Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 02-05-2019   Incompetência material dos tribunais do trabalho.
Independentemente da natureza jurídica do contrato de trabalho do Autor antes de 1.1.2009 e do regime jurídico ao abrigo do qual foi inicialmente celebrado, à data da propositura da acção o litígio a decidir emerge de uma relação jurídica que deve qualificar-se como relação jurídica de emprego público, pelo que importa concluir que não cabia competência aos Juízos do Trabalho de Lisboa para da mesma conhecer.
Proc. 6758/18.3T8LSB-A.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Filomena Manso - Duro Mateus Cardoso - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
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PROC. 6758/18.3T8LSB-A.L1
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa
I — RELATÓRIO
AAA... intentou contra CCC... acção com forma de processo comum formulando o seguinte pedido:
a) Ser declarada a ilicitude do despedimento do Autor;
b) Ser a Ré condenada a reintegrar o Autor como seu trabalhador, na situação funcional e hierárquica em que se encontrava antes do dia 31 de Março de 2017, embora, desta feita, com ocupação efectiva, e sem perda de quaisquer regalias e antiguidade, a menos que o Autor venha a optar pela indemnização prevista na lei em substituição da reintegração, nos termos e prazos legais;
c) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor os créditos laborais decorrentes da cessação da relação laboral existente entre as partes, indicados nos artigos 79. a 100. supra, no valor de €21.493,10, à data de 20 de Março de 2018, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal desde a data do vencimento até efectivo pagamento;
d) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a compensação prevista no artigo 390° do Código do Trabalho, a liquidar em incidente de liquidação de sentença;
e) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor montante não inferior a €7.500,00, a título de danos não patrimoniais;
Subsidiariamente, e para o caso de o Tribunal entender que in casu se trata de cessação de um contrato de trabalho em regime de comissão de serviço, o que se admite como hipótese de trabalho, improcederem os pedidos a) a e) supra, deve a Ré ser condenada a pagar ao Autor:
f) Os créditos laborais decorrentes da cessação da relação laboral existente entre as partes, indicados nos artigos 152. a 173. supra, no valor de €21.493,10, à data de 20 de Março de 2018, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal desde a data da citação até efectivo pagamento;
h) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a compensação prevista na alínea c) do n°1 do artigo 164° do Código do Trabalho, calculada nos termos do artigo 366° do mesmo Código e das normas legais transitórias relativas a este mesmo cálculo, no valor de €41.318,96, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal desde a data do vencimento até efectivo pagamento, dos quais os vencidos até 20 de Março de 2018 ascendem a €1.607,48;
i) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a compensação por falta de cumprimento do aviso prévio para a cessação do contrato, no valor de €11.810,43, acrescida de juros moratórios, calculados À taxa legal desde a data de vencimento até efectivo pagamento, dos quais os vencidos até 20 de Março de 2018 ascendem a €459,46;
j) Ser a Ré condenada no pagamento das custas, nos termos legais.
Alega que foi admitido ao serviço da Ré em 24.4.2008, mediante a celebração de um contrato de comissão de serviço para as funções de dirigente, ao abrigo do disposto no art. 244 e sgs. do Código do Trabalho, pelo prazo de três anos.
Por carta datada de 8.4.2011, a Ré comunicou ao Autor a cessação do seu contrato, no seu termo (23.4.2011), por se ter esgotado o prazo da sua duração inicial.
Após 23.4.2011 o Autor continuou a exercer as suas funções, nos exactos termos em que as tinha exercido até então, funções essas que perduraram até 27.3.2017, data na qual a Ré comunicou-lhe (...) a cessação da comissão de serviço para as funções de Dirigente, actualmente em regime de gestão corrente, tendo este cessado funções em 31.3.201.
Sustenta o Autor que à data de 31.3.2017 mantinha com a Ré uma relação labora, por conta de outrem e por tempo indeterminado, pelo que a sua cessação só podia ocorrer mediante o recurso a uma das modalidades previstas nas alíneas a) a f) do art. 340 do CT. Assim a cessação unilateral do contrato por parte da Ré configura um despedimento, que é ilícito.
Atribuiu ainda à acção o valor de €76.689,43.
