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 - ACRL de 05-04-2017   Acção de impugnação de despedimento. Desobediência. Não acatamento reiterado do horário de trabalho. Aceitação tácita do novo horário de trabalho.
Existindo aceitação, ainda que tácita, de novo horário de trabalho por parte do trabalhador, não pode vir o mesmo anos depois recusar-se a cumprir esse horário.
O não acatamento reiterado do horário de trabalho aceite constitui desobediência passível de fundamentar o despedimento com justa causa do trabalhador
Proc. 27721/15.0T8LSB.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Duro Mateus Cardoso - Albertina Pereira - -
Sumário elaborado por Isabel Lima
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PROCESSO N° 27721/15.0T8LSB.L1 Apelação
Relator: Duro Mateus Cardoso
Adjuntos: Desemb. Albertina Pereira e Desemb. Leopoldo Soares
SUMÁRIO
Acção de impugnação de despedimento. Desobediência - não acatamento reiterado do horário de trabalho. Aceitação tácita de novo horário de trabalho.
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
I- S..., intentou na Secção de Trabalho de Lisboa a presente acção declarativa, com processo especial, de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento, CONTRA,
P..., EMPRESA DE LIMPEZAS, LDa.
II- A empregadora/ré foi citada e realizou-se Audiência de Partes em que teve lugar infrutífera tentativa de conciliação.
III- A ré, requerendo declaração da licitude do despedimento, motivou o mesmo, dizendo, em síntese, que:
- A autora tinha inicialmente (desde Maio de 2007) uma carga horária semanal e um horário de trabalho (de segunda a sábado das 7 às 13) que foram alterados por acordo em Abril de 2012 passando a autora a cumprir horário de segunda a sexta, das 7 às 10 e 15 às 17 e sábados das 7 às 12)
- A partir de Julho de 2015 a ré transferiu a autora para outro estabelecimento do mesmo cliente, sito na rua da Palma, e alterou o horário de trabalho da autora (segunda a sexta, das 7 às 9,30 e 15 às 17 e sábados das 7 às 11,30);
- ...e, por lapso, a ré indicou também à autora um outro cliente com horário, ao sábado, das 14 às 17 horas;
- A autora informou então a ré de que a partir de 1 de Agosto de 2015, passaria a cumprir o horário das 7-12 de segunda a sábado, o que sucedeu a partir de 3 de Agosto de 2015, no estabelecimento da Rua da Palma;
- A 7 de Agosto a ré informou a autora, verbalmente e por escrito, que deveria cumprir o horário anteriormente cumprido das 7 às 10 e 15 às 17 e sábados das 7 às 12 e que não seria admitida a prestar serviço fora do mesmo, sob pena de processo disciplinar.
- ...tendo a autora, apesar disso, continuado a trabalhar das 7-12 de segunda a sábado, desobedecendo às ordens da ré, pelo que o despedimento da autora foi lícito.
IV- RESPONDEU a autora dizendo, em resumo, que:
- Em Dezembro de 2012 a ré reduziu e alterou o seu horário de trabalho:
- Concordou na altura com a redução do horário de trabalho e do vencimento mas não concordou com a repartição do seu horário de trabalho;
- Não concordou com a alteração de Julho de 2015, principalmente quanto ao segundo local de trabalho, pelo transtorno que lhe ia causar por causa de uma filha com 2 anos e meio de idade;
- A transferência da autora para outro local de trabalho aos sábados de tarde implicava grande prejuízo para autora e foi feita sem o acordo da autora. PEDIU que:
- a) Seja declarada a ilicitude do seu despedimento;
-b) Seja a ré condenada a pagar-lhe:
1- €240,44 (€200,84+1,80x22), referentes a metade em dívida da retribuição do mês de Agosto de 2015;
2- €180,42 (€360,84:2), relativos a metade do subsídio de férias em dívida, decorrente das férias vencidas em 01/01/2015;
3- As retribuições vincendas desde a data do despedimento, a 30/09/15, até ao trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida, incluindo a retribuição de férias, subsídio de férias e de Natal, mostrando-se já vencida a retribuição de €721,68 - art. 390° do CT;
4- Uma indemnização, em substituição da sua reintegração, com base em despedimento ilícito, calculada em 45 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade, incluindo o período que decorrer até ao trânsito em julgado da sentença, mostrando-se já vencido o montante total de €4.330,08 (€541,26x8) - art. 390° do CT;
5 - €35,40, de Juros de mora já vencidos, à taxa legal de 4/prct., desde 12/08/2010, sobre todas as importâncias peticionadas, bem como os juros vincendos desde a citação até integral pagamento.
