Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 13-02-2019   Justa causa. Quebra de confiança. Reintegração. Oposição à reintegração. Colocação de outro trabalhador no lugar. Danos não patrimoniais.
O apuramento da justa causa' corporiza-se, essencialmente, no elemento da impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação de trabalho. Relativamente à interpretação desta componente objectiva de justa causa', tem-se entendido que a mesma se traduz na impossibilidade de subsistência do vínculo laboral que deve ser reconduzida à ideia de inexigibilidade da manutenção vinculistica, numa perspectiva de impossibilidade prática, no sentido de imediatamente comprometer, e sem mais, o futuro do contrato. Para tanto, a impossibilidade do vínculo laboral deve ser apreciada tendo em consideração todos os interesses que estão na base da relação contratual, existindo sempre que a manutenção do contrato constitua uma insuportável e injusta imposição do empregador (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.03.2016, proc. 695/03.3TTGMR.G1.S1, www.dgsi.pt).
O apuramento de tal elemento passa por um juízo de prognose sobre a viabilidade da relação contratual, no sentido de saber se ela mantém, ou não, a aptidão e idoneidade para prosseguir a função típica que lhe está cometida, juízo a realizar segundo um padrão essencialmente psicológico, o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, que radica, in extremis, na quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador.
Embora o autor tenha agido sem a prudência, zelo e diligencia que lhe eram exigíveis, ponderando o apontado circunstancialismo (em que os ditos responsáveis também contribuíram para o sobredito desfecho), não se tendo provado prejuízos para a ré, na ausência de passado disciplinar do autor - pese embora a sua conduta seja merecedora de óbvia censura disciplinar, ao abrigo dos princípios de adequação e proporcionalidade que regem a aplicação de sanções disciplinares (art.° 330.° do Código do Trabalho), ao caso seria de aplicar sanção conservatória do vínculo, não ocorrendo justa causa de despedimento.
À luz do princípio da segurança no emprego (art.° 53.° da CRP), e da proibição dos despedimentos sem justa causa, a reintegração do trabalhador ilicitamente despedido é o seu corolário natural. A oposição à reintegração, assume, por isso, natureza excepcional.
Os factos justificativos do afastamento da reintegração poderão radicar nos que levaram o tribunal a declarar a ilicitude do despedimento desde que deles emerjam consequências que permitam formular o juízo pressuposto no aludido normativo legal, ou quando ocorram outros elementos exteriores ao juizo sancionatório do empregador (Pedro Furtado Martins Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, 3. a Edição, pág. 487), que fundamentem a não reintegração.
Na análise da situação impõe-se apurar se ocorre a quebra da base da confiança em que assentou a relação de trabalho, o que deverá ser feito de acordo com as circunstâncias do caso, e em termos rigorosos. E não basta que se apure ser o regresso do trabalhador indesejável ou inconveniente para o empregador, pois serão estas, à partida, as consequências normais de qualquer reintegração decorrente da declaração de um despedimento ilícito.
A circunstância de a ré ter entretanto colocado outro trabalhador a exercer as funções que estavam confiadas ao autor como director coordenador, resultando a reintegração numa duplicação de titulares das ditas funções, não constitui obstáculo, só por si, à reintegração do trabalhador ilicitamente despedido.
Ponderando o tipo de empresa em questão (de estrutura hierarquizada, complexa e burocrática), em que a fidúcia, embora essencial, não pressupõe necessariamente o contacto directo entre os sujeitos; não se podendo olvidar que o autor era pessoa considerada pelos seus colegas de trabalho, nada se tendo apurado no sentido de ter deixado de o ser, e porque nada mais a ré demonstrou que nos permita dizer que ocorre uma irremediável quebra de confiança no trabalhador em questão com projecção no futuro da relação laboral, é de concluir não estar demonstrado que o regresso do autor é (ou viria a ser) gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.
O autor era um trabalhador competente e zeloso, sendo pessoa considerada entre os colegas de trabalho; a instauração do procedimento disciplinar o abalou profundamente, tendo perdido peso. Começou a isolar-se e a conviver muito pouco com colegas e amigos. E que, com o despedimento o referido estado do autor se agravou, evitando sair de casa e estar com outras pessoas. O autor sentia vergonha da situação em que se encontrava e ficou preocupado e abatido, o que era visível por parte de familiares e amigos. Ora, à luz dos considerandos que se expuseram, os padecimentos acima descritos sofridos pelo autor em consequência do despedimento ilícito de que foi alvo configuram-se como danos não patrimoniais que vão para além dos simples incómodos e transtornos, sendo merecedores da tutela do direito.
Proc. 19844/17.8T8LSB.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Albertina Pereira - Leopoldo Soares - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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Proc. 19844/17.8LSB.L1
Apelação — 4.ª Secção
1. Relatório
1. 1. MJC..., residente em Lisboa, veio intentar a presente acção declarativa de condenação com processo especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra BBP..., S.A., com sede em Lisboa, opondo-se ao seu despedimento e pedindo a declaração da ilicitude e/ou irregularidade do mesmo.
Teve lugar a audiência de partes, sem conciliação.
A R motivou o despedimento do A, concluindo pela improcedência da acção e pela licitude e regularidade daquele. Alega sumariamente que o processo disciplinar foi regularmente instruído, inexistindo irregularidades ou nulidades que afectem, sendo verdadeiros os factos nele descritos e tendo a sanção de despedimento perfeito cabimento face à gravidade dos mesmos; à cautela, para o caso de procedência da acção, opõe-se à reintegração do trabalhador.
Contestou o A aquela motivação, alegando, em suma, que prescreveu o direito de exercer o poder disciplinar; caducou o direito de exercer o poder disciplinar; ocorre nulidade do procedimento disciplinar por ausência de produção de prova; os factos invocados para fundamentar a justa causa também não são aptos a despedir. Conclui pela condenação da R na sua reintegração, bem como a pagar-lhe as retribuições que se têm vindo a vencer. Em reconvenção, pediu a condenação da R a pagar-lhe uma indemnização por danos não patrimoniais e nas despesas e honorários dos seus mandatários.
Em resposta, a R refutou o alegado pelo A. e contestou o pedido reconvencional.
Foi proferido despacho saneador.
Teve lugar audiência de discussão e julgamento:
Proferida sentença foi a acção julgada parcialmente procedente, tendo-se decretado a ilicitude do despedimento do autor e condenado a R:
a) a reintegrar o A no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
b) a pagar-lhe todas as retribuições, vencidas e vincendas, desde 13 de Agosto de 2017 e até à data do trânsito em jugado desta sentença;
c) a pagar ao A uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de É 10.000,00, absolvendo-a do demais peticionado.
Inconformado com esta decisão dela recorrem a ré e autor, aquela também, em recurso autónomo, quanto ao valor da causa, finalizando as respectivas alegações desses recursos com as seguintes conclusões:
1.2. Recurso da ré quanto ao valor da causa
1.0 Mmo. Juiz a quo fixou o valor da causa em € 10.000, por ter sido esse o valor da indemnização arbitrada por (arrogada) violação de danos não patrimoniais.
2. Sucede que, nos termos do artigo 98.°-P, n.° 2 do CPT, o valor da causa deve ter em conta a utilidade económica do pedido, designadamente o valor de indemnização, créditos e salários que tenham sido reconhecidos.
3. Ao considerar apenas o valor da indemnização por danos não patrimoniais efetivamente atribuída (alínea c) do dispositivo final), o Mmo. Juiz recorrido, para além de ter considerado apenas parte da sucumbência do Empregador (e não do Trabalhador que formulou um pedido reconvencional de € 250.000) - olvidou de considerar a utilidade económica das demais alíneas do dispositivo final [cfr. als. a) e b), atinentes ao objeto principal dos autos: a declaração da ilicitude do despedimento].
4. Assim sendo, o valor da ação deve ser revisto para € 295.816,60, por ser esta a soma das seguintes parcelas: retribuições intercalares (vencidas no prazo de um ano prevenido no art. 98.°-N do CPT): € 32.071,62; reintegração: € 13.744,98 e pedido reconvencional/ indemnização por danos morais: € 250.000.
5. A respeito das retribuições intercalares, desde já se esclareça que compete ao juiz o conhecimento e liquidação do respetivo montante por força do princípio da oficiosidade que rege a determinação do valor da causa.
6. Assim, para o cômputo dos salários de tramitação, há que atentar que Trabalhador auferia o nível 16 do Acordo de Empresa aplicável à relação laboral entre aquele e o Recorrente (€ 2.290,83) [factos provados 8 e 14]. Subsidiariamente, deve ser considerado o nível mínimo da categoria de Subdiretor: nível 13 (€ 1.748,10).
7. O valor relevante de retribuições intercalares deve ser atualizado à data da prolação do acórdão que julgue o presente recurso por força do disposto no artigo 299.°, n.° 4 CPC, conjugado com o artigo 98.°-P, n.° 2 do CPT.
8. Quanto ao pedido de reintegração, o mesmo deve ser computado em seis retribuições mensais, como bem decidiu esta Secção Social por acórdão de 23.2.2011.
9. Ao fixar o valor da causa em € 10.000 (dez mil euros), o Juízo do Trabalho de Lisboa violou o disposto no artigo 98.°-P, n.° 2 do CPT.
1.3. Recurso da ré da sentença
Retificações da Sentença:
1. A remissão para o facto provado n.° 27 constante do facto provado n.° 39 deve ser entendida como realizada para o facto provado n.° 33.
2. A remissão para o facto provado n.° 27 constante do facto provado n.° 41 deve ser entendida como realizada para o facto provado n.° 39.
3. No facto provado n.° 14 o nome da associação sindical deve ser retificado para Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas; no facto provado n.° 55 a referência correta é a Diretor Regional e não a Diretor Coordenador.
Nulidades da Sentença:
4. A Sentença padece de nulidade por omissão de pronúncia, por não ter conhecido da justa causa de despedimento, assim violando o disposto no artigo 387.°, n.° 4 do CT ex vi artigo 98.°-M, n.° 2 do CPT.
5. A Sentença padece de nulidade por excesso de pronúncia, por ter dado como provado o facto n.° 57, que, sendo embora essencial na economia da exceção de caducidade do poder disciplinar e cujo ónus da prova cabia ao Trabalhador, não foi por este alegado (sendo que sequer identificou o titular do poder disciplinar no Empregador:
Comissão Executiva), não tendo sido dado cumprimento ao disposto no artigo 72.°, n.° 1 do CPT.
Destarte, o facto em causa deve ser eliminado e a exceção de caducidade julgada improcedente.
Impugnação da matéria de facto:
6. Os factos alegados no artigo 67.° do articulado motivador e nos artigos 124.° e 125.° da resposta à contestação devem ser adquiridos, por provados (cfr., respetivamente, Doc. n.° 8 anexo ao articulado inicial e depoimentos de AL...4l — [(10:30); ( 41)
Cfr. ata da audiência de julgamento de 15.2.2018; ficheiro
20180215161715_19379430_2871085. (14-08-2018 14:12:53) Página 3767 de 3999 67/74 (11:46)] e AP... 42 — [(14:31); (15:25)]) e relevantes para a decisão da causa, passando a constar que:
Facto aditando 1: O Empregador tem em vigor um Código de Conduta, que determina: artigo 5.°, n.° 1 (citação da estatuição); artigo 6.°, n.° 3 (citação); artigo 32.°, n.° 2 (citação), artigo 35.°, n.° 4 (citação).
Facto aditando 2: O A foi anteriormente sancionado com suspensão pela prática de rotação de cheques.
7. O facto provado n.° 1 deve ser reformulado em face do estrito teor retirável da missiva nele referida:
Por carta de 3 de junho dc 2016, junta a fls. 221, a R. comunicou ao A a sua suspensão preventiva, no âmbito de um processo prévio de inquérito.
8. Os factos provados n..° s 7, 57 (que se abordarão por ordem inversa), 58 a 62 devem ser eliminados do probatório, porquanto:
8.1. O facto provado n.° 57 foi adquirido com preterição do artigo 72.°, n.° 1 do CPT. Do depoimento de CPT... - que não é conclusivo — não resulta ter sido essa a data em que a Comissão Executiva, órgão titular do poder disciplinar, teve conhecimento da matéria de infração [(18:03);(18:17)]; [(27:38);(28:42)]; [(31:35);(32:12)]; [(32:53); (33:24)]; [(35:11); (35:26)]; [(35:54); (36:26)]; [(40:56); (41:51)]. Adite-se que a motivação do Tribunal recorrido neste tocante não colhe, porquanto não faz sentido alinhar o conhecimento dos factos com o da acusação pública, quando esta é posterior à data apurada pelo julgador a quo (facto provado 16).
8.2. O facto provado n.° 7 deverá ser eliminado do probatório posto que o Mmo. Juiz não o relevou para a apreciação da exceção de caducidade e tampouco o poderá fazer este Tribunal de Recurso (cfr. artigo 130.° CPC). Se o facto provado n.° 57 for suprimido, o facto em apreço deverá ter o mesmo destino, posto que falece o pressuposto da exceção de caducidade (a data do conhecimento dos factos). Em todo o caso, o facto em apreço é infirmado pelo Doc. n.° 2 junto à resposta à contestação, pelo requerimento do Recorrente de 27.2.2018 e pelo depoimento de AL... [(11:47); (13:02)], [(13:31); (14:09)] e [(14:19); (14:28)].
8.3. O facto provado n.° 58 deve ser eliminado do probatório por conflituar com o facto aditando 1 e com o depoimento de AP..., que acaba por reconhecer, em contravenção aos elogios tecidos ao amigo, o antecedente disciplinar: [(14:31); (15:25)].
8.4. Os factos provados n.os 59 a 62 devem ser eliminados do probatório por terem assentado em depoimentos que se pautaram por serem meramente proclamatórios, doutrinadores e genéricos, que (42) Cfr. ata da audiência de julgamento de 12.3.2018; ficheiro 20180312103436_19379430_2871085. ( 43) Cfr. ata da audiência de julgamento de 15.2.2018; ficheiro 20180215145004_19379430-2871085. (14-08-2018 14:12:53) Página 3768 de 3999 68/74 não deveriam ter merecido o crédito do Julgador de 1.a instância — cfr. depoimento de LFJ...44 ([(01:38);(04:15)]; [(08:34);(10:40)]; [(14:11); (17:42)]; [(18:00);(18:38)]; [(19:21);(19:59)]), AJL...45 ([(02:43); (02:50)]; [(03:12); (03:21)]; [(03:34); (03:45)]; [(03:50); (04:10)]; [(04:29); (04:43)1; [(06:00); (06:07)]) e de JMR...46 ([(03:40);(03:53)]; [(04:56); (05:03)];[(05:18); (05:21)]).