Na contestação a Ré vem excepcionar a incompetência material dos Tribunais do Trabalho. Alega, em síntese, que à data da celebração do contrato de comissão de serviço para o exercício de funções de Dirigente entre Autor e o então Instituto Nacional de Aviação Civil, IP, o regime de contracção que vigorava para o seu pessoal era, nos termos do art. 11, n°1 do DL 147/2007, de 27.4, o regime de contrato de trabalho. Sucede que, por efeito do art. 88, n°3 da Lei n° 12-N2008, de 27.2, que entrou em vigor nos termos conjugados do ser art. 118, n°7 e do art. 23 da Lei n° 59/2008, de 11.9 (que aprovou o regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas), ocorreu uma transição dos contratos de trabalho que a Ré tinha com os seus trabalhadores, passando estes a ter um contrato de trabalho em funções públicas, por efeito da lei. Assim, e atendendo ao disposto no art. 83, n°1 da Lei 12¬a/2008, de 27.2, que estatui a competência dos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal, a jurisdição competente apenas poderá ser a administrativa.
Impugnou ainda o valor da acção, pretendendo que o valor indicado pelo Autor seja substituído, fixando-se o valor da acção em €28.993,10, correspondendo ao valor do pedido principal.
Na resposta à contestação, o Autor pugnou pela improcedência desta excepção invocada pela Ré, pronunciando-se ainda sobre os documentos por esta juntos com esse articulado e nos artigos 105 a 106 requereu ainda a junção de documentos. Notificada da resposta, veio a Ré arguir a nulidade parcial desse articulado, na parte em que excedeu a pronuncia sobre a excepção da incompetência material, mormente todos os artigos ressalvados os arts. 5° a 39°, pugnando ainda pela inadmissibilidade quer da prova junta com a resposta à contestação, quer do requerimento de prova aí apresentado.
Foi depois proferido o despacho saneador, que julgou improcedente a arguição da nulidade parcial da resposta à contestação e, conhecendo da excepção da incompetência material dos Tribunais do Trabalho, julgou a mesma improcedente, afirmando a competência destes tribunais para conhecerem dos pedidos formulados pelo Autor. No mesmo despacho, foi ainda fixada à acção o valor de €100.172,07. Inconformada, interpôs a Ré recurso para esta Relação no qual formulou as seguintes
CONCLUSÕES
1. Não obstante considerar que na fixação da competência do tribunal, em razão da matéria, deve atender « ... à natureza da relação jurídica material em debate na perspectiva apresentada em juízo» (Ac. do S. T.J. de 27/9/94 - processo n.° 858/94)., o tribunal a quo concluiu pelo indeferimento da incompetência material deduzida pela R ..
2. Tendo afirmado que .A nulidade desse contrato [de direito público] inviabilizaria a transformação da relação de trabalho em causa num contrato sujeito ao regime de contrato de trabalho em funções públicas, conforme acima se referiu, e, nessa medida, subtraída à jurisdição administrativa porquanto insusceptível de enquadramento no regime do contrato de trabalho em funções públicas..
3. Tal entendimento, para além de já conter uma apreciação do mérito da causa (conclui que a existir Contrato de Trabalho em Funções Públicas o mesmo é nulo), é contrário ao que consta da Petição Inicial do Autor, para além de não corresponder à correcta aplicação do direito.
4. Parte o tribunal a quo do entendimento de que o A. pretende (i) a declaração da existência de um contrato de trabalho e (ii) que tal declaração terá de produzir efeitos desde Abril de 2008, escudando-se para o efeito na aclaração que o A. foi convidado a fazer na audiência preliminar, em que esclareceu que entre esses anos existiu sempre entre as partes um vínculo laborai de direito privado contrariamente ao que alega a Ré na sua contestação..
5. Porém, tal raciocínio não resulta de qualquer dos artigos da Petição Inicial, onde o A. formula dois pedidos subsidiários, um principal de declaração de ilicitude de despedimento, e um subsidiário de créditos laborais por cessação do contrato de comissão de serviço entre A. e R.
6. O A. não formulou em toda a Petição Inicial o pedido principal, a saber, que seja declarada a existência de um contrato de trabalho com a R. pelo menos desde Julho de 2011.
7. Acresce que, em momento algum, coloca em causa a validade do referido contrato de comissão de serviço.
8. Pelo que a manter-se, como AGORA pretende, a existência de um vínculo entre as partes desde Abril de 2008, este apenas poderia ter a mesma natureza do vínculo inicial - contrato de comissão de serviço, pelo que, na eventualidade de ter ocorrido uma cessação ilícita por parte da R. nunca daria lugar ao pagamento de indemnização por despedimento ilícito, nem direito a optar pela reintegração como pretende o A. no seu pedido principal.
9. Assim, como pacificamente considerado pela jurisprudência a competência do tribunal, em razão da matéria, afere-se pelo pedido e causa de pedir formulados pelo Autor., in casu concluir-se-á que em algum momento da relação jurídica entre as partes de se terá constituído um vínculo de trabalho que não a Comissão de Serviço.
