Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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 - ACRL de 20-11-2019   Princípio trabalho igual salário igual. Discriminação.
Não há discriminação retributiva, nem violação do princípio trabalho igual salário igual, quando a diferença se funda em razões objetivas, como quando o trabalhador prestar trabalho de diferente natureza, quantidade e qualidade do que as colegas com a mesma categoria, ou, prestando a mesma atividade, tem mais antiguidade, refletida em diuturnidades.
Mas existe discriminação quando, prestando a mesma atividade, a empregadora não lhe reconhece o nível da categoria correspondente, e o classifica num nível inferior.
Sumário pelo Relator
Proc. 2449/18.3T8PDL.L1 4ª Secção
Desembargadores:  Sérgio Manuel de Almeida - Francisca da Mata Mendes - -
Sumário elaborado por Susana Leandro
_______
TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA
PC n.° 2449 /18.3T8PDLLa
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa
RELATÓRIO
Autores (adiante, por comodidade, designado abreviadamente por AA.):
ARA..., com residência na Rua do ...,
e JAF..., com residência na Rua ....
Ré e recorrente: RRR..., SA, com sede na Avenida ..., Lisboa.
Os AA. alegaram que, estando ao serviço da Ré, no Centro Regional ..., com a categoria profissional de 'técnico de gestão de emissão nível de desenvolvimento II' (desde z de Janeiro de 2013, no caso da Autora, e desde 1 de Janeiro de 2016, no caso do Autor), as funções que desempenham integram o 'nivel de desenvolvimento III', constante do instrumento de regulamentação coletiva aqui aplicável;
- para além do mais, exercem as mesmas funções, com o mesmo horário e os mesmos resultados, desempenhadas, neste Centro Regional, por um outro trabalhador da Ré, também com a categoria profissional de 'técnico de gestão de emissão', o qual tem o 'nivel de desenvolvimento III
- sendo ainda certo que a Ré tem como prática retribuir a polivalência de funções, precisamente, com a subida de um 'nível de desenvolvimento'.
Pediram, com esses fundamentos, o reconhecimento da sua integração no `nível desenvolvimento III', com a categoria profissional de 'técnico de gestão de emissão', desde a data em que exercem as correspondentes funções, e a condenação da Ré no pagamento das respetivas diferenças salariais, com acréscimo dos juros de mora.
Não havendo acordo a ré contestou e pediu a improcedência da ação, alegando que:
- dentro da mesma categoria profissional há trabalhadores com conteúdo funcional, desempenhos e níveis de experiência distintos, assim se lhes sendo atribuído o respetivo 'nível de desenvolvimento
- só após a apreciação de um conjunto de critérios base pré-definidos é que se torna possível a atribuição a um trabalhador de um 'nível de desenvolvimento superior
- pelo que as funções concretamente desempenhadas pelos Autores não lhes permitem fundamentar a sua integração no 'nível de desenvolvimento III
- nem o trabalhador a que se referem em termos comparativos se encontra numa situação similar à sua;
- e nem os Autores, com referência ao que também alegam, prestam funções em regime de polivalência;
- para além do mais, mesmo a admitir este enquadramento num 'nível de desenvolvimento' mais elevado, sempre teriam de ser levadas em conta as reduções previstas nas normas orçamentais publicadas desde 2011.
Pede a Ré, como tal, a improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.

Efetuado o julgamento o,Tribunal julgou a ação parcialmente procedente, nos seguintes termos:
a) declara a Autora, ARA..., como 'técnica de gestão de emissão nível de desenvolvimento III', desde i de Janeiro de 2013;
b) declara o Autor, JAF..., como 'técnico de gestão de emissão nível de desenvolvimento III', desde 5 de Janeiro de 2016;
c) condena a Ré, RRR..., SA, a reconhecer este 'nível de desenvolvimento' fixado em a) e a pagar à Autora ARA... as diferenças retributivas vencidas desde 1 de Janeiro de 2013, no valor de, pelo menos, € 25520,00, sem prejuízo das reduções previstas a partir da Lei do Orçamento de Estado para o ano de zon;
d) condena a Ré a reconhecer este 'nível de desenvolvimento' fixado em b) e a pagar ao Autor JAF... as diferenças retributivas vencidas desde 5 de
Janeiro de 2016, no valor de, pelo menos, 13662,00, sem prejuízo das reduções previstas a partir da Lei do Orçamento de Estado para o ano de 2011;
e) condena a Ré a pagar a cada um dos Autores os juros de mora devidos sobre estas prestações, calculados à taxa legal, vencidos desde a data da citação até definitivo e integral pagamento;
O absolve a Ré do que mais foi peticionado.
Inconformada a R. recorreu, concluindo:
a) A sentença proferida pelo Tribunal a quo - que condenou a Recorrente a enquadrar os Recorridos no nível de desenvolvimento 3 da categoria de técnico de gestão de emissão desde que estes iniciaram as funções correspondentes a essa categoria, bem como a pagar-lhes as diferenças salariais associadas - é, salvo o devido respeito, ilegal, e o recurso merece franco provimento;
b) A decisão não poderá subsistir, uma vez que o Tribunal não considerou provada matéria de facto que a Ré alegou e demonstrou e que é relevante nos autos;
c) Mesmo considerando apenas a matéria de facto que o Tribunal a quo considerou demonstrada d R. deveria ter sido absolvida dos pedidos dos AA.;
d) Ficaram provados os seguintes factos invocados pela Recorrente:
i) antes de 19 de dezembro de 2012, a 1.ª A (ora 1.ã Recorrida) detinha a categoria de Técnica de Sistemas Audiovisuais, nível de desenvolvimento 3A (artigos 10.° e 11.º da contestação);
ii) esta reclassificação implicou a transferência da 1ªA para a área de emissão (art.º 13.º da contestação);
iii) O 2.ºA foi reclassificado, a seu pedido, na categoria de Técnico de Gestão de Emissão, nível de desenvolvimento 2A, após um período experimental de 3 meses, sendo certo que, antes disso, titulava a categoria de 'Técnico de Eletrónica, nível de desenvolvimento 2C (art.° 3o.° da cont.);
iv) das funções exercidas pelo 2ºA, objeto de análise, designadamente, em fevereiro de 2018, resulta que não correspondem ao. que se encontra previsto para o nível de desenvolvimento 3 (cfr. art.2 77.2 da cont.);
v) o trabalhador JT... não se encontra numa situação semelhante à dos AA. - designadamente, em termos de experiência, passado profissional e de tempo de exercício das funções - (art.2 88.° cont.);
e) Para demonstrar os factos descritos em i), remete-se para as declarações da A. ARA... (gravadas em suporte áudio em 16/01/2019, entre as 10:51:59 horas e as 11:04:57 horas), a partir dos n:57 minutos do seu depoimento;
f) A prova dos factos referidos em ii) resulta diretamente do depoimento da testemunha RFO... (gravado em suporte áudio, no dia
17/0112.019, entre as 10:10:44 horas e as 10:17:57 horas); a partir dos .2:00 dos 3:17
minutos do seu depoimento;
g) A demonstração de que, antes da reclassificação, o Recorrido tinha a categoria de Técnico de Eletrónica, nível de desenvolvimento 2C, resulta, desde logo, do documento n.° 1, junto pela Recorrente com a contestação;
h) Quanto aos demais factos referidos em iii), foram cabalmente provados na sequência dos depoimentos de IMF... (gravado em suporte áudio, no dia 17/01/2019, entre as 10:26:06 horas e as 11:02:03 horas), em especial a partir dos 10:43, 25:12 e 30:06 minutos; JT... (gravado em suporte áudio, no dia 16/01/2019, a partir das 10:34:43 horas), a partir dos 5:23 e 12:17 minutos; RMS... (gravado em suporte áudio, no dia 16/01/2019, entre as 10:35:09 horas e as 10:51:58 horas), a partir dos 12:08 minutos,
