Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 18-11-2015   Juros emergentes dos créditos laborais. Prazo de Prescrição.
Os juros emergentes de créditos laborais estão sujeitos à regra especial de prescrição estabelecida sucessivamente nos art. 38° n° 1 da LCT, 381° n° 1 do CT/2003 e 337° n°ldo CT/2009, não lhes sendo aplicável o disposto na ai. d) do art. 310° ai. d) do Cód. Civil.
Proc. 2487/14.5TTLSB.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Maria João Romba - Filomena Carvalho - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
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Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa

H… propôs em 18/7/2014 a presente acção emergente de contrato individual de trabalho contra C… pedindo a condenação da R. a pagar-lhe as diferenças da retribuição de férias, subsídios de férias e de Natal do período de 1986 a 2003, no valor de €16878,42 (relativas à média anual auferida a título de horas extra, trabalho nocturno, abono para falhas, subsídio compensação horário descontínuo, subsídio de condução, abono de carreiras, subsídio compensação horário incómodo, subsídio de turno e abono de viagem, que a R. nunca incluiu naquelas prestações), acrescidas de juros de mora desde a data em que os pagamentos eram devidos. Alegou para tanto, em síntese, que foi admitido em 1984 para trabalhar por conta, sob a autoridade, direcção e fiscalização da R. como carteiro, em regime de escala, auferindo regularmente diversas prestações retributivas, que discrimina, que não lhe foram incluídas na retribuição das férias, subsídios de férias e de Natal.
A R. apresentou a contestação de fls.322/367 excepcionando a prescrição dos créditos laborais anteriores a Maio de 1992 (atenta a natureza pública da relação jurídica de emprego, sujeita ao direito administrativo), a prescrição dos juros moratórios e também se defendeu por impugnação.
Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente por provada apenas em parte, e em consequência condenou a R a pagar ao A:
a) as diferenças salariais na retribuição de férias resultantes da inclusão na mesma dos valores médios recebidos pelo A a título de remuneração por nocturno (em 1986, 1987, 1989, 1990 e de 1992 a 2003), trabalho suplementar (em 1987 e de 1991 a 2003), subsídio de condução (em 1986 e de 1992 a 1998), horário incómodo (em 1990 e de 1992 a 1994), horário descontínuo (em 1992, 1993 e 1995), abono carreira (em 1994 e 1995) e subsídio de turno (de 2000 a 2003), por referência aos valores médios dos últimos doze meses antes da data do vencimento da retribuição de férias;
b) as diferenças de remuneração no subsídio de férias resultantes da inclusão neste dos valores médios recebidos pelo A a título de remuneração por nocturno (em 1986, 1987, 1989, 1990 e de 1992 a 2003), trabalho suplementar (em 1987 e de 1991 a 2003), subsídio de condução (em 1986 e de 1992 a 1998), horário incómodo (em 1990 e de 1992 a 1994), horário descontínuo (em 1992, 1993 e 1995), abono carreira (em 1994 e 1995) e subsídio de turno (de 2000 a 2003), por referência aos valores médios dos últimos doze meses antes da data do vencimento do subsídio de férias;
c) as diferenças de remuneração no subsídio de Natal resultantes da inclusão neste dos valores médios recebidos pelo A a título de remuneração por nocturno (em 1986, 1987, 1989, 1990 e de 1992 a 2003), trabalho suplementar (em 1987 e de 1991 a 2003), subsídio de condução (em 1986 e de 1992 a 1998), horário incómodo (em 1990 e de 1992 a 1994), horário descontínuo (em 1992, 1993 e 1995), abono carreira (em 1994 e 1995) e subsídio de turno (de 2000 a 2003), por referência aos valores médios dos últimos doze meses antes da data do vencimento do subsídio de Natal;
d) Sobre estas quantias deverá ser deduzida a importância de €1.228,36, já paga pela R;
e) juros de mora sobre tais quantias, calculados desde 23 de Julho de 2009 e até integral pagamento, às taxas legais sucessivamente em vigor,
absolvendo a R do demais peticionado.
Ambas as partes recorreram.
O A. suscita no seu recurso a reapreciação da prescrição dos juros, discordando da orientação adoptada pelo tribunal - de julgar procedente a excepção invocada pela R. e considerar prescritos os juros vencidos há mais de cinco anos contados desde o 5° dia posterior à propositura da acção - 23/7/2014 - ou seja, aqueles vencidos antes de 23/7/2009.
