Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 25-01-2017   Falta de gravação da audiência final. Nulidade secundária. Prazo para arguição.
I - A falta ou deficiência da gravação da prova produzida em Audiência Final constitui uma nulidade processual secundária que tem de ser arguida no prazo de 10 dias, no tribunal recorrido, podendo ser depois impugnado o despacho que indeferir a mesma, por intermédio de recurso de Apelação, a interpor depois do recurso deduzido contra a sentença final, caso o referido despacho tenha sido prolatado após esse sentença.
II - A relação que existe entre os art.°s 68.° do C.P.T. e 155.° do NCPC é a de um regime especial (o primeiro) para com um regime geral ou comum (o segundo), não tendo este último a virtualidade de revogar o que de particular ou específico aquele consagra para além ou contra a sua própria letra, alcance e sentido, não se podendo, por exemplo, procurar estender a todo e a qualquer processo laboral onde, por força do regime do artigo 155.° do NCPC, se deve fazer a gravação de todos os atos praticados nas Audiências Finais a possibilidade das partes recorrerem da Decisão sobre a Matéria de Facto que aí for proferida, dado que os limites de cariz quantitativo e qualitativo para o registo da prova para efeitos de tal recurso são os definidos especialmente pelo artigo 68.°, números 1 a 3, do CPT.
III - Muito embora a não gravação das alegações orais dos advogados das partes se configure como uma irregularidade processual, a mesma não tem a virtualidade de influir no exame ou na decisão da causa, não implicando assim a nulidade da Audiência Final.
IV - O artigo 392.°, por referência também ao disposto na al. c) do art.° 387.°, ambos do Código do Trabalho de 2003 regulam uma situação muito específica e concreta: a da existência de uma relação laboral fundada num contrato de trabalho por tempo indeterminado que, apesar da reforma
Proc. 32075/15.2T8LSB 4ª Secção
Desembargadores:  José Eduardo Sapateiro - Maria José Costa Pinto - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
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TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
RECURSO DE APELAÇÃO N.° 32075/15.2T8LSB.L1 (4.a Secção)
ACORDAM NESTE TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA:
I - RELATÓRIO
J..., casado, docente universitário, contribuinte fiscal n.° 128 090 111, residente na Rua Carlos Oliveira, n.° 4 - 6.° Direito, 1600-029 Lisboa, veio instaurar, em 20/11/2015, a presente ação declarativa de condenação com processo comum laboral contra E..., SA, pessoa coletiva n.° 502 948 477, com sede na A..., 2745-615 B..., pedindo, em síntese, que se declare a ilicitude do despedimento e, consequentemente, se condene a Ré a pagar-lhe o valor das retribuições vencidas desde o despedimento até à sentença, uma indemnização de antiguidade correspondente a 30 dias de remuneração por cada ano completo ou fração de antiguidade e € 3.000,00 a título de indemnização por danos morais, tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, até integral e efetivo
pagamento.

Alega o Autor, para tanto e muito em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré no dia 01/10/2007 para, sob a sua autoridade, direção e fiscalização, exercer funções docentes na Universidade Atlântica, mediante o pagamento último de € 1.421,65, e ainda que, por carta datada de 28/07/2015, a Ré lhe comunicou que não contaria com o seu trabalho para o ano letivo seguinte, em consequência do que deixou de prestar funções a partir de 30/09/2015, o que lhe provocou irritação, ansiedade, revolta, abatimento e tristeza, pois que teve que recorrer a familiares e amigos para fazer face às despesas correntes e compromissos assumidos.

Designada data para audiência de partes (fls. 23), que se realizou, nos termos do artigo 54.° do Código do Processo do Trabalho, com a presença das partes (fls. 84 e 85) - tendo a Ré sido citada para o efeito a fls. 26 e 83, por carta registada com Aviso de Recepção
- não foi possível a conciliação entre as mesmas.

A Ré apresentou, a fls. 86 e seguintes, contestação, onde, muito em síntese, alegou que o Autor, quando iniciou funções, já estava reformado, do que tomou
conhecimento apenas em 28/10/2008.

O Autor, a fls. 106 e seguintes, impugnou os documentos juntos pela Ré com a
sua contestação.

A Ré veio a fls. 112 e 114 apresentar um segundo articulado que foi mandado
desentranhar pelo despacho judicial de fls. 115 e 116.

Foi proferido, a fls. 115 e seguintes e em 01/03/2016, despacho saneador,
onde foi mandado desentranhar o articulado da Ré, fixado o valor da ação - € 44.136,26 -, assim como o objeto do litígio, dispensada a enunciação dos temas da prova, deferida a gravação da prova a efetuar em Audiência Final, admitidos os róis de testemunhas das partes (fls. 9 e 86), indeferidas e deferidas algumas diligências de prova, assim como ordenadas outras, tendo sido mantida a data designada para a realização da Audiência de Discussão e Julgamento.
O Autor, na sequência da sua notificação para esse efeito, veio, a fls. 133, informar nos autos que desde o despedimento até 11/3/2016 (data do requerimento apresentado) não auferiu quaisquer rendimentos, para além da pensão que já recebia antes e mantém.
Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento, com observância das legais formalidades, conforme melhor resulta da respetiva ata (fls. 162 a 166), tendo o depoimento de parte do Autor e a prova testemunhal aí produzida sido alvo de registo-áudio.
O tribunal da 1.a instância proferiu, em 28/4/2016, a Decisão sobre a Matéria de Facto que consta de fls. 167 a 170, que não foi objeto de reclamação, dado nenhuma das partes se encontrar presente na sua leitura (fls. 171).

Foi então proferida a fls. 172 e seguintes e com data de 09/06/2016, sentença que, em síntese, decidiu o litígio nos termos seguintes:
Pelo exposto, o Tribunal julga a ação parcialmente procedente e, em consequência, decide:
1. Declarar ilícito o despedimento de «J...».
2. Condenar «EIA - E..., SA» a pagar a «J...» o valor correspondente às retribuições deixadas de auferir desde 20/ 10/2015 (pelo valor mensal de € 1.421,65, inclusive retribuição de férias e subsídios de férias e natal) até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzidos os demais montantes a que alude o n.° 2 do artigo 390.° do Código do Trabalho e as quantias obrigatoriamente devidas ao Fisco e à Segurança Social, acrescida da quantia devida por conta dos juros de mora, à taxa de 4/prct. ao ano, desde o vencimento de cada uma das prestações em dívida até integral e efetivo pagamento.
3. Condenar «EIA - E..., SA.» a pagar a «J...» a indemnização de antiguidade correspondente a 30 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade a apurar, por meio de cálculo aritmético, desde 01/ 10/2007 até ao trânsito em julgado da presente decisão, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento.
4. Absolver «EIA - E..., SA.» do demais peticionado por «J...».
5. Condenar «J...» e «EIA - ENSINO,INVESTIGAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO, SA.» a pagarem as custas judiciais, na proporção do decaimento.
DN: registo em livro autónomo, imediata notificação e baixa.

A Ré E..., SA pediu, a fls. 194 a 196 e em 24/6/2016, cópia da gravação da Audiência Final, que, segundo nota aposta a lápis no rosto do dito requerimento, foi entregue a 27/6/2016, tendo a Ré vindo apresentar o requerimento de fls. 197 a 199, em 29/06/2016, com o seguinte teor:
«1.° - A signatária requereu cópia da gravação da audiência de discussão de julgamento, tendo o respetivo suporte digital sido-lhe disponibilizado no dia 27 de Junho. Sucede que,
2.° - No CD que lhe foi disponibilizado não constam as alegações dos mandatários, o que contraria o disposto no art.° 155.° do NCPC, aplicável ao processo sub judice. Por seu turno,
3.° - A falta de gravação, como parece ser o caso dos presentes autos, deve ser invocada no prazo de dez dias, o que se faz neste momento,
1 Tal sentença foi notificada às partes por ofícios datados de 17/6/2016 (advogados) e de 20/6/2016 (Autor e Ré) - cfr. fls. 189 a 192.
4.° - Desde logo porquanto as alegações são de facto e de direito, sendo que, a confirmar-se a sua inexistência, devem as mesmas ser repetidas e, desta feita, gravadas, com as consequências legais,
designadamente determinando-se a nulidade da sentença.»
A Ré E..., SA, inconformada com tal sentença, veio, a fls. 218 e seguintes, arguir a nulidade e interpor recurso da mesma, que foi admitido a fls. 268 e 269 dos autos, como de Apelação, a subir
imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
O Tribunal do Trabalho de Lisboa, nesse mesmo despacho prolatado em 24/ 10/2016 e constante de fls. 268 e 269, pronunciou-se acerca das nulidades arguidas pela recorrente, nos seguintes moldes:
«Requerimento de fls. 198
A fls. 298 a ré invoca a nulidade da sentença uma vez que as alegações orais proferidas em audiência de julgamento não foram gravadas, em conformidade com o disposto no art.° 155° do Código de Processo Civil.
Nos termos do art.° 195.° do Código de Processo Civil, a prática de atos que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame ou decisão da causa.
O art.° 155.°, n.° 1 do Código de Processo Civil (que, no nosso entender, também se aplica em sede de processo laboral, apesar do disposto no art.° 68.° do Código de Processo Trabalho) determina que a gravação da audiência inclua também as alegações orais produzidas.
Todavia não comina com o vício da nulidade a omissão de tal gravação.
Assim sendo, estamos perante uma mera irregularidade que, nos termos do citado art.° 195.°, n.° 1, só produz nulidade se puder influir no exame ou decisão da causa.
A ré não invoca a razão por que se poderia verificar tal influência na decisão da causa. E não se vislumbra que tal efetivamente possa suceder.
Com efeito, ao invés do que sucede no caso de falta de gravação da prova, que efetivamente impede uma posterior reapreciação, em sede de recurso, sobre a prova e, desse modo, influir indubitavelmente no exame ou decisão da causa, a falta de gravação das alegações orais, ainda que de facto e de direito, não tem influência no exame ou decisão da causa, quer no julgador da primeira instância, que necessariamente escutou as ditas alegações, quer na apreciação a efetuar em sede de recurso, uma vez que as partes, na instância recursiva, proferem alegações escritas, onde podem consignar todas as matérias tidas por relevantes e, sendo caso disso, insistirem em argumentos utilizados nas alegações orais em sede de audiência.
Assim sendo, e também porque não estamos perante um caso de nulidade da sentença, nos termos previstos no art.° 615.° do Código de Processo Civil, indefere-se o pedido de declaração de nulidade da sentença.
Notifique.
(...)
Venerandos Juízes Desembargadores
Salvo o devido respeito por opinião contrária, não se vislumbra que a sentença padeça das nulidades invocadas, pelo que se entende nada haver a suprir (art.° 77.° n.° 3, parte final, a contrario do Código de Processo do Trabalho).»
Vossas Excelências, porém, com mais elevado critério, farão a habitual Justiça.
Notifique e, após, subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, com as
cautelas habituais.»
A Ré não reagiu, por via recursória, a tal despacho judicial onde lhe foi indeferida a arguida nulidade da sentença, traduzida na omissão da gravação das alegações orais, que, de âmbito misto (facto e direito) foram proferidas no final da
Audiência Final.

