Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
Actualidade | Jurisprudência | Legislação pesquisa:


    Jurisprudência da Relação Laboral
Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
 - ACRL de 25-01-2017   Falta por doença. Sanção disciplinar. Proporcionalidade.
Tendo o trabalhador faltado ao serviço por um dia, por motivo de doença comprovada por declaração médica, não se justifica a sanção disciplinar de 20 dias de suspensão com perda de vencimento que a Ré aplicou ao Autor.
Proc. 17073/15.4T8LSB 4ª Secção
Desembargadores:  Claudino Seara Paixão - José Feteira - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
_______
Tribunal da Relação de Lisboa
4B Secção

Proc. 17073/15.4T8LSB.L1


Acordam na secção social do Tribunal da Relação de Lisboa:


RELATÓRIO
L..., instaurou a presente ação declarativa sob a forma de processo comum, no dia 17/06/2015, contra «T..., SA.», pedindo que se declare ilícita a sanção disciplinar de suspensão de trabalho por 20 dias com perda de retribuição e antiguidade e, consequentemente, se a condene a pagar-lhe a quantia de € 829,82 acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento até efetivo e integral pagamento; no pagamento da quantia de € 4.500,00 a título de danos não patrimoniais; a cancelar/retirar/não transcrever qualquer menção ao processo disciplinar e sanção disciplinar, no Processo Individual do A., e ainda, a Ser reposta a situação em que ocorreria, em termos de antiguidade, quer por via da pendência do presente processo disciplinar quer por via da aplicação da sanção disciplinar de suspensão e, perca de 20 dias de antiguidade, ao nível das progressões técnicas e promoções.
Para tanto, alega, no essencial, que foi admitido ao serviço da Ré para, sob a sua autoridade, direção e fiscalização, exercer funções inerentes à categoria profissional de Comissário de Bordo, mediante o pagamento de € 1.261,00 a título de retribuição base acrescida de € 25,22 de senioridade, e ainda que, no dia 28/07/2014, lhe foi instaurado um procedimento disciplinar que culminou com a aplicação de uma sanção de suspensão por 20 dias com perda de retribuição e antiguidade por, no dia 03/05/2014, na manga do avião, ter dito à colega M..., de forma acintosa e desrespeitosa, que ia meter baixa por as escalas não lhe fazerem os favores, o que veio a concretizar no dia 04/03/2014, pelas 05h00, mas tal não sucedeu nos termos denunciados pela colega M..., que se intrometeu na conversa que mantinha com a colega M..., extraindo ilações deturpadas. Elucidando, alega que, no dia 03/05/2014, na chegada a Paris, comentou com a colega M... que se sentia cansado por ter tido problemas de sono e suores, consequentes de malária já sofrida, assim como que se tal se mantivesse não conseguiria terminar a rotação, tendo-se a colega M... intrometido na conversa, perguntando se o mesmo iria dar baixa, ao que respondeu afirmativamente, assim como que iria tentar alterar o serviço para que havia acabado de ser convocado a fim de evitar a baixa médica. Mais alega que não regista antecedentes disciplinares; que sempre foi diligente e zeloso; que não dispõe de outros proventos mensais; que a perspetiva de ser despedido o stressou, enervou, preocupou e deixou angustiado; que temeu não voltar a ter emprego; que os colegas o passaram a ver como mentiroso e mau companheiro, o que o envergonhou e trouxe mau estar; que tal lhe causou insónias diárias; e por fim, que se sentiu triste, magoado e injustiçado. Por fim, alega que a sanção disciplinar foi cumprida de 28/12/2014 a 16/01/2015, tendo-lhe a Ré descontado € 829,82, sendo € 156,86 em 12/2014 e € 663,80 em 01/2015, e ainda, que a sua manutenção é passível de lhe vir a causar graves prejuízos na carreira profissional, ao nível das promoções, progressões e evolução salarial.
Contestando, a Ré alega que, de 03/05/2014 a 05/05/2014, o Autor integrou a rotação NBPNC-3 OPO07P e que, no dia 03/05/2014, ao chegar de Lisboa a Paris, se cruzou com a tripulação que fazia a rotação 4FNC44X na manga do avião, tendo anunciado de véspera, de forma acintosa e desrespeitosa, perante M... e M..., que ia dar baixa por forma a penalizar o serviço de escalas por este não lhe fazer os favores que desejava, o que veio a cumprir no dia 04/05/2014, ligando para as escalas a comunicar que ia dar baixa logo que chegasse ao Porto do TP 459, o que causou perturbações no normal funcionamento da atividade, sobrecarregando outros trabalhadores, a quem obrigou a alteração do planeamento por forma a suprir a ausência do Autor, negando, no mais, a causalidade entre os danos morais alegadamente invocados e o procedimento disciplinar.
Procedeu-se à audiência de julgamento no final da qual foi proferida a decisão sobre a matéria de facto e respectiva fundamentação.
Elaborada a sentença, foi proferida a seguinte DECISÃO:
Pelo exposto, o Tribunal julga a ação parcialmente procedente e, em consequência, decide:
1. Declarar ilícita a sanção disciplinar aplicada a «L...».
2 Condenar a «T..., SA» a eliminar do registo disciplinar a sanção disciplinar de 20 dias de suspensão com . -perda de retribuição e antiguidade.
3. Condenar «T..., SA» a restituir a «L...» a quantia de E 829,82, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento até integral e efetivo pagamento.
