certamente que fez dispêndio a título de custas de parte nas vertentes previstas no n.º 3, alíneas a) e c), do artigo 26.º daquele Regulamento.
Face ao exposto, o segmento relativo às custas a expressar no acórdão em análise devia ter sido no sentido de condenação do recorrido B no pagamento das custas do recurso na vertente das custas de parte liquidandas”.
Neste segundo texto, são as seguintes as conclusões tiradas:
“1.ª - O segmento condenatório “custas da apelação na proporção do decaimento a apurar a final” está negativamente afetado pelos vícios processuais de obscuridade e de falta de fundamentação.
2.ª - O nosso sistema de custas processuais não comporta a condenação no pagamento de custas do recurso na proporção do decaimento a apurar a final.
3.ª – Vencido no recurso, apesar de nele não ter contra-alegado, é o recorrido B sujeito da responsabilidade pelo pagamento das respetivas custas em sentido estrito – sem a vertente da taxa de justiça.
4.ª – Como o recorrente nada despendeu no recurso a título de encargos, a responsabilidade do recorrido pelo pagamento de custas cinge-se à vertente das custas de parte liquidandas.
5.ª – O segmento relativo às custas do acórdão devia expressar: “Condena-se o recorrido no pagamento das custas do recurso, na vertente das custas de parte liquidandas”.
Directamente relevante para a apreciação que fazemos, merece referência expressa o Acórdão da Relação de Lisboa de 11 de Fevereiro de 2021 (Processo n.º 1194/14.3TVLSB.L2-2-Carlos Castelo Branco), onde, depois de se afirmar que da “conjugação do disposto no artigo 527.º, n.ºs. 1 e 2, com o n.º 6 do artigo 607.º e com o n.º 2 do artigo 663.º, todos do CPC, conclui-se que a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no critério do vencimento ou decaimento na causa, ou, não havendo vencimento, no critério do proveito, mas, tal não sucede quanto à taxa de justiça, cuja responsabilidade pelo seu pagamento decorre automaticamente do respetivo impulso processual”, e se sublinhar que de “acordo com o estatuído no n.º 2 do art. 527.º do CPC, o critério de distribuição da responsabilidade pelas custas assenta no princípio da causalidade e, apenas subsidiariamente, no da vantagem ou proveito processual”, se fixou o entendimento segundo o qual “dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for”, sendo que, “Vencidos são todos os que não obtenham na causa satisfação total ou parcial dos seus interesses” e havendo “um vencedor e não se encontrando uma parte vencida, não funciona o critério da causalidade, atuando o princípio do proveito”, pelo que, não havendo isenção tributária, o recurso está sujeito a tributação - aspecto que é preliminar face à determinação da responsabilidade das partes relativamente a custas - não tendo “fundamento legal uma decisão que se expresse “sem custas””.
Todas estas considerações nos merecem concordância.
Reportando-as à situação dos autos, vejamos o tratamento próprio que implicam.
De facto, é claro que será responsável pelo pagamento das custas nos recursos a parte que lhes tenha dado causa e que dá causa às custas dos recursos a parte que neles ficar vencida na respectiva proporção e ainda que o Recorrido não contra-alegou no recurso interposto e que veio a ser julgado procedente.
Mas também o é que a questão em análise no recurso era uma questão processual reportada em exclusivo à Ré-Recorrente e ao Tribunal, sem que nela tivesse tido intervenção o Autor: não foi este último a suscitar a putativa extemporaneidade da apresentação da Contestação, tudo se tendo passado entre Ré-Recorrente e Tribunal; o Autor nem quer apresentou Contra-alegações.
Certo que:
- a Apelante-Ré-Recorrente viu provido o seu recurso, vencendo-o (artigo 527.º, n.ºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil), pelo que - por via do critério do vencimento - não poderia ser objecto de custas do recurso;
- o Autor-Recorrido, sendo totalmente estranho à situação que deu origem à decisão do Tribunal e não tendo apresentado Contra-alegações, é alheio à sorte do recurso, mas não deixa de beneficiar da decisão e, nessa medida, de ser prejudicado com a revogação da decisão do Tribunal.
Como se refere no Acórdão da Relação de Lisboa de 22 de Janeiro de 2019 (Processo n.º 45824/18.8YIPRT-A.L1 -Micaela Sousa), quando “não haja uma parte vencida, se também não existir uma outra vencedora, será responsável pelas custas aquele (ou aqueles) cuja esfera se mostrar favorecida, e também na sua exacta medida, em face do teor da decisão.
