Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
 - Sentença de 09-09-2015   Transmissão do contrato de trabalho. Despedimento. Declaração de vontade tácita por parte da entidade patronal.
I. Apesar do amplo critério estabelecido no Cód. Trab. para abranger as transmissões de estabelecimento ou de exploração de estabelecimento, ou de parte dele, tal amplitude não abrange as situações descritas na cláusula 17.a, n° 2 do CCT para o sector das limpezas, pois esta não contempla qualquer situação de transmissão ou cessão de exploração do estabelecimento.
II. Aquela cláusula 17.a do CCT amplia o regime de manutenção das relações laborals estabelecido no art. 285.° do Cód. Trab., beneficiando os trabalhadores do sector de serviços de limpeza com a garantia dos seus postos de trabalho, mesmo em casos em que nenhuma transmissão de estabelecimento se verifica, mas em que, pela similitude das situações, se justifica uma solução idêntica.
III. Para que exista um despedimento - ainda que ilícito- basta que ocorra uma declaração de vontade tácita, isto é, um comportamento concludente do empregador de onde se deduza, com toda a probabilidade, a sua vontade de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro.
Proc. 162/14.0TTTVD 4ª Secção
Desembargadores:  Isabel Tapadinhas - - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
_______
Tribunal da Relação de Lisboa
4.ª Secção
162/14.OTTTVD.L1
Recurso próprio, admitido com o efeito adequado, que se mantém.
Nada parece obstar ao respetivo conhecimento.

A questão a decidir reveste-se de simplicidade, pelo que pode ser objecto da decisão sumária a que se refere o art. 656.° do Cód. Proc. Civil, o que se passa a fazer.

Relatório
E... instaurou ação declarativa dde condenação com processo comum contra A... e C... pedindo que:
1) a 2.a ré seja condenada a:
a) reintegrar a autora, salvo se até à sentença optar pela indemnização em vez da reintegração;
bem como a pagar à autora:
b) € 1166,84 (mil, cento e sessenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) de retribuições vencidas bem como as que se vencerem até ao trânsito em julgado da decisão;
c) € 4959,12 (quatro mil, novecentos e cinquenta e nove euros e doze cêntimos) a título de férias vencidas e não gozadas, subsídio de férias, proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal bem como os que se vencerem até ao trânsito em julgado da decisão.
d) acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor desde a data em que a referida quantia era devida até efectivo e integral pagamento;
e) assim como de custas e demais encargos com o processo. 2) ou subsidiariamente, 1.a ré seja condenada a:
f) Reintegrar a autora, salvo se até à sentença optar pela indemnização em vez da reintegração;
bem como a pagar à autora:
g) € 1166,84 (mil, cento e sessenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) de retribuições vencidas bem como as que se vencerem até ao trânsito em julgado da decisão;
h) € 4959,12 (quatro mil, novecentos e cinquenta e nove euros e doze cêntimos) a título de férias vencidas e não gozadas, subsídio de férias, proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal bem como os que se vencerem até ao trânsito em julgado da decisão.
i) acrescidos de juros de mora à taxa legal em vigor desde a data em que a referida quantia era devida até efectivo e integral pagamento;
j) assim como de custas e demais encargos com o processo. Frustrada a conciliação ambas as rés contestaram, em separado.
A ré A... reconhecendo ter celebrado contrato de trabalho com a autora alegou que a mesma, após regressar de um período de baixa médica, foi colocada a prestar funções em locais de cliente que posteriormente passou a ser cliente da segunda ré. Como a autora tinha limitações nas suas deslocações ficou então, por decisão da ré, a exercer a sua actividade laboral apenas nesse local, funções que contudo apenas iniciou após gozar o período de férias vencidas e não gozadas a que tinha direito.
Sustentou que quando a autora melhorou da sua situação clínica passou a exercer funções em todos os locais do cliente e que que quando ocorreu a transferência do mencionado cliente para a segunda ré a autora já prestava funções nos locais do cliente há mais de 120 dias.
Conclui pela transferência do contrato de trabalho para segunda ré e consequentemente pela sua absolvição.
A segunda ré contestou começando por questionar a aplicabilidade da CCT invocada pela autora à situação dos autos e o direito da autora às retribuições intercalares que reclama na medida em que se encontrava de baixa médica e estando o contrato suspenso não pode a autora reclamar retribuições durante o período de suspensão iniciado em, pelo menos, 3.11.2013.
Quanto ao mais impugnou que a autora tenha sido colocada no local de trabalho em causa na data que alegou, antes o tendo sido em 11.07.2013. Assim quando em 12.10.2013 a ré começou a explorar o referido local não haviam decorrido 120 dias motivo pelo qual o contrato de trabalho não se transferiu para a contestante o que implica a improcedência da acção contra si intentada, o que reclamou.
Instruída e julgada a causa foi proferida sentença cujo dispositivo se transcreve:
Termos em que, com a fundamentação de facto e de direito exposta, se decide:
1) Declarar a ilicitude do despedimento da autora pela ré C... e em consequência condenar a mesma a:
a) Reintegrar a autora no seu posto de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
b) Pagar à autora as retribuições (retribuição mensal, retribuição de férias, subsidio de férias e subsidio de natal) que a mesma deixou de auferir desde 19-9-2014 até ao trânsito em julgado da presente decisão do tribunal, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos contabilizados desde a data de vencimento e cada uma delas e até efectivo e integral pagamento e, se tal for o caso, deduzidas das importâncias que tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento e do subsídio de desemprego que lhe tenha sido atribuído até à data do trânsito em julgado, devendo a empregadora entregar essa quantia à segurança social.
Absolver a ré A... do pedido subsidiário contra si formulado nos autos.
Custas da acção pela C... - art. 527° do Código de Processo Civil, ex vi do art. 1° n° 2 al a) do Código de Processo de Trabalho.
Inconformada com a decisão, da mesma interpôs a ré C... recurso de apelação, tendo sintetizado a sua alegação nas seguintes conclusões:
1.a Como veremos e salvo o devido respeito por entendimento diverso, o cerne da presente acção e do presente recuso resume-se à análise do documento junto aos autos com a petição inicial sob documento n.° 2 e que consubstancia uma ordem de transferência de local de trabalho acompanhada de uma ordem de marcação de férias. 2.a Em termos de efectiva prestação de trabalho da autora no cliente Turismo de Portugal, a mesma não perfez os 120 dias a que alude a cláusula 17.a da Convenção Colectiva de trabalho aplicável e melhor identificada nos autos (início da prestação de trabalho a 11 de Julho de 2013 - factos provados n. ° 14, 16 e 18).