8.5. O facto provado n.° 60 resultou infirmado por LFJ... que declarou que ele hoje já está mais forte novamente (sic) — v. [(21:30); (21:32)], pelo que o mesmo deve ser suprimido do probatório.
8.6. A propósito do facto n.° 62, registe-se que o mesmo apenas poderia ter sido firmado com base em prova pericial ou, pelo menos, em atestado médico, elementos que não foram carreados para os autos, devendo o ponto em exame ser, também por esta razão, eliminado do probatório.
Impugnação da matéria de Direito:
9. Sendo erradicado o facto provado n.° 57 do probatório, a exceção de caducidade do poder disciplinar terá de ser julgada improcedente, por não provada.
10. Os factos infracionais julgados provados consubstanciam justa causa, uma vez que resultam da violação grave dos deveres laborais que impendem, com especial acuidade sobre os titulares de cargos dirigentes, como é o caso do aqui Recorrente.
11. No contexto de envolvimento do Recorrido com empresas que, com desconhecimento do Empregador, se encontravam ligadas ao narcotráfico (factos provados 19 a 32, 35 a 38 e 42), aquele instruiu um subordinado seu no sentido de contornar a instrução que lhe fora dada por dois administradores do Empregador para se articular com o gabinete de Compliance, tendo-se realizado uma operação que não reverteu — cfr. facto provado 51), atuando em contravenção ao decidido e decretado pela Procuradoria-Geral da República (factos provados 45, 47, 48 a 51).
12. Acrescente-se que, durante o processo-crime, o Recorrido apresentou justificações díspares para o facto de não ter dado cumprimento à determinação dos administradores do Empregador (factos provados 52 e 54), tendo-se acautelado, de forma irrazoável, com a fotografia do seu telefone, quando era sabido que, no dia 30 de setembro e em face da ordem da Procuradoria-Geral da República, a reunião com a ( 44) Ata da
audiência de discussão e julgamento de 12.3.2018; ficheiro
20180312105107_19379430_2871085 (45) Ata da audiência de discussão e julgamento de 12.3.2018; ficheiro 20180312111509_19379430_2871085. ( 46) Ata da audiência de discussão e julgamento de 12.3.2018; ficheiro 20180312112316_19379430_2871085. A Dra. VM... deixara dc fazer sentido c a operação dc transferência já havia sido executada, por ordem sua.
13. O Recorrente não deve arrostar com responsabilidade por danos não patrimoniais, já que, tendo-se eximido a apreciar a justa causa, o Tribunal a quo não poderia ter concluído pela verificação de um comportamento culposo do Empregador, sendo que a ilicitude do despedimento assente na caducidade do poder disciplinar não é apta a gerar danos morais tuteláveis pelo Direito (especialmente considerando, como se apurou, o cometimento de infrações disciplinares). Em todo o caso, o montante de € 10.000 afigura-se excessivo.
14. Em suma, o despedimento do Recorrido deveria ter sido julgado licito, o que se requer seja reconhecido por V. Exas., com o consectário absolutório daí resultante.
15. Subsidiariamente, deve este Tribunal de Recurso deferir a oposição reintegração com base, em especial, nos factos assentes n.os 16, 17, 45, 48, 50, 52 a 54 e 55
(e no facto aditando 2), por tais factos serem reveladores de que o regresso do Recorrido é gravemente prejudicial e perturbador ao funcionamento da Empresa.
16. A reintegração do Recorrido configura, aliás, uma impossibilidade jurídica, conforme resulta dos artigos 30.°-A, n.° 1 e 30.-D, n.° 3, al. h) do RGICSF (v. factos 16 e 17).
17. Deferindo a oposição à reintegração, deverá este Venerando Tribunal da Relação fixar a correlativa indemnização no mínimo legal, considerando uma antiguidade reportada a 2.4.2012 (cfr. cláusula 2.ª do contrato de trabalho — facto provado n.° 56, conjugado com o disposto no artigo 339.°, n.° 1 e 3.°, n.° 5 do Código do Trabalho).
18. Ao ter condenado o Recorrente nos termos constantes das alíneas a) a c) do dispositivo final, o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 72.°, n.° 1 e 98.°-M, n.° 2 do Código de Processo do Trabalho, 329.°, n.° 1, 351.°, n.° 1, 387.°, n.° 4 e 392.° do Código do Trabalho e 496.° e 563.° do Código Civil.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a Sentença do Juízo do Trabalho de Lisboa. Assim decidindo, farão V. Exas. JUSTIÇA!
1. 4. Recurso do autor
A. O Recorrente vem recorrer da Sentença de fls..., que julgou parcialmente procedente a Ação de Impugnação Judicial da Regularidade e Licitude do Despedimento intentada pelo Autor, ora Recorrente e consequentemente condenou a Ré: 1) a reintegrar o A. no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade; 2) a pagar-lhe todas as retribuições, vencidas e vincendas, desde 13 de agosto de 2017 e até à data do transito em julgado da sentença; 3) a pagar ao A. Uma indemnização por danos não patrimoniais no montante de 10.000,00 Euros; 4) absolvendo-a do demais peticionado, por não se conformar com a mesma, versando o presente recurso sobre matéria de direito;
B. O Recorrente não se conforma com a Sentença quanto à determinação do montante da indemnização a título de danos não patrimoniais na quantia de 10.000,00 Euros (dez mil euros);
C. Quanto ao valor da compensação o Tribunal considerou os 250.000,00 Euros peticionados pelo Recorrente ... muito exagerado, tendo em consideração os danos concretamente apurados (...) Assim, tudo ponderado, incluindo (o indicado) valor da retribuição do A., a sua antiguidade e tipo de danos provados, parece-nos justo e adequado fixar a indemnização em 10.000,00 Euros.
D. O Tribunal a quo considerou, ao atribuir o valor de 10.000,00 Euros a título de danos não patrimoniais, que quanto ao facto de o A. se ter sentido fortemente abalado e envergonhado, muito embora sejam sentimentos que um despedimento ilícito sempre provoca nos visados, (...) o certo é que não podemos olvidar que se trata de um subdiretor bancário, responsável por varias agências do Banco R., caso em que tais factos assumem proporções assinaláveis. Sobretudo tendo em consideração que a suspensão e o despedimento do trabalhador colocaram em causa a sua imagem profissional, a sua honra e bom nome perante colegas e familiares (...) e a dificuldade que o A. irá enfrentar para recuperar a imagem perdida.
E. No caso concreto, estamos perante um trabalhador que exercia funções junto da Recorrida há mais de 17 anos, exercendo, atualmente, um cargo de chefia.
F. Estamos perante um trabalhador que foi afastado do seu local de trabalho, sem que tenha sido provado em sede de procedimento disciplinar qualquer ilícito disciplinar.
G. Estamos perante um trabalhador que irá enfrentar imensas dificuldades para recuperar a imagem perdida, não apenas juntos dos clientes mas também junto dos seus familiares e amigos.
H. Mais, o procedimento disciplinar intentado pela R. contra o A., bem como o despedimento promovido por esta, teve efeitos gravíssimos para o Recorrente, a nível físico e psiquiátrico.
I. O comportamento adotado pela Recorrida durante todo o procedimento disciplinar provocou no Recorrente danos que jamais serão indemnizáveis.
J. Estamos perante um procedimento disciplinar intentado por uma conceituada instituição bancária contra um seu trabalhador, com o objetivo de melhorar a imagem pública da mesma.
K. Mais, com o despedimento ilícito do Autor, este deixou de ter acesso a cuidados de saúde (SAMS) a que tinha direito por exercer funções no setor bancário.
L. Sendo o Autor doente oncológico, com a perda de cuidados do SAMS, o Autor foi obrigado a recorrer a tratamentos tanto no Serviço Nacional de Saúde, por falta de rendimentos), bem como no setor privado (pagando pelos mesmos na sua totalidade).
M. O setor bancário, onde o trabalhador se insere, é um setor na qual a imagem, o bom nome, a seriedade e a confiança são valorizadíssimos pelos clientes e colegas em grau superior ao seu, o que agrava a posição do ora Recorrente.
N. Mais, sendo que o Recorrente exercia, à data do despedimento, as funções de subdireção, valores como a honestidade e idoneidade são fundamentais e imprescindíveis não só para a progressão na carreira, como também para o alcance das métricas a que se obrigou. O. Com o despedimento ilícito promovido pela Recorrida, a imagem do Autor ficou irremediavelmente abalada e fragilizada, junto dos seus Clientes, colegas de trabalho, familiares e amigos.
P. O valor atribuído pelo Tribunal a quo é um valor sem qualquer impacto económico para a Recorrida, uma vez que se trata de uma conceituada instituição bancária.
Q. A atribuição do valor da indemnização no montante estipulado pelo Tribunal a quo, mais não é do que um premiar do prevaricador, em detrimento do Trabalhador, aqui Recorrente, que viu o seu despedimento ser declarado ilícito.
R. Nos termos do artigo 389.° do Código do Trabalho Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenando a) a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais.
S. Sendo o Código do Trabalho omisso quanto à forma de se apurar o quantum indemnizatório dos danos não patrimoniais, devemos socorrer-nos do artigo 496.°, número 1, do Código Civil que estabelece que a fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam, a tutela do direito.
T. Dispõe o número 3 do mesmo artigo que a indemnização por danos não patrimoniais será fixada equitativamente, devendo o tribunal considerar, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.° do mesmo Código, o qual prevê que, na fixação do valor da indemnização há que ter em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
U. O despedimento, repita-se, ilícito, colocou em causa o bom nome do ora Recorrente, a sua reputação profissional, prejudicando, obviamente, o seu futuro profissional e originando um estado de angústia e de depressão elevadíssimos.
V. Não podemos esquecer que o Recorrente trabalha há mais de 23 anos no sector bancário, exercendo funções junto da ora Recorrida há mais de 17 anos.
W. Não nos podemos esquecer também que com o despedimento, o Recorrente deixou de poder aceder aos cuidados de saúde que lhe eram proporcionados pelo SAMS desde a data da sua admissão no setor bancário.
X. Nem do facto de ter 50 anos, idade na qual, como sabemos, assume uma dificuldade acrescida de voltar a encontrar um emprego, seja qual for o setor no qual pretenda ingressar.
Y. Somos obrigados a concluir, por todo o exposto, que a decisão recorrida incorre numa manifesta contradição entre a fundamentação apresentada e a consequência jurídica dela retirada, consubstanciando a mesma numa má avaliação de direito, ao considerar o Tribunal a quo ser suficiente a atribuição de uma indemnização no valor de 10.000,00 Euros, violando o disposto no artigo 389.°, n° 1 a) do Código do Trabalho.
NESTES TERMOS e nos melhores de Direito que V. Exas., Senhores Juízes Desembargadores, suprirão, admitindo a presente Apelação, 1. Revogando a Sentença Recorrida quanto à questão de Direito referida supra e, consequentemente condenar a Recorrida ao pagamento da indemnização peticionada a título de danos não patrimoniais no valor de 250.000,00 Euros.
1. 5. O autor respondeu ao derradeiro recurso da ré no sentido do seu não provimento, e a ré ao do autor, concluindo também pelo seu não provimento.
1. 6. O juiz a quo pronunciou-se quanto às invocadas nulidades da sentença, concluindo pela sua não verificação (fls. 780).
1. 7. A R. prestou caução (fls. 844 e 845), que por despacho foi considerada válida (fls. 848).
1. 8. Os recursos foram admitidos, na espécie, efeito e regime de subida adequados (fls. 847 e 848).
1. 9. Recebidos os autos nesta Relação foi ordenado o cumprimento do art.° 87.° n.° 3 do Código de Processo do Trabalho.
1. 10. A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta nesta Relação emitiu parecer no sentido do parcial provimento do recurso da ré quanto ao valor da causa, concluindo pelo não provimento do recurso da ré da sentença e pelo não provimento do recurso do autor (fls. ).
1. 11. A tal parecer apenas respondeu a ré, mantendo os pontos espelhados nas suas alegações (fls. ).
1. 12. Foram colhidos os vistos legais e realizada a conferência. Cumpre apreciar e decidir
2. Objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que não tenham sido apreciadas com trânsito em julgado - artigos 635.°, números 3 e 4, 639.°, n.° 1, 608.°, n.° 2, do Código de Processo Civil (CPC). Não se confundindo com as questões os argumentos e a teses das partes às quais não está o tribunal vinculado a responder (art.° 5.° n.° 3 do CPC). Assim, as questões que se colocam à apreciação deste tribunal decorrentes dos recursos da ré e do autor consistem em apreciar o seguinte:
- se o valor fixado à acção deve ser alterado;
- se a sentença deve se rectificada;
- se a mesma é nula;
- se deve alterar-se a decisão da matéria de facto;
- se deve serjulgada improcedente a excepção de caducidade do poder disciplinar;
- se o despedimento do autor deve ser declarado lícito;
para a hipótese de ser declarado ilícito o despedimento
- se procede oposição à reintegração do autor;
Em caso afirmativo
- se a antiguidade do autor é a indicada pela ré;
E
- se deve ser alterado o valor da compensação fixado ao autor a título de danos não patrimoniais.
3. Fundamentação
3. 1. Fundamentação de facto
Na primeira instância foram considerados provados os seguintes factos:
1. Por carta de 3 de Junho de 2016, junta a fls. 221, decidiu a R suspender preventivamente o A e abrir um processo prévio de inquérito (alterado infra).
2. Por carta datada de 1 de Junho de 2017, foi o A notificado da nota de culpa que está junta a fls. 125.
3. Por e-mail de 27 de Junho de 2017 respondeu o A àquela nota de culpa.
4. Em 28 de Junho de 2017 foi o processo disciplinar remetido à Comissão de Trabalhadores, entidade que emitiu o parecer que está junto a fls. 157
5. Em 31 de Julho de 2017, o instrutor do procedimento disciplinar elaborou o relatório final, junto a fls. 158 verso que veio a ser acolhido pela R, tendo comunicado por carta a decisão de despedimento com justa causa ao A, em 10 de Agosto de 2017.
6. O A recebeu esta comunicação em 11 de Agosto de 2017.
7. Entre a abertura do processo de inquérito e a dedução da nota de culpa e entre esta e a decisão final, nenhum acto instrutório foi praticado no âmbito do procedimento disciplinar (suprimido infra).
8. O A é, desde 2 de Abril de 2012, trabalhador subordinado do R, com o número de colaborador 799, titulando a categoria profissional de Subdirector e exercendo actualmente, desde 2 de Abril de 2012, as funções de Director Regional.