4. Absolver «T..., SA» do demais peticionado por «L...».
5. Condenar «L...» e «T…, SA» a pagarem as custas processuais, na proporção do decaimento.
A Ré, inconformada, interpôs recurso desta decisão terminando as suas alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
1. Vem o presente recurso interposto da decisão que, julgando parcialmente procedente a acção, decretou a ilicitude da sanção disciplinar aplicada ao ora Recorrido, condenando a Ré, ora Recorrente, a retirar do registo disciplinar do A., ora Recorrido, a sanção de 20 dias de suspensão com perda de retribuição e antiguidade, e a restituir-lhe a quantia de € 829,82, absolvendo-a no demais peticionado.
2. A sentença em crise não fez boa aplicação do Direito, nem ajuizou correctamente a prova produzida, principalmente testemunhal.
3. O facto dado por provado na douta sentença em crise sob o n.° 10, deve ter seguinte redacção:
No dia 03 de Maio de 2014, ao chegar do Porto, o Autor cruzou-se, na manga do avião, com a tripulação que fazia a rotação 4FNC44X, nomeadamente com a AB M... com quem teve o seguinte diálogo:
M...: - Olá Jorge, como estás?
Arguido: - Olha nem vais acreditar, apresentei-me agora para fazer isto e as escalas fizeram-me uma alteração após apresentação e amanhã quando chegar ao OPO tenho de ir fazer o LGW!!! Devem pensar que o vou fazer, ahahah!
M...: - Então vais por baixa?
Arguido: - Claro!!! Ou me fazem os favores que eu quero ou então não faço isto!!!
4. A factualidade em causa, com a necessária correcção do lapso de referência a Lisboa quando se devia referir Porto, resultou provada do depoimento da testemunha M..., com quem a conversa foi mantida directamente (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 15.02.2016, págs. 224, 229, 237 das transcrições juntas), do depoimento de M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, págs. 114, 116, 118 das transcrições juntas) e ainda do depoimento da testemunha M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, págs. 167 e 168 das transcrições juntas).
5. Dos depoimentos referidos resulta que o Recorrido referiu expressamente que ia dar baixa porque o serviço de escalas não lhe faziam os favores que ele queria, neste caso, não fazer o voo Porto/Londres/Porto para o qual havia sido validamente nomeado.
6. O facto dado por provado na douta sentença em crise sob o n.° 11 deve ter seguinte redacção:
,Nesse mesmo dia (03 de Maio de 2014), pelas 17h35, o Autor contactou o serviço de
Escalas que, como habitual, procedeu ao registo num RDO (relatório de ocorrências)
elaborado por C...: Liga porque foi alterado fora da base para operar TP
1.33,4/331/04MAYARR TP 459 e diz que se sente cansado (veio da folga) porque dormiu
mal e provavelmente amanhã terei febre.
7. A factualidade em causa resultou provada do que a trabalhadora C... fez constar do relatório de ocorrência do dia 03.05.2014 (fls. 193 do autos), e que a mesma confirmou ter escrito exactamente aquilo que o Recorrido lhe disse no telefonema havido (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, págs. 198 e 199 das transcrições juntas).
8. O Recorrido sempre ligou a baixa que iria dar, ao facto de ter sido nomeado para fazer o serviço de voo Porto-Londres-Porto, para o qual tinha sido validamente nomeado.
9. Deve ser dado por provado, tal como alegado no art.° 12.° da contestação, um novo facto com a seguinte redacção:
No dia 04 de Maio de 2014, Domingo, pelas 05h00, o Autor voltou a contactar as escalas, e deste contacto resultou o seguinte RDO do serviço de Escalas, elaborado por M...: Info baixa à chegada TP459/DT.
10. A factualidade em causa consta do documento junto a fls. 194 dos autos, que não foi impugnado, e resultou também demonstrada do depoimento da testemunha M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, págs. 216, 217 das transcrições juntas).
11. Deve ser dado por provado, tal como alegado nos arts.° 37.° e 38.° da contestação, um novo facto com a seguinte redacção: O Autor, no dia 04.05.2014, depois de ter dado baixa no Porto, saiu para almoçar.
12. A factualidade ora em causa foi aceite no essencial pelo próprio Recorrido (fls. 16 do processo de inquérito), bem como do depoimento das testemunhas M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, pág. 125 das transcrições juntas) e M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 15.02.2016, pág. 231 das transcrições juntas).
13. Deve ser dado por provado, tal como alegado nos arts.° 44.° e 45.° da contestação, um novo facto com a seguinte redacção:
Na sequência do descrito em 15., as faltas a outros voos tiveram que ser supridas por outros tripulantes, designadamente pela Assistente de Bordo M..., que se voluntariaram para tal.
14. Tal factualidade, relevante para aferir das consequências da conduta do Recorrido, uma vez que consumiu indevidamente um tripulante (que estava de assistência), e foi chamado para assegurar o serviço de voo Porto-Londres-Porto, resultou provada pelo depoimento das testemunhas M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, pág. 120 das transcrições juntas), Marta Gomes Teixeira (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 11.01.2016, pág. 172, 173 e 174 das transcrições juntas) e M... (Acta da Sessão da Audiência de Julgamento de 15.02.2016, pág. 230 das transcrições juntas).