V- Em RESPOSTA, a ré disse, em resumo:
- Informou a autora por escrito que deveria retornar o horário que vinha praticando antes da alteração de Julho de 2015 e que fora acordado com a autora;
- Pagou à autora a totalidade do subsídio de férias relativo às férias vencidas em 1/1/2015 e pagou € 183,33 relativos ao mês de Agosto, correspondente Às horas trabalhadas.
VI- Foi dispensada a realização da Audiência Preliminar e proferido despacho saneador, sem selecção da matéria de facto.
O processo seguiu os seus termos, vindo, a final, a ser proferida sentença em que se julgou pela forma seguinte:
VI. Decisão
Face ao exposto, julga-se improcedente a presente acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento intentada pela autora/trabalhadora S... contra a ré/empregadora P... - FACILITY SERVICES, LDA, e, consequentemente, decide-se absolver a ré dos pedidos contra si formulados pela autora/trabalhadora.
Inconformada, a autora interpôs recurso de Apelação (fols. 231 a 240), apresentando as seguintes conclusões:
1- Consta da cláusula quarta, n° 1 do contrato de trabalho a termo certo celebrado em 14/05/2007, entre a Autora e a ora Requerida, junto a .fls. 62 e 72 dos autos, que o período normal de trabalho tem a duração de 36 horas, distribuídas por um horário das 07,00h às 13,00 h, de Segunda Feira a Sábado - doc. n° 1 junto pela Requerida.
2- Depois diz o n° 2 dessa cláusula que o horário de trabalho só poderá ser alterado por acordo de ambas as partes.
3- De acordo com a cláusula terceira, o local de trabalho da autora era no cliente Recheio dos Restauradores .
4- Tratam-se de cláusulas reduzidas a escrito, pelo que o horário de trabalho só poderia ser alterado por acordo de ambas as partes, reduzido a escrito.
5- Ora, tal nunca veio a acontecer com o acordo da Autora, nem sequer pela forma verbal.
6- Na declaração datada de 16/04/2012, junta a fls. 73 dos autos, que corresponde ao Doc. n° 2 junto pela Requerida, apenas consta que a autora aceitou reduzir a sua carga horária de 36 horas para 30 horas semanais, a partir de 01/04/2012.
7- Dela não consta a aceitação expressa da alteração do seu horário de trabalho e que era das 07h00 às 13h00.
8- Dessa redução do total das horas semanais de trabalho não se pode presumir, sequer de forma tácita, que a A. tenha alguma vez concordado com a alteração do seu horário inicialmente acordado e, muito menos, que fosse repartido pela parte da manhã e da tarde de cada dia, como veio a acontecer por mera iniciativa da ora requerida, no período de Dezembro de 2012 a finais de Agosto de 2015.
9- Como se refere no artigo 7° da resposta ao articulado pela Autora, esta concordou com a redução do horário de trabalho mas desde que não fosse repartido pela manhã e tarde.
10- Sempre pretendeu um horário seguido, conforme consta do aludido contrato de trabalho, pois que tem uma filha menor de 2 anos e não tinha condições económicas para pagar a uma ama que tomasse conta dela de manhã e na parte da tarde.
11- Essa sua vontade foi até manifestada junto da ACT, a 22/07/2015, conforme Pedido de Intervenção de fls. 125 (doc. 2), bem como na sua resposta à Nota de Culpa de fls.88.
12- Durante a audiência de julgamento, na qualidade depoimento de parte, afirmou que nunca concordou com a alteração do seu horário de trabalho e que a sua responsável, a supervisora D. I..., lhe disse que era apenas temporária.
13- A A., devido à sua relação de subordinação jurídica e de boa fé, acabou por praticar o novo horário de trabalho que então lhe foi fixado unilateralmente pela Requerida, das 07h,00 às 10h,00 e das 15h,00 às 7h,00, de Segunda a Sexta-Feira, sempre na esperança de que um dia lhe iriam repor o seu horário de trabalho inicialmente acordado.
