Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Cível
Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
 - ACRL de 23-01-2024   Não havendo lugar a réplica, a matéria de facto respeitante às exceções tem-se por não admitida por acordo.
Da responsabilidade do Relator.
1. Uma interpretação do enunciado do n.º 1 do art. 587.º do Cód. Proc. Civil conforme à Const. Rep. Port. – mais precisamente, ao n.º 4 do seu art. 20.º – obriga a que se conclua que, não havendo lugar a réplica, a matéria de facto respeitante às exceções tem-se por não admitida por acordo
2. Conforme se entendeu no Ac. do TC n.º 77/2023, “num processo equitativo, não podem aceitar-se efeitos preclusivos intensos sobre direitos essenciais das partes (…) com base em regras pouco claras. Ou, dito de outro modo, quanto mais intenso é o efeito preclusivo (intensidade medida pela centralidade do direito afetado), mais exigente deve ser o intérprete com a clareza da regra na qual esse efeito se baseia, clareza que se há de buscar, antes de mais, na própria letra da lei, regra que visa evitar que o risco interpretativo seja desproporcionadamente alocado à parte, com sacrifício dos seus direitos processuais, e injustificadamente aliviado do lado do legislador, que tem o dever de sinalizar com clareza os efeitos desfavoráveis, principalmente a supressão de direitos processuais de grande importância”.
3. Do juiz gestor exige-se uma prognose sobre a evolução futura da concreta lide gerida, com vista à concretização de uma ordem processual mais respeitadora dos princípios que informam o processo civil. O juiz só poderá desenvolver esta atividade se lhe for reconhecida uma confortável margem de discricionariedade de apreciação
4. Sendo proferido despacho interlocutório que não inviabiliza julgamento do mérito da causa em prazo razoável nem condiciona o seu sentido, e sendo o objeto de tal despacho a definição do desenvolvimento processual que o tribunal entende ser aquele que o colocará em melhores condições para garantir a justa composição do litígio, deve ser depositada confiança na capacidade gestionária e no prudente juízo do juiz titular, devendo o tribunal ad quem manter a decisão apelada autonomamente.
Proc. 4488/20.5T8ALM-B.L1 7ª Secção
Desembargadores:  Paulo Jorge Ramos de Faria - Ana Mónica C. Mendonça Pavão - -
Sumário elaborado por Carolina Costa
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Processo 4488/20.5T8ALM-B.L1 – Reclamação (art. 652.º, n.º 3). Apelação
Tribunal a quo Juízo Central Cível de Almada – Juiz 1
Recorrente(s) BBB.
Recorrido(a/s) AAA.
Sumário:
1. Uma interpretação do enunciado do n.º 1 do art. 587.º do Cód. Proc. Civil conforme à Const. Rep. Port. – mais precisamente, ao n.º 4 do seu art. 20.º – obriga a que se conclua que, não havendo lugar a réplica, a matéria de facto respeitante às exceções tem-se por não admitida por acordo
2. Conforme se entendeu no Ac. do TC n.º 77/2023, “num processo equitativo, não podem aceitar-se efeitos preclusivos intensos sobre direitos essenciais das partes (…) com base em regras pouco claras. Ou, dito de outro modo, quanto mais intenso é o efeito preclusivo (intensidade medida pela centralidade do direito afetado), mais exigente deve ser o intérprete com a clareza da regra na qual esse efeito se baseia, clareza que se há de buscar, antes de mais, na própria letra da lei, regra que visa evitar que o risco interpretativo seja desproporcionadamente alocado à parte, com sacrifício dos seus direitos processuais, e injustificadamente aliviado do lado do legislador, que tem o dever de sinalizar com clareza os efeitos desfavoráveis, principalmente a supressão de direitos processuais de grande importância”.
3. Do juiz gestor exige-se uma prognose sobre a evolução futura da concreta lide gerida, com vista à concretização de uma ordem processual mais respeitadora dos princípios que informam o processo civil. O juiz só poderá desenvolver esta atividade se lhe for reconhecida uma confortável margem de discricionariedade de apreciação
4. Sendo proferido despacho interlocutório que não inviabiliza julgamento do mérito da causa em prazo razoável nem condiciona o seu sentido, e sendo o objeto de tal despacho a definição do desenvolvimento processual que o tribunal entende ser aquele que o colocará em melhores condições para garantir a justa composição do litígio, deve ser depositada confiança na capacidade gestionária e no prudente juízo do juiz titular, devendo o tribunal ad quem manter a decisão apelada autonomamente.

Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa
A. Relatório
A.A. Identificação das partes e indicação do objeto do litígio
AAA instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra BBB, pedindo a condenação da “ré a pagar ao autor, a título de indemnização por danos patrimoniais de personalidade, pela utilização indevida da sua imagem e do seu nome, a quantia de € 144.000,00 (…), de capital, acrescida dos juros vencidos, no montante de € 51.877,48 (…), tudo no total de € 195.877,48 (…) e dos juros que se vencerem até integral pagamento, à taxa legal, tudo com o mais da lei. // Mais deve a ré ainda ser condenada a pagar ao autor montante nunca inferior a € 5.000,00 (…), a título de danos não patrimoniais, acrescido, também, dos juros vencidos, no montante de € 2.935,34 (…), tudo no total de € 7.935,34 (…) e dos juros que se vencerem até integral pagamento, à taxa legal, tudo com o mais da lei. // E, bem assim, no pagamento das custas e procuradoria condigna, incluindo honorários de mandatário”.