3.a A decisão recorrida entendeu que a autora estava contudo alocada ao dito cliente desde pelo menos a data da recepção da comunicação acima aludida, em 13 de Junho de 2013 - factos provados n.° 13 e 14, juntamente com o segmento decisório e de direito da decisão ora recorrida (por todos, último parágrafo da página 21 da sentença - deste modo, tal não implica que ali normalmente prestavam serviço tenha de ser visto como uma prestação efectiva de funções, ou seja o facto do trabalhador não ter prestado funções no local nos 120 dias que antecedem a perda do local tem de ser visto em função dos motivos determinantes dessa não prestação podendo a transmissão do contrato ocorrer mesmo sem qualquer prestação efectiva, como a própria norma o prevê no seu n° 7 em relação aos trabalhadores em situação e baixa médica, ou seja com uma suspensão do contrato que, no caso dos autos, o gozo de férias nem sequer determinou.
4.a A ré, ora apelante, discorda dessa decisão.
5.a Por último, a apelante mais entende que, perante a constelação factual dada como provada, inexiste qualquer decisão de despedimento imputável à mesma.
6.a Em causa nestes autos esteve uma recusa de ambas as rés em aceitar o contrato de trabalho da autora, tendo ambas entendido que o mesmo não migrara para os seus quadros (a ré A... defende que o contrato se transmitiu por força do disposto na cláusula 17.a da Convenção Colectiva de Trabalho aplicável e a ré C... defende o contrário, por entender que os respectivos pressupostos não estavam preenchidos).
7.a Tal posição de ambas as rés está plasmada nos factos provados n.° 22 e 23 da matéria de facto provada.
8.a A autora na sua petição inicial entende ter sido alvo de um despedimento. a decisão recorrida entendeu ter existido um despedimento tácito (e ilícito por não ter sido precedido de qualquer procedimento).
9.a Ora, entende a ré C... que a situação dos presentes autos, especialmente considerando a facticidade dada como provada, não configura uma situação de despedimento, devendo sim ser perspectivada como uma violação do dever de ocupação efectiva.
10.a A ré C... não expressou jamais um ânimo rescisório do contrato, nem adoptou qualquer postura da qual tal se pudesse inferir.
11.a A recusa da aceitação de trabalho (admitindo por dever de patrocínio que o contrato de trabalho da autora efectivamente migrou para a ré C...) não é mais do que isso - recusa de aceitação do trabalho e efectivação do direito do trabalhador à ocupação efectiva.
12.a Tal é precisamente o entendimento jurisprudencial plasmado nas seguintes decisões:
13.a O Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 22 de outubro de 2008, em www.dgsi.pt (número de documento sj20081022019004), decidiu precisamente que: v - Não configura um despedimento a recusa do empregador em dar serviço a um trabalhador com quem mantinha um vínculo laboral a termo e em pagar-lhe o vencimento, se o empregador não emite qualquer declaração no sentido de considerar cessada a relação laboral entre ambos aprazada, nem adoptou um comportamento inequivocamente representativo da vontade de cessação da falada relação, devendo-se tal recusa ao facto de entender, embora erradamente, que o contrato de trabalho que os vinculava se transmitiu por força daquela cláusula 17a do CCC, à nova adjudicatária dos serviços de limpeza.
14.a No mesmo preciso sentido decidiu o tribunal da Relação do Porto - Acórdão de 19 de Maio de 2012, com o número convencional em www.dgsi.pt jtrp00043905: IV - Definindo-se o despedimento como um acto unilateral do tipo do negócio jurídico, de carácter receptício, tendente à extinção ex nunc do contrato de trabalho, ou como uma declaração de vontade, receptícia, vinculada e constitutiva, dirigida à contraparte, com o fim de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro, ou ainda como uma declaração receptícia de vontade dirigida ao trabalhador na qual a entidade patronal põe fim ao contrato de trabalho, a sua verificação implica que se demonstre que o empregador emitiu uma declaração dirigida ao trabalhador que, por sua vez, a recebeu, devendo tal declaração exprimir uma vontade tendente à cessação do contrato, de forma clara e inequívoca e por iniciativa do primeiro, sem ou contra a vontade do segundo, produzindo os seus efeitos na esfera jurídica deste, de modo inelutável, pois o trabalhador não entre no processo volitivo, sendo a sua vontade exterior ao mesmo.
15.a A ré C... limitou-se a comunicar à autora e à ré A... que entendia que o contrato de trabalho da primeira não se transmitira para si e, naturalmente e em coerência, a recusar receber baixas médicas da mesma. tal como se infere das comunicações trocadas entre as partes e juntas aos autos, a recorrente apenas entendeu que não tinha ocorrido a transmissão da posição jurídica de empregador, por via do disposto da cláusula 17.a
16.a Como é sabido, o despedimento constitui estruturalmente um negócio jurídico unilateral receptício, através do qual a entidade patronal revela a vontade inequívoca de fazer cessar o contrato de trabalho.
17.a Nas palavras do Prof. Pedro Romano Martinez [Direito do Trabalho, 845], trata-se de uma forma de cessação unilateral do contrato em que a iniciativa cabe ao empregador e pressupõe uma declaração de vontade deste comunicando ao trabalhador a cessação do mesmo, declaração essa que, por ser uma declaração de vontade recetícia e com efeitos constitutivos, só produz efeitos depois de chegar ao poder do trabalhador ou depois de ser dele conhecida e não é suscetível de ser unilateralmente revogada pelo empregador, depois de ter sido recebida pelo trabalhador ou de ser dele conhecida (artigos 224.°/1 e 230.°/1 do código civil).
I8. a Nos termos do disposto no artigo 217.° do Código Civil, a declaração negociai pode ser expressa ou tácita, sendo expressa quando feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio direto de demonstração da vontade e tácita quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelem.
19.a É essencial para podermos falar em declaração tácita a inequivocidade dos factos que permitem concluir no sentido do despedimento. a declaração tácita tem lugar sempre que a um comportamento seja atribuído um significado legal tipificado, sem admissão de prova em contrário.