14- Porém, essa expectativa acabou por se frustrar quando em princípios de Julho de 2015 recebeu da requerida uma carta a comunicar-lhe que a partir do dia 01/08/2015 passaria a prestar serviço em dois locais diferentes, sendo um serviço na loja denominada Recheio CashCarry, sita na Rua da palma, em Lisboa, e outro nas instalações da Expressglass, sitas na Rua D. João V, n° 25, em Lisboa - Doc. 3, junto pela Requerida, de fls. 74.
15- No Primeiro local prestaria serviço de Segunda a Sexta- Feira, das 07h,00 às 09h30 e das 15h,00 às 17h,00 e no segundo local prestaria serviço aos Sábados, das 14h,00 às 17h,00.
16- Tal comunicação mereceu-lhe inteira credibilidade, pelo que resolveu dirigir-se à ACT, no dia 22/07/2015, a fim de expor a sua discordância e obter esclarecimentos sobre a legalidade de tal alteração e como actuar juridicamente.
17- A persistência de, por um lado, a Requerida pretender manter-lhe o horário repartido e, por outro lado, lhe alterar também o seu local de trabalho, com a agravante de ser repartido por dois locais diferentes, teve como consequência a sua revolta e indignação.
18- No documento 2, de fls. 125, consta de forma expressa e clara, a sua discordância quanto à mudança do da sua prestação de trabalho para dois locais diferentes e dos respectivos novos horários de trabalho, nele indica como razões o facto de ter de se levantar mais cedo, gastar mais em transportes e por ter de pagar mais a uma ama para tomar conta da sua filha.
19- Aí, segundo transmitiu a A. durante o seu depoimento gravado, foi aconselhada pela ACT a cumprir o horário que tinha no início do contrato, com a redução de uma hora diária, pelo que passou, então, a cumprir o horário de trabalho das 07,00h às 12h,00, no novo local da Rua da Palma.
20- Na sua Resposta à Nota de culpa também refere expressamente que nunca deu o seu acordo, quer verbal, quer por escrito, à alteração do seu horário de trabalho inicialmente acordado, esclarecendo que é mãe de uma filha de 2 anos de idade e que, por esse facto, tinha de compatibilizar o seu horário de trabalho.
21- Todos são elementos objectivos que o tribunal não pode ignorar e que vão no sentido, sem dúvidas, de que a Autora nunca concordou com a alteração do seu horário e local trabalho.
22- Repare-se que, na altura, apenas auferia o magro vencimento mensal de €382,20, acrescido de €1,80/dia útil de subsídio de refeição.
23- Como poderia com tal vencimento pagar a uma ama uma retribuição por cada dia completo que tomasse conta de sua filha, incluindo as tardes da semana e aos Sábados e ter que suportar outras despesas de transporte?
24- A testemunha I..., ex. supervisora da Requerida confirmou, até, que quando nasceu a filha da Autora esta lhe pediu para retomar o horário seguido previsto no contrato, tendo averiguado de tal possibilidade mas que lhe foi negado pelo facto de o cliente pretender o horário repartido e que nunca lhe prometeu o horário seguido - ver fls. 210, ao fundo.
25- Agora veio a Requerida alegar que a indicação do segundo local de trabalho se tratou de mero lapso.
26- Porém, esse alegado lapso nunca fora comunicado à Autora, por escrito ou pela forma verbal, nem fora produzida prova nesse sentido.
27- Esse, foi também um dos factos determinantes para a recusa pela A. em aceitar os novos horários de trabalho e novo local.
28- Tratou-se notoriamente de um facto contra lege , com gravidade, de inteira culpa da Requerida e sério prejuízo para a Autora, que acabou por levar ao seu despedimento.
29- A obrigatoriedade de ter de prestar serviço aos Sábados, na parte da tarde, nas instalações da Express Glass, na Rua D. João V, em local mais distante da sua residência, com os encargos inerentes em deslocações de transporte e ter de contratar uma ama para a tarde desses dias, bem como para os outros dias da semana, à tarde, na Rua da Palma, iria implicar uma diminuição drástica da sua situação económica, com real perigo para o normal desenvolvimento de sua filha.