Para tanto, alegou que a ré, sem o seu consentimento, enriqueceu usando imagens representando fisicamente o autor, o seu nome e alguns dos seus dados biográficos, num dos jogos criados e comercializados pela demandada.
Citada a ré, ofereceu esta a sua contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Na fase intermédia da ação, o tribunal a quo decidiu, além do mais:
Termos em que, visando assegurar a celeridade e a simplificação que devem presidir na tramitação do processo, dispenso a realização da audiência prévia, ao abrigo do que permitem os arts. 6.º, n.º 1, 547.º e 593.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, sem prejuízo de as partes poderem vir requerer a sua marcação, no prazo de 10 (dez) dias, nos termos previstos pelo art. 593.º, n.º 3, do mesmo Código.
(…)
Estando controvertida a matéria alegada respeitante à verificação da exceção de prescrição do direito do autor e à sua atuação em abuso de direito, relega-se para a sentença o conhecimento das aludidas exceções, dado o tribunal não se encontrar em condições de as decidir neste momento sem produção de ulterior prova.
Inconformada, a ré apelou destas decisões, concluindo, no essencial:
c) Quanto à dispensa da realização de audiência prévia, o despacho, além de proferido em erro manifesto, é nulo e ilegal: assume-se que às partes foi dado o exercício do direito de discussão de facto e de direito das exceções invocadas pela ré, o que não ocorreu.
d) O Tribunal refere ter notificado o autor para responder às exceções, o que este fez – 1.º e 4.º parágrafos da pág. 2 e 1.º parágrafo da pág. 15 do despacho recorrido.
e) Sucede que este circunstancialismo não ocorreu sob nenhuma forma, tratando-se de lapso manifesto do tribunal, nos termos do art.º 614.º do CPC.
f) O despacho de dispensa da audiência prévia é igualmente nulo por contradição entre os seus fundamentos, onde se reconhece que face às exceções invocadas nesta ação cumpre permitir às partes exercer a faculdade de discussão de facto e de direito, e o sentido decisório que foi o de dispensar a audiência prévia (além da ambiguidade e ininteligibilidade decorrente da respetiva obscuridade) – art.º 613.º, n.º 3 e 615.º, n.º 1, alínea c) e 4, todos do CPC.
g) Ocorre ainda erro de direito porque, perspetivando-se nos autos que é possível a apreciação imediata das exceções, tal determina a necessidade de convocação de audiência prévia – art.º 591.º, n.º 1 e, a contrario sensu o art.º 593.º, n.º 1 do CPC.
h) A dispensa da audiência prévia, quando se está perante um caso, como o dos autos, que não admite essa dispensa, ou quando não foi devidamente dispensada, é uma irregularidade processual que implica uma nulidade processual, porque a lei entende que a observância do contraditório – na vertente de se dar às partes a possibilidade de influenciarem uma decisão antes de ela ser proferida – deve ter lugar oralmente, perante o juiz e, por isso, a não observância deste modo de exercício do contraditório pode, segundo a lei, influir no exame ou na decisão da causa (art.º 195/1 do CPC), a este respeito, entre outros, o acórdão do TRL de 04.06.2019, Proc. n.º 214/16.1T8MFR.L1-7).
i) Nulidade que se comunica aos demais segmentos decisórios de todo o despacho saneador, implicando a sua total revogação (acórdãos do STJ de 23.06.2016, Proc. n.º 1937/15.8T8BCL.S1 e de 17.03.16, Proc. 1129/09.5TBVRL-H.G1.S1).
j) Caso improceda o recurso contra o despacho que dispensou a realização de audiência prévia, sempre deverá ser declarada a nulidade por omissão de pronúncia de decisão do mérito da ação (e por omissão total de pronúncia sobre a exceção de licenciamento), porque os autos reúnem todos os elementos para decisão das exceções perentórias:
(i) O direito indemnizatório reclamado pelo autor está prescrito, porque o mesmo teve conhecimento da inclusão da sua imagem em 2005 e intentou esta ação década e meia depois, em 2020;
(ii) A ré é titular de licença para exploração económica dos direitos de imagem do autor, através do contrato celebrado com a XXXPRO, entidade mandatada, conforme contrato junto, pelo Sindicato dos Jogadores Profissionais (…), o qual é titular do direito de exploração económica da imagem do autor por via do art.º 14.º, n.º 2 da Lei n.º 54/2017 e art.º 38.º, n.º 4 do Contrato Coletivo de Trabalho (CCT), celebrado entre a Liga Portuguesa (…), em representação dos clubes e o Sindicato dos Jogadores Profissionais (CCT aplicável a todos os [jogadores profissionais] por força da Portaria de Extensão n.º 100/2010 (factualidade detalhada na contestação e constante dos documentos juntos); e
(iii) O autor conhecia os jogos ‘VIDEOGAME’ há mais de 15 anos, sabia que os mesmos representavam um dado momento histórico do [desporto], sabia da inclusão da sua imagem, declarou em entrevista a vontade em estar no jogo e é visível o seu contentamento e entusiasmo com os jogos ‘VIDEOGAME’, tendo tomado a decisão de nunca reivindicar qualquer direito desde 2005 até 2020.