20.a No domínio do despedimento promovido pela entidade patronal, tem sido, quer pela doutrina, quer pela jurisprudência, aceite a existência de situações em que a vontade da entidade empregadora em fazer cessar unilateralmente o contrato de trabalho com o trabalhador ao seu serviço se revela de atitudes inequívocas, conduzindo, assim, a um despedimento de facto.
21.a Ou seja, embora não se admita o despedimento tácito com a amplitude que é conferida às declarações negociais tácitas pelo mencionado artigo 217.° do Código Civil (e muito menos, o despedimento presumido), admitem-se, quer na doutrina, quer na jurisprudência, os chamados despedimentos de facto, corporizados numa atitude inequívoca da entidade patronal, de onde decorre necessariamente a manifestação de uma vontade de fazer cessar a relação laboral.
22.a «A referida inequivocidade visa tanto evitar o abuso de despedimentos efetuados com dificuldade de prova pelo trabalhador, como obstar ao desencadear das suas consequências legais, quando não se mostre claramente ter havido rutura indevida do vínculo laboral por parte da entidade patronal» (Ac. STJ, de 05.04.2006, disponível para consulta em www. dgsi .pt) .
23.a Refira-se ainda que a declaração da entidade patronal há de ser interpretada segundo os critérios enunciados no artigo 236.° do Código Civil, pelo que, se não for expresso, o despedimento terá de ser extraído de factos que, perante o homem médio, revelem inequivocamente a vontade da entidade patronal de fazer cessar o contrato (Ac. STJ de 12.09.2007, www.dgsi.pt). Portanto, tecnicamente, o despedimento configura-se como uma declaração de vontade recipienda, vinculativa e constitutiva, dirigida à contraparte, com o fim de fazer cessar o contrato de trabalho; essa declaração, expressa ou tácita, terá de ser proferida em condições que não suscitem dúvida razoável sobre o seu verdadeiro significado.
E, por essa razão, é necessário que o declarante (o empregador), seja por escrito, seja inequívoco, a sua vontade de extinguir a relação de trabalho, de forma unilateral. o que é exigível é que, havendo tal vontade por parte do empregador, este assuma um comportamento que a torne percetível e inequívoca junto do destinatário, enquanto declaratário normal, tendo sempre presente que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante (Ac. TRL de 26.05.2009, www.dgsi.pt].).
24.a Finalmente é de referir que, nos termos do disposto no art. 342°, n° 1, do Código Civil, o ónus da prova do despedimento impende sobre o trabalhador.
25.a No caso, apenas se provou que, a recorrente remeteu uma carta à autora, a comunicar-lhe que entendia que o seu contrato de trabalho não se transmitira para si. Ora, afigura-se-nos que tal matéria não é suficientemente concludente e inequívoca no sentido de que a ré pretendeu despedir a autora. Refira-se que cabia à autora o ónus da prova do despedimento por parte da recorrente.
26.' Sendo certo que indicação de que o seu vinculo laboral não se tinha transmitido para a ré C..., ora recorrente, não pode ser encarada como um despedimento. Esta declaração não é expressa, nem inequívoca nesse sentido.
27.a Pelo que, perante a dúvida, a questão do despedimento deverá ser decidida contra a parte que a invoca - artigo 414.° do CPC. 28.a Neste sentido, entre outros, Ac. TRP de 21/01/2008, disponível para consulta em www.dsgi.pt e acima já transcrito. 29.a E como também decidiu o TRP, em acórdão proferido em 19-05-2010, disponível para consulta em www.dsgi.pt e acima já transcrito: a lei não nos fornece uma definição de despedimento. A doutrina, porém, tem-se pronunciado sobre a matéria de forma uniforme: o despedimento é estruturalmente um acto unilateral do tipo do negócio jurídico, de carácter receptício (deve ser obrigatoriamente levado ao conhecimento da outra parte), tendente à extinção ex nunc .. do contrato de trabalho- o despedimento configura-se como uma declaração de vontade, recipienda (ou receptícia), vinculada e constitutiva, dirigida à contraparte, com o fim de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro[16]. O despedimento consubstancia-se numa declaração receptícia de vontade dirigida ao trabalhador na qual a entidade patronal põe fim ao contrato de trabalho[17]. Por outro lado, a jurisprudência tem entendido que a vontade de despedir, por banda do empregador, há-de ser inequívoca, mesmo que se trate de despedimento de facto e que pertence ao trabalhador o ónus da prova do despedimento, nomeadamente, das circunstâncias que o revelam[18]. Ora, sendo assim, há-de o empregador emitir uma declaração dirigida ao trabalhador que, por sua vez, a há-de receber, devendo tal declaração exprimir uma vontade tendente à cessação do contrato, de forma clara e inequívoca e por iniciativa do primeiro, sem ou contra a vontade do segundo, produzindo os seus efeitos na esfera jurídica deste de modo inelutável; tal significa que o trabalhador não entre no processo volitivo, sendo a sua vontade exterior ao mesmo.
30.a In casu, cremos, salvo o devido respeito por diferente opinião, que não está demonstrado o despedimento. Veja-se, por exemplo, o que adrede decidiu o Supremo Tribunal de Justiça em acórdão de 2008-10-22, em situação semelhante:
31.a A recorrente diz que o facto de ter recusado o serviço da a. e de pagar-lhe a retribuição a partir de 21/12/2005 integra um despedimento. no entanto, da matéria de facto provada, não resulta minimamente apurado que aquela recusa por parte da recorrente, quer em dar serviço à a. quer em pagar-lhe o vencimento, se devesse a qualquer despedimento ou intenção de despedimento. o que se apurou foi que tal recusa se deveu ao facto de a recorrente entender que o contrato da a. se tinha transmitido à ré, o que é uma realidade fáctico-jurídica totalmente diversa e com consequências práticas bem distintas, sendo que, como estabelece o n° 1 da cláusula 17a do CCT, `a perda de um local de trabalho por parte da entidade patronal não integra o conceito de caducidade, nem de justa causa de despedimento'. Assim, o facto de a recorrente ter recusado à a. ocupação efectiva e remuneração a partir de 21/12/2005, por considerar que o contrato se transmitiu por força daquela cláusula 17.a do CCT, não pode ser entendido como um despedimento, ainda que ilícito.