30- Aliás, no ponto 25 foi dado por provado que, em sequência da missiva referida nos pontos 7 e 8 dos factos assentes, a A. falou com responsáveis da requerida, solicitando que lhe fosse disponibilizado outro local e horário de trabalho.
31- A Pág. 121, refere a M Juiz a quo que a questão da Expressglass não foi para a frente e que a própria A. confirmou mas esse facto não retira a credibilidade e efeito que tal comunicação criou na Autora, que sempre agiu de boa fé.
32- A Requerida é que deu causa a toda a situação que levou à recusa por parte da Autora em aceitar tais alterações e, por isso, não pode o seu despedimento ser considerado lícito.
33- Tais factos foram também confirmados pelas testemunhas da Autora, M..., amiga da Autora e M..., irmã da Autora que ouviram directamente da própria Autora a sua discordância quanto à mudança e alteração do horário de trabalho, por ter de cuidar da sua filha menor e por se tratar de uma alteração ao respectivo contrato de trabalho.
34- Não se pode considerar totalmente isento, por razões da experiência comum, o depoimento das testemunhas da Requerida sobre o essencial dos factos, pois quase todas elas trabalham para a Requerida, sendo director de serviços o Sr. A..., sócio e director-geral o Sr. J... e empregada administrativa a D. G....
35- Refere o art. 217°, n° 4 do CT que o horário individualmente acordado não pode ser unilateralmente alterado.
36- Depois, diz-nos o n° 1 dessa norma que à alteração é aplicável o disposto sobre a sua elaboração e o n° 2 que a alteração do horário deve ser precedida de consulta aos trabalhadores envolvidos e à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais.
37- Ora, para a determinação do horário de trabalho da A. foi utilizada a forma escrita e, por outro lado, nunca fora precedida de consulta a quaisquer das entidades atrás referidas, nem a Requerida fez prova nesse sentido.
38- Estas normas são de carácter imperativo e não foram cumpridas pela Requerida - vide Acs. do TRP de 16/12/2015, do P° n° 907/14.8T8AVR.P1 e de 16/11/2015, do P° n° 904/14.3T8AVR.P1, in 1c~1 ti ,Is ¡ ; ,,
39- Sendo a A. empregada de limpeza até existe CCT, celebrado entre a AHRESP (Associação da Hotelaria e Similares de Portugal) e a FETESE (Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços), conforme BTE n° 3, de 22 de Janeiro de 2011.
40- A Requerida nunca solicitou a consulta prévia a tais organismos quando decidiu alterar os horários de trabalho da A. desde Dezembro de 2102 e agora desde 01 de Agosto de 2015, nem fez qualquer prova nesse sentido.
41- Só por esse motivo nunca as alterações ao horário de trabalho da A. poderão ser consideradas legítimas e legais.
42- Também nos diz o art. 194° n° 1, al. b) do CT que o empregador pode transferir o trabalhador para outro local de trabalho, temporária ou definitivamente, quando outro motivo da empresa o exija e a transferência não implique prejuízo para o trabalhador.
43- E o seu n° 4 refere que «o empregador deve custear as despesas do trabalhador, decorrentes do acréscimo dos custos de deslocação... ».
44- Ora, a Requerida nunca se propôs, sequer, pagar à A. as despesas de deslocação para os seus novos locais de trabalho, o que lhe iria causar grande prejuízo económico e prejudicar a sua relação e a devida assistência para com a sua filha menor.
45- A Autora depôs, de forma clara, segura e credível, quando foi inquirida durante a audiência de julgamento, cujo depoimento se encontra gravado cuja súmula se encontra acima descrita.
46 - Deveria, pois, ter sido dado por assente que a Autora não concordou com a repartição do seu horário de trabalho referida em 22 dos ,factos assentes, bem como dado por assente o facto das als. d), e), j) e K) que deu por não provado.
47- Deveria ter sido dado por provado que a Requerida não cumpriu o determinado nos n°s 2 e 4 do art. 217°do CT.
48- Deveria ter sido dado por provado, pelo menos, que o serviço aos Sábados na Expressglass , na parte da tarde, foi também um dos factores determinantes que levaram a A. a recusar a alteração ao seu horário de trabalho repartido, para além de não ter condições para pagar a uma ama que tomasse conta de sua filha menor durante as tardes da semana e aos Sábados.