Existindo um vencedor, por princípio e natureza, não lhe pode ser imputada a responsabilidade pela obrigação do pagamento das custas por ser de afastar, naturalmente, a causalidade. Ou seja, por regra, o vencedor é aquele que obteve ganho de causa. Ainda que este ganho de causa implique necessariamente um proveito, não é este proveito que releva quando se recorre ao respectivo princípio subsidiário, pois que, tal como resulta do n.º 1 do art. 527°, n.º 1 do CPC, apenas não havendo vencimento é que funciona o critério subsidiário do proveito.
Mas havendo um vencedor e não se encontrando uma parte vencida, esta não pode ser condenada no pagamento de custas porque não se verifica a causalidade (não deu causa à acção ou ao recurso), mas também aquele não o pode ser precisamente por ter havido vencimento (o que afasta o critério do proveito).
Nestas situações, impõe-se encontrar uma outra solução.
Será apenas quando perante a resolução do litígio não se descortine nem um vencido, nem um vencedor, que a responsabilidade tributária terá de assentar então no critério do proveito, isto é, em função das vantagens obtidas.
Na situação sub judice, a apelante obteve vencimento na pretensão recursória que trouxe a juízo, ou seja, logrou obter a revogação do despacho que” considerara extemporânea a apresentação da sua Contestação e, como “tal, a recorrente obteve provimento no recurso por si interposto, ou seja, obteve ganho de causa.
Enquanto vencedora, a recorrente não pode ser responsabilizada pela obrigação tributária, pois houve vencimento de causa.
Por sua vez”, o Autor-Recorrido manteve-se alheio “à sorte do recurso. Não contra-alegou (faculdade concedida pelo art. 638°, n.º 5 do CPC), nem tomou qualquer posição sobre a matéria apreciada na decisão recorrida” (extemporaneidade da Contestação).
“Independentemente da existência ou inexistência de contra-alegação (cuja falta não produz qualquer efeito processual imediato e sem que seja legítimo atribuir-lhe o significado de concordância com a argumentação ou com a pretensão do recorrente (…)), o que releva determinar é se a parte dispositiva da decisão se reflecte negativamente na esfera jurídica da recorrida, ou seja, se o seu resultado efectivamente a desfavorece”.
Ora, o Autor-Recorrido sai vencido no recurso, pois a decisão de lhe dar provimento, acaba por – objectivamente – o desfavorecer: só assim não seria se o próprio Autor-Recorrido tivesse vindo manifestar a sua concordância com a tempestividade da Contestação em causa.
Assim, e inexistindo norma que dispense tributação (em conformidade com o princípio geral de tributação ínsito no artigo 1.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais e com o artigo 527.º do Código de Processo Civil), e tendo com o presente recurso sido desenvolvida actividade jurisdicional relevante para efeitos de custas (custas de parte ), as Custas devidas terão de ficar a cargo do Autor-Recorrido (que apesar de não lhe ter dado causa, se manteve numa posição de expectativa, não interveniente, beneficiante).
Outra qualquer decisão corresponderia a um resultado iníquo - sendo que os Tribunais devem sempre obstar à produção de resultados iníquos - como ocorreria numa situação em que uma parte fosse condenada a pagar custas (mesmo que apenas na vertente de custas de parte), por um recurso cujo resultado não respeitasse ao objecto do processo, nem alterasse a sua posição inicial nos autos, e em que não tivesse qualquer intervenção (seja na origem, seja no seu desenvolvimento).
Em conclusão e em face de tudo o exposto, no que à responsabilidade tributária respeita, as custas do Recurso (na vertente de custas de parte e única em causa) ficarão a cargo do Autor-Recorrido.
DECISÃO
Com o poder fundado no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa, e nos termos dos artigos 663.º e 656.º do Código de Processo Civil, acorda-se, nesta 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, face à argumentação expendida às disposições legais citadas, julgar procedente o recurso e, em conformidade revogar o Despacho recorrido, julgando atempada a apresentação da Contestação e determinando que o processo prossiga em conformidade.
Custas do recurso a cargo do Autor-Recorrido.

Registe e notifique.

Lisboa, 26 de Setembro de 2023
Edgar Taborda Lopes
Ana Rodrigues da Silva
Cristina Maximiano