32.a Em suma, não se verificou qualquer despedimento por parte da recorrente, pelo que, com o devido respeito, andou mal o tribunal a quo ao considerar ter existido um despedimento, que o mesmo foi ilícito e que a responsabilidade do mesmo é imputável à recorrente C....
33.a Com pertinência para a presente alegação, chama-se à colação a matéria dada como provado nos pontos 8 a 10, 12, 13, 14 e 18. 34.a Numa palavra, entendemos que importa analisar o teor e possíveis efeitos do documento n.° 2 junto com a petição inicial - carta através da qual a ré A... transferiu a autora para o local de trabalho Turismo de Portugal, que a ré C... haveria de passar a explorar.
35.a Lido o documento, verificamos que: ...transmitir a V. Ex.a, pela presente, que passará a exercer funções de supervisora nos seguintes locais... (...) permanecerá em gozo das suas férias de 2012 até ao seu termo no dia 10 de Julho, entrando assim ao serviço das suas funções no dia 11 de Julho de 2013.
36.a O teor do documento em questão afigura-se linear - a autora iniciou as suas funções no cliente Turismo de Portugal em 11 de Julho de 2013. Considerando que a recorrente passou a explorar a empreitada Turismo de Portugal em 12 de outubro de 2013 (facto provado n. ° 9), entre esta e aquela data não medeiam os 120 convencionais pressuposto de transmissão dos contratos de trabalho. considerando que previamente à dita comunicação a autora esteve alocada a outro cliente que não o Turismo de Portugal; considerando que as férias da autora diziam respeito ao trabalho prestado em 2012; considerando que é a própria ré A... que refere que a transferência apenas se operará após o gozo das ditas férias; inexistem elementos nos autos que permitiriam à decisão recorrida concluir que a transferência de local de trabalho teve efeitos no dia em que a autora recebeu a correspondente comunicação (ao que parece 13 de Junho de 2013 - facto provado n. ° 14).
37.a Mais considerando que as ordens de transferência definitivas têm de obedecer a um pré-aviso de 30 dias (artigo 196. °, n. ° 1, do novo Código do Trabalho), crê-se concludente que a ordem de transferência apenas se efectivou no primeiro dia de prestação de trabalho da autora no local de trabalho Turismo de Portugal.
38.a Atente-se ainda ao teor da cláusula 17.a da Convenção Colectiva de Trabalho aplicável, que prescreve que são transferíveis os contratos de trabalho dos trabalhadores que normalmente prestem trabalho em determinado local.
39.a Considerando que as férias ora em causa diziam respeito ao trabalho prestado pela autora em 2012 noutro local de trabalho que não o Turismo de Portugal, não se concebe que a ré A... possa indexar o respectivo gozo a esta empreitada.
40.a A razão de ser da cláusula 17.a prende-se com ensejos tutelares quanto à posição jurídica dos trabalhadores, mas prende-se igualmente com a necessidade de salvaguarda da concorrência. Efectivamente, ora se transcreve o que o Supremo Tribunal de Justiça, no seu Acórdão de 22 de Outubro de 2008, in www.dgsi.pt, entendeu sobre este tema: e, como se acrescenta no mesmo acórdão, as empresas deste sector revestem-se de uma peculiar configuração organizativa, que tem a ver com a própria natureza dos serviços prestados e com as condições laborals em que os mesmos se concretizam. `a sucessiva perda de locais de trabalho - sempre possível no aleatório sistema do concurso de empreitada sujeito à dinâmica do mercado e da concorrência - poderia facilmente pôr em causa a própria sobrevivência destas empresas, que ficariam obrigadas à manutenção de uma forte componente salarial sem quaisquer contrapartidas no campo dos lucros resultantes da prestação de serviços, e em consequência disso, pôr em risco a segurança e a estabilidade do emprego dos seus trabalhadores.
41.a Concorrem no mesmo sentido o tribunal da Relação de Lisboa (conferir Acórdãos de 16 de Novembro de 2001, in www.dgsi.pt, processo n.° 3253/2003-4; e de 8 de Julho de 2004, in www.dgsi.pt, processo n.° 4655/2004-4) e o Tribunal da Relação do Porto (cfr. Acórdão de 19 de Maio de 2009, proferido no âmbito dos autos 6699/08-4).
42.a Junta-se sob documento n.° 1 Acórdão do Tribunal da Relação do Porto que nos refere que as disposições convencionais sobre transmissão de contratos de trabalho devem obedecer a uma lógica de racionalidade económica (Acórdão Ângela Lopes).
43.a Atendendo ainda ao Acórdão Ângela Lopes do TRP, que nos diz que tem de haver um nexo indissolúvel entre os custos com pessoal e os rendimentos de determinada empreitada, obrigando os operadores a aproveitar na empreitada que auferem os rendimentos o trabalho dos trabalhadores à mesma indexados. mais nos dizendo que não pode haver aproveitamento dos trabalhadores em empreitadas diversas (onde o operador obtém outros rendimentos), depois pretendendo o mesmo operador limitar o trabalhador a dada empreitada que passa a um concorrente seu.
44.a A autora gozou as férias de 2012 em 2013, após regressar de baixa. Em 2012 a autora não prestou trabalho na empreitada Turismo de Portugal. E a ré A... pretende que o gozo das ditas férias seja aproveitado como tempo de trabalho/alocação à empreitada Turismo de Portugal.
45.a Aliás, como vimos, apenas com o dito período de férias é que, em tese, se preenchem os 120 dias a que alude o disposto na cláusula 17.a da Convenção Colectiva de Trabalho aplicável. 46.ª Defende-se que tal aproveitamento é indevido. Em causa está uma mera alocação administrativa da autora ao local de trabalho Turismo de Portugal, sendo que o gozo de férias que antecedeu o início da efectiva prestação de trabalho disse respeito ao trabalho prestado em 2012 em empreitada que não o Turismo de Portugal.
47.a Acrescendo novamente a temática do aviso prévio de 30 dias que deve anteceder as transferências definitivas de local de trabalho, creio que estão reunidos elementos suficientes para se concluir de forma diversa da decisão ora em crise.
VI - O que se roga.