10. Atender-se-á ainda que a partir de I de Janeiro de 2009, o regime do contrato de trabalho aplicável à R. passou a ser o do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas.
11. Destarte, à data que o A. pretende que seja declarado que possuía um contrato de trabalho com a R., Julho de 2011, pressuposto essencial para que seja declarado o despedimento ilícito peticionado, o contrato que se poderia ter constituído entre A. e R. seria um contrato de trabalho em funções públicas.
12. Não obstante a sucessão de Leis (Lei n.° 12-N2008, de 27 de Fevereiro e Lei n.° 35/2014, de 20 de Junho) a competência para apreciar os litígios emergentes das relações jurídicas de emprego público continua atribuída aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal.
13,Considerou ainda o tribunal a quo quanto ao pedido de reintegração formulado pelo A. que ao mesmo não pode deixar de equivaler uma quantia em dinheiro decorrente da aplicação do disposto no art. 391., n.° 3, do Código do Trabalho. 14.Fixando o valor da causa em € 100.1 72,07, por aplicação do art. 297°, n.° 1, 2a parte do Código de Processo Civil, que estatui o seguinte se pela ação se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.
15.Parece, no entanto, que o tribunal a quo se esqueceu de atender ao expressamente previsto logo no n.° 2 do mesmo artigo, que consagra que na fixação do valor atende-se somente aos interesses iá vencidos..
16.Ao fixar o valor da acção liquidando desde já o montante correspondente à indemnização por despedimento ilícito, o tribunal a quo está a substituir-se ao A., porquanto este ainda não manifestou a sua vontade, estando, assim, a utilizar para a determinação do valor da causa um valor correspondente a um interesse ainda não vencido, uma vez que na eventualidade de o A. optar pela reintegração o valor agora fixado estaria, necessariamente, errado.
17.No mesmo sentido, vide, Ac. do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. 602/1 2.2TTLMG.CI .S1, in www.dgsi.pt: o valor da causa reporta-se aos interesses iá vencidos à data da formulação do pedido, sendo irrelevantes para tal fixação os valores dos interesses que se venham a vencer durante a sua pendência, sendo ainda de relevar a circunstância de inexistir norma que consinta, numa fase adiantada do processo. a correção do valor decorrente dos pedidos formulados..
18.Considerando que o A. formulou dois pedidos de valor diferente, um principal, no valor de € 28.993,10, e outro subsidiário, no valor de € 76.689,43, determina o art. 297°, n.o 3 do Código de Processo Civil, que o valor da acção corresponderá ao valor do pedido que foi formulado em primeiro lugar.
19.Entendeu o tribunal a quo que o autor, na sua resposta, naturalmente que poderia, como fez, responder à matéria de excepção deduzida pela ré, (. . .) poderia responder ao incidente do valor deduzido e, bem assim, aos documentos que a ré apresentou com a sua contestação..
20.Mal andou o tribunal tendo procedido a uma errada aplicação do direito, uma vez que o A. além de responder à excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal (indicada especificada e separadamente), aproveitou para trazer aos autos factos que extrapolavam o âmbito do direito de resposta à excepção.
21.Estabelece o artigo 60° n.° I do Código do Processo de Trabalho que Se o valor da causa exceder a alçada do tribunal e o réu se tiver defendido por excepção, pode o autor responder à respectiva matéria no prazo de 10 dias (. . .).
22.Tendo presente o propalado pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, N° processo n.° 2073/14.0TTLSB.LI -4, in www.dgsi.pt, Mantendo-se o disposto no art 60° do CPT deve entender-se que só é de aplicar o ónus de impugnação especificada nos termos do arto 574° do CPC se na contestação se especificaram separadamente as excepções. 11,
23.Assim, decorre expressamenfe do referido art.? 60° que o direito de resposta à contestação depende da verificação de dois requisitos, a saber, (i) o valor da causa tem de exceder a alçada do tribunal, e (ii) que o réu se tenha defendido por excepção, pelo que, o A. apenas poderia responder à matéria de facto alegada na excepção dilatória.
24.No entanto, o A., para além da resposta à excepção, aproveita para aditar/aperfeiçoar a sua petição inicial.
25.Tendo (i) alegado a confissão por acordo da R. de alguns factos constantes da Petição Inicial, (ii) tendo respondido à questão prévia levantada pela R. relativamente ao valor da acção, e (iii) tendo requerido a admissão de meios de prova adicionais (quer de documentos que juntou com o sua resposta à excepção, quer requerendo a junção aos autos de informação/documentos em posse da parte contrária).
26.Tudo ao arrepio dos princípios da estabilidade da instância, e do direito de defesa e de contraditório da R.