49- Não deve ser considerado como provado o ,facto dado por assente no ponto 30.
50- A M° Juiz a quo cometeu, pois, o vício do Erro na Apreciação da Prova e fez errada aplicação do direito.
A ré contra-alegou (fols. 247 a 269), defendendo a improcedência do recurso e a manutenção da sentença recorrida.
Correram os Vistos legais.
VII- A matéria de facto considerada provada em 1a instância, é a seguinte:
1- A ré dedica-se à prestação de serviços de limpeza.
2- A autora e a ré subscreveram o documento de fls. 62, intitulado contrato de trabalho a termo certo, e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, de acordo com o qual a autora foi admitida ao serviço da ré em 14/05/2007, para prestar a actividade de trabalhadora de limpeza, por sua conta e sob a sua autoridade, tendo como local de trabalho o cliente Recheio dos Restauradores.
3- Consta da cláusula 4ª do contrato referido em 2: «1. O período normal de trabalho tem a duração de 36 horas semanais, distribuídas por um horário das 7h às 13h, de Segunda-feira a Sábado. 2. O horário de trabalho só poderá ser alterado por acordo de ambas as partes».
4- A autora acordou com a ré em reduzir a duração semanal cio seu trabalho de 36 para 30 horas, tendo a primeira subscrito o escrito cuja cópia consta a fls. 63, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, no qual consta: «Eu Susana Pereira Barbosa a prestar serviço no Recheio do Regedor venho por este meio reduzir a minha carga horária de 36 horas semanais pera 30 h semanais a partir do dia 1/04/2012. Lisboa, 16 Março 2012».
5- Por força do referido em 4, o horário de trabalho da autora foi alterado a partir de 1/04/2012, passando aquela a trabalhar de segunda a sexta-feira, das 7 às 10 horas e das 15 às 17 horas e ao sábado das 7 às 12 horas.
6- As alterações referidas nos pontos 4 e 5 foram pedidas pelo cliente da ré, a Recheio - Cash & Carry, onde a autora prestava actividade, mais propriamente fazia-o no estabelecimento desta cliente sito na Rua do Regedor, em Lisboa.
7- Por missiva de 6/07/2015, junta a fls. 64 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, a ré transferiu a autora para um outro estabelecimento do mesmo cliente, mais propriamente o sito na Rua da Palma, em Lisboa, com efeitos a partir de 1 de Agosto seguinte, com o horário das 7h às 9h30m e das 15h às 17h, de Segunda a Sexta-feira, e das 7h às 11h30, ao Sábado.
8- Na mesma missiva a ré indicou à autora um outro cliente, a Express Glass, sito na R. D. João V, n.° 25, em Lisboa, com horário, ao Sábado, das 14 às 17 horas. 9- A autora, na sequência da missiva referida em 7 e 8, informou a ré que, a partir do dia 1 de Agosto, passaria a cumprir um horário das 7h às 12 horas, de segunda-feira a sábado, no estabelecimento sito na Rua da Palma, o que sucedeu a partir do dia 3 de Agosto de 2015.
10- A ré, primeiro pessoalmente e, depois, por escrito que dirigiu à autora em 7/08/2015 e que a mesma recebeu no dia 11 seguinte, junto a fls. 65 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido, comunicou-lhe o seguinte: Exma Senhora,
Desde o dia 3 de Agosto corrente que V. Exa se encontra trabalhar num horário exclusivamente por si definido, contra as nossas ordens de serviço e contra os termos contratados pelo nosso cliente. Ou seja, está a fazer um horário de 5 horas diárias, de segunda-feira a sábado, das 7 às 12 horas.
Ora, nem esse era anteriormente o seu horário, nem foi esse que lhe foi comunicado fazer. Esta situação completamente descabida já conduziu à apresentação de uma reclamação por parte do cliente, que não admite que a situação persista.
Assim, vimos comunicar-lhe que deverá cumprir o horário que vinha cumprindo, ou seja, das 7 às 10 e das 15 às 17 horas, de segunda a sexta-feira, e das 7 às 12 horas, ao sábado.
Não será admitida a prestar actividade fora desse horário. Todas as horas inobservadas até ao presente e no futuro não serão pagas.
