Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Jurisprudência da Relação Laboral
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 - ACRL de 26-06-2019   Acordo de cessação do contrato. Ilícitos criminais.
Tendo o trabalhador omitido, no momento da celebração de acordo de cessação do contrato, a prática de ilícitos criminais praticados pelo mesmo contra o património da entidade empregadora, dever-se-á concluir que formação da vontade desta foi viciada por erro causado pela conduta dolosa do primeiro.
(Simário elaborado pelo Relator)
Proc. 2081/15.3T8LSB-A.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Francisca da Mata Mendes - Maria Celina Nóbrega - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
_______
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa:
I- Relatório
Por apenso aos autos de execução que JMH...
move contra FPR..., veio
a executada deduzir oposição à execução por meio de embargos, pedindo que :
- Seja extinta a execução;
- Seja declarada a anulação do acordo de resolução de contrato de trabalho celebrado entre o exequente e a executada, nomeadamente na parte em que esta assume a obrigação de pagar a compensação financeira ao exequente por essa cessação;
- Seja dada sem efeito a emissão e entrega ao exequente dos cheques que titulam a presente execução.
Para tanto, a embargante alegou em síntese :
- O exequente/embargado exerceu por conta da executada as funções de director financeiro, tendo-se apropriado indevidamente de vários milhares de euros que pertenciam àquela, e, omitindo esta informação, propôs-lhe a cessação do seu contrato de trabalho;
- A executada celebrou com o exequente acordo de cessação de contrato de trabalho, porque desconhecia tal conduta criminosa do exequente;
- Se a executada tivesse conhecimento deste comportamento nunca teria efectuado qualquer acordo, antes teria procedido à cessação desse contrato de trabalho com justa;
- Só depois da cessação do contrato a executada veio a descobrir tal comportamento e que o ora exequente se tinha apropriado de um total de € 45.892,03;
- Perante a tomada de conhecimento deste comportamento, a ora executada decidiu pelo imediato cancelamento dos cheques passados à ordem do exequente para pagamento do montante devido da indemnização pela cessação do contrato de trabalho;
- Ocorreu erro na formação da vontade da executada e sobre elemento essencial da base do negócio;
- O exequente ocultou, dolosamente, informação à executada e essa informação era essencial para a determinação da vontade desta, pelo que deve ser declarado anulado o acordo de resolução de contrato de trabalho celebrado entre o exequente e a executada;
- Ocorre ainda abuso de direito por parte do exequente ao apresentar a pagamento e à execução os cheques obtidos nestas circunstâncias.
O embargado contestou, alegando em síntese :
- Os factos são objecto de um processo crime, onde poderá ser apurada toda a verdade e onde, a ter existido falha sua, será sancionado nos termos da lei;
- O acordo de cessação do contrato foi celebrado em Novembro de 2013 e foi integralmente cumprido pelas partes, tendo o exequente abdicado do seu posto de trabalho e a executada pago a prestação inicial;
- A executada entregou os cheques previstos no mesmo acordo;
- Os factos alegados pela executada chegaram ao seu conhecimento a partir de Novembro de 2013, pelo que há muito está decorrido o respectivo prazo de caducidade previsto no art. 287° do Código Civil;
- O eventual crédito da executada sobre o exequente prescreveu ao fim de um ano após a cessação do vínculo laboral ( art. 337° do CT);
- O acordo de cessação previa pagamentos de créditos salariais, proporcionais, bem como compensação de valor global;
- Os créditos laborais são devidos nos termos da lei e insusceptíveis de compensação por parte da executada.
Concluiu pela improcedência dos embargos.
O Tribunal a quo proferiu despacho saneador/ sentença e considerou assentes os seguintes factos :
1) Na data de 16/01/2015, o Exequente interpôs contra a Executada execução para pagamento de quantia certa, tendo consignado o respectivo requerimento executivo: «... Finalidade da Execução: Pagamento de Quantia Certa - Dívidas de salários, diferenças salariais e indemnizações [Trabalho]. Título Executivo: Outro título com força executiva .Factos: O ora exequente é portador dos seguintes cheques, emitidos pela executada sobre sua conta na CGD:
1. cheque 630…, no valor de 2.891,95 euros, com data de 30.11.2013, apresentado a pagamento e devolvido na compensação em 02.12.2013 com a indicação cancelado/revogado;
2. cheque 630…, no valor de 2.891,96 euros, com data de 31.12.2013, apresentado a pagamento e devolvido na compensação em 03.03.2014 com a indicação cheque cancelado;
3. cheque 630…, no valor de 20.567,82 euros, com data de 28.02.2014, apresentado a pagamento e devolvido na compensação em 03.03.2014 com a indicação cheque cancelado;
4. cheque 630…, no valor de 8.783,91 euros, com data de 31.05.2014, apresentado a pagamento e devolvido na compensação com indicação revogado por falta forma/vício.
Todos os supra referidos cheques foram emitidos na sequência da assinatura de um Acordo de Revogação de Contrato Individual de Trabalho, assinado pelo exequente -e pela executada em 31.10.2013 e onde se previa que parte do pagamento devido ao ora exequente seria através dos referidos cheques, conforme expressamente previsto no n°2 da cláusula 4a. Os cheques foram devolvidos e as quantias em causa permanecem em dívida até à presente data...» (por documento — requerimento executivo).
2) Na data de 31/10/2013, a Executada e o Exequente, na qualidade de «Segundo Contraente», subscreveram o escrito particular denominado «ACORDO DE REVOGAÇÃO DO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO», cuja cópia consta de fls. 8 a 11 dos autos de execução e cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido, no qual está consignado: «... É celebrado e reciprocamente aceite o presente Acordo de Revogação do Contrato Individual de Trabalho, do qual os Considerandos fazem parte integrante, e que será regulado pelas cláusulas seguintes:
1°. O Segundo Contraente é trabalhador da FPR, em regime de trabalho subordinado e a tempo inteiro, desde 10 de Março de 1997, detendo a categoria profissional de Director Financeiro.
2°. Perante a perspectiva da extinção do respectivo posto de trabalho, como referido nos Considerandos supra, a FPR tomou a iniciativa de solicitar a rescisão do presente Contrato ao Segundo Contraente, tendo entretanto as Partes Outorgantes chegado a acordo sobre os termos em que a respectiva relação contratual deve cessar, em função da necessária reestruturação a efectuar no âmbito da actividade da FPR.
3° Pelo presente acordo e em conformidade com o estabelecido nos artigos 349° e ss. do Código do Trabalho, é posto termo, por mútuo acordo, determinado por um processo de extinção do posto de trabalho, ao contrato de trabalho que tem vigorado entre os contraentes desde 10 de Março de 1997, produzindo efeitos a acordada cessação no dia 31 de Outubro de 2013.
4°.
1. A FPR paga ao Segundo Contraente, neste acto, mediante transferência bancária o montante de E 5.497,38 (cinco mil quatrocentos e noventa e sete euro e trinta e oito cêntimos), relativo ao pagamento dos proporcionais legais e férias e todos os demais créditos laborais vencidos.
2. Mais entrega a FPR ao Segundo Contraente os cheques, sacados sobre a Caixa Geral de Depósitos, com os n°s (i) 4563064975, com vencimento a 30 de Novembro de 2013, no montante de 2.891,95 (dois mil oitocentos e noventa e um euro e noventa e cinco cêntimos); (ii) 3663064976, com vencimento a 31 de Dezembro de 2013, no montante de € 2.891,96 (dois mil oitocentos e noventa e um euro e noventa e seis cêntimos); (iii) 2763064977, com vencimento a 28 de Fevereiro de 2014, no montante de € 20.567,82 (vinte mil quinhentos e sessenta e sete euro e oitenta e dois cêntimos), e (iv) 1863064978, com vencimento a 31 ele Maio de 2014, no montante de
8.783,91 (oito mil setecentos e oitenta e três euro e noventa e um cêntimos), a título de pagamento da compensação pecuniária de natureza global pela cessação do contrato individual ele trabalho, tudo no montante global de € 35.135,64 (trinta e cinco mil cento e trinta e cinco euro e sessenta e quatro cêntimos)...» (por documento — cfr. fls. 8 a 11 dos autos de execução).