A Apelante apresentou, a fls. 220 e seguintes, alegações de recurso e formulou as seguintes conclusões:
II - DA NULIDADE DA SENTENÇA
1.°- A sentença é omissa quanto a dois factos, cuja apreciação foi colocada ao tribunal, maxime a idade concreta do Autor, a qual, depois, é referenciada em sede de decisão de direito e os montantes da pensão do Autor,
2.°- Factos, longe de serem irrelevantes, assumem manifesta importância para a boa decisão da causa, sendo que a sua omissão consubstancia causa de nulidade da sentença, de acordo com o estatuído na al. d) do n.° 1 do art.° 615.° do NCPC, ora expressamente invocada.
3.°- A gravação que foi disponibilizada à signatária não contém as alegações, sendo que nos termos do disposto no art.° 155.° do NCPC tal constitui causa de nulidade da sentença, devendo ser ordenada a repetição da respetiva produção.
4.°- Deveria ter sido julgado provado que o Autor só deu conhecimento à Ré de que era reformado em Outubro de 2008. Por outro lado,
5.0- Deve ser aditado aos factos julgados provados que o Autor recebe uma pensão de reforma, a qual era de € € 3960,72 até Dezembro de 2015 e passou a ser de € 4035,21 a partir de Janeiro de 2016. Acresce que,
6.°- Deve ser aditada à matéria julgada provada que o Autor nasceu em 16 de Agosto de 1946, fazendo, portanto, 70 anos no dia 16 de Agosto do corrente ano. Independentemente de tal,
7.°- Do que se interpreta na douta sentença, um dos pressupostos para a decisão de direito do caso ora em apreço prende-se com o facto de a Ré não ter anunciado que a cessação se devia ao facto de o Autor já estar reformado, invocando-se igualmente que não se provou que o Autor se tivesse aposentado por velhice, mais se alegando que o mesmo à data da dita aposentação tinha, apenas, 56 anos. Mas,
8.°- Desde logo no que se reporta à invocação de que se desconhece se o Autor foi reformado por velhice ou por invalidez, ressalvado o devido respeito, atento o disposto na alínea c) do art.° 343.° do CT, a mesma é irrelevante, aplicando-se ao caso vertente o n.° 2 do art.° 348.° do CT, uma vez que a Ré só teve conhecimento posterior da situação do Autor. Mas,
9.0- Ainda que assim não fosse, isto é, para o caso de se vir a entender que o que releva não é a data do conhecimento pela Ré mas a data da reforma, ainda assim tal normativo se deve aplicar, pelo que o contrato deste ou se converteu ou foi celebrado ab initio a termo, sendo que a caducidade não determina o pagamento de qualquer compensação. Sem nada conceder,
10.°- O que é certo é que o Autor fará 70 anos em Agosto de 2016 e, tendo-se presente que o trânsito em julgado ocorrerá depois desta data, a sentença terá de ser revogada e substituída por outra que declare a caducidade do dito vínculo, atento o facto de terem passado seis meses sobre os 70 anos do Autor.
11.0- Apenas para o caso de se vir a concluir que a sentença ora posta em crise não padece do erro de aplicação do direito supra invocado, então sempre se dirá que o montante atribuído a título de indemnização é manifestamente excessivo e desproporcional à situação em apreço, antes devendo ser fixado em 15 dias por cada ano de antiguidade. Por último,
12.°- Ressalvado o devido respeito, só no momento em que o tribunal fixou o montante da compensação, isto é, na sentença, é que podem ser computados os correspondentes juros de mora e, não, como se decidiu, a partir da citação.
Termos em que deve a douta sentença ser revogada, com o que V. Exas farão a ACOSTUMADA JUSTIÇA!

O Autor apresentou contra-alegações dentro do prazo legal, na sequência da respetiva notificação, onde formulou as seguintes conclusões (fls. 248 e seguintes):
1. O art.° 24.° da Contestação não contém qualquer facto, pelo que não se verifica qualquer omissão da Douta Sentença quanto a esta matéria, sendo completamente irrelevante a data de nascimento do Autor;
2. Na data do despedimento - 30 de setembro de 2015 - o Autor ainda não havia completado 70 anos de idade, nem mesmo na data em que foi proferida a Douta Sentença - 09 de junho de 2016 - sendo totalmente irrelevante o facto de o trabalhador, entretanto despedido, perfazer os 70 anos em agosto de 2016;
3. Não se tratando de rendimentos que o Autor aufere em virtude do despedimento, o montante da sua pensão de reforma não tem que ser deduzido nos salários intercalares, sendo irrelevante para a boa decisão da causa o montante da pensão do Autor e não consubstanciando a sua falta qualquer nulidade;
4. Existindo regulamentação específica para o processo laboral, in casu, o artigo 68.° do CPT, não se aplicará, ainda que subsidiariamente, o regime geral do CPC e consequentemente, as alegações não têm de ser gravadas, nem a falta de gravação das mesmas consubstancia qualquer tipo de nulidade;
5. Se era importante para a Ré, no momento da contratação do Autor, saber se este era aposentado ou não, era a ela que lhe competia indagar tal situação.
6. A nova entidade patronal, aqui Recorrente, não pode prevalecer-se do conhecimento posterior à contratação da situação de reformado do trabalhador, preexistente à sua admissão, para invocar a caducidade do contrato com fundamento no art.° 348.° do C.T.;
7. Quando em outubro de 2007 o Autor foi contratado pela Ré já estava aposentado desde 2002.
8. O disposto no artigo 348.° do C.T. aplica-se a trabalhadores que permanecem ao serviço da mesma entidade patronal aquando da reforma e não em relação a trabalhadores já reformados à data da contratação, o que é o caso, nada impedindo a contratação destes trabalhadores sem termo e ficando o respetivo vínculo sujeito aos princípios gerais da contratação, designadamente no caso da contratação a termo ao motivo justificativo do termo e à forma escrita.
9. Vigorando entre as partes um contrato de trabalho por tempo indeterminado, a comunicação da Ré a que alude o ponto 6. da matéria de facto provada configura um despedimento, que é ilícito por não ter sido precedido de processo disciplinar;
10. Em relação à idade do Autor, tendo o mesmo sido despedido sem justa em causa, como foi, por carta datada de 28 de julho de 2015 com efeitos a 30 de setembro de 2015 e sendo a Douta Sentença de 09 de junho de 2016, tendo o Autor feito os 70 anos em Agosto de 2016, tal facto não é relevante para a boa decisão da causa;
11. É justa e proporcional a indemnização com base em 30 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, atenta a duração da relação entre Autor e Ré, o grau de ilicitude da cessação que é significativo e o facto de, independentemente do valor da pensão do Autor, este ter assumido compromissos tendo em conta também o valor do seu vencimento mensal na Ré e, uma vez despedido, ter que pedir ajuda a familiares e amigos.
12. Os juros de mora são devidos desde a citação, ato através do qual a Ré é interpelada judicialmente para cumprir, até integral pagamento.
Resolvendo no sentido da total improcedência do recurso, só assim se decidirá de acordo com a Lei e Vossas Excelências farão inteira JUSTIÇA!

O ilustre magistrado do Ministério Público deu parecer no sentido da improcedência do recurso de Apelação (fls. 280 e 281), não tendo as partes se pronunciado acerca do seu teor dentro do prazo de 10 dias, apesar de notificadas
para o efeito.

Tendo os autos ido a vistos, cumpre apreciar e decidir.
II - OS FACTOS
Foram considerados provados os seguintes factos pelo tribunal da 1.a instância:
«1. A Ré é titular de um estabelecimento de ensino superior denominado Universidade Atlântica.
2. No dia 01/10/2007 a Ré celebrou com o Autor um denominado Contrato de Prestação de Serviços de Funções Docentes, para o exercício das funções de docente do Ensino Superior, com a categoria de Professor Auxiliar, conforme escrito de fls. 12-14 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
3. No dia 01/12/2014, a Ré comunicou ao Autor que: (...) a E..., S.A., na sequência de diversos contactos recentemente mantidos com a ACT, reconhece expressamente manter com V. Exa. um contrato de trabalho, com
antiguidade reportada a 1 de outubro de 2007., cfr. doc. de fls. 15 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
4. O Autor manteve-se ininterruptamente ao serviço da Ré de 01/10/2007 a 30/09/2015.
5. O Autor auferia a remuneração mensal de € 1.421,65.
6. Por carta registada, datada de 28/07/2015, a Ré comunicou ao Autor que:
(...) Atendendo ao Decreto-Lei n.° 115/2013, de 7 de Agosto, ao Decreto-Lei n.° 205/2009, de 31 de Agosto, ao Decreto- Lei n.° 8/2010, de 13 de Maio, e ainda as informações obtidas junto dos organismos da tutela, a partir do ano letivo de 2015/2016 as exigências no ensino superior, nomeadamente para carreira docente, serão muito maiores.
Como é já do V. conhecimento, destaca-se desta legislação e das revisões das carreiras docentes universitária e politécnica, operadas pelos referidos decretos-lei, que o doutoramento ou o grau de especialista, conforme os subsistemas, é o grau de entrada na carreira, ocorrendo a abolição das categorias de assistente e assistente estagiário.
As exigências vão para além dos graus académicos e incluem a necessidade das publicações em revistas com fator de impacto, por exemplo.
Os órgãos sociais e cargos diretivos da EIA e a Reitoria da New Atlântica procurarão aumentar substancialmente as exigências relativas à qualificação académica do corpo docente da Universidade, tendo em consideração a estratégia desenhada mas também a legislação em vigor e os requisitos da A3ES (Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino superior).
Porém, estamos conscientes da questão demográfica, da conjuntura económico-social, das políticas e do objetivo das instituições governativas no que diz respeito ao ensino superior, demasiado evidentes. E é nesta conformidade que lamentamos informar que não estamos a contar consigo para a docência no próximo ano letivo. (...), cfr. Doc. 3 já junto e dado por reproduzido para
todos os efeitos legais., cfr. doc. de fls. 16-17 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
7. Em consequência do descrito em 6., o Autor sentiu ansiedade, irritação e tristeza.
8. Também teve necessidade de recorrer a terceiros para fazer face às suas despesas mensais.
9. No dia 20/08/2015, o Autor remeteu a carta de fls. 97 dos autos à Ré, cujo teor se reproduz na íntegra.
10. No dia 02/10/2015, o Autor remeteu à Ré a carta de fls. 98 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra, por ela recebida a 05/10/2015.
11. A Ré respondeu ao Autor por carta datada de 20/10/2015, que este último rececionou, com o teor de fls. 99 dos autos, cujo teor se reproduz na íntegra.
12. O Autor está aposentado desde 01/12/2002.
13. A Ré fez descontos para a segurança social tendo em conta a aposentação do Autor apenas a partir de 11/2008.
14. O Autor nasceu no dia 16/08/ 1946 (Doc. de fls. 121);
15. O Autor, em outubro de 2015, recebia a título de pensão de reforma o valor mensal de € 3.960,72, que, a partir de janeiro de 2016, passou a ser no montante mensal de € 4.035,21 (Informação da CGP de fls. 159/187).
16. Os serviços administrativos da Ré só tiveram conhecimento, documentalmente comprovado, da situação de aposentado do Autor em Outubro do ano de 2008.
NOTA: O Tribunal da Relação de Lisboa aditou já à Factualidade dada como Provada os novos Pontos de Facto resultantes do julgamento que fez da impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto que foi deduzida pela Ré Apelante (Pontos 14. a
16. assinalados a negrito).

III - OS FACTOS E O DIREITO
É pelas conclusões do recurso que se delimita o seu âmbito de cognição, nos termos do disposto nos artigos 87.° do Código do Processo do Trabalho e 639.° e 635.° n.° 4, ambos do Novo Código de Processo Civil, salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608.° n.° 2 do NCPC).

