Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
Assunto    Área   Frase
Processo   Sec.                     Ver todos
 - ACRL de 08-03-2017   Personalidade colectiva. Uso abusivo. Desconsideração.
Naquelas situações em que se verifique que a personalidade colectiva é usada de modo ilícito ou abusivo para prejudicar terceiros, nomeadamente para retirar direitos e garantias a trabalhadores, existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, cumpre desconsiderá-la.
Proc. 3607/14.5T8SNT 4ª Secção
Desembargadores:  Leopoldo Soares - José Eduardo Sapateiro - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
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TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
Processo n ° 3607/14.5T8SNT
R..., residente na Rua …, Mem Martins, patrocinado pelo M°P, intentou 'acção , com processo comum, contra S..., Lda, com sede no Forum …, Rio de Mouro. Pede que :
- seja reconhecida a existência de um contrato sem termo celebrado entre ele e a Ré S..., Lda, (por formação na sua esfera desde 19 de Outubro de 2013, ou por transmissão da S..., Lda, desde 23 de Novembro de 2013).
- não sendo reconhecida a existência do contrato de trabalho sem termo, seja considerada a inexistência de período experimental no contrato a termo certo assinado entre ambos por falta de cabimento legal na situação concreta.
- Em consequência da procedência desses pedidos, solicita , ainda , que
- seja declarada a ilicitude do seu despedimento ocorrida em 22 de Dezembro de 2013.
- a Ré seja condenada a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde 22 de Dezembro de 2013 até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declarar a ilicitude do despedimento, com a dedução prevista no artigo 390° n° 2 al. b).
- a Ré seja condenada a reintegrá-lo ou, em substituição desta reintegração, ao pagamento de 1.561,50€.
- a Ré seja condenada a pagar-lhe juros vencidos e vincendos sobre as quantias em dívida até integral pagamento.
Alega, em síntese, que , desde 18 de Outubro de 2011, trabalhou para a S... - Restauração, Lda., como empregado de balcão, no Centro Comercial Fórum Sintra.
Auferia a retribuição mensal de € 520,50.
Desde aquela data até 1 de Outubro de 2013, exerceu as suas funções no restaurante A..., sito naquele Centro Comercial. Por carta datada de 26 de Setembro de 2013, a S..., Lda., comunicou-lhe a caducidade do contrato com efeitos a partir de 18 de Outubro de 2013.
A partir de 2 de Outubro daquele ano, por indicação da sua entidade patronal, passou a exercer as funções de empregado de balcão no restaurante I..., localizado no mesmo espaço comercial.
Auferia igual vencimento.
Ali permaneceu a trabalhar, de forma ininterrupta mesmo depois de 18 de Outubro de 2013.
Em 23 de Novembro de 2013 , foi entregue-lhe para assinar um contrato de trabalho a termo certo em que figurava com empregador a aqui Ré, figurando ele como forneiro - aspirante.
O trabalho era prestado na sede da empregadora, no supra citado Centro Comercial.
Veio a receber uma comunicação escrita da Ré, datada de 9 de Dezembro de 2013, que o informava da denúncia do contrato de trabalho com efeitos a partir de 22 de Dezembro de 2013.
Realizou-se audiência de partes.2
A Ré contestou.
Alegou, em resumo, a sua ilegitimidade.
Mais impugnou parte da factualidade alegada pelo Autor.
Referiu que o Autor foi contratado por si em 23 de Novembro de 2013 passando a exercer as funções de forneiro - aspirante no seu estabelecimento comercial.
Contudo , entrou de baixa médica em 27 de Novembro de 2013, pelo período de 11 dias.
O contrato foi denunciado em 9 de Dezembro de 2013 no decurso do período experimental.
Assim pugnou pela sua absolvição.
O Autor respondeu.
Reiterou a legitimidade da Ré e concluiu como na petição inicial. Foi proferido despacho saneador, no qual não se conheceu da excepção de ilegitimidade, por prejudicada.5
Dispensou-se a fixação de matéria assente e controvertida. 6 O valor da causa foi fixado em € 1. 561,50.
Realizou-se julgamento, em duas sessões$, ,que foi gravado. Em 12 de Julho de 2016, foi proferida sentença 9que , em sede dispositiva, teve o seguinte teor:
Face ao exposto julga-se a acção procedente, e:
- Reconhece-se existência de um contrato de trabalho sem termo celebrado entre o Autor e a Ré S..., Lda. e declara-se a ilicitude do despedimento do Autor ocorrido em 22 de Dezembro de 2013;
- Condena-se a Ré a pagar ao Autor as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare ilícito o despedimento, nos termos do art. 390.° do mesmo diploma, e as quais se computam a título provisório, na presente data em € 15.615,00, com as deduções contidas no n.° 2 daquela disposição legal.
- Condena-se a Ré a pagar ao Autor uma indemnização prevista no art. 391.° n.° 1 e 3 do Código do Trabalho no valor de € 1.561,50 ou em alternativa, a reintegrar o Autor nos termos do art. 389.° n.° 1 ai. b) do Código do Trabalho, devendo este ser notificado para se manifestar nos termos do art. 391.° n.° 1 do mesmo diploma.
- Condenar a Ré a pagar ao Autor o valor correspondente aos juros devidos sobre as quantias melhor identificadas supra, desde a data do seu vencimento até efectivo e integral pagamento.
Custas pela Ré (cfr. art. 527.° n.° 1 do CPC).
Registe e notifique. - fim de transcrição.
A Ré recorreu.
Concluiu que:
I - Esteve mal o Tribunal a quo ao decidir como decidiu, julgando a ação procedente.
II - O recurso versa sobre matéria de facto e de direito, sendo as questões a decidir as seguintes:
- Aferir se o Tribunal a quo errou na apreciação que fez da matéria de facto, com a consequente implicação que tal erro terá na decisão da causa;
- Aferir se o autor possuía, ou não, um contrato de trabalho sem termo celebrado com a apelante, e se foi lícita ou ilicitamente despedido em 22 de dezembro de 2013, com as necessárias consequências de pagamento de retribuições, indemnização e juros devidos,
caso se conclua pela ilicitude do despedimento.
III - Esteve mal o Tribunal a quo ao dar como provados os pontos de facto com as letras C, E e F, sendo estes os concretos pontos de facto que se consideram incorretamente julgados.
Entende ainda a apelante que face à prova produzida deverá ser esclarecido o concreto ponto de facto com a letra R.
IV - Nos termos do art.° 574° do C.P.C., a apelante contestou os factos alegados pelo autor, estando os mesmos claramente em oposição com os factos alegados na petição inicial.
A apelante cumpriu o dever de tomar posição definida perante os factos que se pretendia impugnar.
V - Mal andou o tribunal a quo ao considerar provados os factos C, E e F, fundamentando a sua decisão no facto da apelante ter aceitado a factualidade referente às vicissitudes contratuais ocorridas desde o início da sua relação com o autor, nomeadamente aquelas que se reportam à mudança de estabelecimentos e respetivas datas.