9. Em 15 de Junho de 2013, o A assumiu as funções de Director Regional de Lisboa, tendo sob sua responsabilidade a supervisão da agência sita na Avenida Fontes Pereira de Melo, n.° 34-A, em (1050-010) Lisboa.
10. O A reporta a JP..., Director Coordenador, estando ambos, até 8 de Julho de 2016, sob a égide do administrador do pelouro comercial, Dr. JPG....
11. Como resulta da Instrução de Serviço n.° 12/39, As Direções Regionais dependem hierarquicamente da Direção Coordenadora em que estão integradas (na dependência direta do Diretor Coordenador) e a sua chefia é exercida por um titular com categoria diretiva (Diretor Regional), responsável pelo acompanhamento da gestão e dos resultados das Agências integrantes da respetiva Direção.
12. O Responsável da Agência (Gerente ou Subgerente) depende hierarquicamente do Diretor Regional respetivo e assegura a gestão da Agência nas vertentes comercial e de apoio operativo à atividade comercial desenvolvida pela mesma.
13. No âmbito das suas funções, compete ao A, nomeadamente, Gerir, coordenar e dinamizar a atividade da Direção Regional e Acompanhar e colaborar nas medidas que minimizem o risco latente em Clientes que evidenciem sinais de alerta, que não exclusivamente o incumprimento de operações (...).
14. O A é associado do Sindicato do Sul e Ilhas; não é representante sindical.
15. A 22 de Abril de 2015, a Policia Judiciária procedeu a buscas no local de trabalho do ora A, em resultado das quais apreendeu pastas de documentos e procedeu à cópia do conteúdo do computador do A.
16. Por acusação penal do Ministério Público datada de 22 de Abril de 2016, ao A foi imputada a comissão dos seguintes crimes: •Associação criminosa; •Falsificação; e Branqueamento de capitais (associado ao crime de tráfico de estupefacientes).
17. Tendo requerido a abertura de instrução, o A foi pronunciado pelos crimes de que vinha acusado, por decisão instrutória de 19 de Agosto de 2016.
18. O processo-crime (n.° 414.5JFLSB) encontrava-se, à data da notificação da nota de culpa e da decisão final, em fase de julgamento.
19. A MO... dedicava-se à actividade cambial e à prestação de serviços de pagamento, nomeadamente ao processamento de remessas para o estrangeiro, maxime para o Brasil.
20. No registo comercial, constava este objecto social: a prestação de serviços de pagamento de envio de fundos, a realização de operações de compra e venda de notas e moedas, cheques de viagem, ouro e prata, em moeda ou noutra forma não trabalhada, bem como moedas para fins de numismática.
21. Apesar de autorizada pelo Banco de Portugal para o exercício de actividade financeira no território português, a laboração da MO... foi suspensa, por determinação do regulador, a 22 de Abril de 2015, tendo a licença sido revogada em 2 de Agosto de 2016.
22. De acordo com a acusação pública acima referida e a decisão de instrução que a coonestou, a MO... encobria os proventos de uma rede internacional de tráfico de estupefacientes.
23. A MO... procedia à ocultação dos lucros do narcotráfico, criando a aparência de se tratar de dinheiro entregue por putativos clientes seus para serem expedidos pela empresa, como se de vulgares remessas se tratasse.
24. Adicionalmente, a MO... apresentava facturas falsas com o mesmo fito simulatório.
25. Como forma de justificar os depósitos de avultado valor que realizava diariamente junto da Agência Fontes Pereira de Melo do R, a MO... apresentava registos escritos de pretensos pedidos de remessa advenientes de pessoas que haviam sido efectivos clientes seus, no passado, reutilizando os dados pessoais que estes então facultaram, para ocultar a origem ilícita dos lucros que pretendiam introduzir no mercado financeiro.
26. Assim que depositadas no R, as referidas quantias eram branqueadas, passando a circular livremente no sistema bancário, com a aparência de licitude e regularidade.
27. De entre os responsáveis da MO..., contam-se DM..., sócio fundador, BM..., filha de DM... e gerente da empresa, JG..., igualmente sócio da empresa, e AS..., sócio-gerente (testa-de-ferro de JM..., cabecilha da rede de narcotráfico).
28. Consta da acusação pública que: • O JG... tinha a seu cargo a gestão da MO..., competindo-lhe essencialmente dar todas as ordens de pagamento das faturas que serviam (...) para dar cobertura à saída do dinheiro que ali entrava em numerário e proveniente (...) das vantagens obtidas pelos indivíduos ligados ao tráfico de produtos estupefacientes. • (...) JM..., DM... e JG... tinham a informação total do circuito, ou seja, a identidade de quem entregava o dinheiro proveniente das vantagens obtidas com a venda de produtos estupefacientes, a identidade dos intermediários e, ainda, a identidades dos pagadores finais (...).
29. A TT... abriu, igualmente, conta junto do Banco, sendo uma empresa destinada a auxiliar a actividade de branqueamento de capitais da MO....
30. A TT... nunca obteve autorização regulatória para o exercício de actividade financeira em Portugal.
31. JG... representava a TT... junto da Agência Fontes Pereira de Melo.
32. Na verdade, embora se tratasse de sociedades comerciais formalmente distintas, na prática, a TT... prosseguia a mesma actividade ilícita que a MO... (e em prol de beneficiários comuns), procurando despistar a atenção — nomeadamente, das autoridades nacionais — focada nesta última.
33. Em 25 de Setembro de 2014, o Banco exerceu, como lhe competia nos termos da Lei n.° 25/2008, o dever de abstenção e comunicação à UIF respeitante ao pedido da TT... de transferência da quantia de 81.008 USD para a China (país de elevado risco de branqueamento de capitais, permanentemente referenciado nos comunicados do GAFI —Grupo de Acção Financeira Internacional).
34. Na sequência desta comunicação, a Procuradoria-Geral da República determinou, por e-mail enviado ao Gabinete de Compliance (Dra. VM...) do R a 29 de Setembro de 2014, pelas 20h 38min., a suspensão provisória de operações bancárias, nos seguintes termos:
Com referência à V/ comunicação de epígrafe, uma vez indiciar-se que as contas tituladas por TT... CORRETORA DE CÂMBIO, LTDA — NIPC ..., foram utilizadas para permitir fazer circular fundos de origem ilícita, importando identificar movimentos e acautelar a dispersão dos mesmos pela economia legítima, determino, ao abrigo do art. 17.°-1 e 2, e 63.° da Lei 25/2008, de 5 de junho, a suspensão provisória de todas as operações a débito sobre as contas do BBP... n.° … — EURO, n.° … — GBP e n.° … — USD (...).
35. Em maio de 2014, o A reuniu com representantes da TT... para que esta abrisse conta junto da Agência Fontes Pereira de Melo.
36. Nessa reunião, esteve presente JG....
37. O A transmitiu a JP..., por e-mail de 17/09/2014, que Trata-se de uma corretora que irá começar a trabalhar connosco e que irá a curto prazo atingir montantes significativos.
38. Na sequência desta informação, JP... apresentou ao administrador do pelouro, Dr. JP..., uma proposta de limite para negociação directa com a Sala de Mercados de operações cambiais à vista no valor de € 750.000,00.
39. A 26 de Setembro de 2014, o A tomou conhecimento do exercício do direito de comunicação relatado no facto 27, supra, através do e-mail que o gerente da Agência Fontes Pereira de Melo, Sr. JCM..., lhe enviou com a mensagem do Gabinete de Compliance, diriida à agência, com os seguintes dizeres: Cumpre o presente informar que a operação n.° 39088 no ANILWF da Ordenante TT... LTDA, no montante de 81.008,00 USD se encontra parada até nova indicação. Mais informamos que quaisquer pedidos futuros de carregamentos de operações por parte desta entidade, independentemente do país de destino, deverão ficar suspensos e de imediato deve ser contatado o Gabinete de Compliance por forma a informar-nos sobre os dados referentes à operação pretendida' (rectificado infra).
40. A Agência Fontes Pereira de Melo recebeu, em 29 de Setembro seguinte, um pedido da TT... para que o saldo da sua conta (831.594,56 USD) fosse transferido para a da M..O...
41. Ciente que estava do segundo parágrafo do e-mail do Gabinete de Compliance reproduzido em 27, supra, o A promoveu uma reunião, ao final do dia 29 de Setembro de 2014 (por volta das 18 horas), com o administrador do pelouro comercial, JP..., e com o administrador da área de Compliance, CT... (Rectificado infra).
42. Tal reunião visou a discussão da situação da TT... e do modo de tratar do pedido de transferência submetido nesse dia pela cliente, alegando o A que estava a sofrer pressão por parte da TT... para que a operação fosse processada.
43. Nessa reunião, não esteve presente — por não estar a trabalhar a essa hora —VM..., responsável do Gabinete de Compliance.
44. Sendo certo que o exercício do dever de comunicação abrangera apenas os apontados 81.008 USD (o que, na prática, não cativava o demais saldo da conta, que podia ser, por isso, movimentada), os administradores presentes determinaram que a ordem de transferência não deveria ser executada sem que antes o A se reunisse com VM..., às 8h 30m do dia seguinte, 30 de Setembro de 2014.
45. Não obstante, o A instruiu, via telefónica, JCM... para que executasse a transferência pendente.
46. Nesse mesmo dia, pelas 20h48m — e reiterando o acima descrito —, o Ministério Público determinou a suspensão de todas as operações da TT..., com a consequente cativação do saldo.
47. Esta suspensão foi comunicada, nessa data, ao A por VM..., por e-mail expedido às 21h39min.
48. Apesar de ter recebido este e-mail, o A não reverteu a ordem dada ao gerente da Agência Fontes Pereira de Melo.
49. A transferência veio, efectivamente, a ser realizada a 30 de Setembro de 2014, pelas 8h23 min.
50. Por conseguinte, o Banco não deu cumprimento à determinação da Procuradoria-Geral da República.
51. Tendo tomado conhecimento da consumação da operação, o A tampouco promoveu o estorno da quantia em causa, da conta da MO... para a TT....
52. Em declarações prestadas à Policia Judiciária, o A referiu que na noite de 29 de Setembro de 2014 tinha o telemóvel em modo voo.
53. Nessa ocasião, o A apresentou à Policia Judiciária uma fotografia do telefone do seu gabinete, como forma de comprovar que telefonara, na manhã do dia 30 de Setembro de 2014, para VM... e que esta não atendera a chamada.
54. Mais tarde, em sede de requerimento de abertura de instrução, o A declarou que já se encontrava em casa, sendo certo que o seu telemóvel (um smartphone com aptidão para receber mensagens eletrónicas — vulgo, e-mails, tinha ultrapassado o limite de capacidade de receção daquele tipo de mensagens, pelo que não recebeu, por aquela via e naquela noite, a mensagem em consideração.
55. As funções de Director Coordenador que vinham sendo exercidas pelo A foram entretanto confiadas a um outro trabalhador da R, resultando a reintegração numa duplicação de titulares das funções de Director Coordenador (Rectificado infra).
56. Aquando da celebração do contrato de trabalho (junto a fls. 274 v.°) entre A e o BPN, S.A. em 2 de Abril de 2012, foi acordado, além do mais, que «a antiguidade e o tempo de serviço do(a) SEGUNDO(A) OUTORGANTE contam-se, para todos os efeitos legais e contratuais, incluindo diuturnidades, desde 1 de Abril , de 1994» — cláusula segunda.
57. Pelo menos desde Março/ Abril de 2015 que a Comissão Executiva do Banco R... que detém o exercício do poder disciplinar — tinha conhecimento dos factos relatados em 38 a 50 supra (suprimido infra).
58. O A era um trabalhador competente e zeloso, sendo pessoa considerada entre os colegas de trabalho.
59. A instauração do procedimento disciplinar abalou profundamente o A, tendo este perdido peso, começou a isolar-se e a conviver muito pouco com colegas e amigos.
60. Com o despedimento o referido estado do A agravou-se, evitando sair de casa e estar com outras pessoas.
61. O A sentia vergonha da situação em que se encontrava.
62. Ficou deprimido, o que era visível porparte de familiares e amigos (alterado infra).
3.2. Fundamentação de Direito
A) Recurso da ré quanto ao valor da causa
3.2.1. Na primeira instância foi fixada à causa o valor de euros 10.000,00, quantia que a ré impugna, sustentando dever ser fixada a quantia de € 295.000, correspondente às retribuições intercalares vencidas no prazo de um ano € 32.071,62; à reintegração € 13.744,98, e ao pedido reconvencional/indemnização por danos morais € 250.000,00.
No presente caso, tratando-se de uma acção de impugnação judicial de regularidade e licitude do despedimento, há que atender, em primeira linha, ao art.° 98.°-P do Código de Processo do Trabalho no qual se dispõe que:
1-Para efeitos de pagamento de custas,. aplica-se à acção de impugnação judicial de regularidade e licitude do despedimento o disposto na alínea e) do n. ° 1 do artigo 12.° do Regulamento das Custas Processuais.
2 - O valor da causa é sempre fixado a final pelo juiz tendo em conta a utilidade económica do pedido, designadamente o valor de indemnização, créditos e salários que tenham sido reconhecidos.
3 - Se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz, deve este fixá-lo no despacho que admite o recurso.
Assim, e desde logo, por força do seu n.° 1, para efeito de pagamento de custas atende-se ao valor da causa como se ele correspondesse a € 2.000,00. No que se refere à fixação do valor da causa, é o mesmo sempre fixado a final pelo juiz, tendo em conta a utilidade económica do pedido, designadamente o valor da indemnização, créditos e salários que tenham sido reconhecidos. A interpretação deste preceito não tem sido uniforme, como nos dão conta, entre outros, os acórdãos do TRP de 8-07-2015 e do TRE de 29-09-2015 (nos quais se considerou que o valor a atender é o dos créditos reconhecidos pelo tribunal e não os créditos peticionados pelo trabalhador) e os acórdãos do TRC de 8¬10-2015 e do TRP de 21-11-2016 (onde, para além dos créditos reconhecidos se fez apelo ao critério da utilidade económica do pedido), todos em www.dgsi.pt. A questão resume-se, ao fim e ao cabo, na articulação a fazer entre o teor da aludida norma especial e as regras referentes ao valor da causa decorrentes do Código de Processo Civil — matéria entretanto dilucidada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6-12-2016, proc. 519/ 14.6TTVFR.P1-S1, também in www.dgsi.pt, cuja doutrina se subscreve.