3) O Exequente foi funcionário da Executada entre 10 de Março de 1997 e 31 de Outubro de 2013 (por acordo — não impugnado),
4) Exercendo as funções de Director Financeiro, sendo responsável por todo o departamento financeiro desta, estando a seu cargo a elaboração de mapas contabilísticos e orçamentos, planear, organizar, dirigir e controlar as actividades financeiras da Executada, contemplando as actividades de planeamento financeiro, contas a pagar e contas a receber (por acordo— não impugnado).
5) Em finais do primeiro semestre de 2013, face a uma situação financeira difícil, que a obrigava a diminuir os seus custos, a Executada considerou dar início a um procedimento de despedimento colectivo (por acordo — não impugnado),
6) Conhecedor de tal situação, e ainda mais da situação financeira da Executada, bem como alegando e reconhecendo o Exequente sentir um cansaço extremo, ter problemas familiares graves por resolver e que, por isso, não se sentia em condições físicas e psicológicas para manter e desenvolver as suas funções de forma plena (por acordo — não impugnado),
7) O Exequente transmitiu à Direcção da mesma a sua intenção de fazer cessar o seu contrato de trabalho, por acordo, propondo-lhe essa cessação (por acordo —não impugnado).
8) Por Sentença proferida em 14/03/2018, e já transitada em julgado, no Proc. n°3721/14.7TDLSB do Juiz 3 do Juízo Local Criminal de Lisboa, e cuja cópia certificada consta de fls. 354 a 368v destes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, o Exequente foi condenado na pena única de 200 dias de multa à taxa diária de € 5,00, pela prática de um crime de burla qualificada, na forma continuada, e de dois crimes de falsificação de documento, um dos quais na forma continuada, e foi condenado no pagamento à Executada da quantia de € 47.786,70, a que acrescem juros de mora, contados desde as datas da prática de cada um dos actos do arguido até efectivo e integral pagamento e desde a data do vencimento de cheques até efectivo e integral pagamento e no pagamento da quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros legais desde a notificação até efectivo e integral pagamento, tudo com base nos seguintes factos:
«...1 — O arguido exerceu funções de director financeiro da. FPR..., desde o dia 10 de Março de 1997 até 31 de Outubro de 2013, data em que celebrou um acordo de revogação do seu contrato de trabalho;
2 — No exercício daquele cargo competia-lhe dirigir todo o departamento financeiro da ofendida, estando a seu cargo a elaboração de mapas contabilísticos e de orçamentos, planear, organizar, dirigir e controlar as actividades financeiras daquela;
3 — A fim de poder exercer tais funções, o arguido detinha poderes para movimentar as contas bancárias da ofendida, designadamente para efectuar os pagamentos aos fornecedores, contando que obtivesse previamente autorização por parte do Presidente da FPR..., CAS..., ou de dois membros da direcção;
4 — Mais tinha em seu poder os códigos de acesso ao sistema online da Caixa Geral de Depósitos referentes à conta com o n°0278..., titulada pela FPR...;
5 — Assim, e tendo em vista fazer seu o maior valor possível, o arguido acedeu ao aludido sistema online da Caixa Geral de Depósitos e efectuou ordens de transferência para pagamento a fornecedores e a jogadores, as quais ficavam pendentes, a aguardar a validação através das assinaturas supra referidas;
6 — Após o lançamento do movimento na conta bancária da ofendida através da referida plataforma digital, o estado da operação passava a pendente, momento em que o arguido imprimia de imediato o documento comprovativo, o qual juntava à contabilidade da FPR...;
7 — Posteriormente, elaborava mapas de despesas e autorizações de despesas, nos quais fazia constar os aludidos valores, os quais exibia à sua entidade patronal e eram por eles assinados sem previamente confirmarem que a despesa era efectivamente devida, bem como não verificavam que a mesma chegava a ser efectivamente paga;
- 8 — Noutras ocasiões, o arguido chegou a apor em tais documentos, pelo próprio punho, a assinatura de TEC... (Director Técnico da ofendida) ou mandou terceiros fazê-lo;
9 — Acto contínuo, anulava tais movimentos e inseria o NIB de uma conta por si titulada, passando a figurar como destinatário dos montantes em causa, ordenando de seguida a realização das transferências;
10 — Com efeito, o arguido adoptou tal comportamento nas seguintes ocasiões:
• - no dia 28 de Outubro de 2010, transferência no valor de €1.000,00 (mil euros), a qual tinha como suposto beneficiário EM... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 26 de Março de 2012, transferência no valor de €600,00 (seiscentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário JC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 2 de Julho de 2012, transferência no valor de €1.200,00 (mil e duzentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário JA... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... — para o efeito, o arguido elaborou uma tabela e um vale, assinado por TEC..., para obter autorização para a realização da transferência... -
no dia 3 de Julho de 2012, transferência no valor de €2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros), a qual tinha como suposta beneficiária a Associação de RN... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... — para o efeito, o arguido elaborou uma tabela, na qual inseriu uma despesa naquele valor, para assim obter autorização para a realização da transferência...
- no dia 25 de Julho de 2012, transferência no valor de €1.900,00 (mil e novecentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário RA... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... —a fim de obter autorização para a realização da transferência, o arguido elaborou um mapa de despesas, no qual fez constar a aludida quantia...
- no dia 11 de Outubro de 2012, transferência no valor de €1.300,00 (mil e trezentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário HG... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... — a fim de obter autorização para a realização da transferência, o arguido elaborou o mapa de despesas datado de 04/10/2012 e apôs pelo seu próprio punho, ou mando terceiros apor, a assinatura de TEC..., no local destinado à autorização de pagamento...
- no dia 22 de Outubro de 2012, transferência no valor de €2.800,00 (dois mil e oitocentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário o RCL... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 8 de Novembro de 2012, transferência no valor de €2.700,00 (dois mil e setecentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário FM... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 21 de Dezembro de 2012, transferência no valor de €663,80 (seiscentos e sessenta e três euros e oitenta cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário TS... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 2 de Janeiro de 2013, transferência no valor de €732,88 (setecentos e trinta e dois euros e oitenta e oito cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário JSM... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035........
- no dia 2 de Janeiro de 2013, transferência no valor de €1.500,00 (mil e quinhentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário MFC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 25 de Janeiro de 2013, transferência no valor de €1.300,00 (mil e trezentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário indivíduo de identidade concretamente não apurada foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 13 de Junho de 2013, transferência no valor de €485,00 (quatrocentos e oitenta e cinco euros), a qual tinha como suposta beneficiária C... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... - dia 12 de Novembro de 2013,
o arguido procedeu à devolução de tal montante...
- no dia 10 de Julho de 2013, transferência no valor de €1.397,30 (mil, trezentos e noventa e sete euros e trinta cêntimos), a qual tinha como suposta beneficiária W... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 16 de Julho de 2013, transferência no valor de €1.480,67 (mil, quatrocentos e oitenta euros e sessenta e sete cêntimos), a qual tinha como suposta beneficiária W... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 17 de Julho de 2013, transferência no valor de €832,70 (oitocentos e trinta e dois euros e setenta cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário MC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, como NIB 0035.......