i) Bem como pelo próprio A., JAF... (declarações gravadas em suporte áudio, em 16/01/2019, entre as 11:04:59 horas e as 11a2:51 horas) a partir dos 01:40 minutos;
j) Por seu turno, a factualidade referida em iv) ficou provada, nomeadamente, na sequência do depoimento prestado por IMF..., a partir dos 04:49 minutos;
k) Quanto à matéria descrita em v), ficou demonstrada, em primeiro lugar, através do documento n.2 2, junto com a contestação;
1) Depois, com base no depoimento da test. JT..., a partir dos 13:22 minutos, bem como a partir dos 00:29 segundos após regressar à sala de audiências;
m) Estamos perante dois trabalhadores que, em determinada altura da sua carreira profissional (a A. em 2013 e o A. em 2016), acordaram com a Recorrente na alteração da sua categoria profissional, modificando totalmente o âmbito das funções que, até esse momento, vinham desempenhando;
n) Esta modificação do objeto dos seus contratos de trabalho foi de tal forma significativa, que implicou, ao mesmo tempo, uma alteração da própria área onde vinham prestando a sua atividade, tendo transitado para a emissão;
o) A categoria que foi/está atribuída aos Recorridos é a de técnico de gestão de emissão, a qual comporta três níveis de desenvolvimento distintos;
p) Apesar de terem iniciado uma nova carreira profissional, inserida numa área diferente, o que os AA. peticionaram (e que o Tribunal a quo ratificou) foi, precisamen¬te, o enquadramento no nível de desenvolvimento mais elevado dessa categoria (-3), logo desde o primeiro dia em que começaram a desempenhar essas novas funções;
q) Facilmente se percebe que esta circunstância já seria suficiente para, pelo menos, interrogar o sentido da sentença recorrida;
r) Acresce que, nos termos do n.2 z da cláusula 1.7...4 do AE aplicável à R. (publi-cado no BTE n.º 36, de 29/9/2015), A evolução profissional de um trabalhador para um nível de desenvolvimento superior (...) terá em consideração um conjunto de critérios base pré -definidos, designadamente (...) o reconhecimento do desempenho como consistente e significai v o...;
s) Por conseguinte, resulta evidente que este requisito não foi atendido pelo Tribunal a quo, pois: será possível reconhecer que um determinado desempenho é consistente e significativo logo no primeiro dia em que os A. começaram a exercer funções correspondentes à categoria profissional de técnico de gestão de emissão? Claro que não;
t) Tendo decidido desta forma, a sentença recorrida violou, desde logo, o n.º 2 da cláusula 12.ª do AE aplicável à Recorrente;
u) Também não se invoque, para dar provimento aos pedidos formulados pelos AA., o princípio, de matriz constitucional, trabalho igual, salário igual [art.° 59.º, n.º1, al. a) da CRP] e que encontra algumas concretizações legais, designadamente, nos art.º 23-º e 24-º do Código do Trabalho;
v) É verdade que ficou demonstrado que o colega dos AA., Sr. JT..., desempenha atualmente funções iguais ou, pelo menos, semelhantes às dos AA. e ainda que se encontra enquadrado no nível de desenvolvimento 3 da categoria de técnico de gestão de emissão;
w) Contudo, o trabalhador JT..., que transitou para o nível 3 em 2008, já estava no nível de desenvolvimento 2, escalão A, desta Mesma categoria, já tinha a categoria de técnico de gestão de emissão desde 2005 e já desenvolve, desde 1990, tarefas semelhantes às atuais, nesta área da emissão;
x) Resulta pois, claramente, que a experiência profissional e o tempo de exer¬cício de JT... nestas funções é totalmente diferente da dos AA.
y) Ao invés do entendimento que decorre da sentença recorrida: ...não se apura desde quando, em concreto, este terceiro técnico de gestão de emissão exerce tais funções, ficando por esclarecer, como tal, se no momento em que foi integrado no ND III - porque é essa a referência temporal a ser atendida - era, ou não, mais experiente (mais preparado, mais apto) do que os Autores no momento em que assumiram as mesmas tarefas., pelo que os pressupostos de que partiu são incorretos, inquinando assim a decisão que foi proferida;
z) A este propósito, remete-se para o teor do Ac. da Relação de Lisboa de 16/11/2016, proferido no proc. n.2 12007/15.9T8LSB.L1-4, disponível em www.dgsi.pt, o qual sintetiza, nos segmentos transcritos, o sentido que deveria ter norteado a decisão proferida pelo Tribunal recorrido.
aa) Tendo em conta o exposto, é manifesto que a sentença violou, nomeada¬mente, os art.° 59.º, n.º 1, alínea a) da Constituição da República Portuguesa, bem como os art.° 24.º, n.º 1 e 2, al. c), 25.º, n.° 1 e 23.º, al. c) e d) do Código do Trabalho (CT), ao desconsiderar a existência de fundamentos objetivos (tais como o tempo de desempenho destas funções) para que o trabalhador JT... esteja enquadrado num nível de desenvolvimento superior ao dos Recorridos;
bb) Por este motivo, a sentença acaba por produzir, ela própria, o resultado que pretendia evitar - uma verdadeira situação de desigualdade salarial (de JT… em relação ao AA.) -, ao tratar de forma uniforme situações materialmente diferentes;
cc) Isto é, ao colocar - injustificadamente - os AA. no mesmo patamar salarial de JT..., com pelo menos mais 20 anos do que os AA. no exercício deste tipo de funções.
Remata impetrando a revogação da sentença e a sua substituição por decisão que absolva a R. do reconhecimento, aos AA., do nível de desenvolvimento 3 da categoria de técnico de gestão de emissão, bem como do pagamento das diferenças salariais associadas.
Os AA. responderam, pedindo a improcedência do recurso e concluindo:
I — Não existem motivos que permitam alterar a matéria de facto dada como
provada pelo tribunal a quo.
II- E não há razão alguma que permita revogar a sentença recorrida.
III- Mas ainda que todos os factos cuja prova a recorrente quer ver declarada fossem assim considerados, ainda assim não haveria fundamento para alterar a sentença apelada,
IV- a qual deve ser mantida por se ter limitado a aplicar, sem desvios, o direito aos factos relevantes dados como provados.
A Sr-ª Procuradora Geral Adjunta teve vista, pronunciando-se no sentido da confirmação da sentença.
Não houve resposta ao parecer.
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
FUNDAMENTAÇÃO
As questões a apreciar no recurso - considerando que o seu objeto é definido pelas conclusões da recorrente, sem prejuízo de questões de conhecimento oficioso (e excetuando aquelas cuja decisão fique prejudicada pela decisão dada a outras, art.° 635/4, 639/1 e 2, e 663, todos do Código de Processo Civil) -, consistem em saber se
a) a decisão da matéria de facto merece a censura feita pela R.;
b) em face da factualidade apurada inexiste qualquer desigualdade, de categoria e salarial, que cumpra corrigir.

Da decisão da matéria de facto.
A matéria de facto pode ser alterada pelo Tribunal da Relação nas situações contempladas no n.° 1 do art.° 662° do CPC: se os factos tidos por assentes ou a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
No nosso ordenamento jurídico vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da prova livre (art.° 6o7.º, n.º 5, do CPC), segundo o qual O juiz (...) aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto Gr. Ou seja, ao juiz cabe apreciar livremente as provas, sem constrangimentos nomeadamente quanto à natureza das provas, decidindo de harmonia com a convicção que tenha firmado acerca de cada facto controvertido.
O controlo da matéria de facto, nomeadamente com base na documentação (mormente na gravação), dos depoimentos prestados em audiência, está vinculado à observância dos princípios fundamentais do processo civil, entre os quais, além do próprio principio da livre apreciação das provas', o da imediação.