k) O autor não impugnou a genuinidade ou a autenticidade dos documentos juntos pela ré, nem tomou posição, sob qualquer forma e para os efeitos do art.º 587.º do CPC, com a cominação legalmente prevista no art.º 574.º do CPC (admissão por acordo), quanto aos factos relativos à prescrição, ao licenciamento invocado pela ré ou ao exercício do seu direito em abuso de direito. (…)
n) Tendo sido relegado o conhecimento das exceções para final, não só se mostra cometida nulidade por omissão de pronúncia, nos termos dos art.º 613.º, n.º 3 e 615.º, n.º 1, alínea d), e 4, ambos do CPC, como subiste erro de direito já que ao tribunal competia, por força do art.º 595.º, n.º 1, alínea b), decidir o mérito da causa.
O apelado contra-alegou, pugnando pela manutenção das decisões do tribunal a quo impugnadas, concluindo, além do mais, nos seguintes termos:
b) Nos termos do n.º 4, do artigo 595.º do Código de Processo Civil, não cabe recurso da decisão do juiz que, por falta de elementos, relegue para final a decisão de matéria que lhe cumpra conhecer.
c) Aquele segmento decisório do despacho saneador proferido, nos termos configurados pela recorrente no recurso interposto, não é suscetível de recurso. (…)
j) Para além do mais, se – como a ré confessa nas alegações de recurso – não foi dada a possibilidade ao Autor de exercer o contraditório sobre tais exceções perentórias, como pode a ré vir afirmar mais adiante que o Tribunal já está em condições de decidir do mérito sobre essas mesmas exceções? (…)
l) (…) [Q]ualquer decisão proferida nos autos, em tais circunstâncias, incorreria na violação do disposto no artigo 3.º, n.º 3 do Código de processo Civil, uma vez que se trataria, sempre, de uma decisão surpresa. (…)
O tribunal a quo proferiu o despacho previsto no art. 641.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, admitindo o recurso de apelação com subida imediata e em separado, e com efeito meramente devolutivo (ref. 429631656).
Entretanto, pelo tribunal a quo foi proferido despacho, em 23 de outubro de 2023, decidindo:
(…)
Termos em que, para realização da audiência prévia, com as finalidades previstas nos arts. 593.º, n.º 3 e 598.º, n.º 1, designo o próximo dia 28 de novembro de 2023, pelas 14h00, no edifício deste Tribunal, e não antes por indisponibilidade de agenda e de sala de audiências.
Neste tribunal da Relação, foram as partes notificadas para, querendo se pronunciarem sobre a utilidade da instância de recurso, no que respeita à apelação do despacho que dispensou a realização da audiência prévia, em face do despacho proferido pelo tribunal a quo em 23 de outubro de 2023.
Foi, ainda, proporcionada à apelante a oportunidade para responder ao pedido do apelado de rejeição liminar do recurso do despacho que relegou para final a decisão sobre as exceções perentórias invocadas (arts. 595.º, n.º 4, e 655.º, n.º 2, do Cód. Proc. Civil).
No uso da oportunidade proporcionada, o apelado sustentou ser inútil o recurso que tem por objeto a não convocação da audiência prévia.
A apelante alegou, além do mais, o seguinte:
3. (…) [E]ntende a ré que o despacho é ilegal em dois segmentos autónomos: não convocar a audiência prévia para as finalidades das alíneas b) e d) do n.º 1 do art. 591.º do CPC (…) e na parte em que relega o conhecimento das exceções para final (…).
4. É certo que, entretanto, foi convocada audiência prévia, mas esta não se destina às referidas finalidades, antes é convocado nos termos do art.º 593.º, n.º 3 do CPC, onde não se inclui discutir de facto e de direito as exceções, nem projetar a sua imediata decisão em saneador-sentença. (…)
7. A audiência prévia agendada não contende com o objeto do recurso, já que se destinará à reclamação dos despachos relativos à definição do objeto do litígio e temas da prova, alteração dos requerimentos de prova e discutir a posição das partes, para delimitação dos termos do litígio. (…)
10. O art.º 595.º, n.º 4 do CPC consagra a hipótese de irrecorribilidade quando haja falta de elementos – o que não é o caso.
11. Como argumentado em detalhe no recurso, não há factualidade controvertida nos autos (o autor não impugnou os factos densificadores das exceções, nem suscitou a falta de autenticidade ou genuinidade dos documentos que titulam as licenças a favor da ré). (…)
Nestes termos, mantendo-se a total utilidade da presente instância de recurso, deve o mesmo ser admitido e ordenado, como pugnado, a revogação da decisão do Tribunal a quo.