27 O exercício do direito de resposta às excepções dilatórias deduzidas na Contestação não pode ir além da resposta à excepção, dado que, não existindo reconvenção, a fase dos articulados termina com a resposta à contestação.
28.Aliás, caso a R. não se tivesse defendido por excepção, dúvidas não existiriam, que o A. não poderia ter apresentado qualquer resposta ou solicitado o aditamento de quaisquer meios de prova, mormente, documentos.
29.Dessarte, ao admitir in totum a resposta à Contestação apresentada pelo A., por não ser admissível por lei e poder influir na decisão da causa, a mesma encontra-se ferida de nulidade, nos termos do art. 195°, n.° 1 do Código de Processo Civil.
Nestes termos, e nos mais que Vexas. mui doutamente supriram, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em conformidade:
a) Ser revogado o despacho saneador na parte em que indeferiu a excepção de incompetência em razão da matéria, e, em conformidade, ser substituído por outro que declare a incompetência do tribunal a quo para apreciar os factos sub iudice e ordenar a remessa dos autos para o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa;
b) Ser revogado o despacho saneador na parte em que fixou o valor da causa em € 100.172,07 (CEM MIL CENTO E SETENTA E DOIS EUROS E SETE CÊNTIMOS), e, em conformidade, ser substituído por outro que fixe o valor da causa em € 28.993, 10 (VINTE E OITO MIL NOVECENTOS E NOVENTA E TRÊS EUROS E DEZ CÊNTIMOS);
c) Ser revogado o despacho saneador na parte em que admitiu a resposta à excepção apresentada pelo A. in totum, e, em conformidade, ser substituído por outro que expurgue os autos de todo o articulado que exceda o direito de pronúncia, e dos documentos que foram juntos pelo A. com tal peça processual e revogue a determinação para a R. preste a informação solicitada pelo A. no ponto 106°, alíneas a) e b) da referida resposta.
Só assim, Vexas. farão a acostumada JUSTIÇA!
Contra-alegou o Autor que sustentou a improcedência do recurso.
Admitido o recurso e subidos os autos a esta Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da competência dos tribunais judiciais comuns, entendendo que assiste razão à Apelante quanto ao articulado e produção de prova apresentada na resposta à excepção, a qual excede o permitido pelo art. 60° do CPT.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas respectivas conclusões, são as seguintes as questões suscitadas no recurso:
1. (in)competência material dos Tribunais do Trabalho;
2. valor da acção,
3. (in)admissibilidade parcial do articulado de resposta à contestação.
II — FUNDAMENTOS DE FACTO
Para além dos factos e incidências processuais que constam do precedente
relatório, relevam ainda os seguintes:
1. Em 24.4.2008 foi celebrado entre o Autor e o Instituto Nacional de Aviação Civil, IP o acordo escrito que figura a fls 33-35, que as partes denominaram de Contrato de Comissão de Serviço para o Exercício de funções de Dirigente, nos termos e ao abrigo dos arts. 244 e seguintes do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n° 99/2003, de 27.8, e no artigo 6° da Lei n° 23/2004, de 30.4, com início nessa data e duração de três anos, sendo automaticamente renovável, de acordo com a cláusula 4', n°1, se nenhuma das partes comunicar por escrito, até 60 dias antes do seu termo, a intenção de o fazer cessar, dando-se por reproduzido o seu teor.
2. Por escrito datado de 8.2.2011 foi comunicada ao Autor a cessação da comissão de serviço no dia 23.4.2011 (doc. n° 2 junto com a p.i)
3. Após esta data o Autor continuou a exercer as suas funções nos exactos termos em que as tinha prestado até então, sem que novo acordo tenha sido negociado ou formalizado.
4. Por escrito datado de 27.3.2017 (doc. n°3 junto com a p.i.) foi comunicada ao Autor a cessação da comissão de serviço, para o exercício de funções de Dirigente, actualmente em regime de gestão corrente, com efeitos a 31.3.2017.
III — FUNDAMENTOS DE DIREITO
1. Da competência material do Tribunal do Trabalho
Como refere Manuel de Andrade (Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra,
1979, pág. 88-89), a competência dos tribunais em geral resulta da medida de jurisdição atribuída aos diversos tribunais, do modo como entre si fraccionam e repartem o poder jurisdicional que, tomada em bloco, pertence ao conjunto dos tribunais.
Relativamente aos tribunais judiciais, estabelece o art. 40, n°1 da Lei Orgânica dos Sistema Judiciário (LOSJ) que os tribunais judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.
Esta norma está de acordo com o preconizado no art. 211, n°1 da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual os tribunais judiciais são os tribunais comuns em matéria cível e criminal e exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais.