É na 1ª instância que, por natureza, se concretizam os aludidos princípios'', estando, pois, em melhores condições de apreciar os depoimentos prestados em audiência, atento o imediatismo, impossível de obter na análise da matéria de facto na Relação, por ser quem conduz a audiência de julgamento e quem interage com a produção da prova e capta pormenores, reações, hesitações, expressões e gestos, enfim os símbolos impossíveis de deletar em simples gravações'.
O artigo 640 CPC estabelece os ónus que impendem sobre quem recorre da decisão de facto, sob pena de rejeição do recurso (art.° 640/1 e 2/a):
- especificar os concretos pontos da matéria de facto que considera incorretamente julgados (n°1, alínea a);
- especificar quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida (n° 1, alínea b);
- a decisão que, no seu entender, deve ser tomada sobre as questões de facto impugnadas (n.°1, al. c).
Os ónus contidos no art.° 640/1 e 2, do CPC, têm por fim tornar inteligível a impugnação e facilitar o entendinienio da perspetiva do recorrente à contraparte e ao Tribunal ad quem. Neste sentido escreve Abrantes Geraldes que as referidas exigências devem ser apreciadas à luz de um critério de rigor (...). Trata-se, afinal, de uma decorrência do princípio da autorresponsabilização das partes, impedindQ que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação inconsequente de inconformismo (cf. Recursos em Processo Civil, Novo Regime, 2007, 142-143; Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, 129).
Entende-se bem quais os factos que a R. entende mal julgados e com que fundamento, sendo as conclusões claras nessa matéria.
Nada impede, pois, o respetivo conhecimento.

A propósito do facto iv que a R. pretende ver aditado nota a D.M. do M°P° que a R. pretende que se adite um facto novo, o que é inadmissível.
Embora o facto não corresponda exatamente ao que foi articulado (no art.° 77 da contestação a R. afirma que das funções exercidas pelo 22A, objeto de análise, designadamente, em fevereiro de 2o18, resulta que correspondem ao que se encontra previsto para o nível de desenvolvimento 1., enquanto agora o que pretende é que fique assente que essas funções não correspondem ao que se encontra previsto para o nível de desenvolvimento 3), não se nos afigura tão óbvio que se trata de um facto novo, já que a resposta sempre poderia ser explicativa, no sentido de que não correspondia ao nível 3; e de todo o modo, sempre a resposta positiva a um quesito formulado nos termos do referido art.° 77 sempre acarretaria a conclusão de que não corresponderiam, necessariamente, ao nível 3.
Os recorridos apontam-lhe outro defeito, extensivo à matéria referida em v (o trabalhador JT... não se encontra numa situação semelhante à dos AA. ¬designadamente, em termos de experiência, passado profissional e de tempo de exercício das funções), a saber, o seu carater conclusivo.
E efetivamente reconhece-se um acentuado pendor conclusivo, que impede a discussão desta, digamos, factualidade, nos precisos termos em que é formulada (como é fácil de compreender, não se pode perguntar em singelo às testemunhas se o JT... se encontra numa situação semelhante à dos AA. designadamente em termos de experiência, passado profissional e de tempo de exercício das funções, ou se as funções dos AA. correspondem ao nível de desenvolvimento I ou III. As respostas meramente afirmativas ou negativas não seriam senão conclusivas, não permitindo dilucidar a questão e transferindo a decisão do Tribunal para as testemunhas).
Não ignoramos que nem sempre a precisão não é fácil, e isso ocorre por vezes na enunciação das funções desta ou daquela categoria tal como mencionadas nos instrumentos coletivos de trabalho, em que a enumeração e designação das tarefas é complexa e as próprias testemunhas, com conhecimento prático das mesmas (de outro modo nada adiantariam), referem-se-lhes pelas classificações dos IRCTs.
Discutiremos por isso a prova relativamente à matéria do iv (excluindo a do v por incontornavelmente conclusiva, a qual sempre poderia ter sido ultrapassada sem dificuldades de maior no articulado).
Ora, ponderando os elementos probatórios carreados pelas partes, a saber, parte dos depoimentos de IMF... (pela R.), RMS... e AG... (pelos AA.), não vislumbramos que o Tribunal a quo tenha decidido mal, pois confirmam estas (e também JT...) que os AA. desempenhavam as mesmas funções do dito nível III e nas mesmas circunstâncias, não havendo diferenças.
Destarte, não se adita fáctualidade do n.° iv.
Quanto à factualidade mencionada nas al. i., ii, e iii, que a R. entende estar provada, defendem os AA. que é totalmente irrelevante.
Efetivamente, face à matéria já dada por assente, às datas a partir das quais os AA. passaram a exercer as mesmas funções do JT..., e ao dispositivo da sentença (cfr. o termo inicial das funções dos AA. aí consignado P a condenação dA R. an reconhecimento do nível de desenvolvimento e ao pagamento das correspondentes retribuições), bem como atendendo que a factualidade ora em causa é anterior, não se divisa a relevância da mesma, a qual não tem, de per si, e face ao exposto, aptidão para levar à alteração da decisão.
Ora, o princípio da limitação dos atos processuais proíbe a prática de atos
inúteis ou irrelevantes (art.° 131 do CPC), não havendo, pois, lugar para aqueles que não
adiantam para a sorte dos autos.
Destarte, não se conhece da factualidade contida em i., ii e iii. do recurso da R.
Improcede, em suma, o recuso da decisão da matéria de facto.
São estes os factos provados:
1. Com antiguidade contada desde 2 de junho de 1992, ARA... encontra-se admitida ao serviço de RRR..., SA (com anterior denominação de RRR..., EP), no interesse e sob as ordens, direção e fiscalização desta última.
2. A partir da data mencionada no número anterior, com a categoria profissional de 'operadora de TV', exercia as seguintes funções: edição de imagem, mistura de vídeo e áudio e emissão de peças.
3. Não obstante o descrito no número anterior, a Autora, entre novembro de 2007 e, pelo menos, janeiro de 2009, teve o cargo de 'chefe de meios operacionais', com o exercício das seguintes funções: planeando, coordenando e supervisionando a equipa técnica (operadores e assistentes), distribuindo-lhes tarefas.
4. Mediante transação ajustada com a Ré no âmbito do Processo n° 208/12.6T…L, deste Juízo do Trabalho, datada de 19 de dezembro de 2012, a Autora, a partir de 1 de janeiro de 2013, passou a exercer funções, no Centro Regional ..., com a categoria profissional de 'técnica de gestão de imagem', com o 'nível de desenvolvimento 2B'.
5. Até ao descrito no número anterior a Autora tinha o 'nível de desenvolvimento 3A'.
6. Com antiguidade contada desde, pelo menos, 24 de julho de 1986, JAF... encontra-se admitido ao serviço de RRR..., SA (com anterior denominação de RRR..., EP), no interesse e sob as ordens, direção e fiscalização desta última.
7. A partir da mencionada no número anterior, com a categoria profissional de `radiotécnico' / 'técnico de eletrónica', procedia à reparação de aparelhos de eletrônica.
8. Não obstante o descrito no número anterior, o Autor, pelo menos entre de julho de 2oo6 e 9 de abril de 2013 e entre io de maio deste último ano e 31 de dezembro de 2015, teve o cargo de 'chefe funcional' / 'coordenador', com o exercício das seguintes funções: planeando e coordenando os serviços da área técnica, distribuindo tarefas aos técnicos de eletrónica e de comunicações.
9. O Autor, mediante acordo ajustado com a Ré em janeiro de 2016, passou a exercer funções, no Centro Regional ..., com efeitos a partir de 5 de janeiro de
2016, com a categoria profissional de 'técnico de gestão de, imagem', com desenvolvimento 2A'.