A R., por sua vez, suscita as seguintes questões:
- se o subsídio de Natal, até 2003, deve incluir apenas a retribuição base e diuturnidades;
- se as prestações a título de trabalho nocturno, trabalho suplementar, subsídio de condução, horário incómodo, horário descontínuo, abono carreira e subsídio de turno, mesmo tendo como têm, carácter retributivo, devem ser excluídas da retribuição das férias, subsídio de férias e de Natal;

- se das prestações reclamadas, as anteriores a Maio de 1992 são inexigíveis por os actos de processamento de vencimentos e demais prestações remuneratórias se entenderem como actos administrativos (atento o regime jurídico privativo que vigorava para a empresa CTT) e não terem sido oportunamente impugnados;
- inaplicabilidade do art. 38° da LCT, mas antes do art. 306° al. g) do CC.

Considerando que a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal a quo não foi objecto de impugnação, nem ocorrem razões legais para se proceder à respectiva alteração, remete-se, nessa parte, para os termos da sentença recorrida, em conformidade com o disposto pelo art. 663° n° 6 do CPC

Apreciação
Por razões lógicas impõe-se que seja apreciado em primeiro lugar o recurso da R., dado que a eventual procedência do mesmo pode determinar que fique prejudicada a apreciação do recurso do A., uma vez que este diz respeito apenas à prescrição dos juros, ao passo que aquele abarca a prescrição das próprias prestações de capital.
No que concerne à 1a questão, explicitada pela R. na conclusão b., constata-se que a mesma não consta das respectivas alegações, pelo que dela não cabe conhecer.
Sobre a pretensão da recorrente de que as prestações a título de trabalho nocturno, trabalho suplementar, subsídio de condução, horário incómodo, horário descontínuo, abono carreira e subsídio de turno, mesmo tendo, como têm, carácter retributivo, deverem ser excluídas da retribuição das férias, subsídio de férias e de Natal por só deverem existir quando existe a prestação específica de trabalho que lhes subjaz, dir-se-á que tal equivaleria, no que se refere à retribuição de férias e subsídio de férias, a fazer letra morta do texto da lei, já que o art. 6° do DL 874/76 expressamente determinava que a retribuição correspondente ao período de férias não podia ser inferior à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo e que lhe era devido um subsídio de férias de igual montante. Foi o próprio legislador que estabeleceu que, no período de férias, a retribuição é devida, mesmo que não haja prestação de trabalho, seja ou não em condições específicas, não podendo ser inferior à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo. Trata-se, pois, de proceder a um juízo de prognose, ficcionando uma prestação de trabalho nos moldes em que o mesmo é, em geral, prestado. Se, em serviço efectivo, o trabalho é, em geral, prestado em condições específicas que justifiquem o pagamento de prestações retributivas especiais, como as que ora estão em causa, estas, desde que constituam contrapartida da prestação de trabalho e tenham natureza regular e periódica - o que sucede quando isso ocorre onze meses em cada ano civil (como foi, aliás, considerado na sentença recorrida e não foi posto em causa em sede de recurso, não estando pois em discussão) - devem ser pagas na retribuição das férias e, consequentemente, no respectivo subsídio.
Ainda que fosse admissível o entendimento esgrimido pela R. a partir da interpretação conjugada das cIa 142a, 143a e 133° do AE de 1996, no sentido de que a retribuição a considerar é apenas a retribuição normal, ou seja, a correspondente ao período normal de trabalho, não cremos que tal interpretação tenha suporte nos normativos legais e perante o preceituado pelo art. 13° da LCT, é o regime decorrente da lei o que deve prevalecer.
Entendemos, pelo exposto, que o recurso não merece provimento nesta parte.

Passemos à questão de saber se, atentos os fortes traços de direito público de que se reveste o regime jurídico anterior à transformação dos CTT em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, concretizada pelo DL 87/92 de 14/5, tem de entender-se que, em relação às prestações reclamadas pelos trabalhadores contratados até 19/5/92 e que respeitem apenas a esse período, foram determinadas por actos administrativos e, não tendo os mesmos sido oportunamente impugnados nos termos e prazos previstos na lei, não podem ser objecto de apreciação judicial.