Daqui decorre que a competência dos tribunais comuns é residual, só se verificando quando as regras reguladoras da competência de outra ordem jurisdicional não abarcam o conhecimento da questão que é submetida à apreciação do tribunal.
No âmbito dos tribunais judiciais encontram-se as instâncias centrais onde podem ser criadas secção de competência especializada do Trabalho — cfr. arts. 79 e 81, n°, a) e n°2, e) da LOSJ
A competência especializada das Secções do Trabalho encontra-se definida no art. 126 desta Lei, segundo a qual compete a estas Secções conhecer, em matéria cível, entre outras:
b) Das questões emergentes de relações de trabalho subordinado e de relações estabelecidas com vista à celebração de contratos de trabalho;
(...)
n) Das questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o juízo seja directamente competente;
Por sua vez, de acordo com o previsto no art. 212, n°3 da CRP compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.
Em consonância com o mencionado dispositivo constitucional, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), aprovado pela Lei n° 13/2002, de 19.2, diz-nos no n°1 do seu art. 1° que Os tribunais da ordem administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais. Em igual sentido dispõe o art. 144, n°1 da LOSJ.
Com particular destaque para a apreciação do caso vertente, importa ainda deixar assinalado o que estabelece o art. 4°, n°3, d) do ETAF, nos termos do qual fica igualmente excluída do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal:
d) A apreciação de litígios emergentes de contratos individuais de trabalho, ainda que uma das partes seja uma pessoa colectiva de direito público, com excepção de litígios emergentes de contrato de trabalho em função pública.
Constitui entendimento jurisprudencial pacífico o de que a competência em razão da matéria do tribunal se afere pela natureza da relação jurídica, tal como ela é configurada pelo autor na petição inicial, ou seja, no confronto entre a pretensão deduzida (pedido), independentemente do seu mérito, e os respectivos fundamentos (causa de pedir).
In casu, o Autor estrutura a presente causa configurando o vínculo estabelecido com o Instituto Nacional de Aviação Civi, IP, actualmente a ANAC — Autoridade Nacional de Aviação Civil, em 24.4.2008 e que, segundo ele, perdurou até 31.3.2017, como um único contrato de trabalho, que cessou por despedimento promovido pela Ré, que é ilícito, sendo que todos os créditos reclamados decorrem desta cessação ilícita da relação contratual.
Ou seja, o Autor caracterizou o vínculo estabelecido com a Ré como uma relação laborai de direito privado, fundamentando o seu pedido em regras de direito substantivo laborai constantes do Código do Trabalho.
A questão que se coloca á a de saber se, perante os factos alegados na petição inicial, a relação contratual que o Autor mantinha à data da cessação do contrato é uma relação laborai regulada pela Código do Trabalho ou deve antes ser caracterizada como contrato de trabalho em funções públicas.
Resulta da petição inicial que o Autor foi admitido em 24.4.2008, ao serviço do Instituto Nacional de Aviação Civil, IP, actualmente designado Autoridade Nacional de Aviação Civil, que é uma pessoa colectiva de direito público (art. 1° do DL 40/2015, de 16.3), integrada na administração indirecta do Estado, no âmbito de um contrato de trabalho em comissão de serviço externa para o exercício de funções de dirigente, celebrado ao abrigo do art. 244 do Código do Trabalho de 2003 e art. 6° da Lei n° 23/2004, o que ambas as partes aceitam.
A Lei n° 12-A/2008, de 27.2, que estabelece o Regime de Vinculação de Carreiras e de Remunerações dos Trabalhadores que exercem Funções Públicas, introduziu uma mudança de paradigma no regime de vinculação dos trabalhadores que exercem funções públicas, concretizado pela Lei n° 23/2004, de 22.6, que aprovou o Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho na Administração Pública.
No essencial, a Lei n° 12-N2008 veio estabelecer três formas de constituição da relação jurídica da relação jurídica de emprego público (art. 9°): a nomeação (forma clássica da vinculação dos funcionários públicos); o contrato de trabalho em funções públicas (definido no mesmo dispositivo como o acto bilateral celebrado entre uma entidade empregadora pública com ou sem personalidade jurídica, agindo em nome e em representação do Estado, e um particular, nos termos do qual se constitui uma relação de trabalho subordinado de natureza administrativa) e a comissão de serviço, prevista no n°4 da mesma norma (vínculo de emprego público que se constitui em caso de cargos não inseridos em carreiras, designadamente cargos dirigentes, e funções exercidas com vista à aquisição de formação específica, habilitação académica ou título profissional por trabalhador/a já detentor/a de vínculo de emprego público por tempo indeterminado).