Pelo relator, foi proferida decisão singular, no sentido de:
a) não admitir o recurso interposto da decisão que relegou para final o conhecimento das exceções perentórias;
b) julgar improcedente o recurso interposto da decisão que dispensou a realização da audiência prévia.
Novamente inconformada, a ré reclamou para a conferência, requerendo que sobre a matéria do despacho recaia um acórdão (art. 652.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil).
A.B. Questões que ao tribunal cumpre solucionar
São as seguintes as duas questões a abordar:
a) admissibilidade do recurso interposto da decisão que relega para final o conhecimento das exceções perentórias;
b) legalidade da decisão que dispensa a realização da audiência prévia.

B. Fundamentação
B.A. Factos relevantes a considerar
Os factos a considerar nesta decisão são factos meramente processuais, sendo estes os acima descritos no relatório, bem como o teor dos articulados das partes, que aqui se dão por reproduzidos.
B.B. Análise das questões a resolver
São os seguintes os capítulos desta decisão:
1. Admissibilidade do recurso da decisão de relegar o conhecimento de exceções
2. Recurso da decisão que dispensou a realização de audiência prévia
3. Sobre a reclamação para a conferência
3.1. Recurso da decisão que relegou o conhecimento das exceções
3.2. Recurso da decisão que dispensou a audiência prévia
3.3. Conclusão
4. Responsabilidade pelas custas
1. Admissibilidade do recurso da decisão de relegar o conhecimento de exceções
O tribunal a quo decidiu, recorde-se, estar “controvertida a matéria alegada respeitante à verificação da exceção de prescrição do direito do autor e à sua atuação em abuso de direito”, pelo que relegou “para a sentença o conhecimento das aludidas exceções, dado o tribunal não se encontrar em condições de as decidir neste momento sem produção de ulterior prova”. Sobre este desenvolvimento processual, reza o n.º 4 do art. 595.º do Cód. Proc. Civil que “[n]ão cabe recurso da decisão do juiz que, por falta de elementos, relegue para final a decisão de matéria que lhe cumpra conhecer”.
Diferentemente, a apelante entende que o tribunal a quo dispunha de elementos para decidir, desde já, as exceções perentórias invocadas. Está pois em causa, num primeiro momento, o grau de discricionariedade de apreciação confiado ao juiz no preenchimento do pressuposto enunciado na norma – inexistência de elementos bastantes – e, num segundo momento, se for recusada tal discricionariedade, apurar se, de facto, o tribunal a quo dispunha de elementos para decidir, desde já, as exceções perentórias arguidas. Embora seja esta a precedência lógica das questões, a resposta negativa dada à segunda resolve definitivamente o problema, pelo que é por ela que começamos.
Importa aqui notar que o processo só comportou dois articulados: a petição e a contestação. Regista-se, ainda, um requerimento na fase dos articulados, por meio do qual o autor, espontaneamente, exerceu (apenas) o contraditório relativamente à exceção dilatória deduzida. O mesmo é dizer que toda a factualidade nova alegada pela ré na sustentação das exceções perentórias que deduz se encontra controvertida, dado que não está em causa factualidade sujeita a prova tabelada que já tenha sido produzida – neste sentido, cfr. URBANO LOPES DIAS, «O artigo 3.º, n.º 4, do nCPC: extensão do ónus de impugnação ou mera faculdade de exercício do contraditório», Blog do IPPC, comentário sinótico de 14/04/2015 .
Assim, por exemplo, quanto à exceção de prescrição, a afirmação de que o autor teve conhecimento da inclusão da sua imagem nos jogos criados pela ré em 2005 – conclusão j), (i) – encontra-se controvertida. Aliás, é a própria ré que reconhece que o autor nada admitiu a este respeito, nunca especificando “quando concretamente tomou conhecimento” (art. 99.º da contestação). A apelante entende, mal, que estamos perante matéria não carecida de prova, quando é a própria que retira a sua conclusão de um juízo probatório meramente assente em presunções judiciais e em regras da experiência (art. 106.º da contestação), juízo este não admitido pelo autor, designadamente em articulado subsequente. Como é evidente, ainda que tal juízo possa (ou não) ser apropriado, o autor pode ainda produzir prova que o contrarie.
E com este exemplo afastamos, ainda, a ideia de que a exceção de exercício abusivo do direito pode ser imediatamente julgada, por assentar em factos não carecidos de prova. Assentando esta exceção na ideia de que a “não reivindicação de qualquer pretenso direito por um período tão longo teria (e terá) o efeito de impedir uma reivindicação atual” (art. 257.º da contestação), a controvérsia em torno da data em que o autor tomou conhecimento da atuação da ré impede a conclusão no sentido de o estado dos autos permitir o imediato julgamento desta questão.