10. Até ao descrito no número anterior o Autor tinha o nível de desenvolvimento 2C'.
u. Nos termos descritos em 4) e 9), os Autores, desde estas datas, exercem, pelo menos, as seguintes funções:
a) realização de trabalho técnico, com a definição das prioridades a fluxos de trabalho mediante necessidades de emissão, com recurso à otimização dos meios existentes, e a articulação com utilizadores de outras áreas (informação, programação, técnica operacional e manutenção);
h) execução de tarefas como a elaboração final do alinhamento da emissão, alterações estruturais verificadas no decurso da emissão, recurso, com autonomia, de programas e conteúdos de reserva, de forma a garantir a emissão, cumprimento da grelha, com referência às obrigações previstas no contrato de concessão (com conhecimento técnico para tal);
c) coordenação de diretos entre régies de informação e de emissão, bem como de exteriores, para as emissões nacionais e internacionais, estabelecendo os contactos com as centrais técnicas e as respetivas régies;
d) operacionalização do `GM…', com o registo de todos os eventos, incluindo as alterações à programação, ocorridas desde o início ao fim da emissão, inserção de novos programas, não previstos, acertos, spots publicitários, promoções spots institucionais, separadores de estação, apelos de urgência e elaboração de relatórios de ocorrência de emissão;
e) gestão da base de dados do `GM…', com a criação e remoção de elementos necessários à emissão;
O resolução de problemas de natureza técnica (por não ser assegurado o serviço de manutenção em alguns períodos da emissão).
12. No Centro Regional ..., e para além dos Autores, exerce também funções, ao serviço da Ré, com a categoria profissional de 'técnico de gestão de emissão', JT....
13. JT... exerce as mesmas funções dos Autores, nos termos descritos em 11).
14. Com o mesmo regime de turnos e a mesma carga horária dos Autores.
15. A JT..., mediante acordo ajustado com a Ré, com efeitos a partir dei de janeiro de 2008, foi atribuído, como 'técnico de gestão de emissão', o 'nível de desenvolvimento 3'.
i6. Consta da ata da reunião de negociação do instrumento de regulamentação coletiva entre a Ré e o STT — TCA..., realizada em 17 de junho de 2009, que:
a Empresa informou que já se encontra prevista para processamento no presente mês a atribuição de ND 3ff aos 'Técnicos de Gestão de Emissão (ex-Regentes do Centro Regional ...) com efeitos a 1.7.2008....
17. Em 12 de abril de 2018, em resposta a uma solicitação do Autor, representado pelo sindicato onde é associado (TCA...), a Re enviou-lhe uma comunicação escrita com o seguinte teor:
Da análise feita com a respetiva estrutura concluiu-se que o trabalhador JAF... desempenha as funções correspondentes à categoria e nível de desenvolvimento titulados, pelo que ainda não reúne as condições para alteração da sua situação profissional e não existindo, assim, fundamento para a celebração do acordo individual especifico sugerido na vossa carta.
18. A 'retribuição de categoria' mensal de 'técnico de gestão de emissão' é de:
a) €1683,00, para o 'nível de desenvolvimento 2B' (retribuição paga à Autora);
b) € 1588,0o, para o 'nível de desenvolvimento 2A' (retribuição paga ao Autor).
19. À Autora têm sido pagas, ainda, as seguintes prestações:
a) 'remuneração de antiguidade', no valor mensal de € 151,47, a partir de janeiro de 2013, €180,93, a partir de Julho de 2017, € 210,38, a partir de janeiro de 2018;
b) 'subsidio de integração', no valor mensal de €171,31. zo. Ao Autor têm sido pagas, ainda, as seguintes prestações:
a) 'remuneração de antiguidade', no valor mensal de € 190,56, a partir de janeiro de 2016, 218,35, a partir de Julho de 2017, 246,14, a partir de janeiro de 2018;
b) 'subsidio de integração', no valor mensal de 25,0o.
21. A Ré paga à polivalência de funções' a alguns seus funcionários não concretamente identificados, através de uma prestação pecuniária calculada tendo por base a subida de um 'nível de desenvolvimento'.
22. No ano de 2018, os Autores gozaram férias e receberam o respetivo subsídio.
23. Os Autores são filiados no TCA..., desde 19 de outubro de 1998 a 12 de fevereiro de 2016 e a partir de 9 de março de 2018 (a Autora) e a partir de 29 de julho de 2010 (o Autor).

De Direito
Equacionou a sentença recorrida (reproduzindo-se sem as partes menos
relevantes atenta a economia do acórdão) que
Com antiguidade contada desde, respetivamente, 2.6.1992 e 24.7.1986, ARA... e JAF... são trabalhadores da R., Centro Regional ..., tendo desde 1.1.2013 e 5.1.2016. respetivamente, a categoria profissional de 'técnico de
gestão de emissão', com o 'nível de desenvolvimento II' B', no caso de ARA..., e 'II A', no caso de JAF...).
(...) Ao abrigo do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) aqui aplicável, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego (BTE), I Série, n° 16, de 29.4.2006 (com as alterações introduzidas pelo BTE, I S., n° 23, de 22.6.2008), os trabalhadores abrangidos exercem as funções correspondentes à função tipo / categoria e nível de desenvolvimento em que estão integrados. Sendo que, segundo
o Acordo de Empresa (AE) entretanto celebrado, publicado no BTE nº 27/2009, de 22.7 (de revisão do ACT acima referido), o modelo de carreiras no seio da Ré assenta num conjunto de conceitos enunciados no seu Anexo II-A, sendo um deles
o 'nível de desenvolvimento' preconizado para as diferentes funções tipo / categorias, o qual reflete as necessidades da empresa em termos de retenção de conhecimentos críticos, desenvolvimento interno de competências e conhecimentos e coordenação funcional. Ainda de acordo com o mesmo Anexo, a integração num 'nivel de desenvolvimento superior' compreende o desempenho de todas as atividades descritas nos 'níveis de desenvolvimento' inferiores.
Tornando em atenção o Anexo III do AF, verifica-se, então, que a categoria profissional de 'técnico de gestão de emissão' tem três níveis de desenvolvimento, `ND I', 'ND II' e 'ND III', tendo cada um deles, como é alegado pela Ré (e os Autores não contrariam), um conteúdo Funcional mais complexo que o anterior. Assim, o 'técnico de gestão de emissão ND II':
Realiza trabalho técnico de planeamento e controlo de qualidade das atividades operacionais de todos os canais. Gere os espaços de memória em servidor. Possui conhecimentos específicos para proceder à identificação e análise de anomalias, bem como apresentar soluções e sugestões para melhorar o desempenho funcional da régie de emissão.
Na régie de uma só emissão é o responsável pelo planeamento, elaboração e execução de tarefas de elevada responsabilidade, podendo, nomeadamente, tomar as medidas adequadas por forma a assegurar as estratégias próprias definidas para a emissão. Pode coordenar equipas de trabalho por delegação de competências.
E o 'técnico de gestão de emissão ND III':
Realiza trabalho técnico consubstanciado na definição das prioridades efluxos de trabalho mediante necessidades de emissão com recurso a otimização dos meios existentes,
É responsável pelo planeamento e execução de tarefas de elevada responsabilidade, por delegação de competências. Possui domínio de conhecimentos técnicos para, em conformidade com as linhas orientadoras traçadas pela Direção de Programas, tomar as medidas adequadas perante alterações e anomalias, assegurando as estratégias próprias definidas para cada uma das emissões. Coordena toda a atividade técnico-operacional inerente ao bom funcionamento do Centro de Produção de Emissão. Coordena equipas de trabalho.