VI - A prova produzida, nomeadamente, os documentos juntos aos autos, tal como, as declarações do próprio autor e os depoimentos das testemunhas inquiridas, R..., Ana Sofia Carvalho e André Souza Santos, imponham decisão diversa sobre estes concretos pontos de facto.
VII - Face ao depoimento das referidas testemunhas, que o tribunal a quo inclusivamente considerou credíveis e isentos, reveladores de conhecimento direto e imediato dos factos, entende a apelante que foram incorretamente julgados os pontos de factos C, E e F, impondo decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da ora recorrida.
VIII - A apelante entende que a decisão a ser proferida sobre as questões de facto impugnadas deverá ser a seguinte:
C. Desde a data em que firmou aquele contrato até ao dia 18 de outubro de 2013 o autor esteve a trabalhar como empregado de balcão no restaurante A..., naquele centro comercial.
E. Não provado.
F. Não provado.
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré, denominado E…, situado lado a lado com o restaurante A…, este pertencente à entidade S..., Lda., com equipas e chefias próprias, não se confundindo um com o outro.
IX - No pressuposto de ser alterada a decisão sobre a matéria de facto, a conclusão a que temos de chegar é de que não poderá a pretensão do autor ser procedente devendo a apelante ser absolvida de todos os pedidos formulados.
X - A fixação do período experimental não carece de estipulação escrita das partes, tanto mais que resulta diretamente da Lei e do C.C.T. aplicável. A lei apenas exige a estipulação escrita apenas quando as partes pretendam a exclusão do período experimental.
XI - No decurso do período experimental de 30 dias era lícito a qualquer das partes denunciar o contrato, sem invocação de justa causa nem direito a indemnização.
XII - Tendo ficado demonstrado que o autor celebrou com a apelante o contrato de trabalho em 23 de novembro de 2013, dia em que passou a desempenhar as funções no restaurante E..., e que a apelante denunciou esse contrato em 9 de dezembro de 2013, terá de se concluir que a cessação do vínculo laborai foi operada de forma lícita.
XIII - O objeto do presente recurso versa também na reapreciação da fundamentação do direito aplicável à matéria de facto dada como provada e respetiva decisão.
XIV - O Tribunal a quo errou na aplicação da matéria de direito ao caso concreto, já que chegou a uma conclusão que não decorre
minimamente da prova produzida.
XV - Não existiu qualquer transmissão do estabelecimento, e em consequência, não houve qualquer transmissão da posição da entidade empregadora.
XVI - Sempre existiram, lado a lado, os dois restaurantes denominados A... e E..., os quais são totalmente diferentes e
independentes um do outro, com funcionários próprios, equipas e chefias próprias e com conceitos diferentes.
XVII - Pelo exposto, não tem aplicação ao caso concreto o vertido na norma prevista no artigo 285.° n.° 1 do Código do Trabalho.
XVIII - Por outro lado, assim, ainda que se entendesse (o que não se aceita mas apenas se equaciona) que o contrato do autor com a apelante era sem termo, e que produziria efeitos desde o dia 19 de outubro de 2013, a verdade é de que tal não invalida a existência de um período experimental.
XIX - Para os contratos de trabalho sem termo, no caso da generalidade dos trabalhadores, a Lei estipula que o prazo para denúncia é de 90 dias.
XX - Tendo a apelante denunciado o contrato ao abrigo do período experimental, ainda que ocorrido em 9 de dezembro de 2013, estaria dentro do prazo de 90 dias previsto na Lei e na Convenção Coletiva de Trabalho aplicável ao sector.
XXI - Face ao exposto, entende a apelante que foram violadas as normas jurídicas constantes do Art.° 574.° n.° 1 e 2 do Código de Processo Civil, Art.s° 111.0, 112.° n.° 2 a), 114.° n.° 1, 285.° n.° 1, todos do Código do Trabalho, e cláusula 6.a n.° 1 do CCT celebrado entre a AHRESP e a FESAHT e publicado no BTE 3/2012.
XXII - Pelo que se requer a revogação da decisão recorrida, determinando-se a sua substituição por outra que declare lícita a cessação do contrato de trabalho a termo celebrado entre o A. e a apelante S..., ocorrido em 22 de dezembro de 2013, por denúncia dentro do período experimental, julgando-se improcedentes os demais pedidos formulados pelo mesmo por falta de fundamento legal. - fim de transcrição.
Assim, sustenta que deve ser revogada a sentença recorrida, e substituída por outra que determine a licitude da cessação do contrato com o autor, por denúncia dentro do período experimental, e em consequência, julgando-se improcedente todos os demais pedidos formulados pelo mesmo.
O Autor , representado pelo M°P, contra alegou.
Concluiu que:
1. Da mera leitura da contestação se retira que a Ré não assume em ponto algum qualquer posição sobre o período em que o Autor esteve a trabalhar por conta da sua anterior empregadora, mais concretamente a S..., Lda.
Em consequência desta falta de impugnação, expressa ou implícita, nada há a apontar ao facto dado como assente no o ponto 4 da petição inicial (correspondente ao ponto C da sentença sub judice).
2. Limitando-se a Ré a dizer que o Autor foi contratado por si no dia 23 de Novembro de 2013 e que foi a partir de tal data que passou a exercer as funções de aspirante no estabelecimento comercial da Ré, não está a impugnar o facto alegado na petição inicial de que, já antes dessa data, também o Autor trabalhava naquele mesmo local como empregado de balcão da Ré, por determinação da sua anterior entidade empregadora (a S..., Lda).
3. Não tendo a Ré impugnado de forma expressa este facto, e não sendo ele incompatível com a versão dos factos que apresentou, então confessou-o, razão pela qual não se encontra fundamento para colocar em crise o facto dado como assente nos pontos E e F da sentença recorrida.
4. Indiciando-se da prova produzida (não propriamente das testemunhas indicadas pela Ré, que produziram depoimentos alinhados entre si, mas que não podem ser descontextualizados do depoimento espontâneo da testemunha J... que descreveu não só os termos do convite que recebeu da representante da Ré para testemunhar, como atestou a forma de funcionamento diário daqueles restaurantes), a existência de uma gerência partilhada entre os estabelecimentos de restauração explorados pela Ré e pela sociedade S..., Lda, pautada por entre ajuda traduzida na frequente transferência de funcionários entre si para resposta as pontuais exigências de cada jornada de trabalho; e estando documentalmente comprovadas as semelhanças entre estas duas sociedades, traduzidas na partilha de sócios e sede e identidade de objecto social, não há qualquer fundamento para aditar ao ponto R da sentença recorrida e os restaurantes A... e E... tinham equipas e chefias próprias e que não se confundiam um com outro.