Termos em que, (...), se roga a revogação da decisão de 1.9 instância, sendo a mesma substituída por outra que julgue que o contrato de trabalho da autora/apelada não se transmitiu para a apelante e que, em todo o caso, a situação dos autos não pode ser configurável como um despedimento.
Como se sabe, os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes e decididas pelos tribunais inferiores, salvo se importar conhecê-las oficiosamente - tantum devolutum quantum appelatum (Alberto dos Reis Código do Processo Civil Anotado vol. V, pág. 310 e Ac. do STJ de 12.12.95, CJ/STJ Ano III, T. III, pág. 156).
Tratando-se de recurso a interpor para a Relação este pode ter por fundamento só razões de facto ou só razões de direito, ou simultaneamente razões de facto e de direito, e assim as conclusões incidirão apenas sobre a matéria de facto ou de direito ou sobre ambas (Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3a ed., pág. 148).
As questões colocadas no recurso delimitado pelas respetivas conclusões (com trânsito em julgado das questões nela não contidas) - arts. 635.°, n° 3 e 639.° n° 1 do Cód. Proc. Civil - são as seguintes:
1.a - transmissão do contrato de trabalho da autora para a recorrente e, caso a resposta a esta questão seja positiva; 2.a - despedimento da autora por parte da recorrente.
Fundamentação de facto
A 1.a instância considerou provados os seguintes factos:
1. A... - Limpezas e Conservação, Lda. é uma sociedade comercial que tem por objecto a prestação de serviços de limpeza e conservação, bem com manutenção de móveis e imóveis e ainda a prestação de serviços genéricos, de natureza geral não especificada, apoio logístico e administrativo, gestão de pessoal e coordenação de serviços.
2. C... - Sociedade de Limpezas, Lda. é uma sociedade comercial que tem por objecto a prestação de serviços de limpezas industriais, técnicas, especializadas e gerais; desinfecção, desinfestação e extermínio de pragas, bem como todos os serviços directamente relacionados com estas actividades; manutenção técnica e conservação em interiores e exteriores de edifícios; projecto, realização e conservação de jardins; fabrico e comercialização, transformação, representação, importação e exportação de consumíveis, produtos e equipamentos de limpeza, químicos e equivalentes; assistência técnica a terceiros no âmbito das áreas referidas.
3. Ambas as empresas dedicam-se à actividade de prestação de serviços de limpezas.
4. Em 1.02.2007 autora e A... acordaram, em documento que então subscreveram, que a primeira exercia as funções de limpeza, inerentes à categoria de supervisor, mediante o pagamento pela segunda de uma retribuição mensal que em 2013 era de 941,00€, acrescida de 225,84€ a título de isenção de horário de trabalho e 5,12€ a título de subsídio de alimentação por cada dia de trabalho prestado.
5. Mais acordaram que a autora exercia as suas funções nos locais e instalações de qualquer entidade que adjudique à A... os serviços de limpeza e conservação e que por exercer tais funções de forma regular fora do estabelecimento da empresa ficaria sujeita a regime de isenção de horário de trabalho.
6. Para execução das suas funções a autora tinha atribuído pela empresa uma viatura e telemóvel cujos custos eram por esta suportados.
7. A autora é associada do Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domesticas e Actividades Diversas (STAD).
8. A... tinha como cliente Turismo de Portugal onde efectuava serviços de limpeza.
9. Cliente que perdeu quando em 12.10.2013, na sequência de adjudicação à ré C..., os serviços de limpeza desse cliente passaram a ser por esta realizados.
10. Em 2012 a autora iniciou período de baixa médica que se prolongou até ao primeiro semestre de 2013.
11. Durante tal período os clientes da A... aos quais estava adstrita foram entregues a outra supervisora.
12. Após termo da situação de baixa médica autora iniciou o gozo de período de férias referentes ao ano de 2012 o qual terminou em 10.07.2013.
13. Em 11.06.2013 a A... comunicou à autora, por carta registada com aviso de recepção, que passaria a exercer as funções de supervisora nos seguintes locais: Turismo de Portugal S João da Talha, Turismo de Portugal Sede, Turismo de Portugal Escola Lisboa, Turismo de Portugal Escola Portalegre, Turismo de Portugal Escola Estoril, Turismo de Portugal Escola Algarve (Faro), Turismo de Portugal Escola Portimão, Turismo de Portugal Escola Vial Real de St° António, Turismo de Portugal Escola Caldas da Rainha, Turismo de Portugal Escola Óbidos.
14. Na mesma carta, recepcionada a 13.06.2013, informou a autora que a mesma deveria continuar no gozo do seu período de férias com termo a 10-7, devendo entrar ao serviço no dia 11.07.2013.
15. Em 11.07.2013 a A... comunicou à autora que, na sequência das recomendações efectuadas pelos serviços de medicina do trabalho e temporariamente, se deveria apresentar apenas na Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa sita na Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa.
16. Em 11.07.2013 a autora apresentou-se na Escola de Hotelaria e Turismo de Lisboa, sita na Rua Saraiva de Carvalho, em Lisboa para execução das funções contratadas com a A...
17. Os restantes locais atribuídos à autora na comunicação de 11.06.2013 ficaram entregues a autora colega da autora.
18. Antes de 11.07.2013 a autora nunca havia prestado funções no referido cliente.
19. Em 23.08.2013 A... elaborou horário de trabalho da autora identificando o cliente Turismo de Portugal - Escola de Hotelaria e Turismo Lisboa, Rua Saraiva de Carvalho, Lisboa
20. Em 19.9.2013 A..., invocando a melhoria da situação clínica da autora, determinou a cessação da redução de locais decidida a 11.07.2013 determinando que a autora, a partir de 23.09.2013, passaria a prestar funções na totalidade dos locais referidos na comunicação datada de 11.06.2013 sendo-lhe para o efeito atribuída uma viatura e cartão de combustível.
21. Entre 3.10.2013 e 18.09.2014 a autora esteve de baixa médica.
22. A... desde a adjudicação dos serviços do cliente Turismo de Portugal à ré C... não reconhece a autora como sua trabalhadora invocando que o contrato foi transmitido para C... recusando aceitar os documentos médicos enviados pela autora para justificação da sua ausência.
23. C... não reconhece a autora como sua trabalhadora, recusando que o contrato de trabalho da mesma lhe tenha sido transmitido e recusando, desde sempre, aceitar os documentos médicos enviados pela autora para justificação da sua ausência.