- no dia 29 de Julho de 2013, transferência no valor de €806,70 (oitocentos e seis euros e setenta cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário MC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos , com o NIB 0035.......
11 — Acresce que o arguido depositou em contas bancárias por si tituladas cheques emitidos pela sua entidade patronal, a FPR..., para pagamento de dívidas desta, sendo que para o efeito terceiros (de identidade concretamente não apurada) fizeram constar, com o conhecimento e autorização do arguido, a assinatura do beneficiário de tal título de crédito no local destinado ao seu endosso;
12 — Com efeito,
- o cheque n°495871…., emitido em 29/01/2009, pela FPR..., no valor de €750,00 (setecentos e cinquenta euros), a favor de FS…, foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no verso...
- o cheque n°767268…., emitido em 12/12/2009, pela FPR..., no valor de €1.050,00 (mil e cinquenta cêntimos), a favor de DB..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°087268…, emitido em 12/12/2009, pela FPR..., no valor de €900,50 (novecentos euros e cinquenta euros), a favor de HCR..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°221..., emitido em 31/01/2011, pela FPR..., no valor de €4.350,00 (quatro mil, trezentos e cinquenta euros), a favor de FM..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°881..., emitido em 11/05/2011, pela FPR..., no valor de €5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros), a favor da Associação RS…, foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa A Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°791..., emitido em 30/05/2011, pela FPR..., no valor de €2.750,00 (dois mil, setecentos e cinquenta euros), a favor da Associação RRC…, foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°701..., emitido em 02/06/2011, pela FPR..., no valor de €3.000,00 (três mil euros), a favor da Associação de RN..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°461…, emitido em 30/09/2011, pela FPR..., no valor de €600,00 (seiscentos euros), a favor de HG..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
13 — O arguido apresentou igualmente à sua entidade patronal a factura da Z..., Unipessoal, Lda., datada de 24 de Novembro de 2011, no valor de €4.428,00 (quatro mil, quatrocentos e vinte e oito euros) para pagamento, elaborando a respectiva informação proposta de pagamento, com o descritivo Materiais diversos de oferta aos clubes para acções de promoção locais;
14 — Tal pagamento foi autorizado pela FPR..., tendo sido paga por transferência bancária, no dia 24 de Novembro de 2011, para a conta com o NIB 0010.......
15 — Ora, acontece que a FPR... nunca manteve qualquer relação comercial com a referida sociedade, cujo único sócio e gerente é o arguido, o qual é igualmente o titular daquela conta bancária;
16 — O arguido apresentou também à sua entidade patronal a factura Z..., Unipessoal, Lda., datada de 2 de Novembro de 2012, no valor de €1.359,15 (mil, trezentos e cinquenta e nove euros e quinze cêntimos), para pagamento, elaborando a respectiva autorização de despesas, com o descritivo 34 polos térmicos para SN XV X 32,5 +IVA;
17 — Tal pagamento foi autorizado pela FPR..., tendo sido paga por transferência bancária, no dia 30 de Novembro de 2012, para a conta com o NIB 0010.......
18 — Ora, acontece que a FPR... não realizou tal negócio com a referida sociedade, cujo único sócio e gerente é o arguido, o qual é igualmente o titular daquela conta bancária;
19 — Com a conduta agora descrita, o arguido logrou fazer seus €47.301,70 (quarenta e sete mil, trezentos e um euro e setenta cêntimos);
20 — O arguido actuou com o propósito, aliás concretizado, de determinar a FPR... a autorizar a realização das supra elencadas transferências bancárias a seu favor, pensando que estava a fazer pagamentos aos seus credores;
• 21 — O arguido, ao apresentar à ofendida ordens de pagamento com a indicação de que se destinavam a pagar a fornecedores e a jogadores, bem como a apresentar os correspondentes mapas de despesas e autorizações de despesas, criou naquela a aparência de que tais ordens de pagamento seriam efectivamente concretizadas a favor daqueles beneficiários, bem sabendo que a FPR... não autorizaria a sua realização caso soubesse que o arguido iria alterar o NIB do destinatário e concretizar as transferências a seu favor;
22 — Ao apresentar à ofendida duas facturas emitidas pela Z..., Unipessoal, Lda., com a respectiva autorização de despesa, criou naquela a aparência de que se tratava de uma dívida real da ofendida, bem sabendo que a FPR... não pagaria caso soubesse que nunca havia adquirido os bens ali descritos;
23 — O arguido logrou assim obter uma vantagem económica, o que conseguiu por via do engano que provocou à ofendida, bem sabendo que, com tal conduta, causaria um prejuízo patrimonial no valor de €47.786,70 (quarenta e sete mil, setecentos e oitenta e seis euros e setenta cêntimos);
24 — Ao actuar da forma descrita, apondo pelo seu próprio punho a assinatura de TEC..., no local destinado à autorização de pagamento, ou mandando terceiros fazê-lo, quis o arguido obter um benefício ilegítimo, ao qual bem sabia não ter direito, tendo ainda perfeito conhecimento que colocava em causa a veracidade e confiança de que tal documento goza;
25 — O arguido não se coibiu de utilizar os oito cheques nos quais sabia que terceiros de identidade não apurada haviam aposto a assinatura dos beneficiários no local destinado ao seu endosso, assim pretendendo obter um beneficio ilegítimo, ao qual bem sabia não ter direito, tendo ainda perfeito conhecimento que colocava em causa a veracidade e confiança de que os mesmos gozam;
26 — O arguido tinha ainda perfeito conhecimento que terceiros haviam feito constar daqueles títulos de crédito factos juridicamente relevantes e com notória valência normativa cartular, facto que não o impediu de os utilizar, depositando-os na sua própria conta bancária, assim abalando a credibilidade e fé pública que tais documentos merecem, bem como a segurança e confiança no tráfico jurídico;
27 — O arguido agiu sempre no quadro de uma mesma solicitação exterior, aproveitando a circunstância de a sua conduta não ter sido detectada pela sua entidade patronal;
28 — O arguido agiu sempre de forma deliberada, voluntária e consciente, bem sabendo que todas as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei Penal;
29 — Todas estas circunstâncias criaram na FPR... uma forte e estigmatizante perturbação do seu equilíbrio e da sua imagem e reputação, ainda por cima sendo uma associação de utilidade pública desportiva;
30 — O arguido pagou a quantia de €1.500,00 (mil e quinhentos euros) à ofendida FPR... há dois dias atrás;...» (por documento — cfr. fls. 354 a 368v destes autos).
9) A Executada só tomou conhecimento dos comportamentos do Exequente descritos em 8) a partir de Novembro de 2013 (por acordo),
10) Comportamentos que o Exequente sempre ocultou à Executada (por acordo — não impugnado).
11) Perante o conhecimento referido em 9), a Direcção da Executada decidiu pelo imediato cancelamento dos cheques referidos em 1) (por acordo — não impugnado — e por documento — cfr. fls. 38 e 38v dos autos de execução),
12) Por entender que apenas tinha acordado a cessação referida em 2) por desconhecer os comportamentos referidos em 8) (por acordo — não impugnado).
Com base nos factos provados acima indicados, o Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão:
«Face ao exposto, decide julgarem-se procedentes a presente oposição à execução, mediante embargos de executado, deduzida pela Executada/Embargante FPR... contra o Exequente/Embargado JMH... ... e, consequentemente, decide absolver-se a Executada/Embargante do pedido executivo e declarar-se a extinção da instância executiva.
Custas pelo Exequente/Embargado».
O embargado recorreu desta decisão e formulou as seguintes conclusões : 1-A douta sentença avaliou mal a matéria de facto.
2- Em relação aos factos provados 6 e 7 não é possível dizer que o ora Rte os aceita e reconhece, quando os mesmos são expressamente contrários à posição assumida pelo Rte nos autos.