15. Não pode ser dado por provado o Facto Provado n.° 17 (O Autor sofreu de Malária), que deve ser eliminado, já que a qualificação e prova de que se sofre ou sofreu de determinada doença, deve ser feita por documento médico bastante, que não foi junto aos autos, e não por testemunhas (não médicas) que, para além do mais, só podem saber o que Recorrido lhes disse.
16. Resultou demonstrado que, independentemente de confirmação da baixa médica no dia 04.05.2014, a razão pela qual o Recorrido não realizou os voos Porto-Londres-Porto para os quais havia sido validamente nomeado, foi não querer realizá-los, como aliás anunciou antecipadamente.
17. Está em causa, por isso, uma conduta indevida, perante uma ordem lícita da entidade ;empregadora, violadora dos princípios da boa fé que devem presidir às relações laborais, e que causou perturbações evitáveis no normal funcionamento da actividade da
Recorrente, actividade essa já sujeita a vários imponderáveis.
18. O comportamento do Recorrente foi estudado, planeado, e manifestamente intencional, já que visou apenas não realizar os voos resultantes da alteração ao planeamento que lhe havia sido assinalada, e não à restante actividade (voos de regresso à base em Lisboa no dia 5.05.2014), como seria expectável e aceitável se outros fossem os motivos que verdadeiramente estavam na base da decisão do Recorrido, facto que não deixou de sublinhar no segundo contacto com o Serviço de Escalas.
19. No contexto fáctico em causa, fica verdadeiramente incompreensível a fundamentação da resposta à matéria de facto dada pelo Tribunal (pag. 7) e que revela a formação da convicção do julgador, independentemente de ao Recorrido ter sido dada baixa médica por um dia, atento o facto de naturalmente os serviços médicos, no caso concreto, não poderem deixar de acreditar no que o Recorrido lhes disse.
20. Não pode relevar o facto, não demonstrado, de o Recorrido se ter queixado que havia dormido mal, e de estar com arrepios de frio, antes de tomar conhecimento da nomeação para os referidos voos para Londres, desde logo porque tal não impediu o Recorrido de fazer os voos de Lisboa para o Porto, aqui pernoitar e daqui voar para Paris e depois aqui ter pernoitado, sem que tivesse referido à tripulação que o acompanhava, maxime ao seu Chefe de Cabine N..., que iria dar baixa.
21. A necessidade de dar baixa médica só se verificou quando tomou conhecimento de que havia sido nomeado para os voos para Londres.
22. Quanto à repercussão da conduta do Recorrido na actividade operacional da Recorrente, não releva o facto de estar consagrado um regime de assistência (RUPT anexo ao AE TAP/SNPVAC, BTE n.° 48, 28.02.2006), uma vez que tal sistema não pode colmatar todas as irregularidades que acontecem, e se o Comissário de Bordo de assistência no Porto avançou, naturalmente que deixou a descoberto qualquer outra necessidade que efectivamente veio a ocorrer (com a Assistente M...).
23. Ficou demonstrada a infracção disciplinar praticada pelo Recorrido, merecedora da sanção disciplinar ajustada e proporcional à gravidade da infracção e à culpabilidade do infractor (art.° 330.° do Código do Trabalho) e conforme à prática disciplinar da Recorrente.
24. O Recorrido agiu livre e conscientemente, não podendo deixar de saber da ilicitude da sua conduta, premeditada e querida.
25. A conduta das tripulantes I... e M... não se distanciam da conduta do Recorrido, já que as recusas a realizar o voo (por parte da tripulante I...) e o serviço a bordo na classe executiva num outro voo (por parte da tripulante M...), se fundavam em pretenso incumprimento pela Recorrente dos tempos de descanso e do regime de nomeações (no primeiro caso), e no facto de voar com tripulação reduzida ao abrigo de um Regulamento Interno que considerou ilegal (no segundo caso), pelo que em ambos os casos as tripulantes, embora erradamente, estavam convictas de agir a coberto do regime legal e convencional na interpretação que deles faziam.
26. Já o Recorrido nunca questionou a legalidade da nomeação para os voos Porto-Londres-Porto, encontrando antes um estratagema para não realizar aqueles voos.
27. A conduta do Recorrido foi de uma enorme gravidade, com um elevadíssimo grau
de culpa e de premeditação, numa grosseira e manifesta violação das regras da boa-fé .contratual e do respeito que lhe devia merecer a entidade empregadora e os seus colegas - de trabalho.
28. Mostrando-se válida, adequada e proporcional a sanção disciplinar aplicada pela Recorrente ao Recorrido, a sentença em crise, ao decidir como decidiu, violou, entre outras, o disposto nos arts. 128.°, n.° 1, alínea a), b), f) e h), 328.° e 330.° do Código do Trabalho, bem como nas alíneas a), b), g), i) e 1) da Cl.a 4.a do AE TAP/SNPVAC.
Termos em que, pelo que antecede (...) deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença em crise e, em consequência, absolver-se a Recorrente de todos os pedidos.
O Recorrido contra-alegou pugnando pela improcedência do recurso.
Remetidos os autos a este tribunal foram colhidos os vistos legais, tendo a Sr. Procuradora-Geral Adjunta emitido parecer no sentido da confirmação da sentença.
Cumpre apreciar e decidir.