Com efeito, como aí se assinalou, (...) na ação especial de impugnação judicial da regularidade e
licitude do despedimento, o valor da causa deve ser fixado nos termos conjugados do artigo 98. -P, n. 's 1 e 2, do Código de Processo do Trabalho e alínea e), do n.° 1, do artigo 12.°, do Regulamento das Custas Processual-1., o que significa que esse valor deverá ser fixado sempre a final e tendo em conta a utilidade económica do pedido para o trabalhador, designadamente o valor da indemnização, dos créditos e dos salários que tenham sido reconhecidos.
Dispõe o artigo 98°4, n.° 3, do CPC, que, na ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento, o trabalhador pode, no seu articulado, deduzir reconvenção nos casos previstos no n.° 2, do artigo 266, do CPC, bem como peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho, independentemente do valor da ação.
Na primeira parte, deste normativo, englobam-se todos os interesses decorrentes da declaração da licitude ou ilicitude do despedimento [nomeadamente os estabelecidos nos artigos 389. ° e 390.° e 391.° do CT / 2009].
Na sua segunda parte, determina-se que o trabalhador, na reconvenção, pode, também, peticionar créditos emergentes do contrato de trabalho, por exemplo, reportados a férias vencidas e não gozadas, subsídios de férias e de Natal por pagar, retribui:põe' em atraso, trabalho suplementar, etc.
A todos esses pedidos corresponde uma utilidade económica que vai determinar o valor da ação.
Como se diz rio Acórdão de 25 de setembro de 2014, desta 4ª' Secção e Supremo Tribunal, proferido em 25 de setembro de 2014[13], [o] critério geral para a determinação do valor coincide, pois, com a utilidade económica imediata que pela ação se pretende obter.
«Como se avalia essa utilidade?»
Perguntava e respondia Alberto dos Reis:
«A resposta é simples. Vê-se qual é o fim ou o objetivo da ação e depois procura-se a equivalência económica desse objetivo. (...) a equivalência económica consiste na indicação da quantia em dinheiro correspondente ao objetivo da ação.
Ora o objetivo duma ação conhece-se pelo pedido que o autor faz de maneira que o princípio fundamental da fixação do valor enuncia-se assim: Valor da causa igual a valor do pedido expresso em moeda legal.»
(...)
Por outro lado, é jurisprudência firme desta 4ª Secção e Supremo Tribunal, que no domínio do atual Código de Processo do Trabalho, tal como no de 1981, não há que atender, como direito subsidiário, ao critério da imaterialidade dos interesses do artigo 303, n.° 1, do Código de Processo Civil.
Mais se tendo ali assinalado que Ora, do artigo 98°-.13, do CPT, resulta que na ação de Impugnação judicial da Licitude e Regularidade do Despedimento, o seu valor é sempre fixado, pelo juiz a final (o.° 2) e se for interposto recurso antes da fixação do valor da causa pelo juiz deve este fixá-lo no despacho que admite o recurso (n. 3).
Consequentemente, aqui, para se fixar o valor da ação só os interesses que tenham sido reconhecidos, ou seja, só os interesses julgados procedentes na sentença, é que são tidos em conta na fixação do valor da causa.
Por assim ser; é que este valor é sempre fixado a fina/ juiz só se houver recurso, antes da sua fixação, é que deve ser atribuído no despacho que o admitir':
Deve ainda assinalar-se, que em sintonia com o art.° 297.° do Código de Processo Civil, aplicável ao caso, ex vido art.° 1.° n.° 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho;
1- Se pela ação se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela ação se pretende obter um beneficio diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse beneficio.
2- Cumulando-se na mesma ação vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma dos valores de todos eles; mas quando, como acessório do pedido principal, se pedirem juros, rendas e rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos.
(• • •)
No caso vertente, o autor peticionou a título principal (fls. 214) a sua reintegração na ré; a condenação desta nas retribuições que deixou de auferir desde Agosto de 2017 até ao transito em julgado da decisão e na quantia de € 250.000,00 a título de danos não patrimoniais.
Sendo a indemnização por antiguidade o pecuniário da reintegração, a utilidade económica desta corresponderá ao valor daquela - o que, no caso sujeito, tendo em conta a antiguidade do autor na ré (7 anos — facto provado n.° 8), o valor da retribuição (correspondente à categoria de subdirector), invocado pela ré por referência a convenção colectiva (fls. 714) de € 1.748,10, partindo do pressuposto de que a indemnização seria fixada em 30 dias de retribuição-base e diuturnidades - o valor da reintegração equivale a € 12.236,70 (€1.748,10X7). A título de retribuições intercalares, onde se incluem os subsídios de férias e de Natal, assistiria direito ao autor a receber a quantia correspondente ao tempo decorrido desde o despedimento (11-08-2017) até à data da sentença (2-05-2018), uma vez que, nos termos do art.° 98°-P, n° 2, do CPT é na sentença que se fixa o valor da acção em caso de procedência desta, o que equivale a 10 meses (€1.748,10X10) e 11 dias (€1.748,10:30X11) e corresponde a € 18.122.00 (€ 17 481,0+€ 640,97). Acrescendo a tais quantias o valor fixado (reconhecido) na sentença a título de danos não patrimoniais de € 10.000,00, e não o valor peticionado pelo autor, como sustentou a ré.
Assim, à luz dos apontados critérios, à presente acção deve ser fixado o valor de € 40.358,70 (quarenta mil e trezentos e cinquenta oito euros e setenta cêntimos). Termos em que procede, parcialmente, a presente questão.
B) Recurso da ré da sentença
3. 2. 2. Da rectificação da sentença
Pretende a ré que a sentença seja rectificada com base no seguinte:
1. A remissão para o facto provado n.° 27 constante do facto provado n.° 39 deve ser entendida como realizada para o facto provado n.° 33.
2. A remissão para o facto provado n.° 27 constante do facto provado n.° 41 deve ser entendida como realizada para o facto provado n.° 39.
3. No facto provado n.° 14 o nome da associação sindical deve ser retificado para Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas;
4. No facto provado n.° 55 a referência correta é a Diretor Regional e não a Diretor Coordenador.
Quanto às pretendidas rectificações, não tendo as mesmas sido acolhidas pelo juiz a quo, e tendo estas sido suscitadas no presente recurso, nos termos do art.° 614.° do Código de Processo Civil, passa a conhecer-se do requerido. E, porque estão em causa lapsos manifestos que se retiram com clareza da matéria de facto fixada na sentença e documentação junta aos autos (v.g. nota de culpa, fls. 125 a 131, e decisão de despedimento fls. 2 a 13 verso e do articulado motivador do despedimento, fls. 27 a 37 verso), defere-se a requerida rectificação conforme solicitado. Isto é, a remissão para o facto provado n.° 27 constante do facto provado n.° 39 deve considerar-se como dizendo respeito ao facto provado n.° 33, e a remissão para o facto provado n.° 27 constante do facto provado n.° 41 deve ser entendida como feita para o facto provado n.° 39.
No que concerne ao nome do sindicato onde se mostra filiado o autor, é patente, igualmente, pela documentação junta ao processo, acima referida, que a sua designação correcta é a indicada pela ré, tendo ocorrido lapso indicativo desta, a tal respeito, no seu articulado motivador do despedimento (art.° 10.°), e, como tal, errada indicação do aludido sindicato na sentença. Assim, no facto provado n.° 14, deve passar a constar, ao invés de Sindicato do Sul e Ilhas, Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas.
Relativamente à indicação do autor como Director Coordenador constante do facto provado 55 da sentença, também esta decorreu do lapso indicativo da ré constante do articulado de motivação do despedimento (art.° 106.°), pois como resulta da diversa documentação junta aos autos, também já referida, e não está em causa nesta acção, as funções do autor correspondem às de Director Regional. Assim, no facto provado n.° 55, onde consta a designação de Director Coordenador, deve agora passar a constar a de Director Regional'.
3. 2. 3. Das nulidades da sentença
Invoca a ré a nulidade da sentença por omissão de pronúncia em virtude do julgador não ter conhecido da justa causa de despedimento. Nos termos do art.° 615.° n.° 1, alínea d), do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Com cstc normativo se relaciona o art.° 608.° n.° 2 do mesmo diploma onde se prescreve dever o jni7 resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas que cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e que o juiz não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe impuser o conhecimento oficioso de outras. A este propósito importa relembrar, de acordo com o supra afirmado, que o vocábulo questões não abrange os argumentos, os motivos ou as razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, entendendo-se por questões as concretas controvérsias centrais a dirimir (Cfr., entre outros, o Adira. do Supremo Tribunal de Justiça de 2-10-2003, Agr. 480/03 - 7.a Seccão e Rodrigues Bastos, 'Notas ao Código de Processo Civil, Lisboa, Vol. III, pág. 195). Sendo ainda de realçar que O juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretarão e aplicação das regras de direito, nos termos prescritos no art.° 5.°, n.° 3 do Código de Processo Civil. O presente caso respeita a uma acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento (artigos 98.° -B a 98.° - P do Código de Processo do Trabalho). No seu articulado motivador do despedimento a ré concluiu pela licitude do despedimento do trabalhador e, para a hipótese de ser declarado ilícito ou irregular o despedimento, serem deduzidas as verbas a que alude o art.° 390.° n.° 2, solicitando, ainda, se defira a oposição à reintegração do trabalhador que deduziu, e seja fixada a indemnização no mínimo legal (fls. 36 e 37). O autor, por seu turno, na sua contestação invocou: a caducidade do direito de exercer o poder disciplinar em virtude da ré, através dos seus administradores ter tomado conhecimento dos factos em causa no dia 30 de Setembro; a prescrição do procedimento disciplinar (artigos 49.°, 64.° a 74.) e a falta de fundamento do despedimento. Pediu a sua reintegração na ré e a condenação desta no pagamento das retribuições intercalares, bem como em indemnização por danos não patrimoniais no valor de € 250.000,00, e, em alternativa, caso se julgue procedente a oposição à reintegração, a condenação da ré a pagar-lhe uma indemnização correspondente a 60 dias de retribuição base e diuturnidades pela não reintegração, bem como a pagar-lhe a título de danos patrimoniais o montante das retribuições devidas até à data da sua reforma (fls. 214 e 215). Ora, analisando a sentença, verifica-se que nela, para além do mais, o juiz expressamente se pronunciou sobre a verificação da caducidade do exercício do poder disciplinar e consequente ilicitude do despedimento, tendo também feito referência à matéria da verificação e procedência dos fundamentos invocados para o despedimento a que se refere o n.° 4 do art.° 387.° do Código do Trabalho, e considerado, com base nos argumentos que enunciou, que o despedimento era ilícito tornando-se desnecessário apreciar os factos imputados, àquele título, ao autor. Verifica-se, pois, que neste caso o juiz não ignorou ou olvidou a questão da apreciação da justa causa. Pura e simplesmente entendeu, de acordo com a interpretação que fez (e explicitou) do aludido preceito legal, que era desnecessário conhecer da factualidade assacada ao autor a propósito da justa causa. É que, como ensinava o Professor Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, reimpressão, Coimbra Editora, pág. 143, uma coisa é o tribunal deixar de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar, outra invocar ratão, boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção. Assim, tendo o tribunal dado a conhecer as razões para a não apreciação da justa causa, as quais podem proceder ou não, não estamos perante um vício formal da decisão, mas sim, eventualmente, perante erro de julgamento a aferir em sede de recurso - termos em que se indefere a arguida nulidade por omissão de pronúncia.
Refere também a ré que a sentença é nula por excesso de pronúncia por se ter dado como provado o facto n.° 57 que não foi alegado pelo autor, não se tendo dado cumprimento ao preceituado no art.° 72.° do Código de Processo do Trabalho. O n.° 57.° dos factos provados tem o seguinte teor: Pelo menos desde Março/Abril de 2015 que a COmisSão Executiva do Banco réu — órgão que detém o exercício do poder disciplinar— tinha conhecimento dos factos relatados em 38 a 50 supra'. Como resulta do referido art.° 615.° n.° alínea d), do Código de Processo Civil é nula a sentença quando o juiz conheça de questões de que não podia tomar conhecimento. Tendo-se acima indicado o que se deve entender por questões, assinala-se que também quanto a este aspecto está a ré carecida de razão. Efectivamente, como tem vindo a ser entendido, existe excesso de pronúncia quando o tribunal conhece de questão que não foi suscitada por nenhuma das partes, que não integre o pedido ou a causa de pedir ou alguma excepção deduzida. Pois, como se referiu, nomeadamente no acórdão do STJ de 6¬12-2017, proc. 434/14.3TTBRR.L1.S2, www.dgsi.pt Haverá (...) excesso de pronúncia, quando os limites processuais forem ultrapassados com o Juiz a pronunciar-se sobre questão que nenhuma das partes suscitou no processo, excedendo-se, no âmbito da solução do conflito, nos limites por elas pedido e definido. Não podendo o Juiz conhecer de causas de pedir não invocadas, nem de excepções não deduzidas que estejam na exclusiva disponibilidade das partes, sob pena de nulidade. Ora, no caso vertente, o que sucede é que o autor se insurge contra a factualidade considerada provada constante do n.° 58 pelas razões que refere. Só que essa matéria não integra nenhum dos vícios (formais) integradores de nulidade da sentença, podendo antes, eventualmente, configurar erro de julgamento. Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do TRL de 2010.05.18, proc. 319/09.51'BFUN.L1-7 e do STJ de 23-03-2017, proc. 7095/10.7TBMTS.P1.S1 in www.dgsi.pt. Em face do exposto, e sem necessidade de outros considerandos, desatende-se, também, a apontada nulidade por excesso de pronúncia.
3. 2. 4. Questão Prévia
Nos termos do art.° 662.°, n.° 1 do Código de Processo Civil,
A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa'.
Sucede que no caso vertente existe factualidade assente que não foi expressamente consignada na decisão da matéria de facto. Trata-se do processo prévio de inquérito referido pela ré na sua carta de fls. 221-221, que a mesma juntou aos autos através do documento de fls. 276 a 293, 364 a 389 verso, e que não foi impugnado pelo autor. E da certidão constante de fls. 464 a 668, de onde resulta ter o autor sido absolvido de todos os crimes por que vinha pronunciado no âmbito do processo criminal que lhe foi instaurado. Por conseguinte, adita-se à matéria de facto o seguinte:
63. A ré organizou processo prévio de inquérito, com os termos e dizeres constantes de fls. 276 a 293, 364 a 389 verso.
64. O autor foi absolvido de todos os crimes pelos quais tinha sido pronunciado no âmbito do processo criminal que lhe foi instaurado (fls. 464 a 668).