5. Com base na matéria de facto apurada, e relativamente à qual nenhum reparo há a fazer, nada há a assinalar à aplicação que nela foi feita do direito, sustentado o Autor que o contrato de trabalho firmado com a S..., Lda, em 18 de Outubro de 2011 se transferiu para a esfera da Ré e que, em consequência, o despedimento de que foi alvo no dia 22 de Dezembro de 2013 por parte desta, por não ter sido precedido de qualquer procedimento legalmente previsto, foi ilícito, resultando daqui a condenação da Ré ao pagamento de indemnização e dos salários que deixou de lhe pagar desde 07 de Outubro de 2014 até ao trânsito em julgado da sentença.
6. Não se considerando a transmissão do contrato acima referida, entende o Autor que, em face da concreta forma de funcionamento das sociedades envolvidas, deve ser considerada a inexistência do período experimental aposto no contrato a termo celebrado entre o Autor e a Ré em 23 de Novembro de 2013 (pelo facto de a Ré conhecer o trabalho do Autor pelo menos desde 18 de Outubro de 2011) e, em consequência, ser declarado ilícito o despedimento ocorrido no dia 22 de Dezembro de 2013 com as consequências indemnizatórias para tal situação legalmente previstas. - fim de transcrição.
Sustenta, pois, que deve manter-se a sentença recorrida, que não violou qualquer norma legal, nos seus exactos termos.
O recurso foi admitido.
Foram colhidos os vistos.
Nada obsta ao seu conhecimento.
Eis a matéria de facto dada como assente em 1a instância (que foi impugnada):
A. No dia 18 de Outubro de 2011 o Autor Rodrigo Soares firmou contrato de trabalho a termo certo por seis meses com a S... - Restauração, Lda., nos termos do qual começou a trabalhar sob as ordens, direcção e fiscalização desta como empregado de balcão de 2ª
B. Esse trabalho era prestado na sede desta sociedade, sita no Centro Comercial Fórum Sintra, mediante a retribuição mensal de € 520,50.
C. Desde a data em que firmou aquele contrato até ao dia 1 de Outubro de 2013 o Autor esteve a trabalhar como empregado de balcão no restaurante A..., naquele centro comercial.
D. No dia 26 de Setembro de 2013 a S..., Lda., comunicou por escrito ao Autor que fez operar a caducidade do contrato com efeitos a partir de 18 de Outubro daquele ano.
E. A partir do dia 2 de Outubro, e por indicação da sua entidade patronal, o Autor passou a exercer as mesmas funções de empregado de balcão no restaurante E..., localizado também no Centro Comercial Fórum Sintra, auferindo o mesmo vencimento.
F. Onde permaneceu a trabalhar ininterruptamente desde aquela data e depois do dia 18 de Outubro de 2013.
G. No dia 23 de Novembro de 2013 a supervisora do Autor entregou-lhe para assinar um contrato de trabalho a termo certo em que figurava como empregador a Ré S... - Restauração Lda.
H. Nos termos deste contrato, que o Autor assinou por lhe ter sido assim determinado, o Autor foi contratado como forneiro-aspirante, mediante a retribuição de 520,50€, sendo o trabalho prestado na sede da empregadora, sita no Centro Comercial Fórum Sintra. 1. No dia 9 de Dezembro de 2013, quando se apresentou ao serviço, o Autor recebeu da Ré uma comunicação escrita que o informava da denúncia do contrato de trabalho com efeitos a partir do dia 22 desse mês por se encontrar em período experimental.
J. O Autor deixou de trabalhar naquele local a partir do dia 22 de Dezembro de 2013.
K. A Ré não entregou ao Autor qualquer outro documento para justificar a cessação do contrato de trabalho.
L. Tal como não fez anteceder esta cessação de qualquer procedimento.
M. A Ré, na pessoa dos seus legais representantes e dos demais trabalhadores que diariamente contactavam com este, designadamente os supervisores, conheciam o Autor e o trabalho que este desenvolvia pelo menos desde 18 de Outubro de 2011.
N. A sociedade S... Restauração, Lda., é uma sociedade por quotas constituída em Dezembro de 2010, que tem por objecto a actividade de restauração, charcutaria, cafetaria, pastelaria, padaria, cervejaria e bar, bem como a prestação de serviços, catering e a representação e comercialização de bens e produtos conexos com aquela actividade.
O. Tem sede no Fórum Sintra, loja 2.04, IC 19, em Sintra, Alto do Forte, e são seus gerentes F... e B..., sendo seus sócios, para além destes dois, P... e C....
P. Ao passo que a Ré sociedade S..., Lda., é uma sociedade por quotas constituída em Abril de 2011 que tem por objecto a actividade de restauração, charcutaria, cafetaria, pastelaria, padaria, cervejaria e bar, bem como a prestação de serviços, catering e a representação e comercialização de bens e produtos conexos com aquela actividade.
Q. Tem sede no Fórum Sintra, loja …, em Sintra, Alto do Forte, e são seus gerentes F... e B..., sendo seus sócios, para além destes dois, P..., C..., F..., J... e L....
R. A partir de 23 de Novembro de 2013 o Autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré.
S. A Ré procedeu à inscrição do trabalhador junto da Segurança Social.
T. Por carta registada com aviso de recepção, datada de 9 de Dezembro de 2013 e recepcionada no dia seguinte, a Ré denunciou o contrato celebrado com o Autor ao abrigo do regime do período experimental.
U. No dia 23 de Dezembro de 2013, o Autor subscreveu um documento de quitação no qual declarando que nada mais havia a receber da Ré.

Em sede de sentença mais se consignou como factos não provados os seguintes:
1. No dia 26 de Novembro de 2013, quando carregava mercadoria no restaurante E..., o Autor fez uma entorse no ombro, tendo comunicado este facto à sua supervisora que, por seu turno, se recusou a participar à seguradora a ocorrência como acidente de trabalho.
2. No dia 27 de Novembro de 2013, e na sequência de uma luxação no ombro decorrente daquela entorse que lhe foi diagnosticada no serviços de urgências do Hospital de Cascais onde o se deslocou pelos seus meios, o Autor entrou em situação de baixa médica pelo período de 11 dias.
3. O Autor entrou em situação de baixa médica no dia 27 de Novembro de 2013 pelo período de 11 dias.
4. Tal situação não se deveu a ocorrência de acidente de trabalho.

A justificação da matéria de facto foi a seguinte:
O Tribunal teve em consideração a prova produzida e analisada em sede de audiência de julgamento, a saber, não apenas o teor dos documentos juntos aos autos, e os quais não mereceram quaisquer desmérito mas também os depoimentos das testemunhas inquiridas nesta sede, as quais revelaram um conhecimento directo e imediato dos factos pelos quais foram chamadas a testemunhar, tendo-o feito com credibilidade e isenção.