Relativamente à “exceção perentória” de “licenciamento da exploração dos direitos de imagem a favor da ré”, alega esta que [a] utilização pela ré dos direitos de imagem foi integralmente legitimada, do ponto de vista legal, contratual e material, nunca a ré ultrapassando os limites do que foi definido na lei e licenciado por quem estava habilitado para tal” (art. 134.º da contestação). Ora, por um lado, em momento algum o autor aceitou, por exemplo, que “nunca a ré ultrapassando os limites do que foi definido na lei e licenciado por quem estava habilitado para tal”.
Por outro lado, não pode a ré extrair dos documentos juntos que a sua atuação nunca ultrapassou “os limites do que foi definido na lei e licenciado por quem estava habilitado para tal”. Aplicando ao caso a afamada comparação de Winston Churchill, aceitar que os putativos acordos de licenciamento invocados provam que a ré não excedeu o que consta deles é como aceitar que um homem de pé dentro de um balde pode levantar-se a si própria puxando pela pega.
Em suma, o estado dos autos não permite o conhecimento imediato de nenhuma das exceções perentórias invocadas. O conhecimento imediato de uma exceção perentória em sede de despacho saneador só deve ter lugar quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, o que não ocorre no caso dos autos – cfr. o Ac. do TRE de 12-07-2018 (311/17.6T8OLH-A.E1).
Do raciocínio expendido se extrai que o despacho proferido em análise é irrecorrível (art. 595.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil), pelo que não se pode admitir o recurso interposto, na parte em que o tem por objeto.
2. Recurso da decisão que dispensou a realização de audiência prévia
Conforme já foi referido, após a interposição do recurso da decisão que dispensou a realização de audiência prévia, pelo tribunal a quo foi proferido despacho, em 23 de outubro de 2023, decidindo a “realização da audiência prévia, com as finalidades previstas nos arts. 593.º, n.º 3 e 598.º, n.º 1”. A apelada entende que a “audiência prévia agendada não contende com o objeto do recurso, já que se destinará à reclamação dos despachos relativos à definição do objeto do litígio e temas da prova, alteração dos requerimentos de prova e discutir a posição das partes, para delimitação dos termos do litígio”, sendo que a ré pretende que a audiência seja convocada para “as finalidades das alíneas b) e d) do n.º 1 do art. 591.º do Cód. Proc. Civil”.
Assiste razão à apelante, quando sustenta que o despacho entretanto proferido não vai ao encontro da sua pretensão – não tornando o recurso inútil –, mas falece-lhe a razão quanto ao mérito da apelação. Com efeito, como vimos, é prematuro julgamento das exceções perentórias – sobretudo se for no sentido da sua procedência. Assim sendo, a não convocação da audiência prévia para os fins previstos nas als. b) e d) do n.º 1 do art. 591.º do Cód. Proc. Civil tem total cobertura legal.
Quanto ao mais – isto é, quanto às nulidades invocadas –, verifica-se que o despacho recorrido contém um lapso manifesto – respeitante ao putativo prévio oferecimento do contraditório por decisão do tribunal –, tal como a apelante afirma na al. e) das conclusões, a justificar a sua retificação, se necessário, mas sem obrigar à sua invalidação. Ainda neste contexto, não se deteta nenhuma contradição no despacho – uma vez sinalizado e desconsiderado o referido lapso manifesto –, sendo o silogismo apresentado isento de falhas: porque o tribunal não se propunha conhecer do mérito nem se afigurava viável o acordo, a audiência podia ser, como foi, dispensada.
Em suma, o despacho que dispensou a realização de audiência prévia não enferma de nulidade nem de erro de julgamento.
3. Sobre a reclamação para a conferência
Deixando de lado o apontamento mais altruísta da reclamante – defendendo a ocorrência de uma nulidade por omissão, por ofensa ao direito de contraditório (da contraparte) –, por falta de legitimidade, retomaremos agora o raciocínio exposto na decisão do relator reclamada – de que os parágrafos acima são um decalque. Para tanto, seguiremos a mesma ordem de apreciação.
3.1. Recurso da decisão que relegou o conhecimento das exceções
Insiste a reclamante (apelante) que apenas “subsiste por discutir nos autos são apenas questões de direito”, tendo o relator ignorado “completamente o regime legal do art. 587.º do Cód. Proc. Civil”. A reclamante ignora, assim, completamente o que se deixou claro na decisão sumária, acima parcialmente transcrita, na esteira, entre outros, como foi referido, de URBANO LOPES DIAS, «O artigo 3.º, n.º 4, do nCPC: extensão do ónus de impugnação ou mera faculdade de exercício do contraditório», Blog do IPPC, comentário sinótico de 14/04/2015 .
Para que não subsistam dúvidas, esclarece-se que no (anterior) art. 505.º do CPC-95/96 se estabelecia que a falta de impugnação tinha o efeito previsto na contestação, quando se verificasse nos articulados previstos – réplica ou tréplica. A falta de impugnação dos factos alegados na tréplica – que só poderia ser feita através de um requerimento avulso, apresentado no momento previsto no art. 3.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil – não representava a admissão por acordo de tais factos.