Está assente que o A. foi admitido nos quadros da R. em 22 de Dezembro de 1983 e as prestações reclamadas nos autos referem-se ao período de 1986 a 2003.
Nesse período as relações de trabalho entre os CTT e o respectivo pessoal foram sendo conformadas pelos seguintes diplomas:
- o Estatuto dos Correios e Telecomunicações de Portugal aprovado pelo DL n° 49368, de 10 de Novembro de 1969 (que determinava, designadamente, no art. 1°, que a Administração Geral dos Correios, Telégrafos e Telefones1 passava a constituir uma empresa pública do Estado; no art. 26°, que o regime jurídico do pessoal dos CTT2 seria definido em regulamentos especiais, a aprovar por portaria e, no art. 66°, que o Conselho de Administração apresentaria ao Governo no prazo de três anos após a sua entrada em vigor, propostas fundamentadas, contemplando, além do mais a evolução do regime jurídico do pessoal do escalão II no sentido de o aproximar da regulamentação jurídica do contrato individual de trabalho, sem prejuízo das características de serviço público de correios e telecomunicações);
- o Regulamento Geral do Pessoal do CTT aprovado pela Portaria n° 706/71, de 18 de Dezembro (de cujo art. 1° resulta que, com o novo regime jurídico privativo o pessoal dos CTT deixava de estar sujeito ao preceituado no estatuto do funcionalismo público; decorre do respectivo preâmbulo que através deste regime privativo - ainda de direito público - se procedeu à adaptação à empresa pública do regime do contrato individual de trabalho, com as necessárias adaptações, assim dando cumprimento ao disposto pelo art. 11° do DL 49408, que aprovou a LCT. De acordo com o estabelecido no respectivo anexo, só ao pessoal do escalão III seria aplicável, salvo estipulação expressa em contrário, o direito comum do trabalho);
- DL 87/92 de 14/5, que procedeu à transformação da empresa pública em sociedade anónima, convertendo-a em pessoa colectiva de direito privado, com o estatuto de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos. No respectivo art. 9° ficou salvaguardado que os regimes jurídicos definidos na legislação aplicável ao pessoal da empresa pública CTT vigentes naquela data continuavam a produzir efeitos relativamente aos trabalhadores.
Há que ter em atenção também os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, mormente a Portaria de Regulamentação Colectiva de 29/7/77 (BTE 28/77); o AE de 81 (BTE 24/81) e o AE de 96 (BTE 21/96) os quais, sobretudo os de carácter negocial, na medida em que regulam minuciosamente matérias relativas a remunerações, abonos, subsídios, tornam dificilmente aceitável que os actos de processamento de retribuições possam ser considerados actos administrativos.
O A. foi admitido (em 1983) quando os CTT eram um empresa pública e o respectivo regime jurídico privativo de pessoal, embora de direito público, apontava claramente no sentido de um afastamento do regime do funcionalismo público e aproximação ao direito comum do trabalho.
Como se expende no ac. RP de 13/4/2015 proferido no processo 1457/13.5TTVNG-A.P1 (que, analisando com profundidade um caso muito semelhante aos dos autos, em termos que merecem a nossa inteira concordância, e por isso aqui seguimos de perto), depois de se debruçar sobre os instrumentos normativos atrás referidos :«É evidente o afastamento nesta época4, dos trabalhadores dos CTT (com excepção dos que integram o escalão 1) do regime do funcionalismo público. (...) tudo concorrendo (...) para alicerçar a conclusão que as prestações reclamadas nos presentes autos até àquela data de 19 de Maio de 1992 não foram determinadas por actos administrativos já inimpugnáveis.
Especificamente no que diz respeito ao regime prescricional, é certo que o Regulamento Geral do Pessoal dos CTT de 1971 nada previa sobre a prescrição dos créditos laborais e que o anexo a este Regulamento estabelece no seu artigo 2.° que [o]s casos omissos neste anexo serão integrados pelas disposições do Código Civil, salvo quanto aos servidores abrangidos pela secção II, o que, não se enquadrando o A. nesta Secção 11 (referente aos assalariados com carácter acidental), poderia levar numa primeira análise à conclusão de que os créditos laborais reclamados que se reportam aos anos de 1986 até Maio de 1992 estão submetidos ao prazo de prescrição de cinco anos fixado no art. 310.°, alínea g) do Código Civil, referente a outras prescrições periodicamente renováveis e não ao prazo de um ano previsto no art. 38.° da Decreto-Lei n.° 49.408 de 24 de Novembro de 1969 (L.C.T.).