Das conclusões do recurso emergem as seguintes questões:
- Impugnação da matéria de facto;
- Se a sanção disciplinar aplicada pelo Recorrente ao Recorrido é de manter, e, consequentemente, se a sentença recorrida deve ser revogada.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A 1.ª Instância considerou provados os seguintes factos:
1. O Autor foi admitido ao serviço da Ré no dia 15/07/2008 para, sob a sua autoridade, direção e fiscalização, exercer as funções de Comissário de Bordo, mediante o pagamento último de € 1.261,00 a título de retribuição base acrescida de € 25,22 a título de vencimento de senioridade.
2. No dia 28/07/2014 foi instaurado procedimento disciplinar contra o Autor.
3. No dia 30/07/2014 a Ré remeteu ao Autor a nota de culpa de fls. 124127 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra, que a rececionou no dia 04/08/2014, informando-o de que é intenção da TAP proceder ao despedimento do Arguido com invocação de justa causa.
4. O Autor respondeu à nota de culpa nos termos constantes de fls. 135-143 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
5. Por decisão datada de 16/10/2014, a Ré aplicou ao Autor a sanção disciplinar de 20 dias de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade, nos termos constantes do relatório final de fls. 176-183 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
6. O Autor cumpriu a sanção disciplinar de 28/12/2014 a 16/01/2015.
7. A Ré descontou € 829,82 no vencimento do Autor, sendo € 165,86 em 12/2014 e € 663,80 em 01/2015.
8. No dia 03/05/2014, o Autor integrou a tripulação planeada para a rotação NBPNC-3 OPO07P, que contemplava os seguintes voos:
- TP 1954 - 03/05/2014 - LIS/OPO (Lisboa-Porto);
- TP 0454 - 03/05/2014 - OPO/ORY (Porto-Paris);
- TP 0459 - 04/05/2014 - ORY/OPO (Paris-Porto);
-TP 1573 - 05/05/2014 - OPO/FNC (Porto-Funchal);
- TP 1610 - 05/05/2014 - FNC/LIS (Funchal-Lisboa).
9. No dia 03/05/2014, depois de chegar a Paris, o Comandante do Voo informou o
Autor de que tinha havido uma alteração na sua rotação e que, no dia 04/05/2014,
depois de chegar ao Porto, teria que integrar a tripulação do voo TP 334/331, com destino a Londres, após o que regressaria ao Porto, retomando a rotação programada, supra descrita em 8).
10. Na manga do avião, o Autor cruzou-se com M..., Assistente de Bordo de uma outra tripulação, tendo-lhe dito que tinha sofrido uma alteração na rotação mas que não a iria fazer, anunciando-lhe que iria meter baixa médica logo que chegado ao Porto.
11. Por estar com arrepios de frio e ter dormido mal na noite de 02 para 03/05/2014, o Autor, no dia 03/05/2014, pelas 17h35, telefonou, de Paris, para o serviço de escalas da Ré, informando que se sentia cansado, que havia dormido mal e que, no dia de amanhã, provavelmente teria febre.
12. No dia 04/05/2014, o Autor informou o Comandante do voo TP 0459 de que não estava em condições para integrar a tripulação do voo TP 334/331.
13. Quando eram 05h00, o Autor telefonou para o serviço de escalas da Ré, informando que meteria baixa logo que chegasse ao Porto, pelo que não poderia fazer o voo TP 334/331.
14. Chegado ao Porto, o Autor foi observado por médico da Eccosalva, que lhe atribuiu baixa médica por 1 dia.
15. P... estava de assistência mensal, tendo substituído o Autor no voo TP 334/331.
16. O Autor esteve de folga nos dias 01/05/2014 e 02/05/2014.
17. O Autor sofreu Malária.
18. O Autor não regista antecedentes disciplinares.
19. O Autor é empenhado e competente.
20. O procedimento disciplinar gerou tristeza, desmotivação, desgaste e revolta no Autor.
21. No procedimento disciplinar instaurado contra Isabel Cristina Miranda Fernandes, a Ré aplicou-lhe a sanção disciplinar de 24 dias de suspensão com perda de retribuição e antiguidade.
22. No procedimento disciplinar instaurado contra M..., a Ré aplicou-lhe a sanção disciplinar de 24 dias de suspensão com perda de retribuição e antiguidade, nos termos e pelos fundamentos constantes de fls. 251-267 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO Quanto à impugnação da matéria de facto
A Recorrente impugna os pontos n° 10 e 11 dos factos provados, propondo que aos mesmos seja dada nova redacção. Entende que devem ser dados corno provados os factos alegados no art. 12, 37 e 38, 44 e 45, da contestação. Alega, ainda, que não pode ser dado corno provado o facto constante do n° 17 dos factos provados.
Tendo a Recorrente cumprido os ónus previstos no art. 640° do CPC, cumpre apreciar cada um dos pontos impugnados, atento o disposto no art. 662° do CPC.
Antes de mais importa referir que a apreciação da matéria de facto pelos tribunais superiores não pode ter por fim refazer o processo de convicção da 1 a Instância, mas apenas sindicar a matéria em questão, procurando verificar se, efetivamente, ocorreu uma evidente má apreciação que imponha uma alteração da decisão da matéria de facto.
É que o julgador da 1a Instância, face à observância dos princípios da imediação, concentração e oralidade, dispõe de uma pluralidade de elementos decisivos para a formação da sua convicção, que não estão ao alcance do tribunal superior, que apenas dispõe da gravação dos depoimentos ou da leitura da sua transcrição.