Atualmente, a lei apenas dispõe que “a falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu tem o efeito previsto no artigo 574.º”, ou seja, a sua admissão por acordo; não dispõe, de modo paralelo, que a falta de impugnação na réplica tem esse efeito. Embora a redação da norma não seja a mais clara, o legislador não pretendeu impor ao autor o ónus de impugnar os novos factos alegados pelo réu, no momento previsto no art. 3.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil, nos casos em que não é admissível a réplica.
Por um lado, este artigo está (sistematicamente) incluído num capítulo dedicado à réplica. Por outro, a intenção do legislador – promovendo a simplificação e a celeridade processuais –, presente na eliminação da tréplica e na limitação da função da réplica, é clara. Seria, pois, absurdo sustentar que foi seu propósito tornar a audiência prévia e a audiência final mais complexas – o que até inviabilizaria a sua programação –, comportando uma fase inicial verdadeiramente necessária, de resposta à contestação, nos referidos casos em que a réplica não é admissível. Finalmente, a imposição de um ónus deste tipo implicaria, sob pena de violação do princípio da igualdade, que o réu também ficasse a ele sujeito, relativamente aos factos novos alegados na réplica. Ora, nenhuma disposição legal obriga o réu a impugnar a matéria da réplica no momento previsto no art. 3.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil – como transparece da sua epígrafe, o artigo em análise apenas diz respeito à posição do autor quanto aos factos articulados pelo réu.
A atribuição de um efeito ao silêncio da parte sobre os factos alegados pela parte contrária tem um carácter claramente excecional (arts. 218.º e 295.º do Cód. Civil). Seguramente que o autor pode responder à matéria de exceção na audiência prévia ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final (art. 3.º, n.º 4, do Cód. Proc. Civil). Mas deste direito (de contraditório) não se pode extrair um ónus de impugnação. A factualidade excecionada pelo réu tem-se sempre por controvertida, podendo o autor, ainda na fase dos articulados, no prazo previsto na segunda parte do n.º 2 do art. 552.º, do Cód. Proc. Civil, oferecer contraprova sobre a mesma (art. 346.º do Cód. Civil) – cfr. o Ac. do TRP de 23-05-2022 (19815/19.0T8PRT.P1), bem como a doutrina no mesmo citada.
Como é sabido, foi ensaiada uma alteração legislativa, entretanto caducada, que previa a modificação do enunciado do n.º 1 do art. 587.º do Cód. Proc. Civil, neste sentido: “A falta de impugnação dos factos alegados em articulado posterior à contestação tem o efeito cominatório previsto no artigo 574.º, mesmo que a impugnação devesse ser realizada de forma oral, sem prejuízo do disposto na alínea c) do artigo 572.º” – cfr. a Proposta de Lei 92/XIV/2, sublinhado nosso. Não é esta uma circunstância particularmente relevante, pois não faltarão aqueles que dirão que a projetada alteração só vinha clarificar o sentido que já se devia extrair do enunciado legal. Outros dirão que ela demonstra que a lei não previa tal efeito. E com isto se revela que o ónus de impugnação não pode ser afirmado nestes casos.
Com efeito, conforme se decidiu no Ac. do TC n.º 77/2023, na esteira e citando o aresto do mesmo tribunal n.º 766/2022, “num processo equitativo, não podem aceitar-se efeitos preclusivos intensos sobre direitos essenciais das partes (…) com base em regras pouco claras. Ou, dito de outro modo, quanto mais intenso é o efeito preclusivo (intensidade medida pela centralidade do direito afetado), mais exigente deve ser o intérprete com a clareza da regra na qual esse efeito se baseia, clareza que se há de buscar, antes de mais, na própria letra da lei, regra que visa evitar que o risco interpretativo seja desproporcionadamente alocado à parte, com sacrifício dos seus direitos processuais, e injustificadamente aliviado do lado do legislador, que tem o dever de sinalizar com clareza os efeitos desfavoráveis, principalmente a supressão de direitos processuais de grande importância”.
Este raciocínio é inteiramente aplicável ao estabelecimento de um ónus cuja insatisfação importa a admissão de factos. “A escassez e a ambiguidade de elementos de suporte da interpretação” ora pretendida pela reclamante “resulta num comportamento ou exigência que, para a parte, é (acaba por ser) intoleravelmente surpreendente” – cfr. o citado Ac. do TC n.º 77/2023. Esta realidade só pode ser superada se o tribunal, a coberto do disposto nos arts. 6.º, n.º 1, e 547.º do Cód. Proc. Civil, introduzir no rito processual um terceiro articulado, logo esclarecendo as partes para a existência de tal ónus de impugnação no articulado criado – o que não ocorreu no caso dos autos.
Em conclusão, uma interpretação do enunciado do n.º 1 do art. 587.º do Cód. Proc. Civil conforme à Const. Rep. Port. – mais precisamente, ao n.º 4 do seu art. 20.º – obriga a que se conclua que, não havendo lugar a réplica, a matéria de facto respeitante às exceções tem-se por não admitida por acordo.