Assim, certo é que a Ré não impugnou a factualidade alegada pelo Autor com excepção das questões referentes às baixas médicas do mesmo, reiterando a bondade do contrato por si celebrado em Novembro de 2013, assim como a denúncia do mesmo.
Na prática, a Ré aceitou a factualidade referente às vicissitudes contratuais ocorridas desde o início da sua relação com o Autor, nomeadamente aquelas que se reportam à mudança de estabelecimentos (restaurantes) e respectivas datas.
No mais, é de reter que da documentação junta aos autos retira-se, sem qualquer margem de dúvidas quais os contratos celebrados por escrito com o Autor, assim como o seu objecto e âmbito, quais as cartas por este recepcionadas e referentes ao termo desses mesmos contratos, quais os vencimentos auferidos pelo Autor, assim como quais os descontos efectuados no âmbito do exercício da actividade do Autor. De salientar que, do registo das contribuições pagas à Segurança Social e constantes de fls. 36 e 37 dos autos e referentes ao período entre Outubro de 2008 e Dezembro de 2013 retira-se que o Autor beneficiou descontos por parte da empresa S... - Restauração Lda. até Outubro de 2013.
Nesta sequência, há que reter que o Tribunal não considerou a matéria referente às baixas médicas do Autor como não provadas uma vez que tal matéria deveria ter sido provada por documentos comprovativos da sua situação de saúde, tais como atestados ou certificados de incapacidade temporária, ou pelo menos, de documentação médica capaz de fazer prova bastante sobre a situação em apreço, o que não sucedeu.
Por fim, o Tribunal não respondeu à matéria iminentemente jurídica assim como aos factos conclusivos alegados pelas partes. - fim de transcrição.

É sabido que o objecto do recurso apresenta-se delimitado pelas conclusões da respectiva alegação (artigos 635° e 639° ambos do Novo CPC ex vi do artigo 87° do CPT /2010)15.
Analisadas as conclusões do recurso constata-se que comportam três vertentes distintas.
A primeira diz respeito à impugnação da matéria de facto. Segundo a recorrente os pontos de facto com as letras C, E e F (os quais têm o seguinte teor:
C. Desde a data em que firmou aquele contrato até ao dia 1 de Outubro de 2013 o Autor esteve a trabalhar como empregado de balcão no restaurante A..., naquele centro comercial.
E. A partir do dia 2 de Outubro, e por indicação da sua entidade patronal, o Autor passou a exercer as mesmas funções de empregado de balcão no restaurante I..., localizado também no Centro Comercial Fórum Sintra, auferindo o mesmo vencimento.
F. Onde permaneceu a trabalhar ininterruptamente desde aquela data e depois do dia
18 de Outubro de 2013) foram incorrectamente julgados .
Também sustenta que em face da prova produzida deve ser esclarecido
o ponto de facto R ( nele se consignou : R. A partir de 23 de Novembro de 2013 o
Autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré
Entende , pois, que a decisão a ser proferida sobre as questões de facto impugnadas deve ser a seguinte:
C. Desde a data em que firmou aquele contrato até ao dia 18 de outubro de 2013 o autor esteve a trabalhar como empregado de balcão no restaurante A..., naquele centro comercial.
E. Não provado.
F. Não provado.
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré, denominado E..., situado lado a lado com o restaurante A..., este pertencente à entidade S..., Lda., com equipas e chefias próprias, não se confundindo um com o outro.
Será assim ?
Tal como resulta da fundamentação da matéria de facto o Tribunal a a quo deu como assentes os factos C, E e F com base no seguinte raciocínio:
Assim, certo é que a Ré não impuqnou a factualidade alegada pelo Autor com excepção das questões referentes às baixas médicas do mesmo, reiterando a bondade do contrato por si celebrado em Novembro de 2013, assim como a denúncia do mesmo.
Na prática. a Ré aceitou a factualidade referente às vicissitudes contratuais ocorridas desde o início da sua relação com o Autor, nomeadamente aquelas que se reportam à mudança de estabelecimentos (restaurantes) e respectivas datas. - fim de transcrição.
A recorrente, porém, sustenta que:
IV - Nos termos do art.° 574° do C.P.C, a apelante contestou os factos alegados pelo autor, estando os mesmos claramente em oposição com os factos alegados na petição inicial.
A apelante cumpriu o dever de tomar posição definida perante os factos que se pretendia impugnar.
V - Mal andou o tribunal a quo ao considerar provados os factos C, E e F, fundamentando a sua decisão no facto da apelante ter aceitado a factualidade referente às vicissitudes contratuais ocorridas desde o início da sua relação com o autor, nomeadamente aquelas que se reportam à mudança de estabelecimentos e respetivas datas - fim de transcrição.
Analisada a petição inicial e a contestação , salvo o devido respeito por opinião diversa , afigura-se-nos que a matéria dada como provada em C, E e F ( de acordo com a qual:
C. Desde a data em que firmou aquele contrato até ao dia 1 de Outubro de 2013 o Autor esteve a trabalhar como empregado de balcão no restaurante A..., naquele centro comercial.
E. A partir do dia 2 de Outubro, e por indicação da sua entidade patronal, o Autor passou a exercer as mesmas funções de empregado de balcão no restaurante I..., localizado também no Centro Comercial Fórum Sintra, auferindo o mesmo vencimento.
F. Onde permaneceu a trabalhar ininterruptamente desde aquela data e depois do dia 18 de
Outubro de 2013) que foi alegada em sede de petição inicial ( leia-se os artigos 4, 6 e 7 desse articulado) não foi impugnada nem expressa nem tacitamente na contestação.
Efectivamente , lida - e relida - a contestação não se detecta que tal matéria tenha sido expressa ou mesmo tacitamente impugnada. E nem se esgrima, porque isso não decorre da contestação que deve considerar-se impugnada nesse articulado da Ré por estar em oposição com a defesa considerada no seu conjunto.
Para se ter como operado esse tipo de impugnação não basta negar de forma genérica o direito invocado pelo Autor.
Recorde-se que , nos termos do n° 1 ° do artigo 574° do NCPC, ao
contestar, deve o réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.
Como tal, a nosso ver, salvo melhor opinião, de nada releva em relação aos pontos de facto em causa que a prova produzida, nomeadamente, os documentos juntos aos autos, tal como, as declarações do Autor e os depoimentos das testemunhas inquiridas, R..., Ana Sofia Carvalho e André Souza Santos, até pudessem apontar noutro sentido sobre tal matéria.
Assim, à Ré neste particular dir-se-á tão só sibi imputet...!!!
E em relação ao ponto de facto R) ?