E como não provados:
1. Que a autora tenha sido transferida pela A... para o cliente desta Turismo de Portugal em 11.7.2013.
2. Que a autora tenha estado em gozo de férias até 17-6-2013,
3. Que a autora tenha tido consulta de medicina do trabalho em 10.7.2013.
Fundamentação de direito
Quanto à 1.8 questão:
À relação de trabalho existente entre a autora e a ré A... é aplicável o CCT celebrado entre a Associação das Empresas Prestadoras de Serviços de Limpeza e Actividades Similares e o STAD - Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas publicada no BTE n° 12 de 29.03.2004 (última publicação com texto consolidado) e objeto de sucessivas Portarias de Extensão, a última a Portaria n° 478/2005 de 13 de maio, atenta a qualidade da autora de associada do STAD, tal como foi entendido na 1.a
instância sem qualquer reparo da recorrente.
Efetivamente, não obstante a Portaria de Extensão do CCT celebrado entre a Associação Portuguesa de Facility Services e a FETESE - Federação dos Sindicatos dos trabalhadores de Serviços e Outros, publicada no BTE n° 15 de 22.04.2008 e objecto de extensão através da Portaria 1519/2008 de 24 de dezembro (posteriormente foram publicadas revisão global no BTE n° 8 de 28.02.2010 e Portaria com o n° 56/2010) ser mais recente - o critério relevante nos termos do art 482.° n° 3 al a) do Cód. do Trab. na falta de opção pelos trabalhadores -, é aplicável o CCT celebrado pela estrutura sindical na qual a autora se encontra inserida como associada (o STAD) por via da alínea a) da referida Portaria n° 478/2005.
Dispõe a cláusula 17.a do referido CCT:
1 - A perda de um local de trabalho por parte da entidade patronal não integra o conceito de caducidade nem justa causa de despedimento.
2 - Em caso de perda de um local de trabalho, a entidade patronal que tiver obtido a nova empreitada obriga-se a ficar com todos os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviço.
3 - No caso previsto no número anterior, o trabalhador mantém ao serviço da nova empresa todos os seus direitos, regalias e antiguidade, transmitindo-se para a nova empresa as obrigações que impendiam sobre a anterior directamente decorrentes da prestação de trabalho tal como se não tivesse havido qualquer mudança de entidade patronal, salvo créditos que nos termos deste CCT e das leis em geral já deveriam ter sido pagos.
4 - Para os efeitos do disposto no n.° 2 da presente cláusula, não se consideram trabalhadores a prestar normalmente serviço no local de trabalho:
a) Todos aqueles que prestam serviço no local de trabalho há 120 ou menos dias;
b) Todos aqueles cuja remuneração e ou categoria profissional foram alteradas dentro de 120 ou menos dias, desde que tal não tenha resultado directamente da aplicação do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.
Os 120 dias mencionados neste número são os imediatamente anteriores à data do início da nova empreitada.
5 - Quando justificadamente o trabalhador se recusar a ingressar nos quadros da nova empresa, a entidade patronal obriga-se a assegurar-lhe novo posto de trabalho.
6 - Sem prejuízo da aplicação dos números anteriores, a entidade patronal que perder o local de trabalho é obrigada a fornecer, no prazo de cinco dias úteis a contar da recepção do pedido, à empresa que obteve a nova empreitada e ao sindicato representativo dos respectivos trabalhadores os seguintes elementos referentes aos trabalhadores que transitam para os seus quadros:
a) Nome e morada dos trabalhadores;
b) Categoria profissional;
c) Horário de trabalho;
d) Situação sindical de cada trabalhador e indicação, sendo sindicalizados, se a sua quota sindical é paga mediante retenção efectuada pela entidade patronal devidamente autorizada ou não;
e) Data de admissão na empresa e se possível no sector;
f) Início de actividade no local de trabalho;
g) Situação contratual, prazo ou permanente;
h) Se a prazo, cópia de contrato;
i) Mapa de férias do local de trabalho;
j) Extracto de remuneração dos últimos 120 dias, caso seja concedido a algum trabalhador acréscimo de remuneração por trabalho aos domingos, trabalho nocturno ou quaisquer prémios ou regalias com carácter regular e permanente;
k) Situação perante a medicina no trabalho.
7 - No caso dos trabalhadores na situação de baixa que transitam para outra empresa, nos termos desta cláusula, cujo contrato de trabalho tenha cessado por reforma coincidente com o termo de suspensão, compete à empresa adquirente da empreitada o pagamento dos créditos daí resultantes.
8 - O disposto na presente cláusula aplica-se, com as necessárias adaptações, às reduções de empreitadas, aplicando-se os critérios do n. 2 da cláusula 15. no caso de não haver trabalhadores já afectos às áreas objecto da redução.
Refira-se que embora esta cláusula tenha alguma similitude com o regime estabelecido, no art. 285.° do Cód. Trab., no sentido de salvaguardar e dar estabilidade às relações laborals que sofram alteração por ato estranho aos próprios trabalhadores, a verdade é que tem um campo de aplicação diferente.
No âmbito do 285.° do Cód. Trab. o que está em causa é a transmissão do estabelecimento, abrangendo esta toda e qualquer passagem do complexo jurídico-económico onde o trabalhador exerce a sua atividade, da esfera jurídica do empregador para outrem, seja a que título for, enquanto que na cláusula 17.a, n° 2, o que está em causa é a perda do local de trabalho em virtude de a entidade patronal ter perdido a empreitada que ali desenvolvia.
São, assim, diversas as realidades visadas na cláusula 17.a n° 2 do CCT e no art. 285.° do Cód. Trab., pois este aplica-se quando o estabelecimento ou parte dele, que constitua uma unidade económica, muda de sujeito, ao passo que aquela cláusula 17.a se aplica a situações em que o que muda não é a titularidade do estabelecimento, mas sim a entidade a quem é adjudicada determinada empreitada de prestação de serviços de limpeza, visando garantir a segurança no emprego e a ligação ao local de trabalho dos trabalhadores que aí normalmente laboram.
Apesar do amplo critério estabelecido no Cód. Trab. para abranger as transmissões de estabelecimento ou de exploração de estabelecimento, ou de parte dele, tal amplitude não abrange as situações descritas na cláusula 17.a, n° 2 do CCT para o sector das limpezas, pois esta não contempla qualquer situação de transmissão ou cessão de exploração do estabelecimento.