Será aberto, de imediato, procedimento disciplinar contra V. Exa, o qual abrangerá o comportamento futuro, se for o caso. E tal procedimento terá a decisão que for adequado ao comportamento que V. Exa está a assumir.
Sem outro assunto de momento, nos subscrevemos apresentando os melhores cumprimentos.
11- Não obstante esta comunicação e posteriores comunicações orais da ré no mesmo sentido daquela, a autora, desde o dia 3 de Agosto e até à data em que foi produzida a nota de culpa e em que foi despedida continuou a trabalhar das 7h às 12 horas, de Segunda-feira a Sábado, sustentando não estar obrigada a cumprir o horário que lhe foi comunicado pela ré.
12- Isto contra o que o cliente pretendia que fossem as horas de limpeza dos seus estabelecimentos.
13- O cliente em causa tinha, como tem, grande importância para a ré já que, ao abrigo de contratos celebrados para limpeza dos seus estabelecimentos a nível nacional, tinha 103 trabalhadores a prestar actividade naqueles.
14- O cliente por diversas vezes manifestou à ré que pretendia que continuasse a ser cumprido o horário de limpeza, que havia mais de 3 anos estava em prática, e que fosse posto termo à situação.
15- A permanência da situação em causa era susceptível de se repercutir nas relações da ré com o cliente e de as por em causa, o que geraria um grave problema para a ré, quer pelo número de trabalhadores abrangidos, quer porque as receitas geradas pelo serviço são necessárias e indispensáveis ao prosseguimento da actividade da ré.
16- A autora tinha conhecimento que a ré assegurava o serviço de limpeza a todos os estabelecimentos do mencionado cliente.
17- Até à alteração de local de trabalho para o estabelecimento da Rua da Palma, a autora cumpria o horário referido em 5 sem qualquer reparo ou reclamação. 18- A ré instaurou procedimento disciplinar contra a autora, enviando-lhe em 14/09/2015 a nota de culpa junta a fls. 80-86, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, que a autora recebeu em 15/09/2015.
19- A autora respondeu em prazo à referida nota de culpa, nos termos constantes de fls. 88, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, manifestando, designadamente, que não se encontrava obrigada a cumprir o horário de trabalho fixado pela ré em 1/08/2015, que não deu o seu acordo, pela forma verbal ou por escrito, em relação à alteração unilateral da ré do seu horário de trabalho, que tal alteração implicaria redução no seu vencimento e que, sendo mãe de uma criança de 2 anos, tinha que compatibilizar o horário de trabalho. Mais disse que a Cláusula 4° do contrato de trabalho impunha que tal alteração só pudesse ser concretizada por acordo de ambas as partes, concluindo pela ilicitude do processo disciplinar por falta de justa causa.
20- No dia 28/09/2015, a ré veio a proferir a decisão de despedimento junta a fls. 90-108, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, que remeteu à autora, que a recepcionou em 30/09/2015.
21- Como contrapartida do trabalho prestado, a requerente auferiu a retribuição base mensal de € 382,20, acrescida de € 1,80 por cada dia útil de trabalho a título de subsídio de alimentação.
22- Em data não apurada, mas anterior a 1/04/2012, o horário da autora inicialmente fixado foi alterado, passando a estar repartido entre dois períodos das 7h às 10h e das 15h às 18h de Segunda a Sexta-feira e das 7h às 13h aos Sábados.
23- Com a redução da carga horária referida em 4 e 5 a autora passou a auferir o valor base mensal de € 378,30.
24- Em 22/07/2015 a autora dirigiu-se à ACT onde expôs a questão relacionada com tais alterações.
25- Na sequência da recepção da missiva referida em 7 e 8, a autora falou com responsáveis da ré, solicitando que lhe fosse disponibilizado outro local e horário de trabalho.
26- A autora tem uma filha de 2 anos a quem tem de dar a devida assistência e cuidados e na parte da tarde dos Sábados não tem pessoas amigas ou familiares que possam tomar conta de sua filha.
27- No mês de Junho de 2015 a ré pagou à autora, para além do mais, a quantia de € 189,15 a título de subsídio de férias.