A - REGIME ADJECTIVO E SUBSTANTIVO APLICÁVEIS
Importa, antes de mais, definir o regime processual aplicável aos presentes autos, atendendo à circunstância da presente ação ter dado efetiva entrada em tribunal em 20/11/2015, ou seja, depois da entrada em vigor das alterações introduzidas no Código do Processo do Trabalho pelo Decreto-Lei n.° 295/2009, de 13/10, que segundo o seu artigo 6.°, só se aplicam às acções que se iniciem após a sua entrada em vigor, tendo tal acontecido, de acordo com o artigo 9.° do mesmo diploma legal, somente em 1/01/2010.
Esta ação, para efeitos de aplicação supletiva do regime adjetivo comum, foi instaurada depois da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, que ocorreu no dia 1/9/2013.
Será, portanto e essencialmente, com os regimes legais decorrentes da atual redação do Código do Processo do Trabalho e do Novo Código de Processo Civil como pano de fundo adjetivo, que iremos apreciar as diversas questões suscitadas neste recurso de Apelação.
Também se irá considerar, em termos de custas devidas no processo, o Regulamento das Custas Processuais - aprovado pelo Decreto-Lei n.° 34/2008, de 26/02, retificado pela Declaração de Retificação n.° 22/2008, de 24 de Abril e alterado pelas Lei n.° 43/2008, de 27-08, Decreto-Lei n.° 181/2008, de 28-08, Lei n.° 64-A/2008, de 31-12, Lei n.° 3-B/2010, de 28 de Abril, Decreto-Lei n.° 52/2011, de 13 de Abril com início de vigência a 13 de Maio de 2011, Lei n.° 7/2012, de 13 Fevereiro, retificada pela Declaração de Retificação n.° 16/2012, de 26 de Março, Lei n.° 66-B/2012, de 31 de Dezembro, com início de vigência a 1 de Janeiro de 2013, Decreto-Lei n.° 126/2013, de 30 de Agosto, com início de vigência a 1 de Setembro de 2013 e Lei n.° 72/2014, de 2 de Setembro, com início de vigência a 2 de Outubro de 2014 -, que entrou em vigor no dia 20 de Abril de 2009 e se aplica a processos instaurados após essa data.
Importa, finalmente, atentar na circunstância dos factos que se discutem no quadro destes autos terem ocorrido na vigência sucessiva da LCT e legislação complementar, do Código do Trabalho de 2003 e do Código do Trabalho de 2009, (que entrou em vigor em 17/02/2009)[2], sendo, portanto, os regimes decorrentes de tais diplomas que aqui irão ser chamados à colação, em função dos factos que estiverem a ser considerados, tudo sem prejuízo das normas de direito transitório e de sucessão de leis que forem aplicáveis, bem como da legislação referente aos estatutos da aposentação e da reforma dos trabalhadores.
B - NULIDADE DA GRAVAÇÃO DA AUDIÊNCIA FINAL
Existe aqui uma questão prévia que a Ré suscita nos autos e depois nas suas alegações de recurso que importa analisar e decidir à. cabeça das demais problemáticas de índole fáctica e jurídica que são levantadas igualmente na Apelação e que se prende com a referida nulidade do registo-áudio da Audiência de Discussão e Julgamento.
B1- ARGUMENTAÇÃO JURÍDICA DA APELANTE
O Autor vem, com efeito e em sede de arguição de nulidades de sentença, a propósito da deficiente gravação da Audiência Final (omissão das alegações orais dos ilustres advogados das partes), alegar o seguinte:
«Por outro lado ainda,
De acordo com o previsto no art.° 155.° do NCPC, igualmente aplicável aos presentes autos, a audiência de discussão e julgamento é gravada, incluindo-se aqui as alegações orais (n.° 1 do citado preceito legal, parte final).
Sucede que,
Conforme requerimento oportunamente apresentado, a gravação que foi disponibilizada à signatária não contém as alegações que, no caso do foro laboral, assume particular importância, já que as mesmas são de facto e de direito.
Sucede que,
À data da apresentação das competentes alegações, não tinha ainda sido proferido despacho sobre o requerimento da Ré, que solicitou, caso se confirmasse a falta de gravação, a anulação da douta sentença e a repetição das alegações.
Consequentemente, por mera cautela de patrocínio, invoca-se igualmente a nulidade da sentença com este mesmo fundamento.»
Também em fase de conclusões do recurso de Apelação vem o trabalhador refletir tal irregularidade processual, que qualifica também de nulidade de sentença, nos seguintes moldes:
«3.°- A gravação que foi disponibilizada à signatária não contém as alegações, sendo que nos termos do disposto no art.° 155.° do NCPC tal constitui causa de nulidade da sentença, devendo ser ordenada a repetição da respetiva produção.»
B2 - FACTOS COM RELEVÂNCIA PARA A ANÁLISE DA QUESTÃO
Importa recordar, nesta matéria, o que se deixou dito no Relatório do presente Aresto, com relevo para apreciação e julgamento da mesma:
«A Ré E..., SA pediu, a fls. 194 a 196 e em 24/6/2016, cópia da gravação da Audiência Final, que, segundo nota aposta a lápis no rosto do dito requerimento, foi entregue a 27/6/2016, tendo a Ré vindo apresentar o requerimento de fls. 197 a 199, em 29/06/2016, com o seguinte teor:
«1.° - A signatária requereu cópia da gravação da audiência de discussão de julgamento, tendo o respetivo suporte digital sido-lhe disponibilizado no dia 27 de Junho. Sucede que,
2.° - No CD que lhe foi disponibilizado não constam as alegações dos mandatários, o que contraria o disposto no art.° 155.° do NCPC, aplicável ao processo sub judice. Por seu turno,
3.° - A falta de gravação, como parece ser o caso dos presentes autos, deve ser invocada no prazo de dez dias, o que se faz neste momento,
4.° - Desde logo porquanto as alegações são de facto e de direito, sendo que, a confirmar-se a sua inexistência, devem as mesmas ser repetidas e, desta feita, gravadas, com as consequências legais, designadamente determinando-se a nulidade da sentença.»
(...)
O Tribunal do Trabalho de Lisboa, nesse mesmo despacho prolatado em 24/ 10/2016 e constante de fls. 268 e 269, pronunciou-se acerca das nulidades arguidas pela recorrente, nos seguintes moldes:
«Requerimento de fls. 198
A fls. 298 a ré invoca a nulidade da sentença uma vez que as alegações orais proferidas em audiência de julgamento não foram gravadas, em conformidade com o disposto no art.° 155° do Código de Processo Civil.
Nos termos do art.° 195.° do Código de Processo Civil, a prática de atos que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade possa influir no exame ou decisão da causa.
O art.° 155.°, n.° 1 do Código de Processo Civil (que, no nosso entender, também se aplica em sede de processo laboral, apesar do disposto no art.° 68.° do Código de Processo Trabalho) determina que a gravação da audiência inclua também as alegações orais produzidas.
Todavia não comina com o vício da nulidade a omissão de tal gravação.
Assim sendo, estamos perante uma mera irregularidade que, nos termos do citado art.° 195.°, n.° 1, só produz nulidade se puder influir no exame ou decisão da causa.
A ré não invoca a razão por que se poderia verificar tal influência na decisão da causa. E não se vislumbra que tal efetivamente possa suceder.
Com efeito, ao invés do que sucede no caso de falta de gravação da prova, que efetivamente impede uma posterior reapreciação, em sede de recurso, sobre a prova e, desse modo, influir indubitavelmente no exame ou decisão da causa, a falta de gravação das alegações orais, ainda que de facto e de direito, não tem influência no exame ou decisão da causa, quer no julgador da primeira instância, que necessariamente escutou as ditas alegações, quer na apreciação a efetuar em sede de recurso, uma vez que as partes, na instância recursiva, proferem alegações escritas, onde podem consignar todas as matérias tidas por relevantes e, sendo caso disso, insistirem em argumentos utilizados nas alegações orais em sede de audiência.
Assim sendo, e também porque não estamos perante um caso de nulidade da sentença, nos termos previstos no art.° 615.° do Código de Processo Civil, indefere-se o pedido de declaração de nulidade da sentença.
Notifique.
(...)
Venerandos Juízes Desembargadores
Salvo o devido respeito por opinião contrária, não se vislumbra que a sentença padeça das nulidades invocadas, pelo que se entende nada haver a suprir (art.° 77.° n.° 3, parte final, a contrario do Código de Processo do Trabalho).
»Vossas Excelências, porém, com mais elevado critério, farão a habitual Justiça.
Notifique e, após, subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, com as
cautelas habituais.»
A Ré não reagiu, por via recursória, a tal despacho judicial onde lhe foi indeferida a arguida nulidade da sentença, traduzida na omissão da gravação das alegações orais, que, de âmbito misto (facto e direito) foram proferidas no final da Audiência Final.» (FIM DA REPRODUÇÃO)
Impõe-se referir que este Tribunal da Relação de Lisboa já ouviu integralmente a gravação da Audiência Final e constata, efetivamente, que as alegações orais produzidas pelos ilustres causídicos não se mostram aí registadas.
B3 - NATUREZA JURÍDICA DA NULIDADE EM APREÇO
Ora, afigura-se-nos que, desde logo por motivos de cariz adjetivo (e independentemente da discussão em torno da obrigatoriedade jurídica da gravação de todas as audiências finais e prévias realizadas no âmbito do processo laboral), esta nulidade nunca poderá ser apreciada por este tribunal da 2.a instância, como iremos passar a explicar.
Antes do novo regime processual comum que entrou em vigor, em 1/9/2013, debatia-se muito na nossa jurisprudência e doutrina o tipo de nulidade a que devia ser reconduzida a deficiência ou falta da gravação da prova, quando legalmente obrigatória, bem como o prazo e meio processual em que poderia ser invocada, tendo o NCPC vindo, no número 4 do art.° 155.°, consagrar a seguinte norma: «A
falta ou deficiência da gravação deve ser invocada, no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada».
ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES [3], defende o seguinte, a respeito de tal norma: «Tratando-se de uma nulidade processual, terá de ser arguida autonomamente, sendo submetida a posterior decisão do juiz a quo, não sendo admitida a sua inserção imediata nas alegações de recurso».
Logo, tal falta ou deficiência constitui uma nulidade processual secundária que tem de ser arguida no prazo de 10 dias, no tribunal recorrido, podendo ser depois interposto recurso do despacho que indeferir a mesma (no caso de deferimento, será a parte contrária que poderá impugnar o mesmo).
Sempre sustentámos tal posição[4], mesmo ao abrigo do regime anterior, o que implicaria que a Ré, quando confrontada com o despacho de 24/10/2016, em que
viu indeferida a referida nulidade, deveria ter reagido oportuna e dentro do prazo de 10 dias, por intermédio de um segundo recurso de Apelação, interposto depois do recurso deduzido contra a sentença final, como aliás, consente expressamente o número 2, alínea g) do artigo 79.°-A, sendo o prazo mais reduzido que deixámos referido previsto no número 2 do artigo 80.°, ambos do CPT.
B4 - ARTIGO 68.° DO CÓDIGO DE PROCESSO DO TRABALHO E ARTIGO 155.° DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Para quem não aceite a posição deixada exposta, entendendo que a Ré, por antecipação e no quadro das nulidades de sentença invocadas na presente Apelação e ainda nas alegações e conclusões da mesma, veio levantar atempada e corretamente a temática que aqui nos ocupa, iremos avançar um pouco mais na nossa análise, por referência aos argumentos utilizados pelas partes.
Impõe-se realçar, desde logo, que o aqui Apelante requereu, ao abrigo do número 2 do artigo 68.° do Código de Processo do Trabalho, o registo áudio da prova produzida em Audiência de Discussão e Julgamento, o que foi judicialmente deferido e concretizado no decurso de tal diligência, que ocupou apenas uma sessão.
O recorrente vem chamar à colação o disposto no artigo 155.° do Novo Código do Processo Civil, que determina a obrigação de se proceder à gravação integral das audiências finais (sendo que o número 4 do artigo 591.° do NCPC estende tal dever às Audiências Prévias, quando tal for tecnicamente possível), entendendo que tal gravação, no que toca ao caso dos autos, é irregular e nula, por não ter abrangido o registo das alegações proferidas pelos mandatários do Autor e da Ré.
As disposições que interessa considerar na análise jurídica que iremos fazer de imediato são os já mencionados artigos 68.° do C.P.T. e 155.° do NCPC possuindo tais disposições legais a seguinte redação:
SECÇÃO V
Discussão e julgamento da causa
Artigo 68.°
Instrução, discussão e julgamento da causa
1 - A instrução, discussão e julgamento da causa incumbem ao tribunal singular, sem prejuízo do disposto no n.° 3.
2 - Quando a decisão admita recurso ordinário, pode qualquer das partes requerer a gravação da audiência ou o tribunal determiná-la oficiosamente.
3 - A instrução, a discussão e o julgamento da causa incumbem ao tribunal coletivo nas causas de valor superior à alçada da Relação desde que ambas as partes o requeiram e nenhuma tenha requerido a gravação da audiência.
4 - A gravação da audiência ou a intervenção do tribunal coletivo devem ser requeridas na audiência preliminar, se a esta houver lugar, ou até 20 dias antes da data fixada para a audiência de julgamento.
5 - A matéria de facto é decidida imediatamente por despacho, ou por acórdão, se o julgamento tiver decorrido perante tribunal coletivo.