Este logrou o seguinte teor:
R. A partir de 23 de Novembro de 2013 o Autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré.
De acordo a recorrente tal matéria deve ser completada nos seguintes moldes:
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré, denominado Eatalv, situado lado a lado com o restaurante A..., este pertencente à entidade S..., Lda., com equipas e chefias próprias, não se confundindo um com o outro. Neste ponto saliente-se que o Autor nas suas contra alegações deixou consignado o seguinte:
c) Facto R
E na sequência do que se vem expondo, entende o Ministério Público que é inaceitável a sugestão de aditamento ao facto R sugerido pela Ré no que respeita aos dois últimos segmentos.
Assim, e pese embora nada haja a opor a que se considere que o E... está lado a lado com o A..., e que
este último pertence à S..., Lda, já no que respeita a terem equipas e chefias próprias, está lonqe de ser este um facto apurado em sede de julqamento.
Ao contrário, o que se provou foi a existência de uma gerência partilhada, não só entre estes estabelecimentos como ainda de um outro de restauração, pautada por entre ajuda traduzida na frequente transferência de funcionários entre si para resposta as pontuais exigências de cada jornada de trabalho (nomeadamente ocasionadas por faltas de trabalhadores ou por picos de produção).
No que se refere concretamente o último segmento do texto cuja introdução se sugere, não mais é do que uma conclusão para o qual teria de contribuir todas outras matérias factuais que constituiriam as suas premissas. Isto é, para se saber se um estabelecimento não se confundia com o outro, importaria explicar porquê.
E se de facto um restaurante, por natureza, não se há-de confundir com o outro, mais não seja porque servem pratos de origens diferentes, já o mesmo não sucede no que respeita à confusão atinente
ao seu funcionamento, à sua exploração.
Neste ponto é perfeitamente equacionável que as sociedades exploradoras operem em concertação sobre um mesmo conjunto de bens e de empregados (o que inquestionavelmente ocorre quando se transferem trabalhadores de uns estabelecimentos para outros), residindo aqui a confusão que se pode gerar entre as entidades empregadoras, que as mais das vezes até podem ser criadas com estas mesma finalidade: a de justificar a sucessiva contratação a termo de trabalhadores bem para além dos limites legais estabelecidos - fim de transcrição.
E ouvida na íntegra a gravação do julgamento dir-se-á que não se vislumbra que o Tribunal a quo tenha cometido qualquer lapso evidente , manifesto, de valoração no tocante ao não consignar como provado que os restaurantes em causa ( o A... e o E...) tinham equipas e chefias próprias.
Recorde-se a título de exemplo o depoimento prestado pela testemunha J... e referências à supervisora C...e à mesma empresa...
E não se esqueçam , já agora , referências feitas durante o julgamento ao grupo A... - que é um grupo de
restauração que detém algumas marcas , são as mesmas pessoas que gerem... feitas pela testemunha R...
a instâncias da Exma Magistrada do M°P°.
Assim, neste ponto decide conferir-se ao ponto R a seguinte redacção:
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante
no estabelecimento comercial da Ré, denominado E..., situado lado a lado com o restaurante A..., este pertencente à entidade S…, Lda.
Procede , pois, parcialmente o recurso em sede factual nos supra mencionados termos.
A segunda vertente do recurso consiste em saber se o vertido na norma prevista no artigo 285.° n.° 1 do CT/2009 se aplica no caso concreto.
A tal título a recorrente sustenta que o Tribunal a quo errou na aplicação da matéria de direito ao caso concreto, já que chegou a uma conclusão que não decorre minimamente da prova produzida. Entende que não existiu qualquer transmissão do estabelecimento, e em consequência, não houve qualquer transmissão da posição da entidade empregadora.
A seu ver, sempre existiram, lado a lado, os dois restaurantes denominados A... e E..., os quais são totalmente diferentes e independentes um do outro, com funcionários próprios, equipas e chefias próprias e com conceitos diferentes.
Sobre este ponto, a sentença recorrida discorreu o seguinte:
C - Fundamentação de direito:
Assim, resultou provado que o Autor trabalhou para a sociedade S... - Restauração, Lda. até ao dia 18 de Outubro de 2013, data em que o seu contrato cessou por denúncia da mesma.
Resultou igualmente provado que o Autor iniciou a sua prestação profissional ainda ao serviço da empresa S... - Restauração, Lda., no restaurante I... em 02 de Outubro de 2013, tendo continuado a sua prestação nesse mesmo restaurante até à data em que cessou as suas funções em 22 de Dezembro de 2013.
Porém, também resultou provado que entre o dia 02 de Outubro de 2013 e o dia 22 de Dezembro de 2013 (datas essas entre as quais o Autor exerceu funções no restaurante I...) o Autor assinou um contrato de trabalho a termo certo com a Ré.
Ou seja, o Autor, e face à prova produzida nos autos, já se encontrava a trabalhar no restaurante em causa quando celebrou o contrato de trabalho com a Ré, e assim continuou até à cessação do mesmo, sem qualquer alteração salvo quanto à sua categoria profissional.
Posto isto, há que fazer apelo à norma constante do art. 285.° n.° 1 do Código do Trabalho a qual refere que:
Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contra-ordenação laborai.
Ou seia, desconhecendo-se os contornos exactos em que a empresa S... Lda. deixou de explorar o restaurante I... e quais os contornos exactos em que a empresa S.... Lda. (aqui Ré) passou a fazê-lo, o Tribunal não tem dúvidas, face à matéria de facto provada, de que essa transferência ocorreu mantendo-se o Autor a trabalhar no dito restaurante aquando de tal movimentação de empresas, as quais, pertencem ao mesmo grupo de pessoas (sócios e gerentes). Assim sendo, e ao abrigo da supra mencionada norma, é de salientar que a Ré assumiu a posição de empregadora no contrato de trabalho celebrado entre a empresa S... e o Autor, com efeitos desde 18 de Outubro de 2011, sendo como tal indiferente a celebração de um contrato a termo com o mesmo, no dia 23 de Novembro de 2011.
É que, a entender-se o contrário, seria colidir com a garantia do trabalhador expressa no art. 129.° n.° 1 ai. j) do Código do Trabalho o qual menciona que é proibido ao empregador fazer cessar o contrato e readmitir o trabalhador, mesmo com o seu acordo, com o propósito de o prejudicar em direito ou garantia decorrente da antiguidade.
Tal contrato é nulo nos termos do art. 280.° do Código Civil face à violação da norma contida no art. 129.° n.° 1 al. j) do Código do Trabalho, sendo como tal inaplicável o período experimental contabilizado pela Ré desde o dia 23 de Novembro de 2013 uma vez que este se contabiliza desde o início da prestação do trabalhador, nos termos do art. 113.° n.° 1 do Código do Trabalho, ou seja, desde 18 de Outubro de 2011.
Verifica-se assim que o contrato cessou fora dos casos previstos no art. 340.° do Código do Trabalho, sendo ilícito face à inexistência de processo disciplinar nos termos do art. 381.° ai. a) do mesmo diploma.