Aquela cláusula 17.a do CCT amplia o regime de manutenção das relações laborals estabelecido no art. 285.° do Cód. Trab., beneficiando os trabalhadores do sector de serviços de limpeza com a garantia dos seus postos de trabalho, mesmo em casos em que nenhuma transmissão de estabelecimento se verifica, mas em que, pela similitude das situações, se justifica uma solução idêntica.
O escopo fundamental da cláusula 17.a não é apenas o de assegurar aos trabalhadores a prestação de trabalho em determinado local ou serviço, mas também o de lhes garantir a estabilidade de emprego e a manutenção dos direitos adquiridos, tal como sucede com o art. 285.° do Cód. Trab., bem como contribuir ainda para a viabilidade económica das empresas que se dedicam a este tipo de serviços.
As empresas deste sector revestem-se de uma peculiar configuração organizativa, que tem a ver com a própria natureza dos serviços prestados e com as condições laborals em que os mesmos se concretizam. A sucessiva perda de locais de trabalho - sempre possível no aleatório sistema do concurso de empreitada sujeito à dinâmica do mercado e da concorrência - poderia facilmente pôr em causa a própria sobrevivência destas empresas, que ficariam obrigadas à manutenção de uma forte componente salarial sem quaisquer contrapartidas no campo dos lucros resultantes da prestação de serviços, e em consequência disso, pôr em risco a segurança e a estabilidade do emprego dos seus trabalhadores.
Daí que se tenha estabelecido na referida cláusula que a empresa que, em concurso, obtiver a nova empreitada se obrigue a ficar com os trabalhadores que ali normalmente prestavam serviço, na data da adjudicação.
Todavia, o que essencialmente se protege, naquela cláusula 17a, em conjugação com as cláusulas 14.a e 15.a do mesmo CCT, é a prestação de trabalho em determinado espaço físico.
Efetivamente, na cláusula 17.a fala-se em perda do local de trabalho, na cláusulas 14.a define-se o local de trabalho do pessoal da limpeza como o sítio geograficamente convencionado entre as partes para prestação da actividade do trabalhador e na cláusulas 15.a, sob a epígrafe Direito ao local de trabalho estabelece-se, no ponto 6 que [e]ntende-se por mudança de local de trabalho, para os efeitos previstos nesta cláusula, toda e qualquer mudança de local de prestação de trabalho, ainda que na mesma cidade, desde que determine acréscimos de tempo ou despesas de deslocação para o trabalhador.
Daqui resulta claramente que o que ali se protege é o posto de trabalho no local onde a atividade do trabalhador se vinha desenrolando e não noutro local geograficamente distinto.
Assim enquadrada a interpretação daquela cláusula 17.a do CCT em causa, vejamos o caso concreto destes autos
Ficou provado que a autora sendo trabalhadora da ré A... desde 2007, iniciou em 2012 um período de baixa médica que se prolongou até ao primeiro semestre de 2013.
Regressada ao serviço sob as ordens, direcção e autoridade da ré A... a autora permaneceu em gozo de férias até 10.07.2013.
Ainda durante o gozo de férias da autora, a referida ré determinou em 11.06.2013 que a autora passaria a exercer as suas funções nos locais do cliente Turismo de Portugal que entoa identificou.
A referida ordem foi conhecida autora em 13.06.2013.
Não obstante, a mesma ré determinou, invocando recomendações da medicina do trabalho, que a autora em 11.07.2013 se apresentaria apenas num desses locais, ficando os demais atribuídos a outra colega.
Apenas a partir de 23.09.2013, na sequência de revisão da ordem de 11.07.2013, a autora passou a ser responsável pela totalidade dos locais que lhe haviam sido comunicados em 13.06.2013.
A partir de 12.10.2013 o cliente desses locais adjudicou os serviços de limpeza à ré C...
Contabilizando os 120 dias a que alude o n° 4 da cláusula 17.a para ter lugar transmissão do contrato a autora teria de prestar a sua actividade laboral no cliente Turismo de Portugal em 13.06.2013.
Dos factos apurados nos autos resulta que em 11.06.2013 a autora foi colocada no referido cliente por decisão da ré A... no exercício do seu poder de direcção e autoridade decorrente do contrato de trabalho que em 2007 celebrara com a autora. Esta ordem foi conhecida da autora em 13.06.2013.
É igualmente um facto apurado nos autos que o primeiro dia em que a autora se apresentou no referido local foi o dia 11.07.2013.
Tal sucedeu, como igualmente se apurou, por antes dessa data se encontrar em gozo de férias.
Ora, não determinando o gozo de férias qualquer suspensão do contrato de trabalho - art 296.° do Cód. Trab. - antes se integrando na normal execução do mesmo, contando tal período para efeitos de antiguidade e sendo remunerado, não foi pelo facto de a autora estar de férias durante o mês de Junho que deixou de ser trabalhadora colocada no referido local do cliente, posteriormente adjudicado à ré C..., a partir da altura em que a ré A... no exercício do seu poder de direcção o decidiu.
A prestação de serviço a que alude a cláusula 17.a e que é referida no seu n° 2 tem de ser vista por referência à ratio da norma e ao fim pela mesma visado: a protecção do local de trabalho, do espaço em torno do qual o trabalhador organiza a sua vivência profissional, pessoal e familiar.
Deste modo, tal não implica que ali normalmente prestavam serviço tenha de ser visto como uma prestação efectiva de funções, ou seja o facto do trabalhador não ter prestado funções no local nos 120 dias que antecedem a perda do local tem de ser visto em função dos motivos determinantes dessa não prestação podendo a transmissão do contrato ocorrer mesmo sem qualquer prestação efectiva, como a própria norma o prevê no seu n° 7 em relação aos trabalhadores em situação e baixa médica, ou seja com uma suspensão do contrato que, no caso dos autos, o gozo de férias nem sequer determinou.
Igualmente não obsta o facto de a autora, tendo a categoria profissional de supervisora, se encontrar afecta a apenas a um local entre 11.07.2013 e 23.09.2013, isto é, não se deslocar aos diversos locais do cliente que a ré A... lhe atribuiu em 11.06.2013.