Artigo 155.°
Gravação da audiência final e documentação dos demais atos presididos pelo juiz
1 - A audiência final de ações, incidentes e procedimentos cautelares é sempre gravada, devendo apenas ser assinalados na ata o início e o termo de cada depoimento, informação, esclarecimento, requerimento e respetiva resposta, despacho, decisão e alegações orais.
2 - A gravação é efetuada em sistema sonoro, sem prejuízo de outros meios audiovisuais ou de outros processos técnicos semelhantes de que o tribunal possa dispor.
3 - A gravação deve ser disponibilizada às partes, no prazo de dois dias a contar do respetivo ato.
4 - A falta ou deficiência da gravação deve ser invocada, no prazo de 10 dias a contar do momento em que a gravação é disponibilizada.
5 - A secretaria procede à transcrição de requerimentos e respetivas respostas, despachos e decisões que o juiz, oficiosamente ou a requerimento, determine, por despacho irrecorrível.
6 - A transcrição é feita no prazo de cinco dias a contar do respetivo ato; o prazo para arguir qualquer desconformidade da transcrição é de cinco dias a contar da notificação da sua incorporação nos autos.
7 - A realização e o conteúdo dos demais atos processuais presididos pelo juiz são documentados em ata, na qual são recolhidas as declarações, requerimentos, promoções e atos decisórios orais que tiverem ocorrido.
8 - A redação da ata incumbe ao funcionário judicial, sob a direção do juiz.
9 - Em caso de alegada desconformidade entre o teor do que foi ditado e o ocorrido, são feitas consignar as declarações relativas à discrepância, com indicação das retificações a efetuar, após o que o juiz profere, ouvidas as partes presentes, decisão definitiva, sustentando ou modificando a redação inicial.
A relação que existe entre os artigos 68.° do C.P.T. e 155.° do NCPC é a de um regime especial (o primeiro) para com um regime geral ou comum (o segundo), não tendo este último a virtualidade de revogar o que de particular ou específico aquele consagra para além ou contra a sua própria letra, alcance e sentido, não se podendo, por exemplo, procurar estender a todo e a qualquer processo laboral onde, por força do regime do artigo 155.° do NCPC, se faça a gravação de todos os atos praticados nas Audiências Finais a possibilidade das partes recorrerem da Decisão sobre a Matéria de Facto que aí for proferida, dado que os limites de cariz quantitativo e qualitativo para o registo da prova para efeitos de tal recurso são os definidos especialmente pelo artigo 68.°, números 1 a 3, do CPT.
O que se deixou dito quanto aos condicionalismos do registo áudio da Audiência Final implicará que, no processo laboral - quer fora das referidas circunstâncias, quer mesmo dentro das mesmas - não se tem de dar cumprimento (parcial ou total) ao determinado no n.° 1 do artigo 155.° do NCPC (gravação)?
Será que, no âmbito do artigo 68.° do CPT, só é obrigatória a gravação da prova propriamente dita aí produzida e nada mais, havendo que atuar no que ao demais se passa em tais Audiências Finais como se mostra hoje previsto nos números 7 e 8 do artigo 155.° do NCPC (documentação em ata de todos os restantes atos processuais, sem obrigatoriedade da sua gravação)?
Indo ainda mais longe na nossa interrogação, nas outras Audiências Finais, onde não há possibilidade ou necessidade de registo áudio da prova, há simplesmente que dar cumprimento aos números 7 e 8 daquela disposição legal, como sustentam Viriato Reis e Diogo Ravara no seu texto intitulado Reforma do processo civil e do processo de trabalho, publicado no E-book, edição do CEJ, Volume IV, denominado O Novo Processo Civil - Impactos do Novo C.P.C. no Processo de Trabalho, a págs. 45 e 46?
Julgamos que quanto às diligências que não se traduzam em Audiências Finais [71, se aplica efetivamente o dito regime (n.°s 7 e 8 do artigo 155.° do NCPC), mas já no que respeita aquelas Audiências Finais em processo laboral, cujas decisões não sejam, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, importa considerar a regra absoluta estatuída pelo n.° 1 do aludido art.° 155.°: «A audiência final de ações, incidentes e procedimentos cautelares é sempre gravada, devendo apenas ser assinalados na ata o início e o termo de cada depoimento, informação, esclarecimento, requerimento e respetiva resposta, despacho, decisão e alegações orais.» (sublinhado nosso).
Impõe-se também olhar para a finalidade dessa norma que visa não somente assegurar o registo da prova aí produzida para efeitos de futura impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto mas também conferir maior celeridade e eficácia a tais atos de julgamento, ao dispensar as partes de ditarem para a Ata os seus requerimentos e outras intervenções, bem como o juiz as suas decisões, assim libertando o oficial de justiça de fazer papel de escriba e obstando às inerentes e inevitáveis interrupções que para o efeito tinham de acontecer, com as indesejáveis perdas de tempo e quebras de ritmo, raciocínio e sequência lógica dos trabalhos.
Afigura-se-nos também que preocupações de certeza, clareza, rigor, objetividade e pacificação perpassam por aqui, pela gravação de todos os atos processuais concretizados no momento chave de toda a ação judicial - o julgamento -, obrigando todos os intervenientes - principais ou incidentais - a uma postura mais responsável, cuidadosa, ponderada, relativamente ao que fazem e, principalmente ao que dizem (pense-se, designadamente, em cenários adjetivos de impossibilidade legal de impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto, onde nada obsta a que a parte prejudicada com um depoimento testemunhal que considera falso, requeira cópia da sua gravação para efeitos de perseguição criminal).
Por esse conjunto de fundamentos, não vislumbramos óbice a que todas as Audiências Finais em processo do trabalho sejam gravadas, muito embora só nas ações onde seja admitido o recurso da Decisão sobre a Matéria de Facto possam os registos da prova efetuados pelo tribunal ser utilizados pelas partes com essa precisa finalidade.
B5 - OMISSÃO DAS ALEGAÇÕES ORAIS E NULIDADE PROCESSUAL
Ora, tendo nós defendido a aplicação do número 1 do artigo 155.° a todas as Audiências Finais (incluindo as que foram realizadas ao abrigo do artigo 68.°, n.°s 1 a 3 do CPT), constata-se que aquela regra determina que também as gravações orais dos advogados sejam objeto de registo áudio.
Não tendo tal acontecido nos autos e não qualificando juridicamente o número 4 do artigo 155.° do NCPC tal irregularidade, sendo certo que a mesma se traduz na omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreve, afigura-se-nos que - como já antes defendemos, à imagem aliás do que fez o tribunal recorrido, no despacho de indeferimento da mesma - que caímos no âmbito de aplicação das nulidades processuais secundárias previstas nos artigos 195.° e 199.° do NCPC, que têm a seguinte redação:
Artigo 195.°
Regras gerais sobre a nulidade dos atos
1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
2 - Quando um ato tenha de ser anulado, anulam-se também os termos subsequentes que dele dependam absolutamente; a nulidade de uma parte do ato não prejudica as outras partes que dela sejam independentes.
3 - Se o vício de que o ato sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o ato se mostre idóneo.
Artigo 199.°
Regra geral sobre o prazo da arguição
1 - Quanto às outras nulidades, se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
2 - Arguida ou notada a irregularidade durante a prática de ato a que o juiz presida, deve este tomar as providências necessárias para que a lei seja cumprida.
3 - Se o processo for expedido em recurso antes de findar o prazo referido neste artigo, pode a arguição ser feita perante o tribunal superior, contando-se o prazo desde a distribuição.
Ora, chegados aqui e tendo o prazo de 10 dias para a arguição de tal nulidade secundária sido respeitado, temos que concordar com o despacho judicial do Tribunal do Trabalho de Lisboa quando diz que, muito embora nos encontremos face a uma irregularidade processual, a mesma não tem a virtualidade de influir no exame ou na decisão da causa.
Impõe-se frisar o óbvio (até para evitar quaisquer equívocos futuros e desnecessários): com tal afirmação não se pretende minimamente desvalorizar as alegações orais feitas pelos advogados, pelo Ministério Público ou até pelas partes quanto litigam em causa própria e dar corpo e razão aquele dito dos tribunais, que insinua que, em regra, os juízes nunca ouvem as referidas alegações (antes pelo contrário, dado que muitas delas lançam uma luz nova e diversa sobre o que se passou em audiência, abrindo caminhos para uma mais certeira e correta decisão judicial!).
O que nos limitamos a afirmar é que no caso dos autos nada indicia que a falta de audição de tais alegações orais por este tribunal de recurso ponha minimamente em causa a sua capacidade de examinar e julgar o pleito que tem entre mãos.
Logo, como se concluiu no despacho da 1.a instância, tal omissão não tem a virtualidade de provocar a nulidade da Audiência Final dos autos.
C - NULIDADES DA SENTENÇA
O Recorrente veio nas suas alegações arguir a nulidade de sentença que se mostra vertida no número 1, alínea d) do artigo 615.° do Novo Código de Processo
Civil (É nula a sentença quando: d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;), estipulando ainda o
artigo 608.°, número 2, desse mesmo diploma legal, a propósito das questões a
resolver pela sentença, que «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras..
A recorrente justifica a invocação dessa nulidade da sentença recorrida nos seguintes moldes:
«A sentença é omissa quanto a dois factos, cuja apreciação foi colocada ao tribunal, maxime a idade concreta do Autor, a qual, depois, é referenciada em sede de decisão de direito,
E os montantes da pensão do Autor.
Ora,
Tais factos, longe de serem irrelevantes, assumem manifesta importância para a boa decisão da causa, sendo que a sua omissão consubstancia causa de nulidade da sentença, de acordo com o estatuído na al. d) do n.° 1 do art.° 615.° do NCPC, ora expressamente invocada.
Por outro lado ainda,
De acordo com o previsto no art.° 155° do NCPC, igualmente aplicável aos presentes autos, a audiência de discussão e julgamento é gravada, incluindo-se aqui as alegações orais (n.° 1 do citado preceito legal, parte final).
Sucede que,
Conforme requerimento oportunamente apresentado, a gravação que foi disponibilizada à signatária não contém as alegações que, no caso do foro laboral, assume particular importância, já que as mesmas são de facto e de direito.
Sucede que,
À data da apresentação das competentes alegações, não tinha ainda sido proferido despacho sobre o requerimento da Ré, que solicitou, caso se confirmasse a falta de gravação, a anulação da douta sentença e a repetição das alegações.
Consequentemente, por mera cautela de patrocínio, invoca-se igualmente a nulidade da
sentença com este mesmo fundamento.»
O Recorrido respondeu a tais nulidades de sentença nos seguintes moldes:
«1. DA NULIDADE DA SENTENÇA
A Ré vem invocar a nulidade da Douta Sentença por falta de gravação das alegações dos mandatários.
Ora, nos presentes autos, a prova foi gravada a requerimento do Autor, o que a Ré nem sequer fez, nos termos do disposto no C.P.T.
No despacho Saneador foi o pedido de gravação da prova deferido nos termos do disposto no art.° 68.°, n.°(s) 2 e 4 do C.P.T.
Termos em que, havendo norma específica em vigor para o processo laboral, no caso o art.° 68.° do C.P.T., não se aplica subsidiariamente o C.P.C. e consequentemente, à semelhança do que sempre foi feito no processo laboral, e não sofreu qualquer alteração, as alegações não têm que ser gravadas, nem a falta de gravação das mesmas constitui qualquer nulidade.
Veio a Ré ainda invocar que a Douta Sentença é nula por alegadamente ser omissa quanto a dois factos, a idade concreta do Autor e os montantes da pensão do mesmo. Tal omissão consubstancia, no entender da Ré, causa de nulidade da Sentença, de acordo com o estatuído na al. d) do n.° 1 do art.° 615.° do NCPC.
Nos termos do disposto no art.° 615.°, n.° 1, alínea d) do C.P.C., É nula a sentença quando: ( ..) d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
Contudo, independentemente de se considerar que a Ré não tem qualquer razão, sempre se dirá que, de acordo com o n.° 4 do mesmo normativo legal, As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.° 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.
Como a Ré até recorreu, salvo o devido respeito, está vedado ao Tribunal a quo pronunciar-se sobre a alegada nulidade.»
Chegados aqui, impõe-se, desde logo e antes de mais, atentar na regra especial, de índole formal, que, no quadro do direito processual laboralista, vigora nesta matéria e que se acha contida no número 1 do artigo 77.° do Código de Processo de Trabalho.
Ora, se compulsarmos as alegações de recurso da Apelante verificamos que a mesma dá cumprimento mínimo a tal exigência legal específica do regime adjetivo juslaboralista, pois invoca, de forma autónoma, no quadro do requerimento de interposição do recurso, as irregularidades em questão e depois carreia para as conclusões do recurso a essência das mesmas.
Acerca desse vício de natureza formal que deixámos enunciado (antes constante na al. d) do n.° 1 do art.° 668.° do C.P.C.), convirá ouvir FERNANDO AMANCIO FERREIRA, quando afirma o seguinte: À omissão de pronúncia alude a 1. a parte da alínea d) do número 1 do artigo 668.° e traduz-se na circunstância de o juiz se não pronunciar sobre questões que devesse apreciar, ante o estatuído na 1.a parte do número 2 do artigo 660.0.
Trata-se da nulidade mais invocada nos tribunais, originada na confusão que se estabelece com frequência entre questões a apreciar e razões ou argumentos aduzidos no decurso da demanda. (...).
Será conveniente chamar aqui à colação o disposto no artigo 5.° do Novo Código de Processo Civil, quando determina que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