Pelo que, tem o trabalhador direito não apenas à indemnização prevista no art. 391.° n.° 1 e 3 do Código do Trabalho como também às retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare ilícito o despedimento, nos termos do art. 390.° do mesmo diploma.
Quanto àquele primeiro normativo, e face aos elementos apurados, somos a considerar que a Ré agiu com um grau de ilicitude de grau médio, pelo que se fixa a indemnização em 30
dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade. - fim de
transcrição.
Será assim ?
Em nosso entender , cumprindo, desde logo, recordar o disposto no n° 3 do artigo 5° do NCPC, efectivamente a matéria apurada é curta para se poder considerar , tal como se fez na sentença recorrida que , In casu , se deve considerar operada uma transferência de ou cessão de estabelecimento entre a S... - Restauração, Lda, e a Ré S..., Lda, no tocante ao restaurante E....
Com relevo sobre esse ponto apenas se provou que :
E. A partir do dia 2 de Outubro, e por indicação da sua entidade patronal, o Autor passou a exercer as mesmas funções de empregado de balcão no restaurante E..., localizado também no Centro Comercial Fórum Sintra, auferindo o mesmo vencimento.
F. Onde permaneceu a trabalhar ininterruptamente desde aquela data e depois do dia 18 de Outubro de 2013.
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré, denominado E..., situado lado a lado com o restaurante A..., este pertencente à entidade S..., Lda.
Porém, não é por isso que a sentença recorrida deve ser revogada.
É que tal como referimos em acórdão , de 16-03-2016 , desta Relação, proferido no âmbito do processo n° 122/13.8TTTVD-4 acessível em www.dgsi.pt :
Naquelas situações em que se verifique que a personalidade colectiva é usada de modo ilícito ou abusivo para prejudicar terceiros,nomeadamente, para retirar direitos e garantias a trabalhadores, existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, cumpre desconsiderá-la,.
É o que cumpre fazer no caso concreto entre a S... - Restauração, Lda, e a Ré S..., Lda,,
Em nosso entender , com respeito por melhor entendimento , deve operar-se uma desconsideração de personalidade jurídica entre essas duas sociedades em termos da verificação de relação laborai entre os litigantes.
Na realidade, como se refere em acórdão do STJ , de 28-11-2012 , proferido no processo n° 229/08.3TTBGC.PI.SI , 4a Seccção , Relator Conselheiro Pinto Hespanhol (acessível em www.dgsi.pt) : No dizer de MENEZES CORDEIRO (Tratado de Direito Civil Português, 1 (Parte Geral), Tomo III, Almedina, Coimbra, 2004, pp. 627-649), o levantamento da personalidade colectiva [que outros designam por desconsideração da personalidade jurídica, cf. PEDRO CORDEIRO, A desconsideração da personalidade jurídica das sociedades comerciais (1989), referido por MENEZES CORDEIRO, ob. cit., p. 625, nota de rodapé n.° 2074] trata-se dum instituto surgido para sistematizar e explicar diversas soluções concretas, estabelecidas para resolver problemas reais postos pela personalidade colectiva, e que se manifestam na confusão de esferas jurídicas, na subcapitalização e no atentado a terceiros e abuso da personalidade.
Para MENEZES CORDEIRO, «a confusão de esferas jurídicas verifica-se quando, por inobservância de certas regras societárias ou, mesmo, por decorrências puramente objectivas, não fique clara, na prática, a separação entre o património da sociedade e a do sócio ou sócios» (ob. cit., p. 628); «verifica-se uma subcapitalização relevante, para efeitos de levantamento da personalidade, sempre que uma sociedade tenha sido constituída com um capital insuficiente. A insuficiência é aferida em função do seu próprio objecto ou da sua actuação surgindo, assim, como tecnicamente abusiva» (ob. cit., p. 629); já o atentado a terceiros verifica-se sempre que a personalidade colectiva seja usada, de modo ilícito ou abusivo, para os prejudicar. Como resulta da própria fórmula encontrada, não basta uma ocorrência de prejuízo, causada a terceiros através da pessoa colectiva: para haver levantamento será antes necessário que se assista a uma utilização contrária a normas ou princípios gerais, incluindo a ética dos negócios» (ob. cit., p. 633).
Como fundamentar, porém, a responsabilização das pessoas envolvidas em casos que reúnam os pressupostos do levantamento da personalidade colectiva?
Segundo BRITO CORREIA (Direito Comercial, 2.° volume, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 1989, p. 244), «tal responsabilidade pode fundamentar-se no artigo 334.° do Código Civil, sobre o abuso de direito, entendendo que a generalidade das pessoas têm direito de constituir pessoas colectivas e de exercer actividades por intermédio delas, mas que esse direito tem limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito».
Já para BERNARDO DA GAMA XAVIER e OUTROS (Manual de Direito do Trabalho, Verbo - Babel, Lisboa, 2011, p. 382) «justifica-se adoptar uma solução que conduza à chamada desconsideração da personalidade (isto é, não se considera a autonomia dos sujeitos empregadores em presença e de cada uma das relações jurídico-laborais), por forma a garantir que o trabalhador não fique prejudicado», o que sucede «quando se verifique uma utilização abusiva da personalização autónoma de cada sociedade membro do grupo», tecendo as seguintes considerações acerca dos requisitos que podem justificar essa solução de recurso:
«Pensamos que a reconstrução da unidade que pode estar por detrás do grupo de empresas ou de sociedades só se justifica quando o grupo apresente características tais que permitam detectar a efectiva presença de uma especial unidade, que se mantém apesar das personalizações das suas várias componentes e que, em termos de boa-fé, exija a desconsideração dessas personalizações.
É o que sucede, por exemplo: quando as várias sociedades prosseguem um mesmo objectivo económico, com meios comuns (os mesmos dirigentes, a utilização dos mesmos locais, serviços e meios de produção, ou o mesmo pessoal); ou quando, embora as actividades das diferentes sociedades não se confundam, as relações entre elas são de tal forma estreitas que se pode dizer que a sociedade que efectivamente detém os poderes patronais - que realmente dirige o trabalhador em causa - não é quem formalmente ocupa a posição de empregador, mas sim uma outra de quem depende afinal o trabalhador.
Por outro lado, terão de verificar-se nos vínculos laborais formalmente autónomos conexões que os permitam unificar.»
Por seu turno, PEDRO ROMANO MARTINEZ (Direito do Trabalho, 5.a edição, Almedina, Coimbra, 2010, pp. 434-435) aproveita para sublinhar que «[a] procura do empregador real está relacionada com uma ideia de justiça, na tentativa de levar a defesa do trabalhador até onde for juridicamente possível», sendo certo que, «juridicamente, para se chegar à entidade patronal real, sem atender só ao empregador efectivo, pode recorrer-se à figura da desconsideração da personalidade jurídica.
Em princípio, quando se fala no levantamento da personalidade jurídica, pretende-se responsabilizar as pessoas singulares que estão encobertas pela pessoa colectiva.