Ambos estes 'níveis de desenvolvimento' têm as mesmas exigências de formação e conhecimentos: Cursos Profissionais de Audiovisuais e Produção dos Media ou 122 Ano (Curso Geral de Artes do Espetáculo - preferencial). Formação profissional adequada.-
Ora, sendo este o conteúdo de cada um dos 'níveis de desenvolvimento' aqui em causa, 'ND Ir e 'ND III', e confrontando-o com aquelas que são, segundo ficou demonstrado, as funções concretamente executadas por ambos os AA., o que se pode afirmar é que ARA... e JAF..., como 'técnicos de gestão de
emissão', exercem uma atividade que é, em absoluto, enquadrável não só no 'nível de desenvolvimento II', mas também no 'nível de desenvolvimento III'. Com efeito, e para além de outras ações, os Autores:
- realizam trabalho técnico, com a definição das prioridades e fluxos de trabalho mediante necessidades de emissão, com recurso à otimização dos meios existentes;
- executam tarefas de elaboração final do alinhamento da emissão, alterações estruturais verificadas no decurso da emissão, recurso, com autonomia, a programas e conteúdos de reserva, de forma a garantir a emissão, e cumprimento da grelha, com referência às obrigações previstas no contrato de concessão, com conhecimentos técnicos para tal (sendo razoável concluir, então, que executam tarefas de elevada responsabilidade, possuindo conhecimentos técnicos para, ainda que em conformidade com as linhas orientadoras traçadas pela sua hierarquia, tomar as medidas adequadas perante alterações e anomalias, assegurando as estratégias próprias definidas para cada uma das emissões);
- coordenam diretos entre régies de informação e de emissão, bem como de exteriores, para as emissões nacionais e internacionais, estabelecendo os contactos com as centrais técnicas e as respetivas régies (podendo concluir-se, como tal, com plausibilidade, que coordenam a atividade técnico-operacional inerente ao bom funcionamento do centro de produção de emissão, articulando equipas de trabalho).
Não se apura que sejam responsáveis pelo planeamento em si das referidas tarefas de elevada responsabilidade, mas tal função, no 'ND III', e segundo se prevê no Acordo de Empresa, tem subjacente uma delegação de competências.
Esta é, pois, a primeira conclusão a que o Tribunal chega: os Autores, atentos os factos provados, exercem, como 'técnicos de gestão de emissão', funções correspondentes ao 'nível de desenvolvimento III'.
Por outro lado, e indo mais longe, chama-se a atenção para o disposto no art.2 242, n2 i e 2, alínea c), do Código do Trabalho (CT) (...). Conjugadamente, estatui o art.2 25°, n2 1 (...), sendo que, de acordo com o art.° 232, alíneas c) e d), considera-se (...). Trata-se de uma matéria com consagração constitucional, prevendo o art.2 592, n2 1, alínea a), da Constituição da República Portuguesa (...).
Conforme tem vindo a ser definido na nossa jurisprudência, o princípio trabalho igual salário igual impõe a igualdade de retribuição para trabalho igual em natureza, quantidade e qualidade. .assim como a proibição de diferenciação arbitrária (sem qualquer motivo objectivo), ou com base em categorias tidas como fatores de discriminação, destituídas de fundamento material atendível, proibição essa que não contempla diferente remuneração de trabalhadores da mesma categoria profissional, na mesma empresa, quando a natureza, a qualidade e quantidade do trabalho não sejam equivalentes (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2016, disponível em www.dgsi.pt). Pretendendo o trabalhador que seja reconhecida a violação deste princípio, cabe-lhe alegar e provar que a diferenciação existente é injustificada em virtude de o trabalho por si prestado ser igual aos dos demais trabalhadores quanto à natureza, abrangendo esta, designadamente, a dificuldade, quanto à quantidade, aqui cabendo o volume, a intensidade e a duração, e quanto à qualidade, aqui se compreendendo os conhecimentos, a capacidade e a experiência que o trabalho exige, iiìdS também o zelo, a eficiência e a produtividade (rfr. ArArrio da Relação do Porto de 13 de Fevereiro de 2017, disponível em www.dgsi.pt; no mesmo sentido, e entre outros, Acórdão da Relação do Porto de 8 de Janeiro de 2018 e Acórdãos da Relação de Lisboa de u de Julho de 2013 e 9 de Maio de 2018, todos igualmente disponíveis em www.dgsi.pt).
No caso em apreciação, está provado que, ao serviço da Ré, no Centro Regional ..., há um outro técnico de gestão de emissão, o qual exerce exatamente as mesmas funções dos Autores, com o mesmo regime de turnos e a mesma carga horária, estando-lhe atribuído o 'nível de desenvolvimento III'. Ora, se os Autores, para além de terem a mesma categoria profissional de um seu colega, exercem exatamente as mesmas funções desempenhadas por este último, se têm conhecimento técnico para tal, se o fazem nas mesmas condições horárias, se essas funções, como vimos, são enquadráveis, ao abrigo do Acordo de Empresa, nn `nível cie desenvolvimento III', e se, perante tudo isto, o tal outro trabalhador está colocado (até justificadamente) neste 'nível de desenvolvimento' superior, com o respetivo acréscimo salarial, pode também concluir-se que, ao manter os Autores com o 'ND' mais abaixo, a Ré viola este princípio constitucional acima destacado, a trabalho igual salário igual.
Não se ignora que este outro trabalhador está colocado no 'ND III' desde 1 de Janeiro de 2008, exercendo as funções inerentes a esta categoria profissional, em termos absolutos, há mais tempo que os Autores. Mas, continuando a fazer esta análise comparativa, não se pode dizer que haja aqui algum tipo de diferenciação, atendendo a que não se apura desde quando, em concreto, este terceiro técnico de gestão de emissão exerce tais funções, ficando por esclarecer, como tal, se no momento em que foi integrado no 'ND III' - porque é essa a referência temporal a ser atendida - era, ou não, mais experiente (mais preparado, mais apto) do que os Autores no momento em que assumiram as mesmas tarefas. E isto sendo certo, para além do mais, que a atribuição de um 'nível de desenvolvimento' assenta, sobretudo, nas funções exercidas e nos conhecimentos e aptidões que o trabalhador reúne para o efeito (até porque - e é a própria Ré que o afirma - a subida de 'ND' não é automática, não dependendo, pois, da contagem de um determinado tempo).
Por estas razões, pelas funções em si que exercem, pelas condições materiais em que o fazem, pela sua equiparação a um outro trabalhador que aqui se impõe, assiste razão aos Autores na sua pretensão, ambos, com a categoria profissional de `técnico de gestão de emissão', devem ser enquadrados no 'nivel de desenvolvimento III', desde as respetivas datas em que se encontram nesta situação labora! (1 de Janeiro de 2013 e 5 de Janeiro de 2016), auferindo a retribuição correspondente.
Partindo daqui, têm os Autores igualmente direito às diferenças salariais, entre os valores auferidos com o 'ND II' e os valores que deveriam ter recebido com o 'ND III', vencidos desde as datas acima mencionadas.
Contrapõem a isto a recorrente:
Estamos perante dois trabalhadores que, em determinada altura da sua carreira profissional (a A. em 2013 e o A. em 2016), acordaram com a R. na alteração da sua categoria profissional ..., modificando totalmente o âmbito da funções que, até esse momento, vinham desempenhando. Esta modificação ... implicou, ao mesmo tempo, uma alteração da própria área onde vinham prestando a sua atividade, tendo transitado para a emissão.
De acordo com o instrumento de regulamentação coletiva de trabalho (AE) aplicável à R., os seus trabalhadores exercem funções equivalentes à função tipo/categoria e nível de desenvolvimento em que estão integrados, correspon¬dendo CJJC5 nívei5 de desenvolvimento, dentro de cada categoria, a níveis diversos de complexidade e/ou autonomia no que respeita às funções desempenhadas.