Simplesmente, não pode perder-se de vista que, como decorre do artigo 2.°, n.° 3, do Regulamento Geral do Pessoal dos CTT (acima transcrito), o respectivo anexo se reporta apenas, além dos assalariados com carácter acidental (a), aos indivíduos não considerados profissionais dos CTT que prestem serviço como encarregados de postos dos CTT (b), em sistema de avença (c), por tarefa (d) e como arrematantes de conduções de malas (e).
No caso, o autor foi admitido em 1985 com a categoria profissional de CRT, como alega sem contestação da R., pelo que não se enquadra em qualquer destas categorias de indivíduos.
E, assim, não se lhe aplica a norma remissiva para o Código Civil constante do anexo ao Regulamento Geral do Pessoal dos CTT.
É certo que o Regulamento Geral do Pessoal dos CTT de 1971 nada previa sobre a prescrição dos créditos laborais, o mesmo acontecendo com a PRT de 1977, o que nos leva a constatar a existência de uma lacuna na lei, a integrar segundo os critérios emergentes do artigo 10.° do Código Civil.
Sobre esta questão, debruçou-se já o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08 de Outubro de 2014[5], e fé-lo em termos que merecem a nossa adesão. Aí se escreveu:
«[...] não contendo a lei qualquer regra aplicável à situação vertente, quando é certo que deveria conter essa regulamentação, a lacuna da lei tem, necessariamente que ser integrada através da analogia.
E nesta integração jurídica, temos o caminho da analogia legis ou analogia juris, devendo fazer-se chamamento ao que dispõe o art. 10.° do Cód. Civil, com a previsão legal que melhor se adapte às razões justificativas de aplicação concreta.
E assim, a situação legalmente prevista que melhor se adapta à situação presente é a da que prevê a prescrição de créditos laborais, ou seja o disposto no art. 38.° da LCT, pois é disso que se trata (vide com interesse o Ac. da 1.a secção do STA de 12.06.80 n° convencional JSTA00008949, disponível em www.dgsi.pt em cujo sumário se lê que [a] decisão sobre redução do subsidio de residencia do pessoal dos CTT, matéria incluída no ponto 3 da base XCII da respectiva portaria de regulamentação do trabalho, não assume a natureza de acto administrativo definitivo e executório e antes se integra no âmbito das relações laborais entre recorrente e recorrida). De resto, o legislador, no preâmbulo do Regulamento Geral do Pessoal dos CTT que transcrevemos supra nas partes que nos pareceram relevantes para a resolução desta questão, reconhece que o regulamento abrange, fundamentalmente, a relação jurídica de emprego e que se observou o espírito do preceituado no n.° 2 do artigo 11.° do Decreto-Lei n.° 49408, de 24 de Novembro de 1969, que manda aplicar às empresas públicas o regime do contrato individual de trabalho com as adaptações exigidas pelas características destes serviços, não obstante tal diploma não ser aplicável ao pessoal da empresa pública CTT, mas que a recepção dos princípios informadores do diploma fundamental do direito comum do trabalho é tão desejável que o próprio estatuto CTT - lei específica da empresa - a preconiza, de certo modo, na alínea a) do seu artigo 66.°.
Como se viu, esta alínea comete ao conselho de administração a tarefa de apresentar ao Governo, por intermédio do Ministro das Comunicações, propostas fundamentadas de alterações ao Estatuto, decorridos no máximo três anos após a sua entrada em vigor, contemplando designadamente [a] evolução do regime jurídico do pessoal do escalão 11 no sentido de o aproximar da regulamentação jurídica do contrato individual de trabalho sem prejuízo das características do serviço público de correios e telecomunicações.
Com efeito, o referido art. 38.° tem por fundamento e considera iniciado o prazo de prescrição logo que cessa a situação de subordinação jurídica e económica, implicando o receio do trabalhador limitativo do exercício dos seus direitos.
Trata-se de um regime em que o início do prazo prescricional só ocorre após a cessação, de facto, da relação laborai, o que se justifica por razões de pacificação social, dando-se assim a possibilidade às partes, durante a vigência do contrato, de não instaurarem acções com vista à reclamação dos seus direitos, para não se envenenar o bom relacionamento entre elas.