Além disso, quanto à prova testemunhal, prevalece o princípio da livre apreciação da prova (artigo 396° do Código Civil), o qual assenta na convicção que o juiz tenha formado sobre os factos, devendo fazer uma análise crítica e fundamentada dessa prova (artigo 607° n° 5 do Código de Processo Civil).
E a decisão da 1.ª Instância sobre a decisão da matéria de facto foi fundamentada nos seguintes termos:
Na determinação da factualidade provada supra elencada, o Tribunal gizou a sua
convicção no acordo das partes, na prova documental junta aos autos e na prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento, o que se analisou conjugada e criticamente com as máximas da experiência comum e juízos de normalidade e razoabilidade, tendo-se lançado mão, no que se vislumbrou relevante, do disposto no artigo 72°, n. ° 1, do Código de Processo de Trabalho, por sobre toda aquela factualidade ter incidido discussão em sede de audiência final.
(...)
Para prova da demais factualidade o Tribunal atentou no teor da prova testemunhal, devidamente conjugada entre si e com as máximas da experiência comum e juízos de normalidade e razoabilidade.
Sobremaneira relevantes foram as declarações prestadas pela testemunha N..., Chefe de Cabine do voo cuja tripulação o Autor integrou no dia 03/05/2014, porquanto revelou conhecimento direto dos factos, objetividade e manifesta imparcialidade, o que mereceu total credibilidade, tendo declarado, em suma, que o Autor lhe pediu autorização, durante o voo, para usar um casaco de malha por estar com arrepios de frio; que lhe relatou que tinha passado mal a noite;
que havia tido febre; que já havia sofrido malária; que tudo isto sucedeu antes do mesmo ter tido conhecimento da alteração da rotação, o que somente sucedeu quando chegou a Paris vindo do Porto, onde então foi informado pelo Comandante do Voo de que, no dia 04/05/2014, chegado ao Porto, teria que integrar a tripulação do voo TP 334/331- OPO/LGW/OPO, após o que retomaria o serviço de rotação planeado; que o mesmo ligou para o serviço de escalas por não se sentir bem, com o
intuito de informar do seu estado e lograr alcançar uma alteração; que no dia seguinte, 04/05/2014, por ter dormido mal e não se sentir melhor, informou o Comandante de que não estava em condições de fazer o voo para que havia sido escalado ao chegar ao Porto (Porto-Londres); que chegado ao Porto foi observado por médico da Eccosalva, tendo-lhe sido dada baixa médica por 1 dia.
Mais referiu que foi o colega P... que o substituiu na rotação objeto de alteração, e ainda que, pese embora tivesse realizado o voo previsto na rotação completa para o dia 05/05/2014, Porto-Funchal e Funchal-Lisboa, o fez adoentado , sendo que tem o Autor como empenhado, competente e bom profissional, em consequência do que o procedimento disciplinar lhe causou tristeza, desmotivação, desgaste, sentindo-se injustiçado.
L..., Assistente de Bordo desde 2008, também confirmou que o Autor já havia sofrido malária; que era bom profissional; e ainda, que se sentiu triste e injustiçado com o procedimento disciplinar.
T..., Comissário de Bordo desde 2005, colega do Autor na rotação completa, corroborou que o Autor se queixou do seu estado de saúde no voo Lisboa-Porto-Paris e que, chegado a Paris, não quis passear, tendo ficado no hotel.
Mais elucidou que a notícia da alteração da rotação lhe foi dada pelo Comandante de Voo somente quando chegados a Paris e que, quando de regresso ao Porto, o Autor continuou a revelar prostração, dizendo que não se sentia bem e que quando chegasse ao Porto iria chamar o médico.
M... Martinho, Assistente de Bordo desde 2007, colega do Autor e elemento de outra tripulação, também confirmou que se cruzou com o Autor na manga de acesso ao avião em Paris, e que, perguntado ao mesmo se estava bem, o mesmo lhe respondeu que não se sentia bem, que havia passado mal a noite, que achava que não iria conseguir fazer a rotação Porto/Londres/Porto, revelando efetivo cansaço, após o que ambos começaram a falar com outros colegas, sendo o Autor com M....
M..., Assistente de Bordo desde 1988 e Chefe de Cabine desde 07/2008, elemento da tripulação que se cruzou com a do Autor na manga do avião, confirmou que-. o Autor conversou com a colega M..., afecta à sua tripulação.
Porém, dizendo-lhe apenas que havia sido convocado pelas escalas para, fazer um novo voo chegado ao Porto mas que: não pensem as escalas que eu vou fazer o voo! . M..., Assistente de Bordo desde 2005, assistiu à conversa do Autor com M..., tendo confirmado que o Autor lhe referiu, chateado, que tinha tido uma alteração na rotação e que não a iria fazer, anunciando-lhe que iria meter baixa. Neste .contexto, M..., Assistente de Bordo desde 06/2008, colega do Autor desde 2007/2008, foi a única testemunha a referir em audiência de discussão e julgamento que o Autor lhe havia dito que ou as escalas lhe faziam os favores ou ele metia baixa.
Também foi a única a referir que o Autor falou com ela de forma jocosa, leviana e irónica.
Compreende-se a indignação de M... posto estar convencida (facto que não se provou em audiência) que a alteração da sua rotação se deveu à baixa do Autor; Como nos deu conta a testemunha M..., sua Chefe de Cabine, a M... ficou indignada com o Autor por: No entender da Margarida o Jorge estava a dar uma baixa fraudulenta e depois quando ela foi fazer um voo pôr causa dele ficou ainda mais chateada e por isso é que fez a queixa.