3. 2. 5. Da impugnação da matéria de facto
Impugna a ré a decisão da matéria de facto (conclusões 6 a 8.6). Antes de se avançar na análise da presente questão, importa referir que a ré deu no essencial cumprimento aos ónus decorrentes do preceituado no art.° 640.° n.° 1 do Código de Processo Civil, na medida em que especificou a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas. Observou também o n.° 2 alínea a) do mesmo preceito, indicando as passagens da gravação em que se funda o seu recurso e transcrevendo os excertos que considerou relevantes. Impondo-se agora apurar se face à prova produzida deve ser alterada a decisão da matéria de facto.
Vejamos, então, o que a ré invoca a este respeito:
- Pretende que se adite à factualidade provada o seguinte:
O Empregador tem em vigor um Código de Conduta, que determina: artigo 5.°, n.° 1 (citação da estatuição); artigo 6.°, n.° 3 (citação); artigo 32.°, n.° 2 (citação), artigo 35.°, n.° 4 (citação), pois alegou no seu articulado motivador do despedimento (e também na nota de culpa endereçada ao autor) que tem em vigor um Código de Conduta, o que também foi confirmado pela testemunha por si arrolada, AL... (técnica de recursos humanos), que confirmou a existência de tal Código, tanto na intranet do réu como na internet.
Considerando que a referida testemunha fez menção à existência do aludido Código de Conduta, e que a ré o juntou com o articulado motivador do despedimento (fls. 110 a 119 verso), documento esse não impugnado pelo autor, adita-se o seguinte facto:
65. O Empregador tem em vigor um Código de Conduta com os diferes e conteúdo constantes do documento junto a fls. 110 a 119.
- Pretende se adite aos factos provados o que alegou nos artigos 124.° e 125.° da resposta à contestação, ou seja, que O A foi anteriormente sancionado com suspensão pela prática de rotação de cheques. Sobre esta factualidade alegou o autor que tal sanção foi por si impugnada judicialmente, visto o mesmo negar a prática da infracção que lhe foi imputada pela ré, encontrando-se o processo judicial ainda a decorrer.
Desta feita, não obstante a citada testemunha da ré, AL..., tenha referido que o autor foi sancionado disciplinarmente por aquela prática, uma vez que ainda não existe decisão definitiva sobre aquela matéria, não é possível concluir que o autor foi (validamente) sancionado disciplinarmente pela ré por diversa infracção e/ou que esta tenha efectivamente ocorrido. Termos em que se não adita à factualidade provada a pretendida versão factual.
- Pretende que se reformule o teor do facto provado n.° 1, em face do estrito teor retirável da missiva nele referida, passando a constar: Por carta de 3 de junho de 2016, junta a fls. 221, a R. comunicou ao A a sua suspensão preventiva, no âmbito de um processo prévio de inquérito, uma vez que interpretando a dita carta se não pode entender que o banco empregador decidiu abrir um processo prévio de inquérito em 3.6.2016 como assentou o juízo recorrido.
Ponderando que a versão factual consignada na decisão recorrida (Por carta de 3 de Junho de 2016, junta a fls. 221, decidiu a R suspender preventivamente o A e abrir um processo prévio de inquérito) pode originar divergência interpretativa no que se refere àquele aspecto, tendo em atenção a documentação constante dos autos referente ao processo prévio de inquérito, e porque a dita carta se mostra junta a fls. 221-222, e não foi impugnada, da-se como provado o seguinte:
1. A ré endereçou carta ao autor datada de 3-6-2017, com os termos e dkeres constantes de fls. 221 e 222.
- Pretende, outrossim, que se eliminem dos factos provados os n.° s 7, 57, 58 a 62. Começando pelo facto n.° 57, por ter sido adquirido com preterição do artigo 72.°, n.° 1 do Código do Processo do Trabalho. E porque do depoimento de CPT... - que não é conclusivo — não resulta ter sido essa a data em que a Comissão Executiva, órgão titular do poder disciplinar, teve conhecimento da matéria de infração [(18:03);(18:17)]; [(27:38);(28:42)]; [(31:35);(32:12)]; [(32:53); (33:24)1; [(35:11); (35:26)]; [(35:54); (36:26)]; [(40:56); (41:51)]. Diz também que a motivação do Tribunal recorrido neste tocante não colhe, porquanto não faz sentido alinhar o conhecimento dos factos com o da acusação pública, quando esta é posterior à data apurada pelo julgador a quo (facto provado 16).
Em linha com a sequência apresentada pela ré, passa-se a analisar o facto provado n.° 57, cuja redacção é a seguinte: Pelo menos desde Março/ Abril de 2015 que a Comissão Executiva do Banco R — órgão que detém o exercício do poder disciplinar — tinha conhecimento dos factos relatados em 38 a 50 supra.
A propósito do aludido facto, aduz a ré ter sido inobservado o art.° 72.° n.° 2 do Código de Processo do Trabalho uma vez que sobre ele não incidiu discussão, como se confirma pela simples leitura das actas da audiência de discussão e julgamento.
Prescreve o art.° 72.° do Código de Processo do Trabalho:
1- Se no decurso da produção da prova surgirem factos que, embora 'Ta° articulados, o tribunal considere relevantes para a boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória ou, não a havendo, tomá-los em consideração na decisão da matéria de facto, desde que sobre eles tenha incidido discussão;
2- Se for ampliada a base instrutória nos termos do número anterior, podem as partes indicar as respectivas provas, respeitando os limites estabelecidos para a prova testemunhal; as provas são requeridas imediatamente ou, em caso de reconhecida impossibilidade, no prato de cinco dias (negritos e sublinhados nossos).
De acordo com o citado preceito legal, pode o juiz incluir na decisão da matéria de facto, factos que embora não articulados resultem da produção prova e sejam relevantes para a boa decisão da causa, desde que sobre eles tenha incidido discussão. Trata-se de uma emanação dos princípios do inquisitório e princípio da verdade material, que no foro laboral assumem particular acuidade, atentos os interesses de ordem pública e de cariz social de muitas das suas normas. Assim, o juiz não deve impedir a produção de prova de factos que embora não articulados tenham interesse para a boa decisão da causa, desde que sobre eles tenha incidido discussão e não impliquem nova causa de pedir. Sobre o dever de aquisição de matéria factual decorrente daquela norma e os procedimentos a adoptar com vista, designadamente, à observância do princípio do contraditório e proibição da indefesa Cfr. entre outros os Acórdãos do TRC de 28-04-2017, proc. 2282/16.7T8LRA.C1 e do STJ de 10-09-2008, proc. 12/08 (Revista) e de 3.6.2015, proc. 297/12.3TTCTB.C1.S1, in www.dgsi.pt. Sucede, porém, que a aplicação do citado normativo se reporta à aquisição de matéria de facto não alegada pelas partes, o que não ocorre na presente situação. Com efeito, ambas as partes invocaram factualidade referente à (excepção de) caducidade do exercício do direito do procedimento disciplinar. O autor fê-lo nos artigos 37.° a 42.°, 64.° a 71.° da sua contestação, tendo-se a ré pronunciado sobre tal matéria nos artigos 67.° a 75.° da resposta à contestação. Perante tal alegação, de acordo com a valoração da prova produzida a esse respeito, o juiz a quo, no apontado facto n.° 58 o que fez foi consignar uma resposta àquela matéria de conteúdo explicativo, pormenorizando-a (indicando o órgão com competência disciplinar e a data em que este teve conhecimento da matéria em causa), não se mostrando excedido o círculo do alegado a esse título pela partes - razão pela qual não era de observar o referido art.° 72.° do Código de Processo do Trabalho.
Posto isto, importa agora analisar se de prova produzida não se poderia dar como provada a sobredita factualidade, como sustenta a ré. No que diz respeito a este ponto, cumpre assinalar ser manifestamente conclusivo o facto em questão. Para além disso, como refere a ré, a fundamentação apresentada pelo juiz a quo é incoerente, visto nela constar que a testemunha CT... acompanhou de perto os factos investigados pela Polícia Judiciária e que foram integrados no processo crime, confirmou que teve conhecimento dos factos imputados ao autor —ordem para transferir dinheiro da conta da TT... para a conta da MO... - na data em que os mesmos ocorreram e que os levou ao conhecimento da Comissão Executiva seguramente em Março ou Abril de 2015 quando tiveram conhecimento da acusação pública deduzida no inquérito e onde o autor figurava COMO arguido. Igualmente atestou os moldes como correu a reunião de 29 de Setembro de 2014 (itálicos e sublinhados nossos).
Subscreve-se o atestado pela ré. Na verdade, tendo a acusação pública sido deduzida em 22 de Abril de 2016 (facto provado n.° 16), não pode a mesma, por contradição lógica, fundamentar a dita versão factual reportada a Março/Abril de 2015. Acresce que, ouvido o depoimento da testemunha CT… (administrador da ré entre 2008 e 2016 e membro da Comissão Executiva), dele se não pode extrair a versão consignada no referido facto n.° 57. É verdade que a dita testemunha mencionou a ocorrência da reunião de 29-09-2014 à tarde, realizada a solicitação do autor, fez menção às comunicações provenientes da responsável do sector da Compliance, VM..., cujo pelouro lhe pertencia, e aos deveres de abstenção e de comunicação a que se encontrava sujeita a ré enquanto instituição bancária, referindo ainda ter o autor ordenado a transferência pendente da empresa TT..., dando, assim, origem à não observância pela ré do determinado pela PGR (suspensão de todas as operações da aludida empresa). Todavia, no que respeita, concretamente, à data do conhecimento dos factos em questão pela Comissão Executiva, o depoimento da testemunha CT..., não nos permite concluir nos termos consignados na decisão recorrida. O mesmo referiu-se, é certo, aos meses de Março/Abril de 2015, mas fê-lo para explicitar que na sequência de buscas da Policia Judiciária (ao autor) nas instalações da ré, por essa altura, decidiu promover a realização de uma Auditoria Interna. O respectivo relatório (cujos precisos termos e integralidade se desconhecem) foi apresentado um Outubro desse ano, tendo-se nele concluído não haver conluio ou vantagem' entre os trabalhadores do BIC e as empresas TT... e MO.... Também disse a mesma testemunha que em Fevereiro de 2016 começaram a ser chamados à Policia Judiciária várias pessoas. Entre as quais a própria testemunha, a quem foi dado a conhecer coisas altamente perturbadoras, tendo sido constituídos 5 arguidos, entre eles o autor. Foi nessa sequência que foi contactado o escritório de advogados para se proceder a inquérito prévio e se ver se haveria lugar a procedimento disciplinar. Mais à frente no seu depoimento a testemunha acabou por dizer que as suspeitas (?) existiam em Março ou Abril de 2015 com a intervenção da Polícia Judiciária. Aduziu, ainda, sem indicação de data minimamente precisa, ter dito à Comissão Executiva que tinha conhecimento dos factos, mas que estava impedido de os revelar (?) e que achava melhor contactar o escritório de advogados para saberem o que se podia fazer. Assim, pese embora o depoimento da referida testemunha tenha sido aparentemente isento, embora claramente defensivo, o mesmo não é suficientemente coerente, seguro e esclarecedor, de molde a nos permitir corroborar a versão factual (peremptória) consignada na decisão recorrida. Por via do exposto, na ausência de outros dados, não se podendo retirar daquele depoimento que a Comissão Executiva (o órgão colegial da ré com competência disciplinar, como referiu a testemunha AL...), tenha tido (exacto) conhecimento dos factos elencados nos n.°s 38 a 50 em Março ou Abril de 2015, dá-se como não provado o facto n.° 57.
- Pretende a eliminação do facto provado n.° 7, por o mesmo deixar de ter interesse face à eliminação do facto n.° 57 e se mostrar infirmado pelo depoimento de AL...
e do documento 2 , junto com a resposta à contestação.
O facto n.° 7 tem a seguinte redacção: Entre a abertura do processo de inquérito e a dedução da nota de culpa e entre esta e a decisão final, nenhum acto instrutório foi praticado no âmbito do procedimento disciplinar.
Deparamo-nos, mais uma vez, com um facto de cunho conclusivo. Todavia, mesmo que assim não fosse, sempre seria o mesmo de considerar não provado. Com efeito, a testemunha da ré, AL..., referiu, entre o mais, que o banco acompanhou
o processo criminal em que se viu envolvido o autor, tendo sido pedida a transcrição das escutas telefónicas, o que foi indeferido, tendo sido feitas outras diligências no âmbito de processo prévio de inquérito. Para além disso, a ré juntou aos autos, na resposta à contestação o doc. 2, onde consta o processo prévio de inquérito e documentação referente a diligências que terão tido lugar - o que não nos permite concluir no sentido do consignado no sobredito n.° 7 da matéria de facto. Dá-se, por isso, como não provado o facto n. 7.
- Pretende também que se dê como não provado o facto n.° 58 por conflituar com o facto aditando 1 e com o depoimento da testemunha, AP..., que acaba por reconhecer, em contravenção aos elogios tecidos ao amigo, o antecedente disciplinar do autor.
Sobre este aspecto não assiste razão à ré. Com efeito, e desde logo, a circunstância de se ter dado como provado que a ré tem em vigor um Código de Conduta, não pode significar, sem mais, que se dê como não provado o dito facto 58 onde consta que o autor era um trabalhador competente e zeloso, sendo pessoa considerada entre os colegas de trabalho. Esta versão resultou sólida dos depoimentos de várias testemunhas inquiridas, como sucedeu, designadamente, com AP.... Esta testemunha foi funcionária da ré desde 2012 até 2017, tendo desempenhado o cargo de Directora Regional. Revelou ter grande consideração profissional pelo autor, o que fez de modo claro, isento e com a naturalidade de quem conhece bem o contexto em que se desenvolvem as funções que o autor desempenhava. Atestou o empenho e competência do autor, o que chegou a presenciar directamente ao ver as chamadas de atenção daquele aos trabalhadores seus subordinados. Referindo também que a funções de empregado bancário envolvem uma grande proximidade com o cliente, a linha é muito fina' e não se sabe com quem lidamos. Mais disse que a situação em que se viu envolvido o autor e o processo disciplinar que lhe foi movido pelo banco o abalou muito, visto o mesmo ser um funcionário respeitado pelos seus colegas, cumpridor dos procedimentos, e que vestia a camisola' como se costuma dizer. E que, depois disto tudo reencontrou o autor e não o reconheceu pela sua magreza. Mantém-se, pois, como provado o facto n.' 58.
- Entende que se devem considerar não provados os factos n.°s 59 a 62 por terem assentado em depoimentos que se pautaram por serem meramente proclamatórios, doutrinadores e genéricos, que não deveriam ter merecido o crédito do julgador de La instância. Sendo que o facto provado n.° 60 resultou infirmado por LFJ... que declarou que ele hoje já está mais forte novamente. E o facto n.° 62, apenas poderia ter sido firmado com base em prova pericial ou, pelo menos, em atestado médico, elementos que não foram carreados para os autos.