ABÍLIO NETO [101 sustenta que Pelo que respeita ao direito, o juiz move-se livremente. (...) Pode ir buscar regras diferentes daquelas que as partes invocaram (indagação); pode atribuir às regras invocadas pelas partes sentido diferente do que estas lhe deram (interpretação); pode fazer derivar das regras de que as partes se serviram efeitos e consequências diversas das que estas tiraram (aplicação) (...), defendendo, por seu turno, JOÃO DE CASTRO MENDES, que «Estabelece-se que o Juiz não está sujeito à vontade das partes quanto às soluções de direito (art.° 664.0). Isto porque, em princípio, se pretende que a solução dada à hipótese presente ao Tribunal seja a realmente verdadeira (princípio da verdade material) e não apenas aquela que se justifica em face da maneira como decorreu o processo (princípio da verdade formal). Neste campo o Juiz só é limitado pela lei, não pela vontade das partes».
Importa por, outro lado, lembrar que as questões a que alude a transcrita alínea d) do número 1 do art.° 615.° do Novo Código de Processo Civil são as concernentes ao pedido e à causa de pedir que suportam a demanda judicial e não a todas e cada uma das razões, fundamentos, motivações ou meios de prova apresentados pelas partes ao longo da tramitação dos autos, defendendo, a este propósito, o Professor Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, página 670 que o juiz deve (..) conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de
todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e de todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer, ..., não podendo o juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de exceções na exclusiva disponibilidade das partes..., ao
passo que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11.01.2000, publicado no BMJ n.° 493.°, páginas 385 e seguintes, ... Questões para este efeito são, desde logo, as que
se prendem com o pedido e a causa de pedir. São, em primeiro lugar, todas as pretensões formuladas pelas partes, que requerem decisão do juiz, qualquer que seja a forma como são deduzidas (pedidos, exceções, reconvenção)...
Tendo em atenção a doutrina expressa nos excertos acima transcritos e com a qual concordamos e compulsando a motivação da arguição desta nulidade, verificamos desde logo que a irregularidade relativa à omissão da gravação das alegações orais dos ilustres mandatários das partes não pode ser reconduzida a tal omissão de pronúncia da sentença recorrida ou a uma outra das nulidades elencadas no artigo 615.° do NCPC (nem sequer a um qualquer vício dessa mesma índole que houvesse afetado a Decisão sobre a Matéria de Facto que, como sabemos, foi prolatada à parte, de acordo com o regime especial ainda em vigor no seio do direito processual laboral), sendo certo que este tipo de irregularidade não é de conhecimento oficioso, estando o tribunal de recurso subordinado, nessa matéria, à expressa arguição da parte ou partes.
Encarámos, aliás, tal irregularidade como uma nulidade secundária sem reflexos processuais e, para mais, consolidada definitivamente nos autos por não ter havido reação recursória oportuna da Ré.
No que concerne à segunda situação potencialmente integradora da invocada nulidade na sua modalidade de omissão de pronúncia, também facilmente se conclui que aquela não pode ser juridicamente configurada enquanto tal, dado o tribunal ter apreciado todas as questões que lhe foram colocadas pelas partes, mas antes tem de ser reconduzida à impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto, como veio a Apelante também a fazê-lo e que irá ser abordada no Ponto seguinte.
Sendo assim, vão indeferidas, pelos motivos expostos, as «nulidades de sentença» invocadas pela Ré no início das suas alegações de recurso.
D - IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO SOBRE A MATÉRIA DE FACTO
Vem a Apelante interpor recurso da decisão da Matéria de Facto, com referência aos factos descritos nas suas conclusões [12] e que, na opinião do Autor, deveriam ter sido julgados de forma diversa pelo tribunal recorrido, sendo tal impugnação feita nos termos e para os efeitos dos artigos 80.°, número 3, 87.°, número 1, do Código do Processo do Trabalho e 636.°, número 2 e 640.° do Novo Código de Processo Civil, importando, nessa medida, ter presente o seu número 1,
alíneas a) a c), quando estatui que 1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, dizendo por seu turno o seu número 2
que 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte: a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes; b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes., ao passo que o artigo 622.°, números 1 e 2, alíneas a) a d) do NCPC determina a este propósito e na parte que nos interessa o seguinte:
Artigo 662.°
Modificabilidade da decisão de facto
1 - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2 - A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.a instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.a instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
3 (...)
A Ré recorrente, nesta matéria, dá cumprimento suficiente às exigências de natureza substantiva e processual que se mostram elencadas nas normas acabadas de transcrever, o que permite conhecer o recurso, nesta primeira vertente da impugnação da matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido.
Impõe-se realçar que, conforme ressalta do Relatório deste Aresto, a prova testemunhal produzida em Audiência de Discussão e Julgamento foi objeto de gravação, tendo este Tribunal da Relação de Lisboa procedido à sua integral audição, bem como à leitura, interpretação e conjugação dos documentos juntos aos autos e ao seu confronto com tais depoimentos e com os factos assentes que resultaram da confissão ou acordo das partes.
Passemos então a abordar as questões de facto suscitadas pela Ré, começando por transcrever a fundamentação da Decisão sobre a Matéria de Facto, conforme consta de fls. 170 e 171 e reproduzindo-se depois e para esse efeito, o teor dos pontos de facto que, na perspetiva do Apelante, foram objeto de um incorreto julgamento pelo tribunal da 1.a instância e que, nessa medida, merecem a sua contestação:
«Na determinação da factualidade provada supra elencada o Tribunal gizou a sua convicção no acordo das partes, na prova documental junta aos autos e na prova testemunhal produzida em audiência de discussão e julgamento, o que analisou conjugada e criticamente com as máximas da experiência comum e juízos de normalidade e razoabilidade aplicáveis.
O acordo das partes determinou a prova da factualidade supra elencada de 1) a 6) e de 9)a11).
A documentação de fls. 159 dos autos permitiu afirmar a factualidade supra elencada em 12).
A documentação de fls. 100-102 dos autos permitiu afirmar a factualidade supra descrita em 13).
Para prova da factualidade supra elencada em 7) e 8) o Tribunal atendeu ao depoimento prestado pela mulher do Autor, Lúcia Marçal, assim como pelos colegas de trabalho do Autor na Ré, José Manuel Costa e Luís Rodrigues, todos melhor identificados na ata de fls. 162-166 dos autos, porquanto depuseram com honestidade, isenção e lógica, o que mereceu credibilidade.
A não prova da demais matéria de facto alegada pelas partes nos articulados resulta da circunstância de sobre o seu teor não ter sido feita prova cabal, suficiente a um juízo de certeza, não se reputando bastante a prova documental e/ou testemunhal produzida nos autos por titubeante, no que se incluem os demais danos morais invocados pelo Autor, assim como saber se o Autor informou ou não a Ré da sua condição de aposentado e, nesse caso, em que data.
Por ao Tribunal estar vedada resposta não se atendeu ao que nos articulados constitui alegação de matéria de impugnação, juízos de facto repetitivos, juízos conclusivos e jurídicos e/ou jurídico-conclusivos.»
Chegados aqui e transcrita que se mostra a fundamentação avançada pelo tribunal da 1.a instância para justificar a formação da sua convicção quanto aos factos dados como provados, não provados e desconsiderados pelo mesmo, faça-se uma síntese das questões de facto que são suscitadas pela parte recorrente no seu recurso:
I - Pontos de Facto Assentes que deveriam ser dados como provados:
A - O Autor nasceu no dia 16/08/1946.
B - O Autor, em outubro de 2015, recebia a título de pensão de reforma o valor mensal de € 3.960, 72, que, a partir de janeiro de 2016, passou a ser no montante mensal de € 4.035,21.
C - A Ré só teve conhecimento da situação de aposentado do Autor em Outubro do ano de 2008.
E - PONDERAÇÃO GLOBAL DA PROVA PRODUZIDA
Tendo compulsado os documentos juntos aos autosl131 bem como ouvidos os depoimentos testemunhais[14] e depois de fazer a devida ponderação de cada um desses meios de prova, quer em si como entre si, sem perder de vista os demais factos dados como assentes por acordo das partes, confissão ou por força dos aludidos meios probatórios, diremos que existe fundamento para a sua inclusão na Factualidade dada como Provada e prova documental com força probatória suficiente para justificar a procedência da presente impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto no que se refere aos dois primeiros Pontos de Facto (A e B), que, muito embora não tenham tido uma alegação expressa nos seus articulados, decorrem ainda assim da defesa emergente da contestação da Ré, dos pedidos de
informação dirigidos por esta última ao Autor, através da intermediação do tribunal, assim como das diligências desenvolvidas por este último a esse respeito (cfr. aliás, o artigo 72.° do C.P.T.).
Já no que concerne ao último Ponto de Facto (C)], dir-se-á que a prova produzida acerca do mesmo centrou-se essencialmente no depoimento de parte do Apelado e nos depoimentos testemunhais de sua esposa LÚCIA SOUSA MARTINS DO VALE MARÇAL e da responsável pela contabilidade da Ré SANDRA MARIA FARIA DUARTE LOURENÇO (muito embora tivesse havido referências à situação de aposentado do Autor, quando do início das suas funções docentes para a E..., SA e ao conhecimento de alguns professores e colegas daquele de tal situação, por parte das outras duas testemunhas do demandante).
Diremos que da conjugação de tais depoimentos resulta, com alguma nitidez e certeza, que o Autor, ainda que, segundo o próprio, tenha informado os órgãos máximos da Universidade da sua qualidade de professor aposentado, em momento anterior à sua admissão ou no começo da sua atividade profissional naquele estabelecimento de ensino universitário, já não o afirma quanto aos serviços administrativos e contabilísticos da Ré, únicos a quem tal informação verdadeiramente interessava transmitir no início da relação laboral (como veio mais tarde a ser reconhecida pela Ré), tendo somente com a receção dos três primeiros recibos de vencimento (final do ano de 2007 ou início do ano de 2008) e o alerta e posteriores insistências da sua mulher (dado o marido alegar, quando inquirido por ela acerca do assunto, falta de tempo para o fazer, devido aos seus demais afazeres, ao que julgamos, profissionais, familiares e pessoais), vindo o trabalhador a desenvolver as necessárias diligências junto da Segurança Social durante o primeiro semestre do ano de 2008 (nas suas próprias palavras) e tido necessidade de requerer uma declaração da CGA, a pedido dos serviços de contabilidade da Apelante (muito embora a testemunha da Ré afirmasse que tal não seria necessário, bastando a exibição do cartão de aposentado daquele, na única contradição relevante entre o depoimento de parte e o depoimento desta testemunha).
Impõe-se referir ainda o último Ponto de Facto dado como Provado pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa e que reza o seguinte:
13. A Ré fez descontos para a segurança social tendo em conta a aposentação do Autor apenas a partir de 11/2008.
Ora, dos diversos depoimentos testemunhais ressalta que os descontos para Segurança Social derivados da situação de aposentado beneficiava quer o trabalhador, quer a entidade empregadora, mal se compreendendo que a Ré, ainda que possuidora da informação e documentação necessárias para aquele efeito, não tivesse começado a processar, desde logo, os referidos descontos de acordo com o regime mais favorável para ambos.
É este o quadro fáctico que redunda de tal prova de parte e testemunhal, afigurando-se-nos poder dar como assente que os serviços administrativos da Ré só tiveram conhecimento oficial, comprovado da situação de aposentado do Autor no mês de Outubro de 2008, tendo, nessa sequência, iniciado os descontos corretos em Novembro desse mesmo ano.
Sendo assim, pelos motivos expostos, julga-se procedente o recurso de Apelação da Ré nesta sua outra vertente da impugnação da Decisão da Matéria de Facto, decidindo-se aditar à Factualidade dada como Provada pelo tribunal da l.a instância os seguintes três novos Pontos de Facto:
14. O Autor nasceu no dia 16/08/1946 (Doc. de fls. 121);
15. O Autor, em outubro de 2015, recebia a título de pensão de reforma o valor mensal de € 3.960,72, que, a partir de janeiro de 2016, passou a ser no montante mensal de € 4.035,21 (Informação da CGP de fls. 159/187).
16. Os serviços administrativos da Ré só tiveram conhecimento, documentalmente comprovado, da situação de aposentado do Autor em Outubro do ano de 2008.
F - OBJECTO DO RECURSO
Se lermos as alegações de recurso e as conclusões delas extraídas, verificamos que são suscitadas as seguintes questões pela empregadora:
«7.°- Do que se interpreta na douta sentença, um dos pressupostos para a decisão de direito do caso ora em apreço prende-se com o facto de a Ré não ter anunciado que a cessação se devia ao facto de o Autor já estar reformado, invocando-se igualmente que não se provou que o Autor se tivesse aposentado por velhice, mais se alegando que o mesmo à data da dita aposentação tinha, apenas, 56 anos. Mas,
8.°- Desde logo no que se reporta à invocação de que se desconhece se o Autor foi reformado por velhice ou por invalidez, ressalvado o devido respeito, atento o disposto na alínea c) do art.° 343.° do CT, a mesma é irrelevante, aplicando-se ao caso vertente o n.° 2 do art.° 348.° do CT, uma vez que a Ré só teve conhecimento posterior da situação do Autor. Mas,
9.°- Ainda que assim não fosse, isto é, para o caso de se vir a entender que o que releva não é a data do conhecimento pela Ré mas a data da reforma, ainda assim tal normativo se deve aplicar, pelo que o contrato deste ou se converteu ou foi celebrado ab initio a termo, sendo que a caducidade não determina o pagamento de qualquer compensação. Sem nada conceder,