Resta acrescentar que, como é evidente, só pode ser afirmado o exercício abusivo do direito se direito existir. O mesmo é dizer que a ré, não obstante afirmar que o autor não tem o direito de que se arroga, acaba por admitir que tal direito lhe pode, efetivamente, assistir. Sendo prematuro afirmar que o autor tem direito a uma compensação por enriquecimento sem causa ou a uma indemnização fundada em responsabilidade delitual, designadamente, nunca se poderá afirmar nesta fase intermédia da ação que o exerce abusivamente – tanto mais que a concreta tessitura desse putativo exercício abusivo é matéria não assente.
3.2. Recurso da decisão que dispensou a audiência prévia
Entende a apelante que, quando é pelo réu arguida uma exceção perentória, e na falta da criação judicial de um terceiro articulado para que o autor sobre ela tome posição definida, a audiência prévia deve ser convocada, obrigatoriamente. Sinteticamente, entende a apelante “que o processo não pode prosseguir sem a realização de audiência prévia, onde o autor tome posição expressa sobre as exceções ou o tribunal conclua que essa matéria não é controvertida”. E conclui: “[e]m suma, os autos não podem avançar para julgamento sem que a posição das partes sobre os termos do litígio se mostre devidamente definida, sem que as partes se vinculem a uma versão factual, inclusive sobre as matérias de exceção”.
Começamos por notar que, ao menos expressamente, a lei não dispõe exatamente no sentido sustentado pela apelante. A lei não reza, no art. 591.º, n.º 1, al. b), que “é convocada audiência prévia” para facultar às partes a discussão de facto e de direito, independentemente de o juiz tencionar conhecer imediatamente do mérito da causa; reza, sim, que a audiência é convocada para “facultar às partes a discussão de facto e de direito, (…) quando [o juiz] tencione conhecer imediatamente, no todo ou em parte, do mérito da causa”.
Já da articulação entre o art. 591.º, n.º 1, al. c), e art. 593.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil resulta que o juiz deve convocar a audiência prévia quando seja necessário “[d]iscutir as posições das partes, com vista à delimitação dos termos do litígio, e suprir as insuficiências ou imprecisões na exposição da matéria de facto que ainda subsistam (…)”. Sendo os termos do litígio claros, não é forçosa a realização da audiência prévia, para que o autor tome posição sobre todos e cada um dos factos alegados pela ré suscetíveis de integrar os fundamentos de uma exceção. Só assim se deverá proceder quando da discussão puder resultar uma admissão que – à luz das diferentes soluções plausíveis para a questão de direito – habilite o tribunal a, com total segurança, decidir imediatamente de mérito. E ainda que assim proceda, deverá o tribunal esclarecer que entende que, neste caso, a faculdade prevista no n.º 4 do art. 3.º do Cód. Proc. Civil é, na verdade, um ónus (de impugnação) a ser satisfeito oralmente.
No caso dos autos, o autor já tomou posição sobre a questão da eventual prescrição do seu direito, designadamente, nos arts. 41.º, 51.º, 109.º, 153.º e 161.º da petição inicial. Sustenta o autor que a violação do direito exercido nesta ação por parte da ré não foi instantânea, mas sim continuada (com a continuada comercialização das versões anteriores dos jogos pela última) e periodicamente renovada (com o lançamento de novas versões, por vezes, com uma periodicidade anual) – a última edição referida é identificada com o ano 2017 (sendo habitual os jogos serem lançados antes do Natal do ano anterior), tendo a ação dado entrada em setembro de 2020. Mais sustenta que está em discussão a violação de direitos de personalidade, como tal imprescritíveis (art. 298.º, n.º 1, do Cód. Civil).
A ré sustenta que o autor teve conhecimento do conteúdo dos jogos na data de lançamento (!) das respetivas versões – art. 75.º da contestação. Sobre esta alegação, e para a sua impugnação, bastará ao autor dizer: é falso que tenha tido conhecimento do conteúdo de cada uma das versões nas respetivas datas de lançamento. Note-se, por um lado, que não é minimamente evidenciado pela ré tal factualidade – por exemplo, não alega que, antecipadamente, e por usar o seu nome, ofereceu uma cópia de cortesia ao autor nem que este adquiriu uma cópia no dia do lançamento. Por outro lado, os argumentos que invoca no art. 106.º da petição inicial são deduções meramente especulativas (e notoriamente falaciosas), e não puros dados de facto sobre os quais o autor se possa pronunciar (ou mesmo se deva pronunciar, já que as partes se devem cingir ao essencial).
Em qualquer caso, como referimos, a posição adotada pelo autor sobre a prescrição do seu direito – uma das existentes soluções plausíveis para esta questão, porventura a que tem melhor acolhimento pelo tribunal a quo – é indiferente a esta questão de facto. O julgamento desta exceção perentória exige que se conheça a concreta tessitura da relação material controvertida, de modo a que se alcance a natureza do direito ofendido – de personalidade ou puramente patrimonial –, antes de, com segurança, se poder concluir, ou não, pela prescrição, total ou parcial, do direito ou direitos exercidos.