Os factos em causa têm a seguinte redacção:
`59. A instauração do procedimento disciplinar abalou profundamente o A, tendo este perdido peso, começou a isolar-se e a conviver muito pouco com colegas e amigos.
60. Com o despedimento o referido estado do A agravou-se, evitando sair de casa e estar com outras pessoas.
61. O A sentia vergonha da situação em que se encontrava.
62. Ficou deprimido, o que era visível por parte de familiares e amigos.
Porque tais factos dizem respeito à situação vivida pelo autor na sequência da instauração do procedimento disciplinar e do despedimento de que foi alvo serão analisados em conjunto.
Sobre a matéria em causa foram, ouvidas as testemunhas LFJ..., AJL... e JRM.... A primeira testemunha, LFJ..., é empresário, partilhando com o autor o interesse por lides associativas, sendo Presidente da Associação de Atletismo de Lisboa e o autor seu Secretário. Convivem com muita frequência no âmbito associativo-desportivo. Teve conhecimento da situação profissional do autor, de lhe ter sido movido um processo disciplinar, por aquele lhe haver contado o que se estava a passar e que o banco BIC punha a possibilidade de o despedir. Mais disse que o autor mostrou-se sempre muito preocupado com a sua postura e com o que podiam pensar dele. E que o sentiu muitas vezes em baixo, embora tivesse havido fases melhores e outras piores (sendo neste contexto que se interpreta afirmação da testemunha de que o autor está mais forte novamente), tendo havido alturas em que teve de ir sozinho a alguns compromissos associativos, sem o autor, por este não estar em condições de o fazer. Referiu também que o autor sempre disse que estava inocente e que a testemunha sempre lhe deu força, pois a verdade viria ao de cima, tendo-o aconselhado a não aceitar a indemnização, mas sim a reintegração, senão ninguém vai acreditar que era inocente.
A testemunha, ALB..., agente da PSP, é amigo do autor há cerca de 30 anos, tendo ambos morado na zona dos Olivais. Praticam ambos desporto. Referiu que inicialmente o autor lhe escondeuo que se estava a passar com ele a nível profissional, mas que depois soube por aquele lhe haver contado. Afirmando a testemunha ser uma coisa intolerável' o que fizerem com o autor, que é uma pessoa muito dedicada aos outros, às pessoas e ao desporto. Mais disse que devido ao processo disciplinar o autor emagreceu bastante e que até o filho deixou de aparecer nos treinos.
A testemunha, JRM..., é técnico de contabilidade e amigo do autor há cerca de vinte anos, com quem convive com regularidade, tendo aquele feito um estágio numa empresa onde a testemunha trabalhava. Referiu a dita testemunha que o autor era uma pessoa que gostava de conviver e de falar com as pessoa.>, tinha orgulho em ser funcionário do Banco e que trabalhava muito. Mais disse que o processo disciplinar movido pelo banco ao autor foi muito traumatizante para este, tendo-se o mesmo passado a refugiar em casa, raramente contactando e convivendo com as pessoas e com os amigos. Afastou-se inclusive da família, tendo a própria mãe do autor contado à testemunha que 'Para ver o filho tinha de ir à casa dele. Mais disse que o autor Emagreceu bastante, e tinha dificuldades em dormi? que a suspensão tinha-o deitado. muito abaixo, mas que o autor tinha esperança de voltar para o banco, pois com 50 anos não é fácil arranjar emprego e o autor tem família e casa para sustenta?'. Disse também a testemunha que o despedimento foi a facada final', e que o autor está de rastos, tendo voltado a ser consultado novamente em psiquiatria.
Ora, pese embora, alguns dos aludidos depoimentos assumam um cunho mais emotivo ou proclamatório, dadas as relações de amizade, convívio e proximidade existentes entre as referidas testemunhas e o autor, todos os depoimentos se nos afiguram sinceros e isentos, permitindo a sua ponderação e análise conjunta descortinar, com razoabilidade e verosimilhança, a situação emocional, pessoal, e social do autor antes e depois do despedimento. A isto acresce a circunstância de não se nos afigurar necessário a realização de perícia medica para se concluir que alguém passou a andar deprimido, visto que a expressão no conjunto da demais factualidade acima descrita, e como decorre do probatório referido, diz respeito a um estado de abatimento e de preocupação do autor,
não um estado patológico (depressivo) propriamente dito, que se não provou e apenas, em sintonia com tal realidade, ser corrigida a redacção.
Mantêm-se pois como provados os factos n. °s 59 a 61, passando a constar do n.º 62 a seguinte redacção: O autor ficou preocupado e abatido, o que era visível por parte de familiares e amigos.
3. 2. 6. Da improcedência da excepção de caducidade do exercício do direito do procedimento disciplinar
Face à eliminação da factualidade provada do n.° 57, não existem elementos temporais que nos permitam afirmar ter-se esgotado o prazo (60 dias) a que alude o art.° 329.° n.° 2 do Código do Trabalho, improcedendo, por conseguinte, a referida excepção de caducidade do exercício do direito do procedimento disciplinar.
3. 2. 7. Da licitude do despedimento do autor
O juiz a quo considerou ilícito o despedimento por se mostrar ultrapassado o dito prazo de 60 dias a que alude o art.° 329.° n.° 2 do Código do Trabalho. Declarou, como tal, procedente a excepção de caducidade do direito de exercício do procedimento disciplinar, e não conheceu, pelas razões que indicou, da matéria da justa causa. Ora, uma vez que conforme supra se decidiu, foi julgada improcedente a referida excepção, passa agora a conhecer-se da licitude do despedimento, averiguando-se se o autor foi despedido com justa causa, visto os autos conterem os elementos necessários para o efeito e as partes se terem pronunciado sobre tal matéria.
Alega a ré que o comportamento do autor reveste gravidade bastante fundamente de despedimento licito. Aduz, para tanto, que no contexto de envolvimento do recorrido com empresas ligadas ao narcotráfico, aquele instruiu um subordinado seu no sentido de contornar a instrução que lhe fora dada por dois administradores da ré para se articular com o Gabinete da Compliance, actuando em contravenção ao decidido e decretado pela Procuradoria - Geral da República, ocorrendo justa causa de despedimento.
Em termos de enquadramento, transcreve-se aqui, em súmula, o que se tem reiteradamente afirmado a propósito da noção de justa causa (Cfr., designadamente, o Acórdão do TRL de 8-11-2017, proc. 31.543/16. 3T8LSB.L1-4, www.dgsi.pt). De acordo com o art.° 351.° n.° 1 do Código do Trabalho considera-se justa causa traduz-se o comportamento do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. Esse juízo pauta-se por critérios de razoabilidade e exigibilidade, sendo que na sua apreciação, deve atender-se, por força do n.° 3 do mesmo normativo, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes (gr. . Acórdão do STJ de 21.04.2016, proc. 229/14.5T8LLG.P1.S1,www.dgsi.pt). Encontra-se firmado o entendimento pela jurisprudência e pela doutrina de a dita noção é integrada pelo seguinte: 1) um elemento subjectivo, traduzido num comportamento culposo do trabalhador, por acção ou omissão; ii) um elemento objectivo, traduzido na impossibilidade da subsistência da relação de trabalho; iii) o nexo de causalidade entre aquele comportamento e esta impossibilidade. Na ponderação da gravidade da culpa e das suas consequências, importará considerar o entendimento de um bonnus pater farmilie , de um empregador razoável', segundo critérios de objectividade e de razoabilidade, em função das circunstâncias de cada caso em concreto (Cfr. Acórdãos do STJ de 8.6.84, AD 274, pág. 1205, de 16.11.98 AD, 290, pág. 251, de 8.7.88, AD, 324, pág. 1584, de 06-06-2018, proc. 9444/16.55T8LSB.L1 e de 04-07-2018, proc. 4981/16.4T8VIS.C1.S1, www.dgsi.pt). Deve ainda frisar-se, que o apuramento da justa causa' se corporiza, essencialmente, no elemento da impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação de trabalho. Relativamente à interpretação desta componente objectiva de justa causa', tem-se entendido que a mesma se traduz na impossibilidade de subsistência do vínculo laboral que deve ser reconduzida à ideia de inexigibilidade da manutenção vinculistica, numa perspectiva de impossibilidade prática, no sentido de imediatamente comprometer, e sem mais, o futuro do contrato. Para tanto, a impossibilidade do vínculo laboral deve ser apreciada tendo em consideração todos os interesses que estão na base da relação contratual, existindo sempre que a manutenção do contrato constitua uma insuportável e injusta imposição do empregador (Cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.03.2016, proc. 695/03.3TTGMR.G1.S1, www.dgsi.pt). O apuramento de tal elemento passa por um juízo de prognose sobre a viabilidade da relação contratual, no sentido de saber se ela mantém, ou não, a aptidão e idoneidade para prosseguir a função típica que lhe está cometida, juízo a realizar segundo um padrão essencialmente psicológico, o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, que radica, in extremis, na quebra de confiança entre a entidade patronal e o trabalhador. (Cfr. Lobo Xavier, Curso de Direito do Trabalho, Verbo, 2000, pág. 490 e seguintes). Segundo Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, Almedina, 15.a Ed., pág. 593 e seguintes, trata-se de «. . .uma determinada mediante um balanço in concreto dos interesses em presença - fundamentalmente o da urgência na desvinculação e o da conservação do vínculo. (...). (...) significa (...) a referência legal à ((impossibilidade prático, da subsistência da relação de trabalho - que a continuidade da vincularão representaria (objetivamente) uma insuportável e bijusta imposição ao empregador. Nas circunstâncias concretas, a permanência do contrato e das relações (pessoais e patrimoniais) que ele supõe seria de molde a ferir, de modo desmesurado e violento, a sensibilidade e a liberdade psicológica de uma pessoa normal, colocada na posição do empregador. Embora num plano de objetividade, o elemento «impossibilidade prática» reporta-se a um padrão essencialmente psicológico o das condições mínimas de suporte de uma vinculação duradoura, implicando mais ou menos frequentes e intensos contactos entre os sujeitos. Torna-se necessário, em suma, que nenhuma outra sanção se revele adequada a sanar a crise contratual.
Feitas tais considerações é tempo de voltar ao caso que nos ocupa. E um primeiro aspecto se impõe destacar. Relativamente ao esquema montado entre as empresas MO... e TT... para encobrir as suas actividades ilícitas de branqueamento de capitais provenientes do narcotráfico, que esteve na base da acusação pública e resultou provado nestes autos, nada se apurou que ligasse o autor a tais práticas ou que permita concluir que, minimamente, as conhecesse. Pois, se é verdade que o Ministério Público deduziu acusação penal contra o autor em 22-04-2016, tendo-lhe imputado a prática dos crimes de associação criminosa, falsificação e de branqueamento de capitais, pelos quais o autor foi pronunciado, o mesmo veio a ser judicialmente absolvido de todos esses crimes, nos termos constantes da certidão junta aos autos (3.° Volume, fls. 464 a 668). Em sede laboral, como resulta dos autos, o que a ré imputa ao autor consiste, essencialmente, em ter este instruído JCM... para que executasse a transferência pendente requerida pela TT... após a reunião que o mesmo promoveu em 29-9-2014 - não obstante o que aí foi referido pelo administrador da ré, e independentemente do e-mail da Compliance para si endereçado por VM... nesse mesmo dia à noite - e em não ter promovido o estorno da quantia em causa.
Analisemos, então, a apurada conduta do autor, concatenando e interpretando a matéria de facto provada, para com base no contexto e circunstancialismo que a envolveu (art.° 351.°, n.° 3 doo Código do Trabalho), a valorarmos convenientemente.
Começa por se relembrar que o autor exercia na ré as funções de director regional, reportando ao director coordenador, JPA..., estando ambos sob a égide do administrador do pelouro comercial, JP.... Por outro lado, a empresa MO..., cuja gestão era levada a cabo por JG... e que fazia depósitos diariamente de avultado valor na agência da ré da Av. Fontes Pereira de Melo em Lisboa, era considerada como uma empresa geradora de retornos financeiros muito consideráveis, nada constava em desabono do grupo tendo sido desenvolvidos esforços comerciais para se captar este negocio para o Banco B... como referia em 27 de Agosto, JCM..., (gerente da dita agência) em e-mail de 27 de Agosto dirigido à responsável da Compliance da ré, VM... (fls. 84), e com conhecimento, entre outros, também ao autor (factos provados n.°s 10, 28, 25 e 62).
A própria auditoria interna ordenada pelo dito administrador concluiu que a relação de negócio estabelecida entre a ré e a MO... teve elevado nível de rendibilidade e que a dita empresa foi o melhor cliente afecto à agência da Fontes Pereira de Melo de 2012 e 2104 (fls. 91 verso). A isto acresce a circunstância de a MO... ter como objecto social, de acordo com o constante do registo comercial, a prestação de serviços de pagamento de envio de fundos, a realização de operações de compra e venda de notas e moedas, cheques de viagem, ouro e prata, em moeda ou noutra forma não trabalhada, bem como moedas para fins de numismática, encontrando-se a mesma autorizada para o exercício de actividade financeira no território português, tendo (apenas), sido decretada a suspensão da sua laboração em 22 de Abril de 2015, e a sua licença sido revogada (tão só) em 2 de Agosto de 2016 (Cfr. factos provados n.°s 19 a 21). Outro aspecto a considerar é o facto de ser também JG... a representar a empresa TT... junto da agência na Fontes Pereira de Melo.
Desta feita, face à aparência de normalidade e legalidade da actividade da MO..., a rendibilidade que esta trazia à ré, e perante a proximidade existente entre as duas empresas e respectivo responsável, numa óptica comercialista compreende-se a reunião do autor em Maio de 2014 com responsáveis da TT... para que esta abrisse conta na agência da Fontes Pereira de Melo e que tenha transmitido a JÁ…, que se tratava de uma corretora que irá a curto prazo atingir montantes significativos (factos provados n.°5 35 a 37), na sequência do que JÁ… apresentou a JP..., administrador da área comercial, uma proposta de limite para negociação directa na sala de mercados de operações cambiais à vista no valor de €750.000,00.