A comissão de serviço — diz-nos o art. 23, n°1 do mesmo diploma — tem a duração de três anos, sucessivamente renovável por iguais períodos.
Sobre o âmbito de aplicação subjectivo da Lei n° 12-A/2008 rege o art. 2°, que prescreve que:
1. A presente lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, independentemente da modalidade de vinculação e de constituição da relação jurídica de emprego público ao abrigo da qual exercem as respectivas funções.
Como refere Vera Lúcia Santos Antunes O Contrato de Trabalho na Administração Pública, Evolução, Reflexos e tendência para o Emprego Público, Coimbra Editora, 2010, pág. 122) O âmbito de aplicação subjectivo é-nos fornecido através de um critério orgânico, pois abrange todas as pessoas individuais ou colectivas que exerçam funções ou prestem serviços em qualquer organismo ou serviço público. abrangido pela presente lei. A expressão trabalhadores que exercem funções públicas é, por isso, bastante abrangente, pois integra em si todos aqueles que estão ligados à Administração pública, independentemente da modalidade de vinculação e de constituição da relação jurídica de emprego público. O que significa que abarca os trabalhadores nomeados, contratados em regime de contrato de trabalho em funções públicas, de comissão de serviço e até de contrato de prestação de serviços, visto que, embora esta última não seja uma modalidade de emprego público, configura uma modalidade de vínculo à Administração.
E, quanto ao âmbito objectivo de aplicação do citado diploma legal, o seu art. 3°, n° 1, dispõe que:
1. A presente lei é aplicável aos serviços de administração directa e indirecta do Estado.
(-.)
Por sua vez, o art. 90, n°4 da Lei 12-A/2008 prescreve que Os actuais trabalhadores em comissão de serviço em outras situações transitam para a modalidade de comissão de serviço com o conteúdo decorrente da presente lei.
A comissão de serviço não tem definição legal, ao contrário do que acontece com as outras modalidades de constituição da relação jurídica de emprego público, pelo que a sua qualificação não se tem apresentado como pacífica
Autonomizada face à nomeação, há quem a assemelhe à figura da nomeação (cfr. Paulo Veiga e Moura e Cátia Arrima, Comentários à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, 1° vol. Coimbra Editora, 2010, págs. 112 e 113) e quem a configure como um contrato de trabalho (veja-se André Ventura, A Nova Administração Pública — Princípios Fundamentais e normas reguladoras, Ed. Quid Juris, 2014, pág. 62).
Propendemos para esta última solução, que foi também a adoptada no art. 9°, n°2 da Lei n° 35/2014, de 20.6. (Lei do Trabalho na Função Pública), que remete a comissão de serviço para o regime do vínculo de emprego público de origem, seja ele a nomeação ou o contrato, no caso de se tratar de uma comissão interna, ou não existindo qualquer vínculo de origem (como acontece no caso vertente), para o regime do contrato de trabalho em funções públicas.
Assim sendo, colhe aplicação o que vem previsto no art. 17, n°2 da Lei n° 59/2008, de 11.9 (que aprovou o Regime Jurídico do Contrato de Trabalho em Funções Públicas).
Prevê esta norma que Sem prejuízo do disposto no art. 109 de Lei n° 12-A/2008, de 27.2, a transição dos trabalhadores que, nos termos daquele diploma, se deva operar, designadamente das modalidades de nomeação e de contrato individual de trabalho, para a modalidade de contrato de trabalho em funções públicas é feita sem dependência de quaisquer formalidades, considerando-se que os documentos que suportam a relação jurídica anteriormente constituída são título bastante para sustentar a relação jurídica de emprego público constituída por contrato.
Assim, a relação jurídica de trabalho subordinado estabelecida entre um ente público (a Ré) e um privado (o Autor) iniciada antes da vigência das leis publicadas em 2008, convolou-se num vínculo de emprego público, em virtude da conversão legal operada pelo art. 90 e 109 de Lei n° 12-A/2008.
Esta legislação de 2008 entrou em vigor no nosso ordenamento jurídico em 1 de Janeiro de 2009, como resulta das disposições conjugadas dos arts. 118, n°7 da Lei n° 12-A/2008 e 23 da Lei n° 59/2008, pelo que, sendo o contrato de trabalho do Autor de constituição anterior a essa data, convolou-se em 1.1.2009 numa relação jurídica de emprego público.
No que respeita aos pedidos formulados, verifica-se que todos eles emergem de uma relação de trabalho a que é aplicável o regime jurídico do contrato de trabalho em funções públicas, e que não estava já sujeito à lei laborai comum quando se verificaram os factos que os fundamentam e que se traduzem essencialmente na cessação do contrato de trabalho ocorrida em 24.3.2017 (com efeitos a 31.3.2017), ou seja, em data posterior à conversão do contrato de trabalho inicial ou ao início de novo contrato, no caso de se entender que a relação contratual inicial cessou em Junho de 2011 com a cessação da comissão de serviço.