3-Tais factos são diretamente desmentidos pelo acordo de revogação reconhecido no facto provado 2.
4- Também em relação ao facto provado 12 entende o Rte que não há qualquer prova nesse sentido e que a posição que expressou nos autos é contrária.
5- Pelos que os supra referidos factos provados 6, 7 e 12 deveriam ter sido considerados não provados.
6- Não sendo o facto provado 12 mantido, não poderá a douta sentença dar como provados os requisitos da anulabilidade.
7- Defende o Rte que o acordo celebrado em novembro de 2013 foi integralmente cumprido pelas partes.
8- Com efeito, o ora Rte abdicou do seu posto de trabalho e a Rda pagou a prestação inicial e entregou ao ora Rte os cheques previstos no acordo.
9- Pelo que caducou o direito da Rda de requerer a anulabilidade do acordo, nos termos do art. 287° do Código Civil.
10- Sem conceder, a anulabilidade parcial do acordo terá de acarretar a invalidade de todo o contrato, nos termos ao art. 292° do Código Civil, com as varias legais consequências.
11- Forçar o Rte a abdicar do seu vínculo laboral sem a respetiva compensação representaria, além de ilegalidade, uma violação grosseira dos princípios constitucionais da legalidade ( art. 20° da CRP ), e do direito ao trabalho e proteção no emprego ( arts. 53° e 58° da CRP).
Terminou, pugnando pela alteração da decisão recorrida, nos termos peticionados, com as legais consequências.
A embargante contra-alegou e formulou as seguintes conclusões:
A) O ora Recorrente vem recorrer da douta Sentença proferida nos autos e que deu por procedentes os Embargos à Execução.
B) Não tem razão o Recorrente, pelo que não merece censura e deve manter-se integralmente a Sentença proferida.
C) Os factos dados por provados na Sentença foram-no com suporte na falta de impugnação pelo agora Recorrente e em prova documental produzida, nomeadamente por certidão da Sentença proferida em sede criminal.
D) Não existe qualquer caducidade quanto ao pedido de anulabilidade feito pela FPR e concedido pelo Tribunal.
E) Nada se vislumbra - nem o Recorrente o alega - porque é que o Tribunal a quo deveria refletir sobre todo o acordo uma invalidade relativa apenas a um dos seus pontos, sendo certo que a relação entre Recorrente e Recorrida sempre terminaria, fosse pelo acordo fosse pelo despedimento com justa causa.
F) Sendo ainda certo que o que está em causa são os cheques dados à execução e não o acordo.
G) Pelo que a Sentença não merece qualquer reparo ou censura e deve
manter-se integralmente.
Terminou, pugnando pela improcedência do recurso.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
II- Importa solucionar no âmbito do presente recurso
- Se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto;
- Se caducou o direito da entidade empregadora requerer a anulabilidade do
acordo de cessação;
- Se estão verificados os requisitos da anulabilidade parcial de tal acordo;
- Se deve ser conhecida a questão invalidade total do referido acordo.
III- Apreciação.
Vejamos, em primeiro lugar, os factos assentes.
Pretende a recorrente que sejam considerados não provados os factos indicados sob 6, 7 e 12.
Da análise dos articulados, verificamos que tais factos estão admitidos por acordo.
Não obstante o documento que titula o acordo de revogação do contrato de trabalho ( referido sob 2) aludir à iniciativa da entidade empregadora quanto à rescisão do contrato, tal menção, em sede de documento, não impede que, de facto, o exequente tenha transmitido à Direcção a sua intenção de fazer cessar o seu contrato de trabalho, por acordo, propondo-lhe essa cessação ( facto provado sob 7).
Improcede, por isso, o recurso quanto à matéria de facto.
Importa, contudo, precisar o facto provado sob 8. Resulta do documento de fls. 354v. a 368 que o exequente foi condenado na pena de três anos de prisão suspensa na sua execução por três anos pela prática de um crime de burla qualificada, na forma continuada e pela prática de dois crimes de falsificação de documento, um dos quais na forma continuada na pena única de 200 dias de multa à taxa diária de € 5,00.
Os factos provados são os seguintes:
1) Na data de 16/01/2015, o Exequente interpôs contra a Executada execução para pagamento de quantia certa, tendo consignado o respectivo requerimento executivo: «... Finalidade da Execução: Pagamento de Quantia Certa - Dívidas de salários, diferenças salariais e indemnizações [Trabalho]. Título Executivo: Outro título com força executiva .Factos: O ora exequente é portador dos seguintes cheques, emitidos pela executada sobre sua conta na CGD:
1. cheque 630…, no valor de 2.891,95 euros, com data de 30.11.2013, apresentado a pagamento e devolvido na compensação em 02.12.2013 com a indicação cancelado/revogado;
2. cheque 630…, no valor de 2.891,96 euros, com data de 31.12.2013, apresentado a pagamento e devolvido na compensação em 03.03.2014 com a indicação cheque cancelado;
3. cheque 630…, no valor de 20.567,82 euros, com data de 28.02.2014, apresentado a pagamento e devolvido na compensação em 03.03.2014 com a indicação cheque cancelado;
4. cheque 630…, no valor de 8.783,91 euros, com data de 31.05.2014, apresentado a pagamento e devolvido na compensação com indicação revogado por falta forma/vício.
Todos os supra referidos cheques foram emitidos na sequência da assinatura de um Acordo de Revogação de Contrato Individual de Trabalho, assinado pelo exequente e pela executada em 31.10.2013 e onde se previa que parte do pagamento devido ao ora exequente seria através dos referidos cheques, conforme expressamente previsto no n°2 da cláusula 4a. Os cheques foram devolvidos e as quantias em causa permanecem em dívida até à presente data...» (por documento — requerimento executivo).
2) Na data de 31/10/2013, a Executada e o Exequente, na qualidade de «Segundo Contraente», subscreveram o escrito particular denominado «ACORDO DE REVOGAÇÃO DO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO», cuja cópia consta de fls. 8 a 11 dos autos de execução e cujo teor se dá aqui por integralmente por reproduzido, no qual está consignado: «... É celebrado e reciprocamente aceite o presente Acordo de Revogação do Contrato Individual de Trabalho, do qual os Considerandos fazem parte integrante, e que será regulado pelas cláusulas seguintes:
1°. O Segundo Contraente é trabalhador da FPR, em regime de trabalho subordinado e a tempo inteiro, desde 10 de Março de 1997, detendo a categoria profissional de Director Financeiro.
2°. Perante a perspectiva da extinção do respectivo posto de trabalho, como referido nos Considerandos supra, a FPR tomou a iniciativa de solicitar a rescisão do presente Contrato ao Segundo Contraente, tendo entretanto as Partes Outorgantes chegado a ,acordo sobre os termos em que a respectiva relação contratual deve cessar, em função da necessária reestruturação a efectuar no âmbito da actividade da FPR.
3° Pelo presente acordo e em conformidade com o estabelecido nos artigos 349° e ss. do Código do Trabalho, é posto termo, por mútuo acordo, determinado por um processo de extinção do posto de trabalho, ao contrato de trabalho que tem vigorado entre os contraentes desde 10 de Março de 1997, produzindo efeitos a acordada cessação no dia 31 de Outubro de 2013.
4°.
1. A FPR paga ao Segundo Contraente, neste acto, mediante transferência bancária o montante de € 5.497,38 (cinco mil quatrocentos e noventa e sete euro e trinta e oito cêntimos), relativo ao pagamento dos proporcionais legais e férias e todos os demais créditos laborais vencidos.