Neste caso, não é essa a finalidade, pois cabe verificar quem são as outras pessoas colectivas que agem em conjunto com aquele empregador efectivo. Interessa, deste modo, passar por cima do empregador efectivo, desconsiderando-o, ou melhor, não atendendo exclusivamente a essa situação, e procurar o grupo empresarial em que aquele empregador se insere» - cita, a propósito, RAPOSO BERNARDO, in «O Exercício dos Direitos dos Trabalhadores nos Grupos de Sociedades», Relatório de Mestrado, Lisboa, 1995, p. 47), o qual refere que o recurso à desconsideração deve relacionar-se com os princípios da aparência e da confiança legítima, ancorados no princípio da boa-fé - fim de transcrição.
Ora , em nosso entender , a matéria de facto apurada justifica a desconsideração da autonomia e da individualidade jurídica das duas supra citadas sociedades , uma delas aqui Ré, que fizeram uma utilização abusiva da personalidade jurídica colectiva por forma a afectar as garantia do trabalhador aqui Autor.
Relembre-se com relevo evidente para se aportar a tal conclusão que se provou.
A. No dia 18 de Outubro de 2011 o Autor R... firmou contrato de trabalho a termo certo por seis meses com a S... - Restauração, Lda., nos termos do qual começou a trabalhar sob as ordens, direcção e fiscalização desta como empregado de balcão de 2.ª.
B. Esse trabalho era prestado na sede desta sociedade, sita no Centro Comercial Fórum Sintra, mediante a retribuição mensal de € 520,50.
C. Desde a data em que firmou aquele contrato até ao dia 1 de Outubro de 2013 o Autor esteve a trabalhar como empregado de balcão no restaurante A..., naquele centro comercial.,
D. No dia 26 de Setembro de 2013 a S..., Lda., comunicou por escrito ao Autor que fez operar a caducidade do contrato com efeitos a partir de 18 de Outubro daquele ano.
E. A partir do dia 2 de Outubro, e por indicação da sua entidade patronal, o Autor passou a exercer as mesmas funções de empregado de balcão no restaurante E..., localizado também no Centro Comercial Fórum Sintra, auferindo o mesmo vencimento.
F. Onde permaneceu a trabalhar ininterruptamente desde aquela data e depois do dia 18 de Outubro de 2013.
G. No dia 23 de Novembro de 2013 a supervisora do Autor entregou-lhe para assinar um contrato de trabalho a termo certo em que figurava como empregador a Ré S... - Restauração Lda.
H. Nos termos deste contrato, que o Autor assinou por lhe ter sido assim determinado, o Autor foi contratado como forneiro-aspirante, mediante a retribuição de 520,50€, sendo o trabalho prestado na sede da empreqadora, sita no Centro Comercial Fórum Sintra. 1. No dia 9 de Dezembro de 2013, quando se apresentou ao serviço, o Autor recebeu da Ré uma comunicação escrita que o informava da denúncia do contrato de trabalho com efeitos a partir do dia 22 desse mês por se encontrar em período experimental.
J. O Autor deixou de trabalhar naquele local a partir do dia 22 de Dezembro de 2013.
K. A Ré não entregou ao Autor qualquer outro documento para justificar a cessação do contrato de trabalho.
L. Tal como não fez anteceder esta cessação de qualquer procedimento.
M. A Ré, na pessoa dos seus legais representantes e dos demais trabalhadores que diariamente contactavam com este, designadamente os supervisores, conheciam o Autor e o trabalho que este desenvolvia pelo menos desde 18 de Outubro de 2011.
N. A sociedade S... Restauração, Lda., é uma sociedade por quotas constituída em Dezembro de 2010, que tem por objecto a actividade de restauração, charcutaria, cafetaria, pastelaria, padaria, cervejaria e bar, bem como a prestação de serviços, catering e a representação e comercialização de bens e produtos conexos com aquela actividade.
O. Tem sede no Fórum Sintra, loja 2.04, IC 19, em Sintra, Alto do Forte, e são seus gerentes F... e B..., sendo seus sócios, para além destes dois, P... e C....
P. Ao passo que a Ré sociedade S..., Lda., é uma sociedade por quotas constituída em Abril de 2011 que tem por objecto a actividade de restauração, charcutaria, cafetaria, pastelaria, padaria, cervejaria e bar, bem como a prestação de serviços, catering e a representação e comercialização de bens e produtos conexos com aquela actividade.
Q. Tem sede no Fórum Sintra, loja 2.04, IC 19, em Sintra, Alto do Forte, e são seus gerentes F... e B..., sendo seus sócios, para além destes dois, P..., C..., F..., J... e L....
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré, denominado E..., situado lado a lado com o restaurante A..., este pertencente à entidade S..., Lda.
Estamos, pois, perante um caso em que , a nosso ver, as sociedades em causa fizeram uma utilização abusiva da personalidade jurídica colectiva.
Na realidade , se a distinção e autonomia era vincada cabe perguntar a que propósito é que a S... - Restauração, Lda.,a partir do dia 2 de Outubro, indicou , instruiu o Autor para passar a exercer as mesmas funções de empregado de balcão no restaurante E..., pertencente à Ré localizado também no Centro Comercial Fórum Sintra, auferindo o mesmo vencimento. E a que título a Ré aceitou tal indicação (sem reagir de imediato) ? E saliente-se que as duas sociedades têm ambas por objecto a actividade de restauração, charcutaria, cafetaria, pastelaria, padaria, cervejaria e bar, bem como a prestação de serviços, catering e a representação e comercialização de bens e produtos conexos com aquela actividade...
E que têm os mesmos gerentes e praticamente os mesmos sócios. É , assim, por demais , evidente que entre a S... - Restauração, Lda.,e a Ré existia conexão tão acentuada que nos permite , sem rebuço, operar a supra citada desconsideração de personalidade jurídica.
Em resumo, em face dos factos assentes a situação deve ser encarada com o recurso à desconsideração da personalidade colectiva do empregador formal e pela via da unificação dos vínculos laborais estabelecidos entre o autor a ré e a S... - Restauração, Lda, a operar por via judicial.
Só dessa forma se evita que com o expediente utilizado pelas duas sociedades se logre o afastamento da aplicação de normas imperativas relativas aos direitos do trabalhador em causa , nomeadamente, em sede da segurança no emprego.
E cumpre ainda salientar que a atribuição da qualidade de empregador às rés, tal como adverte MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO (Grupo Empresariais e Societários - Incidências Laborais, Coimbra, Almedina, 2008, p. 410), «consubstancia, de facto, uma situação de contitularidade na posição jurídica de empregador, que se reconduz materialmente a um caso de pluralidade de empregadores, na modalidade da pluralidade sucessiva e a par das situações previstas no art. 92.° do CT».