28- No mês de Agosto de 2015 a ré pagou à autora as quantias descriminadas no recibo de fls. 140, sendo € 183,33 a título de vencimento, € 37,80 a título de subsídio de alimentação e descontou-lhe a quantia de € 194,97 a título de 67 horas de faltas injustificadas.
29- No mês de Setembro de 2015 a ré pagou à autora as quantias descriminadas no recibo de fls. 139, sendo € 196,91 a título de vencimento, € 39,60 a título de subsídio de alimentação, € 189,15 a título de subsídio de férias e descontou-lhe a quantia de € 130,95 a título de 45 horas de faltas injustificadas e a quantia de € 50,44 por 4 dias de ausência por motivo de baixa.
30- A indicação referida no ponto 8 tratou-se de um lapso dos escritórios da ré, sendo que, para além da missiva ali referida, não mais foi dito à autora que tinha que cumprir aquele horário e naquele local de trabalho.
31- A redução da carga horária referida em 5 e a repartição de horário referida em 22 foram efectuadas a pedido da cliente onde a autora prestava a sua actividade e abrangeu a grande parte do pessoal de limpeza que trabalhava para tal cliente.
VIII- Nos termos dos arts. 635°-4, 637°-2, 639°-1-2, 608°-2 e 663°-2, todos do CPC/2013, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação; os tribunais de recurso só podem apreciar as questões suscitadas pelas partes, salvo se importar conhecê-las oficiosamente.
Tratando-se de recurso a interpor para a Relação, como este pode ter por fundamento só razões de facto ou só razões de direito, ou simultaneamente razões de facto e de direito, assim as conclusões incidirão apenas sobre a matéria de facto ou de direito ou sobre ambas (v. Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3a ed., pag. 148).
Atento o teor das conclusões das alegações apresentadas pelas apelantes, as questões que fundamentalmente se colocam nos presentes recursos são os seguintes:
A 1a, se a matéria de facto da como provada pode ser alterada corno pretendido pela autora.
A 2a, se face à factualidade provada, o despedimento da autora foi ilícito, porque sem justa causa.
A 3a, se a autora tem direito às quantias peticionadas incluindo as decorrentes de despedimento ilícito.
IX- Decidindo.
Quanto à 1ª questão
Sobre a impugnação da decisão da matéria de facto dispõe o art.° 640° do CPC/2013, no seu n °1: Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou
gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas
n° 2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte.
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Ora apesar de a autora pretender quatro alterações da matéria de facto, em relação a três delas não indica as passagens das gravações em que se funda os seus pedidos de alteração limitando-se a indicações genéricas como, por exemplo, de que o depoimento se encontra gravado ou durante o seu depoimento gravado.
Relativamente à pretensão de que Deveria ter sido dado por provado que a Requerida não cumpriu o determinado nos n°s 2 e 4 do art. 217° do CT, não estamos perante qualquer factualidade a considerar mas antes perante uma pretensão de que se estabeleça matéria de direito a adicionar aos factos provados. Pois com factos assim, para quê fazer sentenças ou acórdãos ?...
Fica, pois, rejeitada na sua totalidade, a pedida reapreciação da matéria de facto.
Quanto à 2ª questão.
A autora foi despedida pela ré porque aquela não cumpriu o horário de trabalho que lhe estava estabelecido.
Resulta dos factos dados como provados que entre 2007 e 2012 a autora cumpriu um horário de trabalho acordado com a ré entre as 7 e as 13 horas, de segunda a sábado (factos n°s 2 e 3).
Antes de 1/4/2012, o horário da autora foi alterado, passando a ser de segunda a sexta das 7 às 10 horas e das 15 às 18, e aos Sábados das 7 às 13 (facto n° 22)
Mas, com efeitos a partir de 1/4/2012, a autora acordou com a ré reduzir a duração semanal do seu trabalho de 36 horas para 30 horas (facto n° 4) o que veio a determinar alteração do horário de trabalho que passou a ser de segunda a sexta, das 7 às 10 horas e das 15 horas às 17 horas de segunda a sexta e ao Sábado das 7 às 12 horas (facto n° 5).
Já, com efeitos a partir de 1/8/2015, a ré pretendeu que a autora trabalhasse noutro local com horário das 7 às 9.30 horas e das 15 horas às 17 horas de segunda a sexta e ao Sábado das 7 às 11.30 horas (facto n° 7). Mais indicou outro local de trabalho ao Sábado, com horário entre as 14 e as 17 horas (facto n° 8).