Por seu turno, cada nível de desenvolvimento comporta três níveis ou escalões salariais (A, 13 e C), 'correspondendo estes a níveiS remuneratórios progressivamente mais elevados (cfr. Anexo II A junto ao AE).
Do mesmo modo, a passagem de um trabalhador para um nível de desenvolvimento superior não é automática, sendo feita atendendo a um conjunto de critérios base pré-definidos, entre os quais se encontram as habilitações académicas ou a experiência profissional comprovada.
A categoria que foi/está atribuída aos AA. é a de técnico de gestão de emissão, a qual comporta três níveis de desenvolvimento distintos.
Apesar de terem iniciado uma nova carreira profissional, inserida numa área
diferente, o que os Recorridos vieram aqui peticionar (e que o Tribunal a quo ratificou) foi, precisamente, o enquadramento no nível de desenvolvimento mais elevado dessa categoria, logo desde o primeiro dia em que começaram a desempenhar essas novas funções.
Facilmente se percebe que esta circunstância já seria suficiente para, pelo menos, interrogar o sentido da sentença recorrida. Não faz sentido que alguém que entra numa nova carreira, em relação à qual terá sempre de existir um período de adaptação (sendo certo que, no caso do A., até ficou demonstrada a existência de um período de experiência de 3 meses), bem como uma prática consolidada no exercício dessas mesmas funções para poder justificar a progressão nessa nova carreira e categoria, seja colocado, logo de início, no patamar mais elevado dessa mesma categoria.
E, acrescente-se, o âmbito genérico das funções exercidas não pode ser o
único critério atendível para concluir por determinando enquadramento de um trabalhador.
Tal como consta do n.º 2 da clã 12.4 do AE aplicável à R. (publicado no BTE n.° 36, de 29/9/2015), A evolução profissional de um trabalhador para um nível de desenvolvimento superior (...) terá em consideração um conjunto de critérios base pré-definidos, designadamente (...) o reconhecimento do desempenho como consistente e significativo...
Por conseguinte, resulta evidente que este requisito não foi atendido pelo Tribunal a quo: será possível reconhecer que um determinado desempenho é consistente e significativo logo no primeiro dia em que os AA. começaram a exercer funções correspondentes à categoria profissional de técnico de gestão de emissão? Claro que não.
Aliás, como decorreu da prova produzida em sede de julgamento, os AA. até foram colocados num nível de desenvolvimento superior ao inicial (isto é, no 2), não por causa das concretas funções exercidas, mas única e exclusivamente para não passarem a auferir uma remuneração inferior àquela que detinham na categoria anterior.
Ora, colocá-los ainda num patamar mais acima, desde o início (isto é, no nível de desenvolvimento 3), corresponde a uma espécie de per saltum que não se poderá admitir por contrário aos princípios fundamentais de direito.
Decidindo desta forma a sentença violou, desde logo, o n.2 2 da cláusula 12.4 do AE aplicável à R. Mas mais: também não se poderá afirmar, ao contrário do que é entendimento plasmado na sentença, que os AA. têm fundamento para reclamar o enquadramento no nível de desenvolvimento 3 da categoria de técnico de gestão de emissão, por invocação do princípio, de matriz constitucional, trabalho igual, salário igual [art.° 59.º, n.º1, al. a) da CRP] e que encontra algumas concretizações legais, designadamente, nos art.° 23.2 e 24.2 do CT.
É verdade que ficou demonstrado que o colega de trabalho dos AA., Sr. JT..., desempenha atualmente funções iguais ou, pelo menos, semelhantes às dos AA. e ainda que se encontra enquadrado no nível de desenvolvimento 3 da categoria de técnico de gestão de emissão.
Contudo, JT... tem, inequivocamente, um percurso na R. bem distinto dos AA. JT... transitou para o nível 3 em 20,38 mas, antes disso, já estava no nível de desenvolvimento 2, escalão A, desta mesma categoria. Já lhe tinha sido atribuída a categoria de técnico de gestão de emissão em 2005 e pelo menos desde 1990 que vem desenvolvendo funções semelhantes, nesta área da emissão, ainda que sob as vestes de categorias profissionais com designações um pouco diferentes, tais como supervisor de emissão e regente de emissão. Resulta pois, que a experiência profissional e o tempo de exercício do trabalhador JT... nestas funções é totalmente diferente da dos AA.
Aliás, mesmo considerando apenas. o. momento em que JT... foi enquadrado no nível de desenvolvimento 3 da categoria de técnico de gestão de emissão, é mais do que evidente que já tinha um passado, uma experiência e um tempo de serviço nestas mesmas funções completamente diferente dos AA., na altura em que lhes fOi atribuída esta categoria (2013 e 2016).
É certo que a sentença recorrida ainda aflora este aspeto, em especial no segmento decisório em que assinala que «Não se ignora que este outro trabalhador está colocado no ND III desde i de janeiro de 2008, exercendo as funções inerentes a esta categoria profissional, em termos absolutos, há mais tempo que os Autores». No entanto, um pouco mais adiante, fica patente um dos principais erros que, com o devido respeito, a inquina decisivamente: «... não se apura desde quando, em concreto, este terceiro técnico de gestão de emissão exerce tais funções, ficando por esclarecer, como tal, se no momento em que foi integrado no ND III - porque é essa a referencia temporal A ser atendida - era, ou não, mais experiente (mais preparado, mais apto) do que os Autores no momento em que assumiram as mesmas tarefas.».
Com efeito, se este trabalhador já exercia este tipo de funções pelo menos desde 1990, se até já tinha a mesma categoria profissional (técnico de gestão de emissão) desde 2005, como poderá questionar-se se, em 2008, quando transitou para o nivel de desenvolvimento 3, JT... era mais experiente, no desempenho destas funções, do que os AA. quando foram reclassificados em técnicos de gestão de emissão (em 2013 e 2016, respetivamente)?
A este propósito, remete-se para o teor do Acórdão da Relação de Lisboa de 16/11/2016, proferido no processo n.º 12007/15.9T8LSB.L1-4, disponível em www.dgsi.pt, o qual sintetiza, nos segmentos transcritos, o sentido que deveria ter norteado a decisão proferida pelo Tribunal recorrido: «Assim e apesar de o núcleo funcional do A. e dos demais trabalhadores com os quais se compara ser, em tudo, idêntico, existem fatores objetivos que justificam a ausência de paralelismo retributivo que, a existir, então sim, seria violador do princípio da igualdade, por se tratarem situações materialmente distintas - em termos de antiguidade, progressão, escalão salarial de origem, experiência - de forma uniforme. (...) Isso não significa, todavia, como se escreveu no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 313/89, de 9.3.89, proferido no processo n.2 265/88, da 2.ª Secção, que aquele princípio proíba que o mesmo tipo de trabalho seja remunerado em termos quantitativamente diferentes, conforme seja feito por pessoas com mais ou menos habilitações e com mais ou menos tempo de serviço, pagando-se mais, naturalmente, aos que maiores habilitações possuem e mais tempo de serviço têm. O que aquele princípio proíbe, diz-se naquele acórdão, é que se pague de maneira diferente a trabalhadores que prestam o mesmo tipo de trabalho, têm iguais habilitações e o mesmo tempo de serviço. O que se proíbe são as discriminações, as distinções sem fundamento material, designadamente porque assentes em meras categorias subjetivas. Se as diferenças de remuneração assentarem em critérios objetivos, então elas são materialmente fundadas e não discriminatórias (...) E, como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, este princípio não significa uma igualdade absoluta em todas as circunstâncias, nem impede que possa haver, justificadamente, tratamento diferenciado, ou seja, que a diferenciação de tratamento se mostre legitimada sempre que se baseie numa diferenciação objetiva (...) Por isso se pode dizer que o princípio da igualdade retributiva não é um princípio massificador, mas uma mera projeção da equidade (...) E no art.° 28° depois de assegurar a igualdade de condições de trabalho, em especial quanto à retribuição, refere, no n2 2, o seguinte: as diferenciações retributivas não constituem discriminação se assentes em critérios objetivos, sendo admissíveis, nomeadamente, distinções em função do mérito, produtividade, assiduidade ou antiguidade dos trabalhadores (...) É desta situação que emergem as diferenças retributivas entre o Recorrente e os trabalhadores com quem se compara, CC, DD e EE, verificando-se, assim, existirem fatores objetivos de diferenciação, nomeadamente a maior antiguidade na empresa e no exercício das funções de animador de equipa de máquinas, que se repercutem necessariamente na quantidade e qualidade do trabalho desenvolvido.»