10.0- O que é certo é que o Autor fará 70 anos em Agosto de 2016 e, tendo-se presente que o trânsito em julgado ocorrerá depois desta data, a sentença terá de ser revogada e substituída por outra que declare a caducidade do dito vínculo, atento o facto de terem passado seis meses sobre os 70 anos do Autor.
11.0- Apenas para o caso de se vir a concluir que a sentença ora posta em crise não padece do erro de aplicação do direito supra invocado, então sempre se dirá que o montante atribuído a título de indemnização é manifestamente excessivo e desproporcional à situação em apreço, antes devendo ser fixado em 15 dias por cada ano de antiguidade. Por último,
12.°- Ressalvado o devido respeito, só no momento em que o tribunal fixou o montante da compensação, isto é, na sentença, é que podem ser computados os correspondentes juros de mora e, não, como se decidiu, a partir da citação.»
G - DESPEDIMENTO ILÍCITO DO AUTOR OU CADUCIDADE DO CONTRATO DE TRABALHO DOS AUTOS
A Ré começa por colocar em crise a circunstância do tribunal recorrido ter considerado que a Autora havia sido despedida por si e não visto cessado por caducidade o seu contrato de trabalho a termo certo, mas o julgamento de tal questão depende da apreciação prévia de diversas premissas de facto e de direito que a particular situação profissional do trabalhador demanda.
H - APOSENTAÇAO POR VELHICE OU INCAPACIDADE E CONTRATO DE TRABALHO DOS AUTOS
Se compulsarmos a matéria de facto dada como provada, constatamos que o Autor se encontra aposentado desde 1/12/2002, tendo iniciado funções para a Ré no dia 1/10/2007, como professor, ao abrigo de um contrato de trabalho de natureza privada (cfr. artigos 1152.° do Código Civil, 10.° e 12.° do Código do Trabalho de 2003 e 11.° e 12.° do Código do Trabalho de 2009.
A Ré sustenta que, ao abrigo do artigo 348.° do Código do Trabalho de 2009 [16], denunciou o contrato de trabalho que mantinha com o Autor, por entender que o mesmo, por força da aludida aposentação do recorrido, tinha a natureza de um contrato de trabalho a termo certo de 6 meses, renovável por idêntico período, denunciável pelo empregador no prazo de 60 dias e sem direito a qualquer compensação.
Sendo este o quadro fáctico e jurídico, que, muito sinteticamente, nos é colocado à consideração, diremos, desde já, que a Apelante não tem razão no que defendeu na ação e agora nas alegações e conclusões de recurso.
Importa referir que, tendo o Autor se aposentado em dezembro de 2002 e firmado o seu vínculo jurídico-profissional com a recorrente em Outubro de 2007, estava em vigor o artigo 392.° do Código do Trabalho de 2003[17], que, no que à sustcntada (pela Ré) «conversão» jurídica, possui uma redação diversa da do atual artigo 348.°, muito embora nos pareça que o seu sentido e alcance são idênticos.
Se interpretamos corretamente a letra e o espírito das normas constantes do transcrito artigo 392.°, por referência também ao disposto na alínea c) do artigo 387.°[18], ambos do Código do Trabalho de 2003, o legislador com tal regime pretende regular uma situação muito específica e concreta: a da existência de uma relação laboral fundada num contrato de trabalho por tempo indeterminado que, apesar da reforma por velhice comunicada ao trabalhador e ao empregador, se continua a desenvolver por um período superior a 30 dias contado desde a última das comunicações feita a um deles pela Segurança Social, com referência à concessão da dita reforma em razão da idade do empregado, implicando tal cenário a constituição de um vínculo de trabalho com outro formato ou numa outra modalidade, a saber, a de um contrato de trabalho por termo certo de 6 meses, nos termos acima elencados.
Importa realçar a deficiente redação de que, em nosso entender, os dois preceitos em presença padecem (atente-se na forma idêntica como o artigo 392.° trata situações radicalmente diversas, a saber, a caducidade do contrato de trabalho devido à reforma do trabalhador e a emergência de um novo contrato de trabalho a termo, por um lado, e a manutenção da mesma relação laboral, apesar de convertida, após os 70 anos do trabalhador ativo) bem como a aparente contradição entre o estatuído no artigo 387.°, alínea c) do Código do Trabalho, quando afirma que o contrato de trabalho caduca nos termos gerais, nomeadamente, com a reforma do trabalhador, por velhice ou invalidez (ou seja, a relação laboral finda com o conhecimento de tal facto extintivo), ao passo que o artigo 392.°, número 1, estipula que se considera a termo o contrato de trabalho em que o trabalhador permaneça ao serviço decorridos 30 dias sobre o conhecimento, por ambas as partes, da reforma daquele por velhice, sendo tal situação qualificada pela epígrafe dessa mesma disposição como Reforma por velhice.
Logo e em rigor, face ao estipulado no artigo 387.°, alínea c) do Código do Trabalho, parece que o dito contrato, por tempo indeterminado, com a comunicação a ambos da reforma cessa, por caducidade, ao passo que, ao abrigo da segunda disposição mencionada, a caducidade em questão só se verifica quando o empregador impede o referido trabalhador de retomar o seu trabalho ou este deixe de prestar serviço por sua iniciativa, desde que tal ocorra até 30 dias após a mencionada comunicação.
Abordando mais aprofundadamente a questão deixada em aberto, afigura-se-nos que as descritas duas interpretações do regime legal em presença são as únicas que, em teoria, são defensáveis, já não sendo possível, em nosso entender, sustentar que após a comunicação da situação de reforma do trabalhador a este último e ao empregador, tenha início, desde logo, uma nova relação jurídica de trabalho, reconduzível já ao aludido contrato especial a termo certo de 6 meses ou a um outro vínculo de natureza similar, distinto do anterior (por tempo indeterminado) pois a lei faz depender do decurso do prazo de 30 dias a ocorrência da dita conversão.
A cessação imediata do contrato com a comunicação da reforma, obriga a questionarmos juridicamente o período de 30 dias previsto no artigo 392.°, que se segue a tal conhecimento, podendo falar-se, eventualmente, numa relação ou situação contratual de facto que virá ou não a culminar, por imposição legal, num (novo) contrato de trabalho a termo certo de 6 meses, conforme o trabalhador ou empregador venham ou não a colocar um ponto final na mesma durante o referido prazo, ficando ainda por saber se esse contrato a prazo, numa aproximação jurídica, porventura abusiva, entre tal prazo de 30 dias e o período experimental, de idêntica duração, previsto para os contratos de trabalho a termo certo por período de 6 meses ou superior (artigo 108.°, alínea a) do Código do Trabalho de 2003), se retroage e abrange esse período ou se só tem início no 31.° dia após o seu decurso.
O artigo 392.° do Código do Trabalho evita tais escolhos, dado fazer depender a caducidade da interrupção da prestação laboral em momento anterior ao decurso do prazo de 30 dias aí previsto, por iniciativa de qualquer uma das partes, o que implica estarmos perante dois momentos distintos mas juridicamente radicados numa relação contratual.
Aqui chegados, a doutrina divide-se, pois existem uns que se referem a um só contrato de trabalho que, após o decurso do prazo de 30 dias sobre o conhecimento comum da reforma por velhice, não cessa, deixando, tão-somente, de ser um contrato de trabalho por tempo indeterminado, para se transformar num contrato de trabalho especial a termo certo de 6 meses, mantendo-se, portanto um só, único e ininterrupto vínculo laboral (neste sentido, PEDRO ROMANO MARTINEZ[19], em anotação ao artigo 348.°, muito embora sejam de realçar as dúvidas de interpretação assinaladas por esse autor, face à diferença de redação de tal disposição, quando confrontada com o teor do anterior artigo 392.° do Código do Trabalho de 2003 e tendo por pano de fundo o que era determinado pelo artigo 5.° da LCCT), posicionando-se outros autores (como o Professor JORGE LEITE, em Direito do Trabalho, Volume II, Serviço de Textos dos Serviços de Ação Social da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2004, página 201 e, aparentemente, Maria do Rosário Palma Ramalho, Direito do Trabalho - Parte II - Situações Laborais Individuais, II Volume, Julho de 2006, Almedina, página 793) no polo oposto, defendendo que a manutenção do vínculo laboral, apesar de afetado pela conversão, só acontece na hipótese constante do número 3 do artigo 392.°, ao passo que na reforma por velhice o original contrato de trabalho por tempo indeterminado ou tempo certo cessa por caducidade, decorridos que se mostrem os aludidos 30 dias, emergindo a partir daí uma nova relação contratual, sujeita às condicionantes previstas nas diversas alíneas do número 2 do artigo 392.° do Código do Trabalho.
Temos de aderir à segunda posição enunciada (dois contratos sucessivos e diferentes), dado a primeira tese, apesar da equivocidade da lei, não ter na devida conta o artigo 387.°, alínea c) do Código do Trabalho, que aponta claramente para a extinção por caducidade do contrato de trabalho em que o trabalhador se reforme por velhice, bem como implica que, em situações de despedimento individual sem justa causa, coletivo ou por extinção do posto de trabalho desse trabalhador, se tenha, necessariamente, de contabilizar toda a antiguidade do trabalhador, para efeitos de cálculo da indemnização ou da compensação devidas (sem ignorar que, face ao estatuído nas alíneas b), c) e d) do número 2 do artigo 392.°, tais casos, a existirem, serão raros), o que nos parece trair o teor, sentido e alcance do regime jurídico em análise.
Esta busca da melhor interpretação jurídica das regras estabelecidas nos artigos 387.°, alínea c) e 392.° do Código do Trabalho[2q, não só quanto à reforma por velhice como também quanto à permanência no desempenho de funções de trabalhador com mais de 70 anos, que não tenha requerido a sua reforma por limite de idade, faz ressaltar com absoluta nitidez o que se defendeu antes, ou seja, que os dois vínculos laborais que se sucedem, nos moldes expostos, têm de se referir ao mesmo trabalhador e à mesma entidade empregadora.
Ora, conforme ressalta da factualidade dada como provada e dos documentos que a complementam, constata-se que a situação de aposentação do Apelado afetou apenas e exclusivamente a prestação funcional que era pelo mesmo desenvolvida para o Estado, surgindo o desempenho de funções, de cariz privado, que passou a executar para a aqui Ré desde outubro de 2007, de forma totalmente autónoma e independente e sem qualquer conexão, quer com o dito estatuto de aposentado, quer com as entidades públicas para quem anteriormente prestou a sua atividade profissional (ao que presumimos, também como docente universitário).
Não é igualmente despiciendo fazer notar que a Apelante, entre 1 de outubro de 2007 e 30 de setembro de 2015 fez os normais «descontos» para a Segurança Social, na percentagem de 11/prct. e depois de 8/prct., no salário e por conta do Apelado, o que mal se compreenderia caso houvesse alguma solução de continuidade entre a atividade pública do Autor, os inerentes descontos e a sua posterior Aposentação pela CGA e, finalmente, o seu contrato de trabalho privado com a E..., SA, com os inerentes descontos para uma entidade diversa da dita Caixa Geral de Aposentações.
Pensamos que o único raciocínio jurídico plausível e correto é aquele que estabelece uma conexão entre o estatuto de aposentado da função pública e a
atividade desenvolvida para o Estado, na qualidade de funcionário público, bem como uma conexão (independente daquela outra) entre os descontos para a Segurança Social, a subsequente reforma por velhice ou incapacidade dentro desse sistema (caso legalmente possível) e a inerente caducidade do correspondente vínculo de natureza privada e laboral com a Ré ou o prosseguimento para além dos 30 dias ou dos 70 anos de idade do trabalhador, de um vínculo sustentado num contrato de trabalho a termo certo, novo ou convertido.
Logo, a atitude da Ré só seria legítima perante a reforma por velhice do Autor, caso esta se referisse à atividade profissional de cariz privado que o mesmo havia desenvolvido para a Apelante, por aí poder ocorrer, efetivamente, após o decurso do prazo de 30 dias sobre a comunicação da situação de reforma, a aludida conversão do vínculo efetivo em vínculo a prazo.
I - REGIMES LEGAIS APLICÁVEIS
Importa aprofundar um pouco mais a problemática analisada, posicionando, de um lado, o ESTATUTO DO APOSENTADO que se mostra regulamentado pelo Decreto-Lei n.° 498/72, de 9 de Dezembro[21], bem como a Lei n.° 4/2009, de 29/01
e Decreto-Lei n.° 54/2009, de 2/03 (Regime de proteção social dos trabalhadores que exercem funções públicas) e, do outro, o CÓDIGO DOS REGIMES CONTRIBUTIVOS DO SISTEMA PREVIDENCIAL DE SEGURANÇA SOCIAL, aprovado pela Lei n.° 110/2009, de 16 de Setembro[22], que revogou as normas e diplomas elencados no artigo 5.° de tal Lei, convindo mencionar, entre eles, o Decreto-Lei n.° 103/80, de 9/05 e o Decreto-Regulamentar n.° 12/83, de 12/02 (regime jurídico das contribuições para a Previdência), Decreto-Lei n.° 329/93, de 25 de Setembro (Regime de proteção na velhice e na invalidez dos beneficiários do regime geral de segurança social)[25], depois revogado pelo Decreto-Lei n.° 187/2007, de 10 de Maio (Regime de proteção nas eventualidades de invalidez e velhice dos beneficiários do regime geral de segurança social)[26], Decreto-Lei n.° 141/91, de 10/04 (regime de acumulação de pensões), Decreto-Lei n.° 199/99, de 08/06 e Decreto-Regulamentar n.° 26/99, de 27/ 10 (taxas contributivas) e o Decreto-Lei n.° 8-B/2002 de 15 de Janeiro (estabelece normas destinadas a assegurar a inscrição das entidades empregadoras no sistema de solidariedade e segurança social e a gestão, pelo instituto de gestão financeira da segurança social, do processo de cobrança e pagamento das contribuições e quotizações devidas à segurança social)[27].
A interpretação e confronto entre tais regimes jurídicos permitem afirmar que o legislador tem mantido a distinção entre o sistema contributivo e de proteção dos funcionários públicos e equiparados (situação em que o Autor se encontrava face ao Estado) e o seu congénere, gizado para os trabalhadores por conta de outrem, que prestam serviço ao abrigo de um contrato de trabalho, como era o caso do vínculo firmado entre o Apelado e a Ré (muito embora não se ignore a progressiva tendência privatística que nas duas últimas décadas tem vindo a singrar no âmbito da Administração Pública, com a transformação dos vínculos jurídicos, do sistema contributivo e do tipo de proteção social disponibilizado).