2. Mais entrega a FPR ao Segundo Contraente os cheques, sacados sobre a Caixa Geral de Depósitos, com os n°s (i) 4563064975, com vencimento a 30 de Novembro de 2013, no montante de € 2.891,95 (dois mil oitocentos e noventa e um euro e noventa e cinco cêntimos); (ii) 3663064976, com vencimento a 31 de Dezembro de 2013, no montante de € 2.891,96 (dois mil oitocentos e noventa e um euro e noventa e seis cêntimos); (iii) 2763064977, com vencimento a 28 de Fevereiro de 2014, no montante de € 20.567,82 (vinte mil quinhentos e sessenta e sete euro e oitenta e dois cêntimos), e (iv) 1863064978, com vencimento a 31 ele Maio de 2014, no montante de € 8.783,91 (oito mil setecentos e oitenta e três euro e noventa e um cêntimos), a título de pagamento da compensação pecuniária de natureza global pela cessação do contrato individual ele trabalho, tudo no montante global de € 35.135,64 (trinta e cinco mil cento e trinta e cinco euro e sessenta e quatro cêntimos)...» (por documento — cfr. fls. 8 a 11 dos autos de execução).
3) O Exequente foi funcionário da Executada entre 10 de Março de 1997 e 31 de Outubro de 2013 (por acordo — não impugnado),
4) Exercendo as funções de Director Financeiro, sendo responsável por todo o departamento financeiro desta, estando a seu cargo a elaboração de mapas contabilísticos e orçamentos, planear, organizar, dirigir e controlar as actividades financeiras da Executada, contemplando as actividades de planeamento financeiro, contas a pagar e contas a receber (por acordo— não impugnado).
5) Em finais do primeiro semestre de 2013, face a uma situação financeira difícil, que a obrigava a diminuir os seus custos, a Executada considerou dar início a um procedimento de despedimento colectivo (por acordo — não impugnado),
6) Conhecedor de tal situação, e ainda mais da situação financeira da Executada, bem como alegando e reconhecendo o Exequente sentir um cansaço extremo, ter problemas familiares graves por resolver e que, por isso, não se sentia em condições físicas e psicológicas para manter e desenvolver as suas funções de forma plena (por acordo — não impugnado),
7) O Exequente transmitiu à Direcção da mesma a sua intenção de fazer cessar o seu contrato de trabalho, por acordo, propondo-lhe essa cessação (por acordo —não impugnado).
8) Por Sentença proferida em 14/03/2018, e já transitada em julgado, no Proc. n°3721/14.7TDLSB do Juiz 3 do Juízo Local Criminal de Lisboa, e cuja cópia certificada consta de fls. 354 a 368v destes autos e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido, o Exequente foi condenado na pena de três anos de prisão suspensa na sua execução por três anos pela prática de um crime de burla qualificada, na forma continuada e na pena única de 200 dias de multa à taxa diária de € 5,00 pela prática de dois crimes de falsificação de documento, um dos quais na forma continuada. O Exequente foi ainda condenado no pagamento à Executada da quantia de € 47.786,70, a que acrescem juros de mora, contados desde as datas da prática de cada um dos actos do arguido até efectivo e integral pagamento e desde a data do vencimento de cheques até efectivo e integral pagamento e no pagamento da quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros legais desde a notificação até efectivo e integral pagamento, tudo com base nos seguintes factos:
«...1 — O arguido exerceu funções de director financeiro da FPR..., desde o dia 10 de Março de 1997 até 31 de Outubro de 2013, data em que celebrou um acordo de revogação do seu contrato de trabalho;
2 — No exercício daquele cargo competia-lhe dirigir todo o departamento financeiro da ofendida, estando a seu cargo a elaboração de mapas contabilísticos e de orçamentos, planear, organizar, dirigir e controlar as actividades financeiras daquela;
3 — A fim de poder exercer tais funções, o arguido detinha poderes para movimentar as contas bancárias da ofendida, designadamente para efectuar os pagamentos aos fornecedores, contando que obtivesse previamente autorização por parte do Presidente da FPR..., CAS..., ou de dois membros da direcção;
4 — Mais tinha em seu poder os códigos de acesso ao sistema online da Caixa Geral de Depósitos referentes à conta com o n°0278..., titulada pela FPR...;
5 — Assim, e tendo em vista fazer seu o maior valor possível, o arguido acedeu ao aludido sistema online da Caixa Geral de Depósitos e efectuou ordens de transferência para pagamento a fornecedores e a jogadores, as quais ficavam pendentes, a aguardar a validação através das assinaturas supra referidas;
6 — Após o lançamento do movimento na conta bancária da ofendida através da referida plataforma digital, o estado da operação passava a pendente, momento em que o arguido imprimia de imediato o documento comprovativo, o qual juntava à contabilidade da FPR...;
7 — Posteriormente, elaborava mapas de despesas e autorizações de despesas, nos quais fazia constar os aludidos valores, os quais exibia à sua entidade patronal e eram por eles assinados sem previamente confirmarem que a despesa era efectivamente devida, bem como não verificavam que a mesma chegava a ser efectivamente paga;
8 — Noutras ocasiões, o arguido chegou a apor em tais documentos, pelo próprio punho, a assinatura de TEC... (Director Técnico da ofendida) ou mandou terceiros fazê-lo;
9 — Acto contínuo, anulava tais movimentos e inseria o NIB de uma conta por si titulada, passando a figurar como destinatário dos montantes em causa, ordenando de seguida a realização das transferências;
10 — Com efeito, o arguido adoptou tal comportamento nas seguintes ocasiões:
- no dia 28 de Outubro de 2010, transferência no valor de €1.000,00 (mil euros), a qual tinha como suposto beneficiário EM... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 26 de Março de 2012, transferência no valor de €600,00 (seiscentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário JC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 2 de Julho de 2012, transferência no valor de €1.200,00 (mil e duzentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário JA... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... — para o efeito, o arguido elaborou uma tabela e um vale, assinado por TEC..., para obter autorização para a realização da transferência... -
no dia 3 de Julho de 2012, transferência no valor de €2.400,00 (dois mil e quatrocentos euros), a qual tinha como suposta beneficiária a Associação de RN… foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... — para o efeito, o arguido elaborou uma tabela, na qual inseriu uma despesa naquele valor, para assim obter autorização para a realização da transferência...
- no dia 25 de Julho de 2012, transferência no valor de €1.900,00 (mil e novecentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário RA... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... —a fim de obter autorização para a realização da transferência, o arguido elaborou um mapa de despesas, no qual fez constar a aludida quantia...
- no dia 11 de Outubro de 2012, transferência no valor de €1.300,00 (mil e trezentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário HG... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... — a fim de obter autorização para a realização da transferência, o arguido elaborou o mapa de despesas datado de 04/10/2012 e apôs pelo seu próprio punho, ou mando terceiros apor, a assinatura de TEC..., no local destinado à autorização de pagamento...
- no dia 22 de Outubro de 2012, transferência no valor de €2.800,00 (dois mil e oitocentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário o RCL... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 8 de Novembro de 2012, transferência no valor de €2.700,00 (dois mil e setecentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário FM... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 21 de Dezembro de 2012, transferência no valor de €663,80 (seiscentos e sessenta e três euros e oitenta cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário TS... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 2 de Janeiro de 2013, transferência no valor de €732,88 (setecentos e trinta e dois euros e oitenta e oito cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário JSM... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035........
- no dia 2 de Janeiro de 2013, transferência no valor de €1.500,00 (mil e quinhentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário MFC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 25 de Janeiro de 2013, transferência no valor de €1.300,00 (mil e trezentos euros), a qual tinha como suposto beneficiário indivíduo de identidade concretamente não apurada foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 13 de Junho de 2013, transferência no valor de €485,00 (quatrocentos e oitenta e cinco euros), a qual tinha como suposta beneficiária C... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.... - dia 12 de Novembro de 2013, o arguido procedeu à devolução de tal montante...