Tendo em conta o exposto, é manifesto que a sentença recorrida violou, nomeadamente, os artigos 59.2, n.2 1, alínea a) da Constituição da República Portuguesa, bem como os artigos 24.2, n.9 1 e 2, alínea c), 25.2, n.2 1 e 23.2, alíneas c) e d) do CT. O Tribunal a quo desconsiderou a existência de fatores (tais como o tempo de desempenho destas funções), que não só legitimariam como até'
imporiam uma decisão bem distinta. A sentença recorrida acaba por produzir, ela própria, o resultado que pretenderia evitar a criação de urna verdadeira situação de desigualdade salarial (do Sr. JT... em relação aos AA.) -, ao tratar de forma uniforme situações materialmente diferentes, colocando - injustificada-mente - os AA. no mesmo patamar salarial do colega JT..., com pelo menos mais 20 anos do que os AA. no exercício deste tipo de funções.

Vejamos.
Dispõe o art.° 59º, n.º 1, alínea a), da Constituição da República, relativo aos direitos dos trabalhadores, que «todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito»: «a) ,à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna».
Trata-se de um afloramento do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Lei Fundamental, nos termos do qual, «todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei» e «ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou Orientação sexual», no que toca à igualdade salarial.
É claro que o princípio da igualdade «não impede diferenças remuneratórias entre trabalhadores mas apenas um tratamento remuneratório discriminatório. Por outras palavras, apenas estão aqui contempladas as situações em que, perante um trabalho igual ou de valor igual, a retribuição seja diferente sem uma causa de justificação objetiva» (cfr. Maria do Rosário da Palma Ramalho. Direito do Trabalho - Parte II - Situações Laborais Individuais, Almedina, 3.R Edição).
O Código do Trabalho estabelece que deve ter-se em conta a quantidade, natureza e qualidade do trabalho, observando-se o princípio de que, para trabalho igual ou de valor igual, salário igual (art.° 270.2)
Por seu lado o artigo 24.2, sob a epígrafe Direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho) dispõe:
1 - O trabalhador ou candidato a emprego tem direito a igualdade de oportunidades e de tratamento no que se refere ao acesso ao emprego, à formação e promoção ou carreira profissionais e às condições de trabalho, não podendo ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão, nomeadamente, de ascendência, idade, sexo, orientação sexual, identidade de género, estado civil, situação familiar, situação económica, instrução, origem ou condição social, património genético, capacidade de trabalho reduzida, deficiência, doença crónica, nacionalidade, origem étnica ou raça, território de origem, língua, religião, convicções políticas ou ideológicas e filiação sindical, devendo o Estado promover a igualdade de acesso a tais direitos.
2 - O direito referido no número anterior respeita, designadamente: a), b (...);
c) A retribuição e outras prestações patrimoniais, promoção a todos os níveis hierárquicos e critérios para seleção de trabalhadores a despedir;
d) (...).
3, 4, 5 - (...)»
Densificando a noção de discriminação, o art.° 25 estipula:
1- O empregador não pode praticar qualquer discriminação, direta ou indireta, em razão nomeadamente dos fatores referidos no n.°1 do artigo anterior.
2 - Não constitui discriminação o comportamento baseado em facto de discriminação que constitua um requisito justificável e determinante para o exercício da atividade profissional, em virtude da natureza da atividade em causa ou do contexto da sua execução, devendo o objetivo ser legítimo e o requisito proporcional.
3 - São nomeadamente permitidas diferenças de tratamento baseadas na idade que sejam necessárias e apropriadas à realização de um objetivo legítimo, designadamente de política de emprego, mercado de trabalho ou formação profissional.
4 - As disposições legais ou de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho que justifiquem os comportamentos referidos no número anterior devem ser 'avaliadas periodicamente e revistas se deixarem de se justificar.
5 - Cabe a quem alega discriminação indicar o trabalhador ou trabalhadores ein relação a quem se considera discriminado, incumbindo ao empregador provar que a diferença de tratamento não assenta em qualquer fator de discriminação.
6 - O disposto no número anterior é designadamente aplicável em caso de invocação de qualquer prática discriminatória no acesso ao trabalho ou à formação
Profissional ou nas condições de trabalho nomeadamente por motivo de dispensa para
consulta pré-natal, proteção da segurança e saúde de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante, licenças Dor parentalidade ou faltas para assistência a menores.
7 - É inválido o ato de retaliação que prejudique o trabalhador em consequência de rejeição ou submissão a ato discriminatório.
8 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto nos n.°s 1 ou 7.» Enfim, o art.° 23.°, sob a epigrafe Conceitos em matéria de igualdade e não discriminação, dispõe que:
1- Para efeitos do presente Código, considera-se:
a) Discriminação 'direta, sempre que, em razão de um fator de discriminação, uma pessoa seja sujeita a tratamento menos favorável do que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável;
b) Discriminação indireta, sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutro seja suscetível de colocar uma pessoa, por motivo de um fator de discriminação, numa posição de desvantagem comparativamente com outras, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objetivamente justificado por um fim legítimo e que os meios para o alcançar sejam adequados e necessários;
c) Trabalho igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são iguais ou objetivamente semelhantes em natureza, qualidade e quantidade;
d) Trabalho de valor igual, aquele em que as funções desempenhadas ao serviço do mesmo empregador são equivalentes, atendendo nomeadamente à qualificação ou experiência exigida, às responsabilidades atribuídas, ao esforço físico e psíquico e às condições em que o trabalho é efetuado.
2 - Constitui discriminação a mera ordem ou instrução que tenha por finalidade prejudicar alguém em razão de um fator de discriminação.»
Discutindo-se nos autos a categoria, há que notar que esta noção não é unívoca, existindo várias.
Com efeito, já o Dr. António Nunes de Carvalho apontava, no estudo sobre a categoria profissional que constituiu a sua tese de mestrado, Das Carreiras Profissionais no Direito do Trabalho, aliás realizada no tempo da LCT, que a categoria pode significar as aptidões técnico-profissionais ou as habilitações do trabalhador; o conjunto de funções para as quais ele foi contratado - ao qual corresponde, eventualmente, uma certa posição na organização patronal ou um posto de trabalho constante do respetivo quadro; o feixe de tarefas que o prestador de trabalho efetivamente executa; um certo perfil profissional definido na convenção coletiva aplicável e que se traduz num específico tratamento remuneratório; ou, ainda, uma posição singular no mercado do trabalho (pag. 70). Mais adiante acrescenta: o traço comum ... é constituído pela existência de uma conexão entre um trabalhador (ou um grupo de trabalhadores) e uma função (ou núcleo de funções) (pag. 75).