Segundo o anexo de definições de funções do CCT em causa Supervisor. - É o trabalhador que ao serviço de uma empresa faz orçamentos, fiscaliza e controla a qualidade dos serviços e a boa gestão dos produtos, equipamentos e materiais e é responsável pelo desenrolar das operações de limpeza, orienta o pessoal em vários locais de trabalho, mais lhe competindo o relacionamento com os clientes e operações administrativas com os trabalhadores, daqui não resultando que o supervisor tenha necessariamente de prestar a sua actividade em diversos locais. Depois, mesmo que assim fosse e concedendo que os termos do contrato de trabalho da autora com a ré A... a tal conduzem, importa atender que tal afectação exclusiva a um local sucedeu por determinação da empregadora A..., nos termos e períodos temporárias em que a mesma determinou o condicionamento das funções da autora obstando à sua deslocação aos demais locais, designadamente por ordem temporária expressa nesse sentido e não lhe atribuindo a viatura para tal, como havia sido contratualizado.
Tendo a autora sido colocada como trabalhadora nos diversos locais do cliente Turismo de Portugal antes de 120 dias imediatamente anteriores à transmissão do local de trabalho a decisão da sua empregadora de não lhe atribuir trabalho, de lhe ordenar que não se desloque a alguns deles ou de lhe não proporcionar os meios para deslocação à totalidade dos locais não obsta a que a autora se considere como prestando normalmente serviço nos locais transmitidos.
Concluindo, o contrato de trabalho da autora transmitiu-se para a ré C... por via do disposto na cláusula 17.a n° 2 do mencionado CCT.
Quanto à 2.a questão:
O despedimento é uma das formas de extinção do contrato de trabalho, que se consubstancia na resolução unilateral daquele negócio jurídico por parte do empregador - arts. 340.° e 351.° e segs. do Cód. Trab..
Assim, o despedimento configura-se como uma declaração de vontade recepienda, vinculativa e constitutiva, dirigida à contraparte, com o fim de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro - arts. 357.°, n.° 7 do Cód. Trab. e 224.° do Cód. Civil.
Essa declaração, expressa ou tácita, terá de ser enunciada em condições de não suscitar dúvida razoável sobre o seu verdadeiro significado; é, assim, necessário que o empregador declarante - por escrito, verbalmente ou até por mera atitude - denote ao trabalhador declaratário, de modo inequívoco, a vontade de extinguir a relação de trabalho - art. 217.° do Cód. Civil.
O que é exigível é que, havendo tal vontade por parte do empregador, este assuma um comportamento que a torne percetível e inequívoca junto do destinatário, enquanto declaratário normal, tendo sempre presente que a declaração negocial vale com o sentido que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante - art. 236.° do Cód. Civil.
Sobre a questão, veja-se o sumário do Acórdão desta Relação de Lisboa de 3 de março de 1999, (www.dgsi.pt) em cujo sumário se lê o seguinte:
1. A declaração de despedimento, seja com justa causa, seja sem justa causa, deve caracterizar-se por manifestação de vontade expressa (directa ou imediata) ou tácita (indirecta ou mediata) formulada de modo a não consentir dúvidas do sentido e alcance para o trabalhador, seu destinatário.
2. Essa declaração deve ser emitida, de forma inequívoca, pela entidade patronal ou por um representante desta.
Bem como o que se diz no Ac. do STJ de 5 de abril de 2006, (www.dgsi.pt):
O despedimento, na acepção que ao caso interessa, traduz-se na ruptura da relação laboral, por acto unilateral da entidade patronal, consubstanciado em manifestação da vontade de fazer cessar o contrato de trabalho, acto esse de carácter receptício, o que significa que, para ser eficaz, nos termos do artigo 224.°, n.° 1, 1.a parte, do Código Civil, deve tal desígnio ser levado ao conhecimento do trabalhador, quer através de palavras, escritas ou transmitidas por qualquer outro meio de manifestação
de vontade, quer através de actos equivalentes, que revelem,
clara e inequivocamente, a vontade de despedir e, como tal, sejam entendidos pelo trabalhador, segundo o critério definido no artigo 236.°, n.° 1, do referido.
A referida inequivocidade visa, tanto evitar o abuso de despedimentos efectuados com dificuldade de prova pelo trabalhador, como obstar ao desencadear das suas consequências legais, quando não se mostre claramente ter havido ruptura indevida do vínculo laboral por parte da entidade patronal.
No caso dos autos, provou-se que a recorrente se recusou reconhecer a autora como sua trabalhadora, recusou receber os certificados de incapacidade para o trabalho que esta lhe enviava, devolvendo os mesmos, sendo, pois, manifesta a sua vontade de não ter a autora como sua trabalhadora.
Sendo a autora efetivamente sua trabalhadora, tal manifestação de vontade que se verifica desde a altura em que passou a executar os serviços no cliente Turismo de Portugal, e que foi sucessivamente reiterada, tem o mesmo significado de uma declaração expressa e unilateral de cessação do contrato.
Nas palavras de Pedro Furtado Martins (Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, Cascais, 2012, pág. 151), [o] despedimento lícito pressupõe sempre uma declaração expressa da vontade patronal de pôr termo ao contrato de trabalho, a qual, para ser válida e eficaz, tem de obedecer ao formalismo legalmente exigido para as diferentes formas de despedimento, mais concretamente para a decisão de despedimento que culmina o respectivo procedimento . artigos 357.°, 363.°, 371.° e 378.°.
Contudo, para que exista um despedimento - ainda que ilícito basta que ocorra uma declaração de vontade tácita, isto é, um comportamento concludente do empregador de onde se deduza, com toda a probabilidade, a sua vontade de fazer cessar o contrato de trabalho para o futuro.
Deste modo, entende-se que na situação em apreço se configura uma declaração unilateral de vontade da empregadora no sentido de fazer cessar o contrato de trabalho, ou seja, que a autora logrou demonstrar, como lhe competia por força do art. 342.°, n° 1 do Cód. Civil, que foi objeto de despedimento pela recorrente, tal como o mesmo deve ser entendido, nos sobreditos termos.
Pelo exposto, e sem necessidade de mais considerações, falecem in totum as conclusões do recurso.
Decisão
Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
Lisboa, d.s.

(Isabel Tapadinhas)