- no dia 10 de Julho de 2013, transferência no valor de €1.397,30 (mil, trezentos e noventa e sete euros e trinta cêntimos), a qual tinha como suposta beneficiária W... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 16 de Julho de 2013, transferência no valor de €1.480,67 (mil, quatrocentos e oitenta euros e sessenta e sete cêntimos), a qual tinha como suposta beneficiária W... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 17 de Julho de 2013, transferência no valor de €832,70 (oitocentos e trinta e dois euros e setenta cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário MC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035.......
- no dia 29 de Julho de 2013, transferência no valor de €806,70 (oitocentos e seis euros e setenta cêntimos), a qual tinha como suposto beneficiário MC... foi na verdade creditada na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos , com o NIB 0035.......
11 — Acresce que o arguido depositou em contas bancárias por si tituladas cheques emitidos pela sua entidade patronal, a FPR..., para pagamento de dívidas desta, sendo que para o efeito terceiros (de identidade concretamente não apurada) fizeram constar, com o conhecimento e autorização do arguido, a assinatura do beneficiário de tal título de crédito no local destinado ao seu endosso;
12 — Com efeito,
- o cheque n°495…, emitido em 29/01/2009, pela FPR..., no valor de €750,00 (setecentos e cinquenta euros), a favor de F…, foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no verso...
- o cheque n°767…, emitido em 12/12/2009, pela FPR..., no valor de €1.050,00 (mil e cinquenta cêntimos), a favor de DB..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°0872…, emitido em 12/12/2009, pela FPR..., no valor de €900,50 (novecentos euros e cinquenta euros), a favor de HCR..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°221..., emitido em 31/01/2011, pela FPR..., no valor de €4.350,00 (quatro mil, trezentos e cinquenta euros), a favor de FM..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°881..., emitido em 11/05/2011, pela FPR..., no valor de €5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros); a favor da ARS…, foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa A Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°791..., emitido em 30/05/2011, pela FPR..., no valor de €2.750,00 (dois mil, setecentos e cinquenta euros), a favor da ARR… do Centro, foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°701..., emitido em 02/06/2011, pela FPR..., no valor de €3.000,00 (três mil euros), a favor da Associação de RN..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
- o cheque n°4612558282, emitido em 30/09/2011, pela FPR..., no valor de €600,00 (seiscentos euros), a favor de HG..., foi depositado na conta titulada pelo arguido junto da Caixa Geral de Depósitos, com o NIB 0035...., após terceiro de identidade não apurada o ter endossado, mediante a aposição da assinatura do beneficiário no seu verso...
13 — O arguido apresentou igualmente à sua entidade patronal a factura da Z..., Unipessoal, Lda., datada de 24 de Novembro de 2011, no valor de €4.428,00 (quatro mil, quatrocentos e vinte e oito euros) para pagamento, elaborando a respectiva informação proposta de pagamento, com o descritivo Materiais diversos de oferta aos clubes para acções de promoção locais;
14 — Tal pagamento foi autorizado pela FPR..., tendo sido paga por transferência bancária, no dia 24 de Novembro de 2011, para a conta com o NIB 0010.......
15 — Ora, acontece que a FPR... nunca manteve qualquer relação comercial com a referida sociedade, cujo único sócio e gerente é o arguido, o qual é igualmente o titular daquela conta bancária;
16 — O arguido apresentou também à sua entidade patronal a factura Z..., Unipessoal, Lda., datada de 2 de Novembro de 2012, no valor de €1.359,15 (mil, trezentos e cinquenta e nove euros e quinze cêntimos), para pagamento, elaborando a respectiva autorização de despesas, com o descritivo 34 polos térmicos para SN XV X 32,5 +IVA;
17 — Tal pagamento foi autorizado pela FPR..., tendo sido paga por transferência bancária, no dia 30 de Novembro de 2012, para a conta com o NIB 0010.......
18 — Ora, acontece que a FPR... não realizou tal negócio com a referida sociedade, cujo único sócio e gerente é o arguido, o qual é igualmente o titular daquela conta bancária;
19 — Com a conduta agora descrita, o arguido logrou fazer seus €47.301,70 (quarenta e sete mil, trezentos e um euro e setenta cêntimos);
20 — O arguido actuou com o propósito, aliás concretizado, de determinar a FPR... a autorizar a realização das supra elencadas transferências bancárias a seu favor, pensando que estava a fazer pagamentos aos seus credores;
21 — O arguido, ao apresentar à ofendida ordens de pagamento com a indicação de que se destinavam a pagar a fornecedores e a jogadores, bem como a apresentar os correspondentes mapas de despesas e autorizações de despesas, criou naquela a aparência de que tais ordens de pagamento seriam efectivamente concretizadas a favor daqueles beneficiários, bem sabendo que a FPR... não autorizaria a sua realização caso soubesse que o arguido iria alterar o NIB do destinatário e concretizar as transferências a seu favor;
22 — Ao apresentar à ofendida duas facturas emitidas pela Z..., Unipessoal, Lda., com a respectiva autorização de despesa, criou naquela a aparência de que se tratava de uma dívida real da ofendida, bem sabendo que a FPR... não pagaria caso soubesse que nunca havia adquirido os bens ali descritos;
23 — O arguido logrou assim obter uma vantagem económica, o que conseguiu por via do engano que provocou à ofendida, bem sabendo que, com tal conduta, causaria um prejuízo patrimonial no valor de €47.786,70 (quarenta e sete mil, setecentos e oitenta e seis euros e setenta cêntimos);
24 — Ao actuar da forma descrita, apondo pelo seu próprio punho a assinatura de TEC..., no local destinado à autorização de pagamento, ou mandando terceiros fazê-lo, quis o arguido obter um benefício ilegítimo, ao qual bem sabia não ter direito, tendo ainda perfeito conhecimento que colocava em causa a veracidade e confiança de que tal documento goza;
25 — O arguido não se coibiu de utilizar os oito cheques nos quais sabia que terceiros de identidade não apurada haviam aposto a assinatura dos beneficiários no local destinado ao seu endosso, assim pretendendo obter um beneficio ilegítimo, ao qual bem sabia não ter direito, tendo ainda perfeito conhecimento que colocava em causa a veracidade e confiança de que os mesmos gozam;
26 — O arguido tinha ainda perfeito conhecimento que terceiros haviam feito constar daqueles títulos de crédito factos juridicamente relevantes e com notória valência normativa cartular, facto que não o impediu de os utilizar, depositando-os na sua própria conta bancária, assim abalando a credibilidade e fé pública que tais documentos merecem, bem como a segurança e confiança no tráfico jurídico;
27 — O arguido agiu sempre no quadro de uma mesma solicitação exterior, aproveitando a circunstância de a sua conduta não ter sido detectada pela sua entidade patronal;
28 — O arguido agiu sempre de forma deliberada, voluntária e consciente, bem sabendo que todas as suas condutas eram proibidas e punidas por Lei Penal;
29 — Todas estas circunstâncias criaram na FPR... uma forte e estigmatizante perturbação do seu equilíbrio e da sua imagem e reputação, ainda por cima sendo uma associação de utilidade pública desportiva;
30 — O arguido pagou a quantia de €1.500,00 (mil e quinhentos euros) à ofendida FPR... há dois dias atrás;...» (por documento — cfr. fls. 354 a 368v destes autos).
9) A Executada só tomou conhecimento dos comportamentos do Exequente descritos em 8) a partir de Novembro de 2013 (por acordo),
10) Comportamentos que o Exequente sempre ocultou à Executada (por acordo — não impugnado).