Tal destrinça ressalta com grande nitidez das normas que regulamentam a acumulação de pensões atribuídas por sistemas sociais diferentes, como é o caso do já referido Decreto-Lei n.° 141/91, de 10/04 (cfr., particularmente, os artigos 2.° a 5.°) e 89.° e seguintes do Código Contributivo (Lei n.° 110/2009, de 16 de Setembro).
Não será despiciendo, recordar o que Ilídio das Neves afirma[28], acerca do
sistema de proteção social da função pública:
«424. A natureza institucionalmente limitada do regime
O que foi referido sobre as particularidades do sistema de proteção social da função pública permite ter uma ideia da natureza da estrutura institucional que nele prevalece para concretizar o direito à proteção social garantida aos funcionários e agentes da Administração Pública. Com efeito, às diferentes obrigações contributivas correspondem outras tantas instituições.
Assim, a Caixa Geral de Aposentações, criada em 1929, é uma instituição de previdência que, conjuntamente com o Montepio dos Servidores do Estado, com competência no domínio das pensões de sobrevivência, constituía a Caixa Nacional de Previdência. 0 Montepio, organismo criado em 1934, encontra-se hoje totalmente integrado num novo instituto público com aquela designação de Caixa Geral de Aposentações, de acordo com a reforma estabelecida pelo Decreto-Lei n.° 277/93, de 10 de Agosto. Até esta alteração legislativa a Caixa não teve autonomia, uma vez que funcionava como instituição anexa à Caixa Geral de Depósitos. A partir de então passou a ser, de acordo com o artigo 1.° daquele diploma, «uma pessoa coletiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira e com património próprio)).
Não parece inteiramente correta a indicação do fim da Caixa Geral de Aposentações («... a gestão do regime de segurança social do funcionalismo público em matéria de pensões» ), já que as suas competências ultrapassam um pouco o âmbito das eventualidades que conferem prestações diferidas.
Assim, cabe à instituição em matéria previdencial: a) proceder à inscrição dos subscritores, ou seja, dos beneficiários, que são ao mesmo tempo contribuintes; b) conceder pensões de aposentação ou reforma por velhice, invalidez ou em consequência de desvalorização sofrida em acidentes de serviço; c) conceder pensões de sobrevivência, bem como, nos termos do Decreto-Lei n.° 140/87, de 20 de Marco, pensões especiais de preço de sangue e de outra natureza; d) conceder as prestações familiares a que tenham direito os pensionistas.
Cabe igualmente a instituição, em matéria gestionária, centralizar os respetivos processos, arrecadar as receitas, gerir o orçamento e exercer a fiscalização necessária.
A Direção-Geral de Proteção dos Funcionários e Agentes da Administração Pública, que utiliza ainda a sigla ADSE do antigo Serviço de Assistência na Doença aos Servidores do Estado, foi criada pelo Decreto-Lei n.° 476/80, de 15 de Outubro, cujo regime jurídico foi desenvolvido pelo Decreto-Lei n.° 118/83, de 25 de Fevereiro, que definiu o esquema de beneficios atribuídos aos funcionários e agentes, designadamente em relação aos cuidados de saúde.
Não obstante este organismo ser concebido como um órgão coordenador do sistema de segurança social da função pública, continua a atuar fundamentalmente no domínio da concessão de cuidados de saúde (vejam-se, designadamente, os artigos 20.° a 38. °), incluindo a verificação domiciliária e outros controles médicos da situação de doença dos funcionários e agentes.»
Afigura-se-nos, nessa medida, que também do ponto de vista dos regimes legais contributivos e de proteção social dos funcionários públicos e dos trabalhadores assalariados do sistema privado, resulta uma lógica e regulamentação próprias e independentes das dos demais, que reforça a conclusão tirada pela sentença da 1.a instância e por nós aqui confirmada.
J - REFORMA DO TRABALHADOR E LIBERDADE DE CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE TRABALHO
Importa dizer que nada impede, no regime laboral em vigor em 2007 ou em 2015, que um trabalhador aposentado ou reformado celebre os contratos de trabalho que bem entenda, quer com a sua antiga entidade empregadora, quer com outras empresas ou pessoas singulares, e por tempo indeterminado ou a termo certo ou incerto, desde que a lei laboral aplicável o consinta.
Como bem se afirma no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 9/7/2014, Processo n.° 696/ 12.TTLSB.L1-4, relatora: Filomena Manso, publicado em www.dgsi.pt (Sumário):
I - O estatuto de reformado alcançado por um trabalhador ao serviço de uma empresa não constitui, por si só, circunstância impeditiva da celebração de um contrato de trabalho com empresa distinta, podendo essa contratação ser estabelecida a termo ou por tempo indeterminado.
II - A nova entidade patronal não pode prevalecer-se do conhecimento posterior à contratação da situação de reformado do trabalhador, preexistente à sua admissão, para invocar a caducidade do contrato, fazendo apelo ao disposto nos arts. 343, c) e 348, n° 1 do CT/09.
III - O trabalhador que foi objeto de despedimento ilícito, só tem direito a indemnização por danos não patrimoniais, se alegar e provar os danos concretos que essa situação lhe provocou, sua dimensão, duração e gravidade que assumiram.
Também o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 1/10/2008, Processo n.° 5842/2008-4, relator: José Feteira, publicado em www.dgsi.pt. (Sumário) vai nesse mesmo sentido:
«O estatuto de reformado obtido por um trabalhador ao serviço de uma instituição (empresarial ou não), não constitui, por si só, circunstância impeditiva da celebração de um contrato de trabalho com uma empresa distinta, assim como não é impeditivo de que essa contratação se concretize sem a aposição de termo ou por tempo indeterminado.»
K - DESPEDIMENTO ILÍCITO
Sendo assim, não podia a recorrente considerar, por sua auto recriação e em virtude da aposentação do Autor da função pública, que tal implicava, ao abrigo dos números 1 e 2 do artigo 392.° do Código do Trabalho de 2003, a celebração, ab initio, de um contrato de trabalho a termo certo ou uma qualquer «conversão jurídica», a partir de Outubro de 2008 [31], do contrato de trabalho por tempo indeterminado que mantinha com o recorrido em contrato de trabalho a termo certo, por seis meses renováveis, livremente denunciável pela mesma nos moldes ali previstos, correspondendo, nessa medida, a um despedimento ilícito, porque não precedido de procedimento disciplinar e de invocação de justa causa, a declaração oportunamente vertida na carta de fls. 16 e 17.[32]
Muito embora não seja diretamente suscitado pela recorrente, dir-se-á mesmo e a talho de foice, que nem o teor da referida missiva de fls. 16 e 17 se pode reconduzir seriamente a uma qualquer denúncia de um contrato de trabalho a termo certo nem sequer à invocação da caducidade da relação laboral em questão por verificação de uma impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva da Apelante continuar a receber o trabalho do Apelado (artigo 343.°, alínea b) do CT/ 2009), pois o texto do documento em questão não consubstancia minimamente tal (sub)modalidade de cessação do vínculo de trabalho como inexistem factos alegados e provados nos autos que sustentem essa tese.
Logo, improcede, nesta vertente, o recurso de Apelação interposto pela E..., SA.
G - PRESTAÇÕES DECORRENTES DO DESPEDIMENTO ILÍCITO - JUROS DE MORA
Sendo assim e tendo agora em consideração o estatuído nos artigos 389.° a 391.° do Código do Trabalho de 2009 e a circunstância do trabalhador ter pedido a condenação da Ré no pagamento da indemnização em substituição da reintegração, não restam dúvidas de que o Autor tem direito às prestações que lhe foram reconhecidas pela sentença proferida pelo tribunal da 1.a instância (compensação do número 1 do artigo 390.° + montante indemnizatório), tendo nesta última sido fixados 30 dias de retribuição por cada ano de antiguidade relativamente a esta segunda realidade.
Ora, a Ré vem contestar a decisão do Tribunal do Trabalho de Lisboa nos seguintes moldes, quanto às consequências da declaração de ilicitude do despedimento deque o recorrido foi alvo e que foi por nós acima reafirmada:
«10.°- O que é certo é que o Autor fará 70 anos em Agosto de 2016 e, tendo-se presente que o trânsito em julgado ocorrerá depois desta data, a sentença terá de ser revogada e substituída por outra que declare a caducidade do dito vínculo, atento o facto de terem passado seis meses sobre os 70 anos do Autor.
11.0- Apenas para o caso de se vir a concluir que a sentença ora posta em crise não padece do erro de aplicação do direito supra invocado, então sempre se dirá que o montante atribuído a título de indemnização é manifestamente excessivo e desproporcional à situação em apreço, antes devendo ser fixado em 15 dias por cada ano de antiguidade. Por último,
12.°- Ressalvado o devido respeito, só no momento em que o tribunal fixou o montante da compensação, isto é, na sentença, é que podem ser computados os correspondentes juros de mora e,
não, como se decidiu, a partir da citação.»
No que toca à questão dos 70 anos do trabalhador, perfeitos em Agosto do corrente ano de 2016 e à invocada aplicação dos números 3 e 2 do artigo 348.° do CT/2009, diremos, por um lado, que a mera circunstância do Autor ter alcançado a referida idade não significa, em si e só por si, a caducidade do vínculo laboral mas a mera conversão do contrato de trabalho por tempo indeterminado em contrato de trabalho a termo certo por 6 meses, havendo, nessa medida e salvo o devido respeito pela referida alegação, alguma confusão e contradição na alegação feita pela Ré a esse respeito.
Ora, a ser assim, e interpretando tal parte das alegações de recurso da Apelante como uma denúncia de tal vínculo convertido e de cariz precário, a mesma só poderia provocar a caducidade do mesmo no final do termo desse primeiro período de 6 meses e que só se se atingiria em 16/2/2017, não se compreendendo assim o pedido de revogação da sentença recorrida e sua substituição pela indicada na conclusão 10.a acima transcrita.
Temos, contudo, para nós, aí acompanhando o já referido Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 19 de Dezembro de 2012, Processo n.°
3747/ 09. 2TTLSB. L 1-4, que É totalmente irrelevante o facto de o trabalhador, entretanto despedido, ir perfazer a breve trecho 70 anos, pois não somente nos deparamos com uma
situação fora da normalidade e da norma, porque violadora do regime legal aplicável - dado traduzir-se num despedimento ilícito, promovido pela Ré - que, por força do reconhecimento e declaração judicial correspondentes, faz acionar o regime imperativo dos artigos 389.° a 392.° do C.T./2009, o que, em nosso entender, veda e bloqueia qualquer intervenção ou atuação da entidade empregadora que vise obstar ou travar os efeitos jurídicos aí previstos, como o recorrido não pretende retornar profissionalmente ao seio da empresa, dado ter pedido a indemnização em substituição da reintegração que o artigo 391.° do CT/2009 lhe confere.
Ponderando agora o valor da indemnização que foi atribuída ao Autor e que se situou no ponto intermédio entre os limites máximos e mínimos previstos no citado artigo 391.°, número 1, temos que atender aos critérios enunciados no final da referida disposição legal - valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.° - e afirmar que o grau de ilicitude em causa é médio (alínea c) do artigo 381.°) e o montante da retribuição é já considerável (€ 1.421,65), o que, segundo o que tem vindo a ser defendido pelo Supremo Tribunal de Justiça [33], nos leva a reduzir o quantitativo anual a considerar para tal efeito para 20 dias de retribuição por cada ano completo ou fração de antiguidade.
Finalmente, quanto aos juros de mora e à condenação da Ré no seu pagamento desde a data da citação desta última até à integral liquidação da compensação (a Ré quer-se referir, verdadeiramente, à indemnização do artigo 391.° do CT/ 2009, conforme ressalta da parte correspondente das alegações e não à compensação prevista no artigo 390.°, número 1, do mesmo diploma legal), o respetivo montante só se apura com o trânsito em julgado da sentença (melhor dizendo, do presente Aresto), o que implica que não só tal condenação fique aquém do peticionado pelo Autor como inclusive do regime do artigo 805.°, número 1, do Código Civil, que foi aplicado pelo tribunal da 1.a instância, só sendo devidos juros de mora desde o dia imediato à formação do caso julgado material quanto ao quantum da dita indemnização.
Logo, pelos fundamentos expostos, julga-se parcialmente procedente nesta última vertente jurídica o recurso de Apelação da Ré, alterando-se, nessa precisa medida, a sentença recorrida (fixação do valor da indemnização e juros de mora devidos sobre esta última).
IV - DECISÃO
Por todo o exposto, nos termos dos artigos 87.° do Código do Processo do Trabalho e 662.° e 663.° do Novo Código de Processo Civil, acorda-se na 4.a Secção do Tribunal da Relação de Lisboa no seguinte:
a) Em julgar procedente o presente recurso de apelação interposto por E..., SA na sua vertente de impugnação da Decisão sobre a Matéria de Facto, decidindo-se, nessa medida, aditar três novos Pontos à Factualidade dada como Provada (Pontos 14, 15 e 16);
b) Em julgar parcialmente procedente o presente recurso de apelação interposto por E..., SA, na sua vertente jurídica, decidindo-se, nessa medida, alterar a sentença recorrida no que concerne ao valor da indemnização em substituição da reintegração que é devida ao Autor e que se fixa em 20 dias de retribuição por cada ano completo ou fração de antiguidade contada desde 1/10/2007 até ao trânsito em julgado deste Aresto, vencendo-se juros de mora sobre essa indemnização desde o dia imediato a tal trânsito em julgado até efetivo e integral pagamento do montante indemnizatório;
c) Em tudo o mais se confirma o teor da mesma sentença recorrida.
Custas da ação e do presente recurso a cargo do Autor e da Ré na proporção do decaimento - artigo 527.°, número 1 do Novo Código de Processo Civil. Registe e notifique.