Na sequência, a autora comunicou à ré que trabalharia de segunda a Sábado entre as 7 e as 12 horas (facto n° 9).
Em face da posição da autora a ré então determinou que a autora regressasse ao horário que vinha cumprindo desde Ide Abril de 2012, ou seja, de segunda a sexta, das 7 às 10 horas e das 15 horas às 17 horas de segunda a sexta e ao Sábado das 7 às 12 horas (facto n° 10).
Apesar da determinação para o regresso ao horário anterior a 1/8/2015, a autora passou a trabalhar de segunda a sábado entre as 7 e as 12 horas (facto n° 11).
Veio a autora/apelante sustentar no seu recurso que só estava obrigada a prestar trabalho em função do horário de trabalho estabelecido em 2007 por duas ordens de razões: Urna, porque nunca deu o seu acordo à mudança do horário de trabalho fora do período inicialmente estabelecido, entre as 7 e as 13 horas; Outra, porque a partir de 2015, para além de lhe manterem um horário repartido ao longo do dia, indicavam um segundo local de trabalho aos Sábados à tarde.
Vejamos então, com mais pormenor.
No que toca à alteração ocorrida em 1/8/ 2015, só assistiria razão à autora na recusa em cumprir o novo horário de trabalho (e em trabalhar em dois locais) se a ré não tivesse arrepiado caminho e não lhe tivesse determinado o regresso ao cumprimento do horário que cumpria desde 1/4/2012, ou seja, há mais de 3 anos, necessariamente excluindo o trabalho no novo segundo local pois era da parte da tarde de Sábado.
Portanto, a posterior e contínua recusa da autora em regressar ao horário que imediatamente tinha efectuado só é admissível se também não estivesse obrigada ao cumprimento do mesmo, mas tão só do horário estipulado inicialmente em 2007.
Se é certo que compete ao empregador determinar o horário de trabalho (art. 212°-1 do CT/2009), o mesmo não pode ser alterado unilateralmente aquele que foi individualmente acordado (art. 217°-4 do CT/2009).
Será então que, face aso factos provados, podemos considerar que existiu acordo entre autora e ré, em 2012, para a alteração do horário acordado em 2007 ?
Na sentença recorrida entendeu-se, e bem, que houve uma aceitação tácita, por parte da autora, do novo horário estabelecido a partir de 1/4/2012, tendo em conta que somente após 3 anos e 3 meses é que a autora o veio colocar em causa, o que antes nunca acontecera (facto n° 17).
Acompanha-se por isso o Ac. do STJ de 21/1/1998 (também citado na sentença recorrida), P. n° 97S187, disponível em www.dgsi.pt/jstj, quando ali se escreve que É que os Autores efectuaram a sua prestação laboral durante um espaço de tempo tão dilatado como o que se verificou no caso presente não pode deixar de ser entendida como uma aceitação tácita revelada pelo seu conformismo.
Na verdade, parece-nos certo que, seguindo-se à referida alteração uma prática reiterada da prestação laborai cumprindo o novo horário, sem que manifestassem o seu desacordo e com perduração por tempo prolongado (a alteração foi efectuada em Julho de 1982 e a acção foi intentada em Julho de 1993), seria atentatório das regras da boa-fé e excederia manifestamente o fim económico e social do direito exercido o vir agora pedir a reposição de um horário que estava a não ser praticado há vários anos, com as consequentes compensações legais.
Assim, e face ao circunstancialismo referido seria abusivo o exercício do direito por parte dos Autores (cfr. Acórdão deste Supremo, de 10 de Julho de 1996, na Revista 4279)..
Acresce que já antes de Abril de 2012 a autora passara a ter um horário repartido ao longo do dia, como resulta do facto provado n° 22.
Não podia assim a autora recusar-se, como recusou a cumprir o horário que aceitou desde 1/4/2012.
A sentença recorrida não merece, por isso, censura, sendo de confirmar inteiramente e ficando prejudicado o conhecimento da 3ª questão enunciada.
X- Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas em ambas as instâncias a cargo da autora sem prejuízo da isenção de que goza.
Lisboa, 5 de Abril de 2017