Todavia, como bem sublinha a mesma AUTORA:
«[...] o facto de este caso de pluralidade não estar previsto na lei nem obedecer aos requisitos de admissibilidade legalmente previstos para aquela figura não tem aqui um escopo negocial e voluntário, mas um escopo judicial e correctivo - o que, só por si, retira sentido às exigências dos requisitos de forma e do requisito substancial do acordo das partes (art. 92.°, n.° 1, alíneas a) a c) do CT).
Uma vez admitida a constituição de uma situação de contitularidade da posição de empregador, crê-se que dela são de retirar as devidas consequências, nomeadamente para efeitos da sujeição desta situação ao regime especial de responsabilidade solidária pelos créditos laborais, consagrado no art. 92.°, n.° 3, do CT[4], e que parece poder aqui aplicar-se por analogia [...].»
E assim é, porquanto «[h]á analogia sempre que no caso omisso procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei» (artigo 10.°, n.° 2, do Código Civil), sendo que, no caso, embora falte o acordo expresso das partes na constituição do vínculo laboral com a contitularidade da posição de empregador, bem como os requisitos formais da redução do acordo a escrito e as menções obrigatórias no respectivo documento constitutivo (artigo 92.°, n.° 1, alíneas a) a c), do Código do Trabalho de 2003), verifica-se o pressuposto material do instituto da pluralidade de empregadores, na forma mais ampla contemplada no n.° 2 do citado artigo 92.°, que pressupõe que os empregadores mantenham estruturas organizativas comuns, cuja existência ficou demonstrada .... - fim de transcrição. Assim , sendo certo que a S... - Restauração, Lda, aqui não é Ré, cumpre confirmar a sentença recorrida.
É que operada tal desconsideração , embora com outros motivos , logra procedência o raciocínio levado a cabo nas sentença recorrida segundo o qual:
Assim sendo, e ao abrigo da supra mencionada norma, é de salientar que a Ré assumiu á posição de empreqadora no contrato de trabalho celebrado entre a empresa S... e o Autor, com efeitos desde 18 de Outubro de 2011, sendo como tal indiferente a celebração de um contrato a termo com o mesmo, no dia 23 de Novembro de 2011.
É que, a entender-se o contrário, seria colidir com a garantia do trabalhador expressa no art. 129.° n.° 1 al. j) do Código do Trabalho o qual menciona que é proibido ao empregador fazer cessar o contrato e readmitir o trabalhador, mesmo com o seu acordo, com o propósito de o prejudicar em direito ou garantia decorrente da antiguidade.
Tal contrato é nulo nos termos do art. 280.° do Código Civil face à violação da norma contida no art. 129.° n.° 1 al. j) do Código do Trabalho, sendo como tal inaplicável o período experimental contabilizado pela Ré desde o dia 23 de Novembro de 2013 uma vez que este se contabiliza desde o início da prestação do trabalhador, nos termos do art. 113.° n.° 1 do Código do Trabalho, ou seja, desde 18 de Outubro de 2011.
Verifica-se assim que o contrato cessou fora dos casos previstos no art. 340.° do Código do Trabalho, sendo ilícito face à inexistência de processo disciplinar nos termos do art. 381.° ai. a) do mesmo diploma.
Pelo que, tem o trabalhador direito não apenas à indemnização prevista no art. 391.° n.° 1 e 3 do Código do Trabalho como também às retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare ilícito o despedimento, nos termos do art. 390.° do mesmo diploma.
Quanto àquele primeiro normativo, e face aos elementos apurados, somos a considerar que a Ré agiu com um grau de ilicitude de grau médio, pelo que se fixa a indemnização em 30 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade. - fim de transcrição.
E nada mais nos cumpre referir a tal título pelo que o recurso improcede nesta vertente.
E nem se esgrima que estamos perante uma causa de pedir distinta , visto que a pretensão e factualidade apresentadas permitem apontar neste sentido, sendo certo que a mera referência ao artigo 2851, n° 1 do CT/2009, só por si, não nos veda, porque estamos em sede de direito, a formulação do supra citado raciocínio , atento o disposto no n° 30 do já mencionado artigo 50 do NCPC.
Em resumo, o recurso improcede nesta vertente.
A terceira vertente do recurso consiste em saber se mesmo considerando que se operou a verberada transmissão de estabelecimento e que o contrato do autor com a apelante era sem termo, e produzia efeitos desde 19 de Outubro de 2013,ainda assim a sua cessação ocorreu dentro do período experimental.
Segundo a recorrente tal não invalida a existência de umperíodo experimental.
É que para os contratos de trabalho sem termo, no caso da generalidade dos trabalhadores, a Lei estipula que o prazo para denúncia é de 90 dias.
Como tal, tendo a apelante denunciado o contrato ao abrigo do período experimental, ainda que ocorrido em 9 de Dezembro de 2013, estaria dentro do prazo de 90 dias previsto na Lei e na Convenção Coletiva de Trabalho aplicável ao sector.
Todavia , como é evidente , esta vertente do recurso não pode proceder.
É que a cessação do contrato com invocação do período experimental ocorreu em 22 de Dezembro de 2013.
Provou-se que:
1 - No dia 9 de Dezembro de 2013, quando se apresentou ao serviço, o Autor recebeu da Ré uma comunicação escrita que o informava da denúncia do contrato de trabalho com efeitos a partir do dia 22 desse mês por se encontrar em período experimental.
J. O Autor deixou de trabalhar naquele local a partir do dia 22 de Dezembro de 2013.
Ora , de acordo com o raciocínio supra exposto , que aqui se acolheu, a antiguidade do Autor deve reportar-se a 18 de Outubro de 2011. Improcede , pois, o recurso neste ponto , sem necessidade sequer de maiores considerações.
Assim, o recurso , salvo no tocante à supra mencionada alteração do ponto R da matéria assente, improcede.

Em face do exposto, acorda-se em conferir a seguinte redacção ao ponto de facto R):
R. A partir do dia 23 de novembro de 2013, o autor passou a exercer as funções de forneiro - aspirante no estabelecimento comercial da Ré, denominado Eatalv, situado lado a lado com o restaurante A..., este pertencente à entidade S..., Lda.
No mais , acorda-se , embora com motivação algo diversa , em julgar improcedente o recurso e confirmar a sentença recorrida. Custas pela recorrente.
Notifique.

08/03/2017
Leopoldo Soares
José Eduardo Sapateiro
Alves Duarte

Nos termos e para os efeitos do preceituado no n° 7° artigo 663° do Novo CPC, o relator sumaria o presente acórdão nos seguintes moldes: Naquelas situações em que se verifique que a personalidade colectiva é usada de modo ilícito ou abusivo para prejudicar terceiros, nomeadamente para retirar direitos e garantias a trabalhadores, existindo uma utilização contrária a normas ou princípios gerais , cumpre desconsiderá-la.

Leopoldo Soares