Sucedeu, porém, que perante o pedido da TT... de transferência de € 81.008 USD para a China (país de elevado risco de branqueamento de capitais, permanentemente referenciado nos comunicados do GF...) o réu exerceu o dever de abstenção e de comunicação à UIF. Esta actuação decorre da Lei 25/2008, de 5 de Junho, diploma que estabelece medidas de natureza preventiva e repressiva de combate ao branqueamento de vantagens de proveniência ilícita e ao financiamento do terrorismo, transpondo para a ordem jurídica interna as Directivas 2005 / 60/ CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Outubro, e 2006/70/ CE, da Comissão, de 1 de Agosto, relativas à prevenção da utilização do sistema financeiro e das actividades e profissões especialmente designadas para efeitos de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo, na redacção vigente à data dos factos, constante da Lei 18/2013, de 6 de Fevereiro, onde se determina que as entidades sujeitas, onde se contam as entidades financeiras - instituições de crédito (art.° 3.°, n.° 1 alínea a)) estão obrigadas, no exercício da respectiva actividade, ao cumprimento, entre outros, dos deveres gerais de comunicação e de abstenção (art.° 6.° alíneas J) e â), devendo, por sua própria iniciativa, informar de imediato o Procurador-Geral da República e a Unidade de Informação Financeira, sempre que saibam, suspeitem ou tenham razões suficientes para suspeitar que teve lugar, está em curso ou foi tentada uma operação susceptível de configurar a prática do crime de branqueamento ou de financiamento do terrorismo(art.° 16.°) e abster-se de executar qualquer operação sempre que saibam ou suspeitem estar relacionada com a prática dos crimes de branqueamento ou de financiamento do terrorismo (n.° 1). Devendo a entidade informar de imediato o Procurador-Geral da República e a Unidade de Informação Financeira de que se absteve de executar a
operação, podendo aquele determinar a suspensão da execução da operação suspeita notificando, para o efeito, a entidade sujeita (n.° 2).
Foi dado a conhecer ao autor, em 26-09-2014, por e-mail do gerente da agência Fontes Pereira de Melo, JCM..., a mensagem do Gabinete da Compliance, dirigida à agência, com os seguintes dizeres: Cumpre o presente informar que a operação n.° 39088 no AMLWF da Ordenante TT... LTDA, no montante de 81.008,00 USD se encontra parada até nova indicação. Mais informamos que quaisquer pedidos futuros de carregamentos de operações por parte desta entidade, independentemente do país de destino, deverão ficar suspensos e de imediato deve ser contactado o Gabinete de Compliance por forma a informar-nos sobre os dados referentes à operação pretendida' . Mais tendo ficado provado que o autor teve conhecimento do teor da supra referida comunicação do Gabinete da Compliance.
Analisando a sobredita factualidade, afigura-se-nos que tendo a agência da Fontes Pereira de Melo recebido poucos dias depois, em 29 de Setembro de 2014, um pedido da TT... para que o saldo da sua conta (€831.594,56) fosse transferido para a conta da MO..., era natural que autor como director regional face ao tipo de cliente em questão, valores envolvidos, e porque segundo referiu estava a ser pressionado pelo cliente para que a operação fosse processada, sentisse necessidade de esclarecer o assunto e tivesse promovido uma reunião, no final do dia 29, com os administradores dos pelouros envolvidos, respectivamente JP... e CT....
Note-se que o e-mail do Gabinete da Compliance apenas comunicava que a operação da TT... referente ao valor de € 81.008,00 se encontrava parada, ficando os outros pedidos suspensos, devendo de imediato ser contactado o Gabinete da Compliance por forma a informar-nos da operação pretendida. Afigura-se-nos que em face do referido circunstancialismo, se configurava como perfeitamente razoável reunir com os responsáveis máximos dos sectores em questão - comercial e da Compliance - na ausência da sua responsável imediata, VM..., para se esclarecer o assunto.
Sucede que nessa reunião, os ditos administradores, cientes (que não podiam deixar de estar) da referida comunicação do Gabinete da Compliance e dos deveres que recaem sobre a ré enquanto instituição de crédito no âmbito da prevenção e do combate ao branqueamento de capitais - não ordenaram ao autor que não executasse a dita operação da TT.... Antes optaram por deferir o assunto para momento posterior, limitando-se a determinar que o autor não executasse a ordem de transferência sem que antes se reunisse com VM..., às 8h,30min do dia seguinte, 30 de Setembro. Ou seja, deixaram a questão em aberto, nada tendo decidido ou ordenado relativamente ao pedido de transferência feito pela cliente TT..., nada tendo esclarecido o autor para além do que já constava da anterior comunicação da Compliance. Em linha com tal posição de aparente neutralidade, como resulta de fls. 106 verso, se compreende o e-mail enviado por CT..., a VM..., naquele mesmo dia às 20h31min, onde consta a conta não está bloqueada, e que salvo o montante de USD 81mil o restante das contas não tem limitações de movimentação .... Provou-se é certo, que ao contrário do que seria razoável ocorrer na dita situação, o autor veio a instruir JCM... para efectuar a transferência pendente, o que, não obstante o teor algo ambíguo da reunião havida com os aludidos administradores, não deixa naturalmente de consubstanciar um comportamento imprudente, falho de diligência e de zelo, pois seria esperável que o autor por força das funções que desempenhava tivesse previamente obtido mais informação e esclarecimentos junto do Gabinete de Compliance a fim de aquilatar quanto ao modo de agir. Mostram-se, assim, violados nomeadamente os deveres a que o autor como pessoa sujeita (art.° 2.°) estava vinculado - artigos 5.° (cumprimento), 6.° n.° 3 (ponderação) 32.° n.°2 (conhecimento e diligência) e 35.° n.° 4 (grau aprofundado de conhecimento dos clientes e das suas transacções), do Código de Conduta vigente na ré (fls. 109 verso a 119 verso). Código de Conduta este cuja adopção decorre do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo DL 298/92, de 31 de Dezembro, na redacção, à data dos factos, decorrente do DL 114-B/2014, de 04 de Agosto (art.°77.° -B), e que visa estabelecer e sistematizar um conjunto de regras de natureza comportamental que devem ser imperativamente observados no exercício de toda a actividade bancárid'.
Ocorreu ainda que a Procuradoria-Geral da República, na sequência da aludida informação da ré datada de 25 de Setembro, comunicou a esta em 29 de Setembro de 2014, pelas 20h38min, através de e-mail enviado ao Gabinete da Compliace (VM...), a suspensão provisória de operações bancárias, nos seguintes termos: Com referência à V/ comunicarão de epígrafe, uma ver indiciar-se que as contas tituladas por `TT... C…CÂMBIO, LTDA' — NIPC ..., foram utilizadas para permitir fazer circular fundos de origem ilícita, importando identificar movimentos e acautelar a dispersão dos mesmos pela economia legítima, determino, ao a mgo do art. 17.°-1 e 2, e 63. ° da Lei 25 / 2008, de 5 de junho, a suspensão prodrória de todas as operações a &bit sobre as contas do BBP... n.° … — EURO, n.° … — G 1) e n.º… — USD (. . .) . (Sublinhados nossos).
Mais se apurou que a dita suspensão foi comunicada ao autor, nesse dia, por VM... por e-mail expedido às 21 h 39 min, e que apesar de ter recebido este e-mail, o autor não reverteu a ordem dada à agência da Fontes Pereira de Melo, tendo sido a transferência efectivamente realizada a 30 de Setembro de 2014, pelas 8h23min, não tendo a ré cumprido a determinação da Procuradoria Geral da República.
Ora, sobre esta matéria não pode deixar de se ponderar que, pese embora VM... tenha enviado e-mail ao autor, a comunicar a suspensão da operação da TT..., nada se provou nestes autos no sentido de  autor o ter lido, ou de ter tido conhecimento de tal mensagem. antes de se operar a transferência solicitada pela TT…: Na verdade, atenta a responsabilidade que recai sobre o Gabinete da Compliance do réu, tendo sido exercido o dever de comunicação junto da Procuradoria-Geral da República quanto à dita operação da TT... e aguardando-se, nos termos legais, uma resposta desta entidade judiciária sobre o assunto, não se compreende porque razão aquela responsável, transmitiu uma comunicação oficial daquela responsabilidade - à noite, quase uma hora depois daquela ter sido emitida, através de uma simples mensagem de correio electrónico - sem se ter assegurado de que o autor efectivamente teve dela conhecimento, o que poderia ter acontecido através de mero contacto telefónico com o autor, o que não resulta dos factos tenha sido feito ou tentado fazer. Ciente que estava aquela responsável da reunião ocorrida nesse mesmo dia, entre o autor e os referidos administradores quanto à pretendida transferência da TT..., e da controvérsia que a questão suscitava, exigia-se à mesma uma maior diligência e cuidado na efectiva transmissão da ordem proveniente da Procuradoria-Geral da República, por forma a que ficasse assegurado, da sua parte, que a pretendida transferência seria efectivamente suspensa, não tendo lugar. Também seria de supor, em termos da normal diligência e da prudência exigidas, que aquela ordem fosse efectiva e rapidamente transmitida à agência da Fontes Pereira de Melo, onde a questão se colocava com maior premência visto ter sido aí que a havia sido solicitada a transferência em questão - o que não ocorreu. Como referido, VM..., naquele dia, limitou-se a enviar um e-mail, à noite, para o autor, sem se ter dado ao cuidado de confirmar que o autor se havia efectivamente inteirado do seu conteúdo. Assim sendo, embora tenha ficado provado que o autor recebeu o dito e-mail, não ficou demonstrado nestes autos que o mesmo teve conhecimento da mensagem enviada por VM… a tempo de reverter a ordem dada à agência da Fontes Pereira de Melo, sendo certo que as respostas que deu na Policia Judiciária e aquando da abertura da instrução (factos provados 52 a 54), por si só não permitem concluir em sentido diverso, apenas se tendo provado nestes autos o acima referido quanto a esta concreta matéria. Para além disso, tão pouco resultou provado neste processo que o autor tenha ordenado ao responsável daquela agência. JCM..., para proceder à dita operação à hora em que ocorreu Sh23min, ou seja, antes da abertura da agência. Destarte, embora se admita que o autor com o seu comportamento contribuiu para o não cumprimento do determinado pela Procuradoria-Geral da Republica, não é possível afirmar que tal incumprimento se deu por exclusiva ou principal culpa sua, já que tanto a responsável da Compliance, como os próprios administradores da ré, não foram cuidadosos, expeditos e diligentes no cumprimento dos deveres que sobre si (também), impendiam, enquanto pessoas sujeitas ao referido Código de Conduta e legislação referida - no sentido de travar de facto, a dita operação bancária.
Sustentou a ré, e resultou provado, que o autor não promoveu o estorno da quantia em causa da conta da MO… para a TT.... A ré não invocou, porém, a violação de qualquer normativo com a descrita conduta do autor, não se vislumbrando que estivesse o autor habilitado, sem mais, a proceder a tal operação (em parecer jurídico junto aos pela ré a fls. 107 verso é dito que qualquer devolução dos valores transferidos só poderão ocorrer havendo consentimento do beneficiário, não podendo o banco unilateralmente realizar esse movimento), sendo certo, por outro lado, que, mesmo que assim não fosse, tratando-se de operação bancária proscrita pelas competentes autoridades judiciárias, de que a ré através dos seus responsáveis estava bem ciente, tão pouco se se compreende porque razão não diligenciou ela mesma no sentido de ordenar ao autor ou a outro funcionário a realização de tal estorno (a ser viável). Importa ainda realçar que nada se apurou, nem a ré concretamente o alegou, no sentido de que a situação em causa (incumprimento do determinado pela PGR) tivesse originado para si qualquer tipo de prejuizo, sanção ou intervenção das competentes autoridades. Entendemos, por tudo isso, que embora o autor tenha agido sem a prudência, zelo e diligencia que lhe eram exigíveis, ponderando o apontado circunstancialismo (em que os ditos responsáveis também contribuíram para o sobredito desfecho), não se tendo provado prejuízos para a ré, na ausência de passado disciplinar do autor - pese embora a sua conduta seja merecedora de óbvia censura disciplinar, ao abrigo dos princípios de adequação e proporcionalidade que regem a aplicação de sanções disciplinares (art.° 330.° do Código do Trabalho), ao caso seria de aplicar sanção conservatória do vínculo, não ocorrendo justa causa de despedimento, sendo este ilícito com as legais consequências (artigos 389.° e 390.° do Código do Trabalho), relembrando-se que o autor optou pela reintegração na ré.
Improcede, por conseguinte, a pressente questão.
3. 2. 8. Da oposição à reintegração do autor
Deduziu a ré oposição à reintegração do autor, sustentando que o regresso do trabalhador à empresa, à luz de um juízo de prognose é «gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa». Aduz, para o efeito, ser de deferir a oposição à reintegração com base, em especial, nos factos assentes 16, 17, 45, 48, 50, 52 a 54 e 55, e no facto aditando 2.
Nos termos do art.° 392.° do Código do Trabalho,
1 - Em caso de microempresa ou de trabalhador que ocupe cargo de administração ou de direção, o empregador pode requerer ao tribunal que exclua a reintegração, com fundamento em factos e circunstâncias que tornem o regresso do trabalhador gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.
2 - O disposto no número anterior não se aplica sempre que a ilicitude do despedimento se fundar em motivo político, ideológico, étnico ou religioso, ainda que com invocação de motivo diverso, ou quando o fundamento da oposição à reintegração for culposamente criado pelo empregador.
3 - Caso o tribunal exclua a reintegração, o trabalhador tem direito a indemnização, determinada pelo tribunal entre 30 e 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade, nos termos estabelecidos nos n.os 1 e 2 do artigo anterior, não podendo ser inferior ao valor correspondente a seis meses de retribuição base e diuturnidades'
Vejamos.
No caso em apreço, não estando em causa microempresa e desempenhando o autor as funções de director regional (factos provados n.°s 9, 11 e 13) é inequívoco encontrarmo-nos perante trabalhador que ocupa cargo de direcção. E, porque tão pouco se apurou ter-se fundado
o despedimento do autor em motivo politico, ideológico, étnico ou religioso, ainda que com invocação de motivo diverso, ou ter sido o fundamento da oposição à reintegração culposamente criado pelo empregador, importa tão só aquilatar se o regresso do trabalhador é gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa.
À luz do princípio da segurança no emprego (art.° 53.° da CRP), e da proibição dos despedimentos sem justa causa, a reintegração do trabalhador ilicitamente despedido é o seu corolário natural, sendo através dela que se assegura plenamente a reposição da situação que existia antes do despedimento (Maria do Rosário Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Parte II, 5.° Edição, Almedina, pág. 1007), determinando o art.° 389.° n.° 1 aliena a) do Código do Trabalho que sendo o despedimento ilícito o empregador é condenado na reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade (...). A oposição à reintegração, assume, por isso, natureza excepcional. Só pode ter lugar nos casos legalmente previstos. Cabendo o ónus da prova ao empregador (art.° 342.° do Código Civil).