11) Perante o conhecimento referido em 9), a Direcção da Executada decidiu pelo imediato cancelamento dos cheques referidos em 1) (por acordo — não impugnado — e por documento — cfr. fls. 38 e 38v dos autos de execução),
12) Por entender que apenas tinha acordado a cessação referida em 2) por desconhecer os comportamentos referidos em 8) (por acordo — não impugnado).
Vejamos, agora, se procede a excepção de caducidade.
Em sede fundamentação de Direito refere a sentença recorrida :
« No que concerne à divergência não intencional que se apresenta sob a forma de erro sobre o objecto do negócio, que é o vício da vontade que para o caso em apreço releva, prescreve o art. 251° do C.Civil: «O erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa do declaratário ou ao objecto do negócio, torna este anulável nos termos do artigo 247. °». Embora exista conformidade entre a vontade real e a vontade declarada, no erro-motivo (ou erro-vício) verifica-se que aquela vontade real foi formada em consequência de erro sofrido pelo declarante, sendo que, se não fosse este erro sofrido, a pessoa não teria pretendida realizar o negócio, pelo menos nos termos em que o efectuou.
(...) à data da celebração do referido acordo de cessação do contrato de trabalho, a Executada desconhecia, em absoluto, que, no âmbito da relação laborai, o Exequente, enquanto trabalhador, havia praticado um conjunto de actos que, sendo integradores de ilícitos penais (um crime de burla qualificada, na forma continuada, e de dois crimes de falsificação de documento, um dos quais na forma continuada), causaram um prejuízo patrimonial àquela, enquanto empregadora, no valor de é' 47.786,70, e ainda lhe causaram um prejuízo não patrimonial no valor de e 5.000,00 (conforme decidido em sentença penal já transitada em julgado - cfr. facto provado n°8), sendo que tais actos consubstanciam, simultaneamente, infracções disciplinares graves que inequivocamente, pela sua gravidade, constituem justa causa de despedimento quer nos termos do n°1 do art. 351° do C. Trabalho de 2009, quer nos termos da alínea e) do n°2 do mesmo preceito legal.
Ora, resulta das regras da experiência comum, ou é mesmo um facto notório, que é essencial para qualquer Empregador e para a sua vontade de manter ou não a sua relação laborai com certo Trabalhador conhecer se este praticou ou não alguma infracção disciplinar grave, essencialidade esta que muito mais se acentua quando Empregador e Trabalhador vão negociar um acordo de cessação do contrato de trabalho, para mais quando no âmbito do mesmo fixam pagamentos de compensações que nunca teriam lugar no caso de existência de motivo para cessar o contrato, não por acordo, mas sim por despedimento com justa causa. Portanto, está verificado o requisito da essencialidade exigido para o preenchimento do erro sobre o objecto do negócio: para formar a sua vontade em celebrar um acordo de cessação do contrato de trabalho com o Exequente, e aliás, proposto por este, era essencial que a Executada tivesse conhecimento de que aquele havia praticados vários comportamentos ilícitos, de natureza disciplinar, e com consequências/prejuízos patrimoniais (e não patrimoniais) muito relevantes.
Está também preenchido o requisito de ser do conhecimento do Exequente que era essencial para a Executada, antes e na celebração do acordo de cessação, saber que ele, enquanto trabalhador, tinha praticados vários comportamentos ilícitos, de natureza disciplinar, e com consequências/prejuízos patrimoniais muito relevantes. Com efeito, resulta das regras da experiência comum, ou é mesmo um facto notório, que qualquer Trabalhador tem absoluta e total consciência que numa relação laborai é indispensável que o Empregador (quer por forma a poder manter ou não a confiança naquele, quer por força do princípio da boa fé que preside à execução do contrato —cfr. art. 126°/1 do C. Trabalho de 2009) ter integral conhecimento de todas as infracções disciplinares, e respectivas consequências, praticadas pelo Trabalhador, situação que ainda mais se acentua e se torna indispensável no momento em que se negoceia e se celebra um acordo de cessação do contrato que prevê o pagamento de
compensação que nunca teriam lugar no caso de existência de motivo para cessar o contrato, não por acordo, mas sim por despedimento com justa causa.
(...) Nestas circunstâncias, perante a factualidade supra descrita e analisada, impõe concluir-se que se mostram preenchidos os requisitos essenciais do erro sobre o objecto (a essencialidade para o declarante do elemento sobre que recaiu o erro e o conhecimento ou dever de não ignorar essa essencialidade por parte do declaratário), o que, nos termos do art. 247° do C.Civil, determina a anulabilidade do negócio consistente no aludido acordo de cessação do contrato de trabalho, pelo menos, na parte em que foi convencionado pagamento de uma compensação pela Executada/Empregadora ao Exequente/Trabalhador: com efeito, perante a essencialidade do conhecimento de tais comportamentos ilícitos e graves, é de admitir (resulta das regras da experiência comum, isto se não é mesmo um facto notório) que qualquer entidade Empregadora, porque queria terminar de imediato a relação laboral perante tais comportamentos, ainda admitisse a cessação do contrato por acordo, mas tal cessação nunca seria acompanhada de uma obrigação de pagamento ao Trabalhador de uma compensação quando este tinha causado um significativo prejuízo patrimonial à Empregadora, aliás de valor bem superior ao dessa compensação.
Veio o Exequente alegar que «os factos alegados pela Executada chegaram ao seu conhecimento a partir de Novembro de 2013 pelo que há muito está decorrido o respectivo prazo de caducidade», mas não lhe assiste qualquer razão. Com efeito, prescreve o art. 287° do C. Civil: «1. Só têm legitimidade para arguir a anulabilidade as pessoas em cujo interesse a lei a estabelece, e só dentro do ano subsequente à cessação do vício que lhe serve de fundamento. 2. Enquanto, porém, o negócio não estiver cumprido, pode a anulabilidade ser arguida, sem dependência de prazo, tanto por via de acção como por via de excepção». Ora, embora a Executada tenha tido conhecimento dos comportamentos ilícitos e gravosos do Exequente em Novembro de 2013, e tenha aí cessado o vício do desconhecimento desses comportamentos e que deformou a sua vontade negocial, certo é que o negócio viciado (acordo de cessação do contrato de trabalho) não foi ainda integralmente cumprido (como o Exequente muito bem sabe, e daí a razão de ser da execução principal que visa obter a cobrança coerciva da parte do acordo não cumprida, e que é precisamente a relativa à obrigação de pagamento da compensação), pelo que se mostra inaplicável o prazo de um ano previsto no n°1 do referido art. 287° (e que terminaria em Novembro de 2014), sendo sim aplicável o disposto no n°2 do mesmo preceito e, por via disso, não estando cumprido o negócio em causa, podia, e pode, a Executada arguir a anulabilidade do mesmo nos presentes embargos de executado, como efectivamente fez, importando frisar que tal arguição tem a natureza de uma excepção porque visa extinguir a obrigação executiva, isto é, extinguir o crédito que o Exequente pretendia cobrar coercitivamente, pelo inexiste aqui qualquer obrigação do Tribunal declarar formalmente qualquer anulabilidade do negócio.
(...) Consequentemente e sem necessidade de outras considerações, mais se conclui que, em face da arguida anulabilidade do negócio consistente no acordo de cessação do contrato de trabalho, pelo menos, na parte em que foi convencionado pagamento de uma compensação pela Executada ao Exequente, a qual efectivamente se verifica, inexiste obrigação exequenda, porque a verificação desta anulabilidade extingue a obrigação de pagamento da compensação cujo valor corresponde ao crédito exequendo e estava titulado pelos cheques dados à execução e, por via disso, deverão os presentes embargos de executado proceder.