A existência de outras soluções plausíveis para a questão de direito – ou a não adoção pelo tribunal a quo da pretendida pela excipiente – justifica, no caso, que se relegue para final o seu conhecimento. Trata-se de uma decisão com uma forte componente gestionária – para maiores desenvolvimentos, cfr. PAULO RAMOS DE FARIA, «Relevância das (outras) soluções plausíveis da questão de direito», Julgar Online, outubro de 2019, p. 7 e segs., .
Em suma, decisão que dispensou a audiência prévia não enferma de erro de julgamento nem está viciada por nenhuma nulidade prevista no art. 615.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil.
3.3. Conclusão
Como nota final, recordamos que do juiz gestor exige-se uma prognose sobre a evolução futura da concreta lide gerida, com vista à concretização de uma ordem processual mais respeitadora dos princípios, até diversa da que resultaria da adoção acrítica da solução (final) geral e abstrata positivada. A função do juiz não é, neste contexto, absolutamente neutra, realizando, sim, ativamente interesses públicos, como a eficiência do procedimento ou a garantia (concreta) do processo equitativo, sem agredir, antes promovendo, a justa composição do litígio, de acordo com o axioma suum cuique tribuere.
Há um espaço entre a pronúncia jurisdicional que define os direitos e as obrigações das partes – ou que condiciona decisivamente essa definição – e os despachos que decidem matérias incontroversamente confiadas ao prudente arbítrio do julgador, no uso legal de um poder discricionário (art. 152.º, n.º 4, segunda parte, do Cód. Proc. Civil). Este espaço é ocupado por inúmeras normas que apelam ao entendimento ou convicção do concreto julgador.
A propósito da condução do processo, quando a norma processual-civil se dirige à convicção do concreto juiz do processo ou à gestão que decide realizar, não pode deixar de lhe ser reconhecida uma ampla latitude decisória. Assim ocorre no caso tratado nos autos, sendo notória a diferença entre a primeira hipótese – “cumpra” – e a segunda hipótese – “tencione”, e não cumpra – do enunciado do art. 591.º, n.º 1, al. c), do Cód. Proc. Civil. Também assim ocorre, por exemplo, quando a lei se refere ao entendimento (arts. 37.º, n.º 4, 119.º, n.os 1 e 4, 173.º, n.º 4, 266.º, n.º 5, 273.º, n.º 1, 468.º, n.º 1, al. a), e 476.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, entre dezenas de outros casos), à consideração (arts. 236.º, n.º 1, 480.º, n.º 2, 561.º, n.º 1, e 569.º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil, entre muitos outros) ou ao julgamento, hoc sensu (arts. 50.º, n.º 3, 123.º, n.º 1, 487.º, n.º 2, 490.º, n.º 1, e 501.º do Cód. Proc. Civil, entre outros), do juiz do processo.
Deve ser assumido sem tibieza que a decisão do juiz proferida neste contexto assenta, em boa medida, em critérios de conveniência e de oportunidade. Neste pressuposto, devemos ter consciência de que o juiz só poderá desenvolver esta atividade se lhe for reconhecida uma confortável margem de discricionariedade de apreciação – que não se confunde com a discricionariedade de decisão –, razão pela qual, relativamente a muitos destes casos – em especial, quando estamos perante uma pura atividade gestionária –, o legislador sujeitou a recorribilidade da decisão, quando a admite, a um fundamento específico.
Não sendo comprometida, em determinada decisão interlocutória, a definição do direito substantivo emergente da relação material controvertida, e por regra, deve ser depositada confiança na capacidade e no juízo do juiz titular da causa, ainda que se entenda que não se está perante o uso legal de um poder discricionário. De nada valem declarações grandiloquentes do legislador-político no sentido de se ter garantido no atual regime processual-civil um maior poder gestionário ao juiz do processo, confiando na sua capacidade, conhecimentos e bom-senso, se, na prática judiciária, continuarmos a minar os terrenos por onde se move o juiz de primeira instância com constantes nulidades processuais e com uma intervenção tutelar e deslegitimadora realizada pelo tribunal superior.
4. Responsabilidade pelas custas
A decisão sobre custas da apelação, quando se mostrem previamente liquidadas as taxas de justiça que sejam devidas, tende a repercutir-se apenas na reclamação de custas de parte (art. 25.º do Reg. Cus. Proc.).
A responsabilidade pelas custas cabe à reclamante/apelante, por ter ficado vencida (art. 527.º do Cód. Proc. Civil).
C. Dispositivo
C.A. Do mérito das questões tratadas
Em face do exposto, na improcedência da reclamação para a conferência, acorda se em:
a) não admitir o recurso interposto da decisão que relegou para final o conhecimento das exceções perentórias;
b) julgar improcedente o recurso interposto da decisão que dispensou a realização da audiência prévia.
C.B. Das custas
Custas a cargo da apelante, fixando-se a taxa de justiça no mínimo legal.

Notifique.
Lisboa (data constante da assinatura eletrónica)
Paulo Ramos de Faria
Ana Mónica Mendonça Pavão
Luís Filipe Pires de Sousa