Embora a lei não esclareça se os factos que o empregador poderá invocar neste domínio são os posteriores ao despedimento ou são (também) os anteriores, afigura-se-nos que os factos justificativos do afastamento da reintegração poderão radicar nos que levaram o tribunal a declarar a ilicitude do despedimento desde que deles emerjam consequências que permitam formular o juízo pressuposto no aludido normativo legal, ou quando ocorram outros elementos exteriores ao juízo sancionatório do empregador (Pedro Furtado Martins Cessação do Contrato de Trabalho, Principia, 3. a Edição, pág. 487), que fundamentem a não reintegração.
Na análise da situação impõe-se apurar se ocorre a quebra da base da confiança em que assentou a relação de trabalho, o que deverá ser feito de acordo com as circunstâncias do caso, e em termos rigorosos. E não basta que se apure ser o regresso do trabalhador indesejável ou inconveniente para o empregador, pois serão estas, à partida, as consequências normais de qualquer reintegração decorrente da declaração de um despedimento ilícito. Subscreve-se , pois, a opinião de Júlio Gomes (Direito do Trabalho, Volume I, Relações Individuais de Trabalho, Coimbra Editora, 2007, p. 1031), quando o mesmo refere que (a oposição só é possível se o empregador demonstrar que o regresso do trabalhador é gravemente prejudicial e perturbador para a prossecução da atividade empresarial (artigo 438. ° n.° 2, parte final) o que é, na nossa opinião coisa bem distinta e muito mais exigente do que dizer simplesmente (...) que a reintegração terá de ser inconveniente para a prossecução da atividade empresarial. Na verdade, pensamos poder afirmar-se que raras vetes a reintegração deixará de ser inconveniente, pelo menos na perspetiva do empregador ... Exige-se, pois, algo muito mais grave que uma mera inconveniência: um prejuízo, uma perturbação tão grave para a atividade empresarial, que justifiquem que um facto ilícito não seja objeto de reparação in natura».
A ré invocou para fundamentar a não reintegração o que consta dos seguintes factos provados:
16. Por acusação penal do Ministério Público datada de 22 de Abril de 2016, ao A foi imputada a comissão dos seguintes crimes: Associação criminosa; Falsificação; e Branqueamento de capitais (associado ao crime de tráfico de estupefacientes).
17. Tendo requerido a abertura de instrução, o A foi pronunciado pelos crimes de que vinha acusado, por decisão instrutória de 19 de Agosto de 2016
50. Por conseguinte, o Banco não deu cumprimento à determinação da Procuradoria-Geral da República.
52. Em declarações prestadas à Polícia Judiciária, o A referiu que na noite de 29 de Setembro de 2014 tinha o telemóvel em modo voo.
53. Nessa ocasião, o A apresentou à Polícia Judiciária uma fotografia do telefone do seu gabinete, como forma de comprovar que telefonara, na manhã do dia 30 de Setembro de 2014, para VM... e que esta não atendera a chamada.
54. Mais tarde, em sede de requerimento de abertura de instrução, o A declarou que 'já se encontrava em casa, sendo certo que o seu telemóvel (um smartphone com aptidão para receber mensagens eletrónicas - vulgo, e-mails, tinha ultrapassado o limite de capacidade de reação daquele tipo de mensagens, pelo que não recebeu, por aquela via e naquela noite, a mensagem em consideração.
55. As funções de Director Coordenador que vinham sendo exercidas pelo A foram entretanto confiadas a um outro trabalhador da R, resultando a reintegração numa duplicação de titulares das funções de Director Coordenador.
Dos sobreditos factos, apenas o derradeiro não é anterior ao despedimento e não fundamentou a decisão disciplinar, nada mais tendo a ré alegado ou demonstrado existir para fundamentar a rejeição à reintegração do autor. Todavia, ainda que assim se não fosse, sempre seria de ponderar que não obstante se tenha apurado que o autor foi acusado e pronunciado pela prática dos crimes acima referidos, dos mesmos foi o mesmo totalmente absolvido. E, se é verdade, ficou demonstrado que a ré não observou o determinado pela PGR, como já dito, tal não se deveu apenas a culpa do autor, mas também a falta de diligência do seus responsáveis.
Acresce ainda que o facto de as versões apresentadas pelo autor na PJ e posteriormente no processo criminal não serem coincidentes, tal não significa que se não tenham verificado ou que sejam de todo incompatíveis entre si e/ou reveladoras de comportamento não verdadeiro do autor, quando é certo em sede laboral nada se apurou quanto à matéria que esteve na base de tais declaracões.
Por fim, a circunstância de a ré ter entretanto colocado outro trabalhador a exercer as funções que estavam confiadas ao autor como director coordenador, resultando a reintegração numa duplicação de titulares das ditas funções, não constitui obstáculo, só por si, à reintegração do trabalhador ilicitamente despedido. Com efeito, desconhece-se a que título desempenha esse trabalhador tais funcões visto a ré nada mais ter provado quanto a essa matéi. , para além de que, no uso das suas prerrogativas patronais, de conteúdo organizativo da própria empresa, não se vislumbra que a ré não possa (re)colocar tal trabalhador em funções compatíveis, propiciando o normal retorno do autor.
Para além disso, ponderando o tipo de empresa em questão (de estrutura hierarquizada, complexa e burocrática), em que a fidúcia, embora essencial, não pressupõe necessariamente o contacto directo entre os sujeitos; não se podendo olvidar que o autor era pessoa considerada pelos seus colegas de trabalho, nada se tendo apurado no sentido de ter deixado de o ser, e porque nada mais a ré demonstrou que nos permita dizer que ocorre uma irremediável quebra de confiança no trabalhador em questão com projecção no futuro da relação laboral, é de concluir não estar demonstrado que o regresso do autor é (ou viria a ser) gravemente prejudicial e perturbador do funcionamento da empresa. Sendo, por isso, de indeferir a pretendida oposição à reintegração, improcedendo a presente questão.
3. 2. 9. Da antiguidade do autor ser a indicada pela ré
Tendo improcedido a questão anterior, e porque o autor optou pela reintegração na ré, queda prejudicada a análise da presente questão.
C) Recurso do autor
3. 2. 10. Da alteração do valor da compensação fixado a título por danos não patrimoniais ao autor
Insurge-se o autor quanto ao valor atribuído pelo tribunal recorrido a título de danos não patrimoniais de €10.000,00, que considera constituir um prémio para prevaricador em detrimento do trabalhador, sustentando dever a ré ser condenada no valor por si pedido de € 250.000,00.
Nos termos do art.° 389.° do Código do Trabalho, Sendo o despedimento declarado ilícito o empregador é condenado a) a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais. E porque o referido diploma legal é omisso quanto ao modo de apurar o valor da compensação dos danos não patrimoniais importa fazer apelo ao disposto no art.° 496.° n.° 1 do Código Civil, onde se prescreve que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Ditando o seu n.° 3 que a indemnização por danos não patrimoniais será fixada equitativamente, devendo o tribunal considerar, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no art.° 494.° do mesmo Código, o qual prevê que na fixação do valor da indemnização há que ter em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
Deste modo, desde que se verifiquem os requisitos da obrigação de indemnizar, art.° 483.°, do Código Civil (facto ilícito, culpa, dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano) e os danos apurados sejam graves a ponto de merecerem a tutela do direito, o montante da respectiva indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal.
Como tem vindo a ser considerado, os danos não patrimoniais traduzem-se em prejuízos causados na pessoa do lesado, podendo ser físicos ou psíquicos (dor de alma), bem como significar prejuízos para a sua vida em relação.
A jurisprudência tem-se debruçado sobre esta matéria em inúmeros arestos, delimitando o conceito de dano não patrimonial e aferindo da sua existência no foro laboral, quer procedendo a análise cuidada da matéria de facto e suas circunstâncias com vista à fixação da respectiva compensação. Tanto mais, como também tem sido entendido, que o recurso à equidade para a determinação da indemnização a atribuir por danos não patrimoniais nos termos do art.° 496.°, n.°s 1 e 3, do Código Civil, não pode deixar de considerar as exigências decorrentes do princípio da igualdade, o que implica a busca uniformização de critérios, dentro do circunstancialismo concreto de cada caso. Nessa linha, Cfr., entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20-06-2018, proc. 31947/15.9T8LSB.L2.S1 e de 24-01-2018, proc. 1634/15.4T8AVR.S1, in www.dgsi.pt., tendo-se neste último consignado que: Esta Secção tem-se debruçado inúmeras veres sobre a problemática da reparação dos danos não patrimoniais. Referiu-se, com efeito, no acórdão de 1 de marco de 2018, proferido no processo n.° 606 /13.817MTS.P1.52, o seguinte:
«Na verdade, podemos encontrar decisões do Supremo Tribunal de Justiça, nomeadamente desta 4.' sec,cão, sobre a indemnizas por danos não patrimoniais, no âmbito do foro laborai, que nos podem ajudar neste julgamento de equidade, como é apelidado por Fernando Andrade Pires de Lima e João de Matos Antunes Varela código Civil, anotado, Coimbra Editora, Vol. 1, pág. 339).
No Acórdão de 25 /11 /2014, proferido no Recurso n.° 781 /11.6TTFAR.E1 .S1, proclamou-se o principio de que a 'A indemnização por danos não patrimoniais pressupõe, concretamente no foro laboral, que se trate de danos que constituam lesão grave, com justificação causalmente segura, decorrente de atuação culposa do agente, e que sejam dignos da tutela do Direito.
No Acórdão, datado de 14-02-2013, proferido no Recurso n.° 1508 / 06.0TTLSB.L1.S1, concretizou-se que Configurando-se a violação do dever de ocupação efetiva do trabalhador e a sua despromoção ilidia, e considerando que esses factos contribuíram para a situação de doença do trabalhador, que se prolongou por bastante tempo, é de reputar como equilibrada a importância de € 15.000,00, a título de compensação pelos danos não patrimoniais causados.
Na mesma linha, também o Acórdão, de 05 / 03 / 2013, proferido no Recurso n.°
1361 / 09.111PRT.P1.51, sublinhou Configurando-se a violação do dever de cometer funções correspondentes à atividade contratada, justifica-se a atribuição, ao autor, de uma compensação pelos danos não patrimoniais gerados por tal violação
O Acórdão de 12/ 09 / 2013, proferido no Recurso n.° 18003 /11.8T2SNT.L1.S1, frisou que `Provando—se que, devido à conduta do empregador, a trabalhadora ficou afetada emocional e psicologicamente de forma grave, passando a carecer de acompanhamento psiquiátrico e de internamento hospitalar, deverá considerar-se que ocorreram danos não patrimoniais relevantes que justificam a atribuição de indemnkação no montante de € 17.500,00, como forma de compensação
Também o Acórdão, de 17-12-2014, proferido no Recurso n.° 292 /11.0TTSTR.E1.S1, salienta que `Resultando provado que a ré não atribuiu à autora as funções correspondentes à categoria profissional contratada —mas sim funções de categoria inferior, desempenhadas a par e ao lado de colegas que lhe estavam hierarquicamente subordinados — e que violou o seu direito a não trabalhar aos sábados e domingos, provocando-lhe danos graves, atentatórios da sua saúde física e psicológica (sentimentos de humilhação, tristeza, angústia, ansiedade e stresse), estão verificados os pressupostos da indemnização por danos não patrimoniais.
Finalmente, o Acórdão, de 28/ 01 / 2016, proferido no Recurso n.° 2501 / 09.6TTLSB.L2.S1, adianta que 'Tendo a ré despedido ilicitamente a autora, e esta sofrido danos não patrimoniais graves, em virtude do despedimento realizado, justifica-se que lhe seja atribuída uma compensação por danos não patrimoniais, sendo de reputar como equilibrada a quantia de €10.000,00 conferida, a esse título, no acórdão recorrido'
No presente caso, apurou-se que o autor era um trabalhador competente e zeloso, sendo pessoa considerada entre os colegas de trabalho; a instauração do procedimento disciplinar o abalou profundamente, tendo perdido peso. Começou a isolar-se e a conviver muito pouco com colegas e amigos. E que, com o despedimento o referido estado do autor se agravou, evitando sair de casa e estar com outras pessoas. O autor sentia vergonha da situação em que se encontrava e ficou preocupado e abatido, o que era visível por parte de familiares e amigos (n.°s 58 a 62).
Ora, à luz dos considerandos que se expuseram, desde já se adianta que os padecimentos acima descritos sofridos pelo autor em consequência do despedimento ilícito de que foi alvo se configuram como danos não patrimoniais que vão para além dos simples incómodos e transtornos, sendo merecedores da tutela do direito. Com efeito, importa recordar que o autor tinha a categoria de subdirector, exercia na ré as funções de director regional, estando ligado à banca, como funcionário bancário desde 1994 e à ré desde 2012. Era um trabalhador competente e zeloso, sendo considerado pelos seus colegas de trabalho. Com a instauração do procedimento disciplinar e posterior despedimento, o autor sofreu uma alteração profunda na sua vida profissional, pessoal e social. Pois, não somente foi afastado ilicitamente do seu local de trabalho e da sua carreira, como seu estado emocional foi claramente afectado e se agravou com o despedimento, como o mesmo passou a isolar-se a conviver pouco com colegas e amigos, evitando sair de casa e a estar com outras pessoas, sentido vergonha da situação, tendo também emagrecido. Ponderando todo o nefasto circunstancialismo decorrente do despedimento que o autor sofreu, a sua duração, a favorável situação económica da ré (instituição bancária) face à (conhecida) do autor (funcionário bancário), tendo em atenção os valores compensatórios que em casos com alguma similitude com o presente têm sido fixados pelos nossos tribunais, entende-se ajustado fixar como indemnização ao autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia de €15.000,00. Procedendo, assim, apenas em parte a presente questão.
4. Decisão
Em face do exposto, e de acordo com o supra referido:
Concede-se-- provimento parcial ao recurso da ré quanto ao valor da causa.
Concede-se provimento parcial ao recurso da ré da sentença.
Julga-se ilícito o despedimento do autor por não verificação de justa causa.
Concede-se provimento parcial ao recurso do autor, condenando-se a ré pagar-lhe a título de indemnização por danos não patrimoniais a importância de €15.000,00.
Custas pela ré e pelo autor em ambos os recursos da ré, na respectiva proporção.
Custas pelo autor e pela ré no recurso do autor, na respectiva proporção.
Lisboa, 2019-02-13
Albertina Pereira
Leopoldo Soares
Eduardo Sapateiro