E é perante este desenho da petição inicial que se deve aferir a competência material do tribunal.
De acordo com o disposto no já citado art. 4°, n°3 d) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Ficais, bem como no art. 83°, n°1 da Lei 59/2008, de 27.2 os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os competentes para apreciar os litígios emergentes das relações jurídicas de emprego público.
Igualmente o art. 12° da actual Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas aprovada pela Lei n° 35/2014 estabelece que são da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios emergentes do vínculo de emprego público.
Assim, uma vez que a relação contratual invocada na presente acção se converteu ope legis em 1.1.2009 em relação de trabalho de natureza administrativa, falece aos juízos do Trabalho competência material para apreciar os pedidos formulados ainda que possa considerar-se que o contrato de trabalho em vigor em Março de 2017 tenha nascido em data anterior a 1.1.2009, sendo-lhe então aplicável a lei geral do trabalho.
Independentemente da natureza jurídica do contrato de trabalho do Autor antes de 1.1.2009 e do regime jurídico ao abrigo do qual foi inicialmente celebrado, à data da propositura da acção o litígio a decidir emerge de uma relação jurídica que deve qualificar-se como relação jurídica de emprego público, pelo que importa concluir que não cabia competência aos Juízos do Trabalho de Lisboa para da mesma conhecer.
Há assim que julgar procedente a excepção dilatória da incompetência material com a consequente absolvição da Ré da instância, nos termos prescritos nos arts. 96°,
a), 97°, n°1, 99°, n°1, t a) e 578° do CPC.
Procede, pois, o recurso nesta parte.
2. Do valor da acção
Discorda a Apelante do entendimento do Tribunal a quo, que fixou o valor da acção em €100 172,17, sustentando que deve ser alterado, fixando-se o mesmo em €28 993,10.
Alega que é este o valor do pedido principal, sendo que resulta do n°2 do art. 297 do CPC que na fixação do valor atende-se somente aos interesses vencidos, pelo que não pode ser contabilizado o valor da indemnização por despedimento ilícito, pela qual o Apelado nem sequer ainda optou, nem o valor das retribuições intercalares. Vejamos.
Nos termos do n°1 do art. 296 do CPC, a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica do pedido. E o art. 297 do CPC aponta os critérios gerais para a fixação do valor, referindo: 1. Se pela acção se pretende obter qualquer quantia certa em dinheiro, é esse o valor da causa, não sendo atendível impugnação nem acordo em contrário; se pela acção se pretende obter um benefício diverso, o valor da causa é a quantia em dinheiro equivalente a esse benefício.
2. Cumulando-se na mesma acção vários pedidos, o valor é a quantia correspondente à soma de todos eles; mas quando, como acessório do pedido principal, se pedirem juros, rendas ou rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos.
Importa ainda ter em conta que, no caso de pedidos subsidiários, atende-se unicamente ao pedido formulado em primeiro lugar (n°3 do art. 297).
Por seu turno, o art. 299 do CPC, sob a epígrafe Momento a que se atende para a determinação do valor preconiza que Na determinação do valor da causa, deve atender-se ao momento em que a acção é proposta, exceto quando haja reconvenção ou intervenção principal (n°1), casos em que o valor do pedido formulado pelo réu ou pelo interveniente, quando distintos do deduzido pelo autor se soma ao valor deste (n°2) e, ainda, os processos de liquidação ou outros em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da acção, sendo o valor inicialmente aceite corrigido logo que o processo forneça os elementos necessários (n°4).