Mas ainda que não procedesse tal extinção da obrigação exequenda por via da arguida anulabilidade, o que só se admite por mera hipótese da raciocínio, ainda assim a obrigação exequenda seria inexigível por estarmos perante uma manifesta situação de abuso de direito por parte do Exequente.
(...) verificando-se que está demonstrado que, à data da celebração do referido acordo de cessação do contrato de trabalho, a Executada desconhecia, em absoluto, que, no âmbito da relação laboral, o Exequente, enquanto trabalhador, havia praticado um conjunto de actos que, sendo integradores de ilícitos penais (um crime de burla qualificada, na forma continuada, e de dois crimes de falsificação de documento, um dos quais na forma continuada), causaram um prejuízo patrimonial àquela; enquanto empregadora, no valor de 47.786,70, e ainda lhe causaram um prejuízo não
patrimonial no valor de 5.000,00, sendo que tais actos consubstanciam,
simultaneamente, infracções disciplinares graves que inequivocamente, pela sua gravidade, constituem justa causa de despedimento, actos esses que foram todos confessados pelo próprio Exequente em sede judicial (cfr. facto provado n°8), então vir a juízo pretender obter a cobrança coerciva de uma compensação pela cessação de um contrato de trabalho por acordo com fundamento numa extinção do posto de trabalho, acordo esse que foi proposto pelo Exequente e foi por si conseguido porque escondeu e ocultou sempre à Executada tais actos motivavam uma cessação do contrato por despedimento com justa causa sem direito a indemnização ou compensação, e compensação esse que é prevista legalmente para trabalhadores que não praticaram actos da natureza daqueles que o Exequente praticou, sempre configuraria e consubstanciaria um manifesto e absoluto abuso desse direito na modalidade de venire contra factum proprium já que está a pretender obter uma compensação prevista para os casos em que não há fundamento para despedimento com justa causa, sendo que ele próprio confessou os factos que dariam lugar a essa justa causa, escondeu-os da sua entidade Empregadora, e mais sabe ainda que tais factos originaram à Executada um prejuízo patrimonial e não patrimonial muito superior ao valor da compensação que exige (compensação esta que sabe que nunca teria sido acordado caso tivesse confessado à sua Empregadora os seus comportamentos), o que tudo contraria os limites mínimos da boa fé: exigir, neste caso concreto, o efectivo pagamento da compensação por parte da Executada, mesmo que tal direito lhe assista formalmente, configura o exercício de um direito por parte do Exequente em termos clamorosamente ofensivos da justiça, e de forma que representa uma injustiça gravemente chocante e reprovável para o sentimento jurídico prevalente na comunidade social (...)»
Estatuí o art. 287°, n°2 do Código Civil : Enquanto o negócio não estiver cumprido, pode a anulabilidade ser arguida, sem dependência de prazo, tanto por via de acção como por via de excepção.
No caso vertente a anulabilidade foi invocada por via da excepção. E o contrato ainda não estava cumprido, uma vez que a emissão dos cheques acima indicados configura uma datio pro solvendo (art. 840° do Código Civil).
Improcede, por isso, a excepção de caducidade.
Da factualidade assente resulta que a recorrida celebrou o acordo de cessação do contrato sem conhecimento dos descritos actos ilícitos do recorrente.
Ocorre, assim, erro na formação da vontade da ora recorrida. Tal erro incide sobre os motivos determinantes da vontade e também sobre a própria pessoa do recorrente. Com efeito, o erro sobre a pessoa do declaratário a que alude o art. 251° do Código Civil respeita também às qualidades pessoais e morais do mesmo. A entidade empregadora, ao celebrar o referida acordo de cessação, desconhecia a conduta desleal do trabalhador, por este ter omitido tais factos.
O que nos reconduz a uma conduta dolosa, por omissão.
Entendemos, assim, estão preenchidos os requisitos de anulabilidade do acordo de, cessação do contrato de trabalho na parte em que foi convencionado pagamento de uma compensação.
Mesmo que se entendesse que não estavam preenchidos tais requisitos, a conduta do exequente configuraria sempre uma situação de abuso de direito.
De acordo com o disposto no art. 334° do Código Civil, « é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito».
Para aferir os indicados limites importa atender, conforme referem Pires de Lima e Antunes Varela in Código Civil Anotado, vol I, pág. 297, às concepções ético jurídicas dominantes na colectividade.
São as seguintes as modalidades do abuso de direito: o venire contra factum proprium , a exceptio doli, da inalegabilidade de nulidades formais, da supressio e surrectio e do desequilíbrio no exercício jurídico.
Conforme refere o professor Menezes Cordeiro in Do abuso do direito: estado das questões e perspectivas, ROA, Ano 2005, vol II : « Ainda no Direito romano, pôs-se a hipótese de a exceptio doli poder ser usada para deter práticas abusivas. A exceptio doli, particularmente possível nos bonae fidei iudicia, permitia deter certas pretensões. A tradição do Direito romano comum reconhecia um papel duplo na exceptio doli, base da sua repartição por duas exceptiones diferenciadas. Nuns casos, o defendente alegava a prática, pelo autor, de dolo, no momento em que a situação jurídica levada a juízo se formara: era a exceptio doli praeteriti ou specialis. Noutros, o réu contrapunha, à acção, o incurso do autor em dolo, no momento da discussão da causa: era a exceptio doli praesentis ou generalis (...)»
Conforme acima referimos, o recorrente actuou, de forma dolosa, por
omissão, no momento da celebração do acordo, pelo que ao peticionar o pagamento da compensação acordada, excede, de forma manifesta, os limites impostos pela boa-fé.
Por último refere o recorrente que a anulabilidade parcial do acordo terá de acarretar a invalidade de todo o contrato, nos termos ao art. 292° do Código Civil.
Resulta do disposto neste último preceito legal que « a nulidade ou anulação parcial não determina a invalidade de todo o negócio, salvo quando se mostre que este não teria sido concluído sem a parte viciada».
Ora, as circunstâncias previstas na segunda parte deste preceito não foram invocadas na contestação aos embargos e não foram objecto de apreciação pelo Tribunal a quo.
Os recursos visam apenas modificar as decisões recorrida e não criar decisões sobre matéria nova, com ressalva do conhecimento das questões do conhecimento oficioso.
Conforme refere Armindo Ribeiro Mendes in Recursos em Processo Civil, Coimbra Editora, 2009, pág. 81 : « Em Portugal, os recursos ordinários são recursos de revisão ou de reponderação da decisão recorrida (...) A jurisprudência tem repetido uniformemente e desde o início da vigência do CPC de 1939 que os recursos visam apenas modificar as decisões recorrida e não criar decisões sobre matéria nova.» Ficam ressalvadas as questões do conhecimento oficioso.
Estamos perante uma questão nova que não foi sujeita à apreciação da 1a instância, pelo que não poderá o Tribunal ad quem conhecer da referida questão.
Importa ainda referir que anulabilidade parcial de acordo não configura violação dos princípios constitucionais da legalidade e do direito ao trabalho e protecção no emprego.
Improcede, desta forma, o recurso de apelação.

IV- Decisão
Em face do exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso de
apelação e, em consequência, confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo recorrente, sem prejuízo de eventual apoio judiciário.
Registe e notifique.
Lisboa, 26 de Junho de 2019
Francisca Mendes
Maria Celina de Jesus de Nóbrega
Paula de Jesus Jorge dos Santos
Sumário : Tendo o trabalhador omitido, no momento da celebração de acordo de cessação do contrato, a prática de ilícitos criminais praticados pelo mesmo contra o património da entidade empregadora, dever-se-á concluir que formação da vontade desta foi viciada por erro causado pela conduta dolosa do primeiro.