Ora, as demais testemunhas que conviveram com o Autor antes do mesmo ter tido conhecimento da alteração da rotação referiram, com convicção e seriedade, que o Autor não se sentia efetivamente bem e que, como é compreensível, ,ficou chateado com a alteração da rotação.
Donde, só M... concluiu, como participou com vista à instauração do inquérito (cfr. fls. 90-91), que estaria em causa uma baixa fraudulenta, baixa que a Ré não impugnou.
Pelo que tem que entender-se que se o Autor, chegado ao Porto, foi observado por um médico que lhe recomendou um dia de descanso, tal sucedeu por não se encontrar em condições de trabalhar e, portanto, de, fazer o voo para que havia sido destacado.
Apreciemos então cada um dos factos impugnados.
Quanto ao facto constante do n° 10 dos factos provados.
Alega a Recorrente que o facto n° 10, com base no depoimento das testemunhas M..., com quem a conversa foi mantida directamente, e das testemunhas M... e M..., que estavam presentes, devia ter a seguinte redacção:
No dia 03 de Maio de 2014, ao chegar do Porto, o Autor cruzou-se, na manga do avião, com a tripulação que fazia a rotação 4FNC44X, nomeadamente com a AB M... com quem teve o seguinte diálogo:
M...: - Olá Jorge, como estás?
Arguido: - Olha nem vais acreditar, apresentei-me agora para fazer isto e as escalas fizeram-me uma alteração após apresentação e amanhã quando chegar ao OPO tenho de ir fazer o LGW!!! Devem pensar que o vou fazer, ahahah!
M...: - Então vais pôr baixa?
Arguido: - Claro!!! Ou me fazem os favores que eu quero ou então não faço isto!!!
O que há de diferente neste diálogo que a Apelante pretende ver provado e o que consta do ponto 10 impugnado, é a expressão: ou (as escalas) me fazem os favores que eu quero ou então não faço isto, e o tom jocoso com que afirma as escalas fizeram-me uma alteração e amanhã quando chegar ao OPO tenho de fazer o LGW!!! Devem pensar que o vou fazer, ahahah!.
Reapreciados os depoimentos das testemunhas M..., M... e M..., verifica-se que os mesmos não são coincidentes entre si, nomeadamente nas expressões usadas e no tom (jocoso ou chateado) com que as mesmas foram proferidas.
Além disso não podemos deixar de considerar os depoimentos de outras testemunhas ouvidas na audiência de julgamento que de certa forma explicam a atitude do Autor, nomeadamente a testemunha N..., Chefe de cabine do voo, que referiu que o Autor durante o voo, e ainda antes de saber da alteração da rotação, lhe pediu autorização para usar um casaco de malha, que havia passado mal a noite e tido febre, que já havia sofrido malária. Também a testemunha T..., Comissário de bordo na mesma rotação do Autor, referiu que o Autor se queixou do seu estado de saúde e que, chegado a Paris não quis passear, tendo ficado no hotel. Que a notícia da alteração da rotação lhe foi dada pelo Comandante de Voo, quando chegaram a Paris, e que no regresso ao Porto, o Autor continuou a revelar prostração, dizendo que quando chegasse ao Porto iria ao médico.
A testemunha M..., Assistente de Bordo, elemento de outra tripulação, referiu que se cruzou com o Autor no acesso ao avião, em Paris, e perguntou ao Autor .se- se sentia bem, ao que ele respondeu que havia passado mal a noite e que achava que não iria conseguir fazer a rotação Porto/Londres/Porto, revelando cansaço, após o que o Autor começou a falar com M....
É neste contexto que surge a conversa com a testemunha M..., que de facto é a única testemunha a referir que o Autor lhe havia dito que ou as escalas me fazem os favores ou meto baixa e que falou com ela de forma jocosa ou irónica.
A testemunha M... explica a indignação da M..., por esta entender que o Autor estava a dar uma baixa fraudulenta e, por isso, fez queixa dele.
Acontece que o Autor chegado ao Porto foi observado por médico dos serviços clínicos da Ré que lhe deu um dia de baixa, o que a Ré não contestou.
Assim, no contexto de todos os depoimentos prestados na audiência de julgamento, entendemos que o facto provado constante do n° 10, não merece qualquer reparo, não havendo fundamento para se concluir, como pretende a Apelante, que o Autor só deu baixa porque o serviço de escalas o nomeou para um serviço de voo (Porto/Londres/Porto) que ele não queria fazer.
Improcede por isso a impugnação deste facto feita pela Apelante.
Quanto ao facto provado constante do n.° 11.
Alega a Apelante que, com base no que a trabalhadora C... fez constar do relatório de ocorrência do dia 03.05.2014 (fls. 193 do autos), tal facto deveria ter a seguinte redacção:
Nesse mesmo dia (03 de Maio de 2014), pelas 17h35, o Autor contactou o serviço de Escalas que, como habitual, procedeu ao registo num RDO (relatório de ocorrências) elaborado por C...: Liga porque foi alterado fora da base para operar TP 334/331/04MAYARR TP 459 e diz que se sente cansado (veio da folga) porque dormiu mal e provavelmente amanhã terei febre .