Por outro lado, com o protelamento do seu início para o dia seguinte ao do termo do contrato, visou-se essencialmente proteger o trabalhador, dados os naturais constrangimentos que este pode ter para exigir os seus direitos durante a sua vigência, nomeadamente por receio de retaliações do empregador caso ousasse accioná-lo durante a vigência da relação laboral, e que poderiam atingir o risco do seu próprio despedimento.
Por estas razões, avisadamente estabeleceu o legislador que o prazo da prescrição dos créditos laborais só começa a correr depois do contrato se extinguir, verificando-se portanto uma suspensão do início do seu curso até esta altura».
Em suma, nem se pode afirmar a inexigibilidade dos créditos anteriores a Maio de 1992 reclamados pelo A. (inexigibilidade que a recorrente fundou na asserção indemonstrada de que os trabalhadores tinham um estatuto típico de funcionalismo público e, por isso, os actos de processamento de vencimentos do autor levados a efeito pela ré até então eram actos administrativos que se tornaram inimpugnáveis), nem se pode afirmar a aplicabilidade do regime prescricional previsto nos arts. 306°, n.° 1 e 310°, alínea g) do Código Civil (igualmente fundada na indemonstrada natureza público-administrativa da relação de trabalho, que a subtraía ao regime laborai comum, designadamente em matéria de prescrição), devendo aplicar-se, por analogia, o regime prescrito no artigo 38.° da L.C.T. aprovada pelo Decreto-Lei n.° 49.408 de 24 de Novembro de 1969.»
Tem plena aplicação ao caso vertente, dada a similitude das situações, a argumentação acabada de transcrever, que fazemos nossa, levando-nos a concluir pela improcedência do recurso também quanto a esta questão.
Passemos à apreciação do recurso do A.
Vem este pôr em causa a decisão na parte em que, acolhendo a tese da R. sobre a questão da não aplicabilidade aos juros de mora da norma própria dos créditos laborais consignada respectivamente nos art. 38° da LCT, 381° do CT/2003 e 337° do CT/2009, antes lhe aplicando a norma do art. 310° al. d) do CC, julgou prescritos os juros de mora vencidos até 22/7/2009.
Entendemos assistir-lhe razão.
Embora a obrigação de juros seja acessória da obrigação principal (a obrigação remuneratória), valem para a respectiva prescrição as mesmas razões que determinaram o legislador a estabelecer uma regra especial em matéria de prescrição de créditos laborais, de acordo com a qual, o respectivo prazo, embora mais curto do que o que resultaria da lei civil, só começa a correr após a cessação do contrato.
Com efeito, a matéria da prescrição em direito laborai tem sido estabelecida em termos substancialmente idênticos sucessivamente (para não ir mais atrás), no art. 38° da LCT aprovada pelo DL 48409, de 25/11/69, no art. 381° do CT de 2003 e no art. 337° do CT/2009.
Estas normas estabelecem que os créditos emergentes do contrato de trabalho, da sua violação ou cessação, pertencentes ao empregador ou ao trabalhador, extinguem-se, por prescrição, decorrido um ano a partir do dia seguinte àquele em que cessou o contrato de trabalho.
Trata-se de um regime especial que apresenta como especificidades, relativamente ao regime_ geral, o lacta de o prazo ser bem mais curto do que_o que resulta do regime geral (art. 309° a 311° do CC) mas, por outro lado, só começar a correr no dia seguinte à cessação do contrato e não desde que o direito possa ser exercido (art. 306° n° 1 CC).
A razão de ser desta especificidade prende-se com a situação de real desequilíbrio de forças entre os dois titulares do contrato, pois enquanto um detém poder de direcção e autoridade sobre o outro, estoutro está juridicamente subordinado àquele, devendo-lhe obediência. É por se reconhecer que, devido a essa situação de efectiva assimetria, o trabalhador muitas vezes se pode sentir psicologicamente inibido de reclamar perante o empregador créditos a que se ache com direito, por recear que essa sua reivindicação possa de algum modo pôr em causa a estabilidade da relação, que o legislador desde há muito estabeleceu este regime especial.