Lisboa, 25 de janeiro de 2017
José Eduardo Sapateiro
Alves Duarte
Maria José Costa pinto


Sumário
I - A falta ou deficiência da gravação da prova produzida em Audiência Final constitui uma nulidade processual secundária que tem de ser arguida no prazo de 10 dias, no tribunal recorrido, podendo ser depois impugnado o despacho que indeferir a mesma, por intermédio de recurso de Apelação, a interpor depois do recurso deduzido contra a sentença final, caso o referido despacho tenha sido prolatado após esse sentença.
II - A relação que existe entre os art.°s 68.° do C.P.T. e 155.° do NCPC é a de um regime especial (o primeiro) para com um regime geral ou comum (o segundo), não tendo este último a virtualidade de revogar o que de particular ou específico aquele consagra para além ou contra a sua própria letra, alcance e sentido, não se podendo, por exemplo, procurar estender a todo e a qualquer processo laboral onde, por força do regime do artigo 155.° do NCPC, se deve fazer a gravação de todos os atos praticados nas Audiências Finais a possibilidade das partes recorrerem da Decisão sobre a Matéria de Facto que aí for proferida, dado que os limites de cariz quantitativo e qualitativo para o registo da prova para efeitos de tal recurso são os definidos especialmente pelo artigo 68.°, números 1 a 3, do CPT.
III - Muito embora a não gravação das alegações orais dos advogados das partes se configure como uma irregularidade processual, a mesma não tem a virtualidade de influir no exame ou na decisão da causa, não implicando assim a nulidade da Audiência Final.
IV - O artigo 392.°, por referência também ao disposto na al. c) do art.° 387.°, ambos do Código do Trabalho de 2003 regulam uma situação muito específica e concreta: a da existência de uma relação laboral fundada num contrato de trabalho por tempo indeterminado que, apesar da reforma
por velhice comunicada ao trabalhador e ao empregador, se continua a desenvolver por um período superior a 30 dias contado desde a última das comunicações feita a um deles pela Segurança Social, com referência à concessão da dita reforma em razão da idade do empregado, implicando tal cenário a constituição de um vínculo de trabalho por termo certo de 6 meses renováveis.
V - As duas disposições citadas em IV implicam a extinção por caducidade do contrato de trabalho por tempo indeterminado e a formação de um segundo contrato com termo certo, nas situações em que o trabalhador reformado por velhice se mantenha ao serviço do mesmo empregador por período superior a 30 dias, nos moldes referidos no Ponto anterior.
VI - Também do ponto de vista dos regimes legais contributivos e de proteção social dos funcionários públicos e dos trabalhadores assalariados do sistema privado, resulta uma lógica e regulamentação próprias e independentes das dos demais.
VII - Nada impede, no regime laboral em vigor em 2007 ou em 2015, que um trabalhador aposentado ou reformado celebre os contratos de trabalho que bem entenda, quer com a sua antiga entidade empregadora, quer com outras empresas ou pessoas singulares, e por tempo indeterminado ou a termo certo ou incerto, desde que a lei laboral aplicável o consinta.
VIII - A recorrente não podia considerar, por sua auto recriação e em virtude da aposentação do Autor da função pública, que tal implicava, ao abrigo dos n.°s 1 e 2 do artigo 392.° do Código do Trabalho de 2003, a celebração, ab initio, de um contrato de trabalho a termo certo ou uma qualquer «conversão jurídica», a partir de Outubro de 2008, do contrato de trabalho por tempo indeterminado que mantinha com o recorrido em contrato de trabalho a termo certo, por seis meses renováveis, livremente denunciável pela mesma nos moldes ali previstos, correspondendo, nessa medida, a um despedimento ilícito, porque não precedido de procedimento disciplinar e de invocação de justa causa, a declaração oportunamente vertida na carta de fls. 16 e 17.
IX - A mera circunstância do trabalhador no ativo alcançar a idade de 70 anos não significa, em si e só por si, a caducidade do vínculo laboral mas a mera conversão do contrato de trabalho por tempo indeterminado que mantenha com a sua entidade empregadora em contrato de trabalho a termo certo por 6 meses, nos termos dos n.°s 3 e 2 do art.° 348.° do CT/2009.
X - O facto do trabalhador despedido ir fazer brevemente 70 anos é juridicamente irrelevante, pois não somente nos deparamos com uma situação fora da normalidade e da norma, porque violadora do regime legal aplicável - dado traduzir-se num despedimento ilícito, promovido pela Ré - que, por força do reconhecimento e declaração judicial correspondentes, faz acionar o regime imperativo dos artigos 389.° a 392.° do C.T./2009, o que, em nosso entender, veda e bloqueia qualquer intervenção ou atuação da entidade empregadora que vise obstar ou travar os efeitos jurídicos aí previstos, como o recorrido não pretende retornar profissionalmente ao seio da empresa, dado ter pedido a indemnização em substituição da reintegração que o artigo 391.° do CT/2009 lhe confere.
XI - Ponderando o valor da indemnização que foi atribuída ao Autor e que se situou no ponto intermédio entre os limites máximos e mínimos previstos no citado artigo 391.°, número 1, temos que atender aos critérios enunciados no final da referida disposição legal - valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381.° - e afirmar que o grau de ilicitude em causa é médio (alínea c) do artigo 381.°) e o montante da retribuição é já considerável (€ 1.421,65), o que, segundo o que tem vindo a ser defendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos leva a reduzir o quantitativo anual a considerar para tal efeito para 20 dias de retribuição por cada ano completo ou fração de antiguidade.
XII - Os juros de mora relativos à indemnização em substituição da reintegração só são devidos a partir do trânsito em julgado da correspondente decisão condenatória.