Ora, na petição inicial o Autor formulou os seguintes pedidos:
a) Ser declarada a ilicitude do despedimento do Autor;
b) Ser a Ré condenada a reintegrar o Autor como seu trabalhador, na situação funcional e hierárquica em que se encontrava antes do dia 31 de Março de 2017, embora, desta feita, com ocupação efectiva, e sem perda de quaisquer regalias e antiguidade, a menos que o Autor venha a optar pela indemnização prevista na lei em substituição da reintegração, nos termos e prazos legais;
c) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor os créditos laborais decorrentes da cessação da relação laborai existente entre as partes, indicados nos artigos 79. A 100. Supra, no valor de €21.493,10, à data de 20 de Março de 2018, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal desde a data do vencimento até efectivo pagamento;
d) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a compensação prevista no artigo 390° do Código do Trabalho, a liquidar em incidente de liquidação de sentença;
e) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor montante não inferior a €7.500,00, a título de danos não patrimoniais;
Subsidiariamente, e para o caso de o Tribunal entender que in casu se trata de cessação de um contrato de trabalho em regime de comissão de serviço, o que se admite como hipótese de trabalho, improcederem os pedidos a) a e) supra, deve a Ré ser condenada a pagar ao Autor:
f) Os créditos laborais decorrentes da cessação da relação laborai existente entre as partes, indicados nos artigos 152. a 173. supra, no valor de €21.493,10, à data de 20 de Março de 2018, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal desde a data da citação até efectivo pagamento;
h) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a compensação prevista na alínea c) do n°1 do artigo 164° do Código do Trabalho, calculada nos termos do artigo 366° do mesmo Código e das normas legais transitórias relativas a este mesmo cálculo, no valor de €41.318,96, acrescida de juros moratórios, calculados à taxa legal desde a data do vencimento até efectivo pagamento, dos quais os vencidos até 20 de Março de 2018 ascendem a €1.607,48;
i) Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a compensação por falta de cumprimento do aviso prévio para a cessação do contrato, no valor de €11.810,43, acrescida de juros moratórios, calculados À taxa legal desde a data de vencimento até efectivo pagamento, dos quais os vencidos até 20 de Março de 2018 ascendem a €459,46;
j) Ser a Ré condenada no pagamento das custas, nos termos legais.
Na presente acção pedem-se quantias certas em dinheiro, que representam a utilidade económica do pedido, sendo esse o valor da causa, segundo o critério geral consagrado nos arts 296 e 297, n°1 do CPC, não tendo influência no valor da causa as quantias que a Ré terá, efectivamente, de pagar no futuro.
E as retribuições e juros vincendos não terão, igualmente, qualquer influência na fixação do valor da causa (neste sentido, vd. os Acs. do STJ de 25.9.2014 e de 22.6.2017, disponíveis em www dasi.pt)
Com efeito, não estamos perante um processo de liquidação ou outro em que, analogamente, a utilidade económica do pedido só se define na sequência da acção, pelo que não colhe aplicação o disposto no n°4 do art. 299 do CPC.
Também não é aplicável o critério ínsito no art. 300 do CPC, que só tem aplicação aos casos em que, com base em relações de carácter duradouro ou de trato sucessivo, o autor pede o cumprimento não só de prestações já vencidas, mas também de prestações que só se vêm a tornar exigíveis no desenvolvimento da relação contratual subjacente (vd. Rodrigues Bastos, Notas ao Código do Processo Civil, vol. II, 3aed. Revista e Actualizada, 2000, pág. 94), o que não é, manifestamente, o caso da presente acção, não só pelo facto da pretensão principal do autos não assentar no cumprimento de prestação — mas sim no pedido de declaração de ilicitude do despedimento — mas também por as denominadas retribuições vincendas não serem exigíveis por causa do desenvolvimento da lide, antes o sendo — se assim for decidido — pelo reconhecimento da ilicitude da cessação de um vínculo contratual.
Assim, não é de considerar o valor das retribuições vincendas no valor da acção. Por outro lado, na petição inicial o Autor pede que se declare a ilicitude do despedimento e respectiva reintegração, não tendo optado, desde logo, pela indemnização substitutiva, pelo que o valor da mesma também não pode ser considerado.
Assim, atendo-nos apenas ao pedido principal (art. 297, n°3 do CPC) o valor da acção deve ser fixado em €28 993,10 (€21 493,10 de créditos laborais+ €7 500,00 referentes à indemnização por danos não patrimoniais), assistindo razão à Apelante.
3. Da (in)admissibilidade parcial do articulado de resposta à contestação.
Uma vez que esta questão não se prende com a análise de quaisquer das restantes matérias versadas no recurso e a sua apreciação só revestia eventual relevância caso os autos prosseguissem, julga-se prejudicado o seu conhecimento, pelo que se não toma conhecimento do objecto do recurso, nesta parte.
IV — DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar procedente a apelação, pelo que se revoga a decisão recorrida na parte atinente à apreciação da competência material dos Tribunais do Trabalho e ao valor da acção, pelo que:
a) julga-se procedente a excepção da incompetência material dos Tribunais do Trabalho e, em consequência, absolve-se a Ré da instância;
b) fixa-se o valor da acção em €28 993,10;
c) no mais, não se conhece do objecto do recurso, por resultar prejudicada a sua apreciação.
Custas pelo Apelado em ambas as instâncias
Lisboa, 2 de Maio de 2019
Filomena Manso
José Manuel Duro Mateus Cardoso
Albertina Pereira