Parece-nos que a factualidade constante do n° 11 traduz, no essencial, o que consta do referido relatório de ocorrência (fls. 193), embora integrado no contexto do que foi provado na audiência de julgamento, em que a testemunha N..., em Paris, ouviu o telefonema que o Autor fez para o serviço de escalas, atendido pela C..., a quem o A. referiu que tinha passado mal a noite e estava com arrepios de frio, se não havia possibilidade de alterar o seu planeamento, pois não podia executar esse serviço.
A nosso ver, não há elementos para se considerar provado, como pretende a Apelante, que o Autor sempre ligou a baixa ao facto de ter sido nomeado para fazer o serviço Porto-Londres-Porto que não queria fazer.
Mantem-se, pois, inalterado o que consta do n° 11 dos factos provados.
Pretende a Apelante se dê como provado o facto alegado no art. 12 da contestação, com a seguinte redacção:
No dia 04 de Maio de 2014, Domingo, pelas 05h00, o Autor voltou a contactar as escalas, e deste contacto resultou o seguinte RDO do serviço de Escalas, elaborado por Miguel Tereso: Info baixa à chegada TP459/DT.
Embora este facto conste do documento junto a fls. 194 dos autos, não vemos qualquer utilidade prática do mesmo face a qualquer uma das soluções de direito plausíveis, uma vez que já se sabe que o A. deu baixa após a chegada, servindo essa comunicação de aviso para atempadamente se poder reprogramar o serviço a que o A. iria faltar por se sentir doente.
Alega a Apelante que deve ser dado por provado um novo facto, de acordo com o alegado nos arts.° 37.° e 38.° da contestação, com a seguinte redacção: O Autor, no dia 04.05.2014, depois de ter dado baixa no Porto, saiu para almoçar.
Também não vemos qual seja a utilidade prática deste facto que se pretende ver provado para a decisão da causa. A este propósito não podemos deixar de referir o que a Ma Juiz refere na sentença: `para tal juízo irreleva, como é evidente, a circunstância do Autor ter sido visto, no hotel localizado no Porto, a vir do almoço com o Chefe de Cabine (pois que os doentes também comem), assim como o facto de o mesmo não ter chamado o médico em Paris (certamente por o seu estado de saúde não o impor) ou ter trabalhado no dia a seguir (certamente por se encontrar melhor).
A Apelante entende que deve ser dado por provado, tal como alegado nos arts.° 44.° e 45.° da contestação, um novo facto com a seguinte redacção: Na sequência do descrito em 15., as faltas a outros voos tiveram que ser supridas por outros tripulantes, designadamente pela Assistente de Bordo M..., que se voluntariaram para tal.
Ora, o que consta do ponto 15 é que P... estava de assistência mensal, tendo substituído o Autor no voo TP 334/331.
A falta do Autor foi substituída com recurso ao serviço de assistência previsto no n° 31 da cls. 4a do RUPT anexo ao AE TAP/SNPVAC, BTE n° 48 de 28.02.2006.
De resto, não ficamos convencidos de que a baixa do Autor no dia 4.05.2014, tivesse ocasionado faltas de tripulantes noutros voos que tivessem de ser supridas pela assistente de bordo M....
Improcede, pois, a alteração preconizada pela Apelante.
Finalmente alega a Apelante que o Facto Provado n.° 17 (O Autor sofreu de Malária), que deve ser eliminado, já que a qualificação e prova de que se sofre ou sofreu de determinada doença, deve ser feita por documento médico bastante, que não foi junto aos autos, e não por testemunhas (não médicas) que, para além do mais, só podem saber o que Recorrido lhes disse.
Ora bem, para além de efectivamente algumas testemunhas terem afirmado que o Autor lhes disse que sofria de malária, a Apelante não pode ignorar que o A. logo na resposta à nota de culpa referiu ter-lhe sido anteriormente diagnosticada Malária, após um voo com estadia e ACCRA, e que foi caracterizada, pelas autoridades competentes, como doença profissional, conforme documento que juntou e se encontra a fls. 154 dos autos, o qual a Apelante nunca impugnou.
Por isso, é de manter o que consta do n° 17 dos factos provados.
Improcede, na sua totalidade, a impugnação da matéria de facto. Quanto à adequação da sanção aplicada.
Alega a Apelante que a sanção disciplinar aplicada pela Recorrente ao Recorrido de 20 dias de suspensão com perda de vencimento, mostra-se válida, adequada e proporcional, pois em seu entender, apesar de ao Recorrido ter sido dada baixa médica por um dia, a razão pela qual não realizou os voos Porto-Londres-Porto para os quais havia sido validamente nomeado, foi por não querer realizá-los, como aliás anunciou antecipadamente.
A sentença recorrida, porém, face aos factos provados, concluiu pela ilicitude da sanção disciplinar aplicada ao Recorrido, com a consequente eliminação do registo da mesma do processo disciplinar e a restituição da quantia descontada no vencimento no total de 829,82, a que acrescem os juros de mora respectivos.
Face à improcedência da impugnação da matéria de facto, concordamos com a sentença recorrida, nomeadamente quando esta refere o seguinte:
Não se provou assim, como alega a Ré, que o Autor tenha dito a M... que ia dar baixa por forma a penalizar o serviço de escalas e, em concreto, por tais serviços não lhe fazerem os 'favores que desejava.