Embora se reconheça que a obrigação de juros, como obrigação acessória da obrigação de capital sobre que recai, é autónoma desta (art. 561° do CC), não nos parece que isso seja óbice a que beneficie do regime especial estabelecido na lei laborai, pois de outro modo, estar-se-ia a contrariar a teleologia do citado regime especial. Com efeito, entendemos não fazer sentido que se reconheça aos trabalhadores o direito de reclamar créditos, por exemplo relativos a diferenças salariais vencidas há 10, 20 ou mais anos, só após a cessação do contrato de trabalho, mas se lhe exija que, se não quiserem prescindir dos juros de mora, os peticionem dentro de cinco anos após o vencimento sob pena de prescrição. Como se afirma no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-03-2002, disponível em www.dgsi.pt, não ocorre justificação para distinguir em tal regime de prescrição especial os juros (obrigação acessória) dos créditos resultantes da obrigação principal, antes fazendo todo o sentido que partilhem de igual regime (especial). No mesmo sentido, se pronunciou o STJ nos ac. de 21/02/2006 e de 14/12/006 (no proc.° 6S2448), disponíveis em www.dgsi.pt..
Assim, seguindo esta orientação jurisprudencial também nós entendemos que os juros emergentes de créditos laborais estão sujeitos à regra especial de prescrição estabelecida sucessivamente nos art. 38° n° 1 da LCT, 381° n° 1 do CT/2003 e 337° n°ldo CT/2009, não lhes sendo aplicável o disposto na ai. d) do art. 310° ai. d) do Cód. Civil.
Por isso, dando provimento à pretensão do recorrente A., há que alterar a sentença na parte em que absolvia a R. dos juros vencidos até 22/7/2009, condenando-a antes a pagar ao A. juros de mora à taxa supletiva legal sobre cada uma das prestações em que foi condenada, desde a data de vencimento até efectivo pagamento.

Decisão
Pelo exposto se acorda em:
- julgar procedente o recurso do A., alterando a sentença no sentido de condenar a R. também no pagamento ao A. de juros de mora à taxa supletiva legal desde a data de vencimento de cada prestação até integral pagamento
- julgar improcedente o recurso da R., confirmando a sentença (excepto na parte acabada de alterar).
Custas de ambos os recursos pela R..
Lisboa, 18 de Novembro de 2015
Maria João Romba
Paula Sá Fernandes
Filomena Manso

Processo n° 2487/ 14.5TTLSB.L1
Declaração
Voto vencida relativamente ao entendimento do acórdão que não considera a prescrição dos juros de mora vencidos cinco anos antes da data da citação, pelas seguintes razões:
O art.°561 do CCivil, sobre a autonomia do crédito de juros, dispõe que: Desde que se constitui, o crédito de juros não fica necessariamente dependente do crédito principal, podendo qualquer deles ser cedido ou extinguir-se sem o outro.
Assim, os juros de mora podem ter um regime diferente do crédito que os origina. Se os juros seguissem o regime prescricional do crédito incumprido não fazia sentido a existência de uma norma especial no que respeita à sua prescrição, como é o caso da d) do art.°310 do CCivil, que só se alcança porque juros e crédito têm, por expressa vontade da lei, prazos prescricionais diferentes. Por outro lado, o art.°337 do CT/2009 é uma norma excepcional que não dispõe sobre os juros, sendo que estes não resultam do contrato de trabalho em causa, antes nascendo do seu incumprimento como de um qualquer outro tipo contratual.
Deste modo, entendo ser aplicável aos juros de mora dos créditos laborais o disposto no art.°310 aliena d) do CC, ou seja, a sua sujeição ao prazo de prescrição de cinco anos, não se suspendendo esse prazo por mero efeito de ainda estar em execução o contrato de trabalho; com este entendimento já se pronunciou o AC. RL Coimbra de 02-03.2011 publicado em www.dgsi, que refere: Atenta a sua autonomia em relação ao capital, aos juros dos créditos laborais, como aos que decorrem de qualquer outro tipo contratual, é aplicável o prazo de prescrição previsto no art.°310, al. d), do C. Civil., norma específica que abrange expressamente no seu âmbito todos e quaisquer juros.
Assim, devem considerar-se prescritos os juros de mora que se mostrem vencidos cinco anos antes da data da citação, por força do efeito interruptivo desta, como resulta do disposto no n.°1 do art.°323 do C. Civil.

Lisboa, 18 de Novembro de 2015.