Concomitantemente, não se provou que o tenha feito acintosa e desrespeitosamente. Também' nãórse alegou nem concretizou na nota de culpa nem na decisão final tida no procedimento disciplinar quais os colegas do Autor que estavam no Porto e em Lisboa que se' viram obrigados à alteração do seu próprio planeamento para suprir a ausência do Arguido nem quais as `perturbações no normal funcionamento da actividddé onde se insere, com reflexos negativos na disciplina de trabalho . Provou-se apenas, e como dito, que o Autor anunciou de véspera uma baixa médica a uma colega, no caso, à colega M....
Ora, esta conduta em si mesma, em face do que a antecedeu e lhe sucedeu, nada tem de censurável.
Precedentemente porque, como também se provou, o Autor tinha, de facto, dormido mal na noite anterior e estava com arrepios de frio. Posteriormente, porque o Autor, chegado de Paris ao Porto, foi observado por médico dos serviços da Ré, que lhe deu baixa médica por um dia, atestando assim a sua falta de capacidade para o trabalho, o que aliás a Ré não pôs em causa.
Que o anúncio de baixas fraudulentas, ou seja, das que não tenham na sua génese um efetivo estado de falta de saúde para o trabalho, seja de censurar ética, disciplinar e criminalmente, não há dúvida.
Todavia, no caso em apreço, a Ré aceitou que a baixa médica do Autor se deveu a efetiva falta de condições para trabalhar.
Donde, em face da factualidade provada, só pode ter-se por diligente a conduta do Autor, que atempadamente avisou os serviços de que não iria comparecer ao serviço por estar doente, assim lhes permitindo que também com tempo colmatassem a sua ausência, contactando com quem tivessem que contactar.
Sem prejuízo do que antecede, sempre haveria que considerar a desproporcionalidade da medida da sanção encontrada pelo Empregador.
Ainda que se tivesse provado que o Autor havia produzido a afirmação imputada na nota de culpa/decisão de despedimento, o que como dito não sucedeu, tendo a Ré aceite que o Autor não estava efetivamente apto para o trabalho, não se vislumbra, com todo o respeito, como é que, atenta a antiguidade (7 anos) do Autor e a ausência de registo disciplinar, se instaura um procedimento disciplinar destinado à aplicação da sanção disciplinar máxima, ou seja, o despedimento sem justa causa. É certo que tal proposta foi posteriormente convolada numa suspensão de 20 dias com perda de retribuição e antiguidade.
Porém, e não descurando a gravidade da afirmação alegadamente produzida, em desproporção da sanção disciplinar aplicada às colegas I... e M..., por factos incomensuravelmente mais graves, mormente do ponto de vista do dano (cfr. decisões delis. 230-250, 251-267 e 271-333 dos autos).
Donde, objetiva e comparativamente, sempre teríamos que afirmar, feita que tivesse sido a prova daquele facto, a desproporcionalidade da sanção aplicada.
Assim, carece de razão a Apelante quando alega que a conduta do Recorrido foi violadora do princípio da boa-fé que deve presidir às relações laborais, assim como se afigura totalmente infundada a afirmação de que a necessidade de dar baixa médica só se verificou quando tomou conhecimento de que havia sido nomeado para os voos para Londres, pois, como ficou provado, o Autor sentiu-se mal na noite anterior, o que contudo não o impediu de regressar à base no Porto, onde foi visto por um médico dos serviços clínicos que colaboram com a Ré (EcoSalva), que lhe deu baixa por um dia, facto que a Apelante nunca impugnou.
Face a este dado objectivo, demonstrativo de que o Autor estava de facto impossibilidade de trabalhar nesse dia, não se vê razão para continuar a pretender sancionar disciplinarmente o Autor, pelo facto de não ter feito o voo Porto-Londres-Porto, resultante da alteração da rota que lhe havia sido anunciada no dia anterior, pois se o Autor não realizou esse voo foi por não poder e não por não querer.
Na verdade, ninguém escolhe quando adoece!
Acresce que o facto de o A. ter anunciado antecipadamente que iria faltar, não merece a crítica que a Apelante faz, pois o facto de o A. ter atempadamente avisado os serviços de que não iria comparecer ao serviço por estar doente, só pode ter-se por conduta diligente, pois permitia aos serviços que com tempo colmatassem a sua ausência. Por outro lado, não é de estranhar que o Autor soubesse antecipadamente que lhe iria ser dada baixa, uma vez que quem sofre de malária conhece os efeitos que essa doença produz no organismo e apercebe-se quando os sintomas reaparecem.
'As faltas ao serviço por motivo de doença consideram-se justificadas (art. 249 n° 2, al.d)doCT).
Em suma, o Apelado não violou os deveres constantes do art. 128.°, n.° 1, alínea a), b), f),e h), do Código do Trabalho, nem as alíneas a), b), g), i) e 1) da Cl.a 4.a do AE TAP/SNPVAC.
A decisão recorrida não merece qualquer reparo quer do ponto de vista factual, quer do ponto de vista da aplicação do direito, pelo que nos resta a sua confirmação.
DECISÃO:
Nos termos expostos acorda-se:
A) Julgar improcedente a impugnação da matéria de facto;
B) Julgar improcedente o recurso quanto à matéria de direito, confirmando-se integralmente a sentença recorrida.
C) Custas do recurso a cargo da Apelante.

Lisboa, 25 de Janeiro de 2017
Claudino Seara Paixão
José Feteira

Sumário:
Tendo o trabalhador faltado ao serviço por um dia, por motivo de doença comprovada por declaração médica, não se justifica a sanção disciplinar de 20 dias de suspensão com perda de vencimento que a Ré aplicou ao Autor.