Há desde logo que distinguir a categoria subjetiva, que corresponde às aptidões especificas ou qualidades do trabalhador, da categoria contratual, que traduz o amplo conjunto de funções, dentro da organização do empregador, para cujo exercício o trabalhador foi contratado, da categoria real ou objetiva, correspondente ao conjunto de atividades, sitas dentro do leque maior da categoria contratual, que empregador irá requerer ao trabalhador, e, ainda, da categoria normativa, que consiste na subsunção das funções efetivamente exercidas a uma dás categorias descritas na convenção coletiva e às quais corresponde uma especifica posição salarial
O conjunto de serviços e tarefas que formam o objeto da prestação laboral define a posição do trabalhador na organização produtiva em que se integra. Esta posição corresponde à sua categoria, e consubstancia o estatuto que tem nessa organização, determinado normativamente em conformidade com a natureza e espécie das tarefas concretamente desempenhada na prestação da sua atividade. Daqui decorre que a sua categoria profissional é composta pelas realidades, factual e jurídica, correspondentes à categoria-função ou categoria contratual, e à categoria-estatuto ou categoria normativa.
A categoria-função corresponde ao essencial das funções a que o trabalhador se obrigou via contrato laborai, determinando-se qualitativamente a prestação de trabalho. A categoria-estatuto traduz o núcleo de direitos garantidos àquele complexo de funções pela lei e pelos instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho. Redunda na designação dada nas fontes a certa situação laborai a fim de lhe associar a aplicação de diversas normas; resulta da categoria-função, ou seja, de um juízo de integração do trabalhador nessa categoria.
A categoria profissional é vinculativa para o empregador e deve ser efectiva e reconhecida (correspondendo a real à contratual).
Desempenhando funções de mais do que de uma categoria o trabalhador deve ser integrado naquela que mais se aproxime das funções efetivamente exercidas e que não o prejudique atenta a natureza, dignidade e hierarquia da sua categoria função.
Pois bem.
É fundamental, para apreciar a questão posta pela R., a sua argumentação de que a categoria que foi/está atribuída aos AA. é a de técnico de gestão de emissão, a qual comporta três níveis de desenvolvimento distintos.
Esta é também a categoria de JT....
Mas enquanto o JT... tem o nível de desenvolvimento 3, acordado desde janeiro de 2008, os AA. estão, respetivamente, com o nível 2B (ARA…) e 2 A (JAF…).
Neste ponto, diz a R. que o princípio salário igual trabalho igual não implica que os trabalhadores estejam todos em situação de plena igualdade.
Do que se escreveu já resulta o nosso assentimento em tese geral: a lei laboral admite diferenciações, desde que justificadas. Por ex. em face da formação académica (com um licenciado a auferir mais do que um trabalhador com o ensino médio) ou da antiguidade (sendo que as diuturnidades refletem exatamente na retribuição essa diferenciação, cfr. art.° 262, n.° 2, al. b) do CT: 2 - Para efeito do disposto no número anterior, entende-se por (...) b) Diuturnidade, a prestação de natureza retributiva a que
o trabalhador tenha direito com fundamento na antiguidade. Há, com efeito, razões para estas diferenciações, ainda que na prática a atividade possa coincidir: no primeiro,
o empregador beneficia da disponibilidade de uma mão-de-obra dotada de maior formação académica, à partida mais adaptável a alterações tecnológica e organizativas num tempo como o atual de mudança; na antiguidade, a diferenciação salarial, recompensando a experiencia, leva a que os mais velhos deixem de ver os novos como concorrentes perigosos, em face da sua maior disponibilidade e pujança física e mental e promove a transferência de conhecimentos decorrentes daquela mesma experiencia.
No caso, a R. posiciona a diferença de níveis no âmbito das diferenciações justificadas.
É exatamente isto que importa verificar.
Como nota a decisão recorrida, a cláusula n do Acordo Coletivo de Trabalho (Acordo de Empresa celebrado entre a RRR..., S. A., e o STT — TCA... e outros) publicado no BTE, -1.ª S., n.º 16 de 29.04.06, com as alterações publicadas no BTE, lª S., 23/2009, de 22.o6-.08; -dispõe que “1- Os trabalhadores abrangidos por este acordo exercem as funções correspondentes à função tipo/categoria e nível de desenvolvimento em que estão integrados.
Do anexo II-A do IRCT publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 27, 22/7/2009, vê-se que os níveis de desenvolvimento levam ao exercício das correspondentes a funções. Por exemplo, no caso de Técnico de Comunicações Nível de Desenvolvimento I temos que realiza trabalho variado, segundo planos, inerente à conservação, transporte, montagem e desmontagem dos diferentes recursos técnicos que opera. Possui conhecimentos específicos para identificar e efetuar pequenas reparações e ensaio dos equipamentos de comunicações. Pode, sob orientação, operar os sistemas de telecomunicações e os equipamentos . destinados à captação,,, tratamento, comutação, registo e reprodução de sinais de vídeo e áudio. EXige-se-lhe, como formação e conhecimentos, o Curso Tecnológico de Eletrotecnia/Eletrónica ou Curso Profissional de Eletrónica e Automação ou 122 ano (Curso Geral de Ciências e Tecnologias). Formação profissional adequada.
Já no que concerne a Técnico de Comunicações Nível de Desenvolvimento III, a descrição das suas tarefas é:
Realiza trabalho técnico de forma a garantir a exploração operaCional dos meios e equipamentos de telecomunicações. Garante a operacionalidade dos equipamentos com base em critérios de prevenção e no âmbito do diagnóstico efetuado aos equipamentos e sistemas. Possui conhecimentos técnicos para proceder à análise de esquemas, desenhos e especificações técnicas e elaborar relatórios técnicos. Pode coordenar meios técnicos e equipas de trabalho.
E a formação que lhe assiste é:
Formação superior em Eletrónica e Telecomunicações ou formação superior equivalente. Formação profissional adequada.
Vejamos agora o caso dos AA e do JT..., de acordo com o quadro constante do referido anexo II-A.
Função
Tipo /
Categoria Técnico de Gestão de Emissão Área de Conhecimento:
Produção de Programas
Âmbito Funcional: Opera diferentes tecnologias e sistemas audiovisuais. Estuda e planeia os alinhamentos finais da emissão de acordo com os mapas diários de programação e é o responsável pela condução das emissões. Níveis de Desenvolvimento:
NDi.
NI32
ND3

Nível de Desenvolvimento Descrição Formação e Conhecimentos
Técnico Realiza trabalho variado, segundo planos, para assegurar a Cursos Profissio
de Gestão operação de todos os equipamentos inerentes à régie de nais de Audiovi
de emissão, cumprindo os alinhamentos e dando forma final às suais e Produção
Emissão emissões, garantindo-lhes coerência e continuidade, de dos Media ou 12
acordo com as normas técnicas e de programação. Possui ano (Curso Geral
Nível de conhecimentos técnico-funcionais para tomar as medidas de Artes do Es
Desenvolv operacionais adequadas perante alterações ou anomalias, face petáculo - prefe
imento I nomeadamente a uma listagem de promoções e acertos, assegurando, desta forma, a condução da emissão. Procede à rencial). Forma
ção profissional
transferência de fluxos de conteúdos entre servidores na
aquisição, registo, arquivo e reprodução de informação. adequada.
Elabora relatórios técnicos.
Técnico Realiza trabalho técnico de planeamento e controlo de Cursos Profissio
de Gestão qualidade das atividades operacionais de todos os canais. nais de Audio
de Gere os espaços de memória em servidor. Possui visuais e Produ
Emissão conhecimentos específicos para proceder à identificação e ção dos Media
análise de anomalias, bem como apresentar soluções e ou 122 ano (Curso
Nível de sugestões para melhorar o desempenho funcional da régie de Geral de Artes do
Desenvolv emissão. Na régie de uma só emissão é o responsável pelo Espetáculo -
imento II planeamento, elaboração e execução de tarefas de elevada preferencial).
responsabilidade, podendo, nomeadamente, tomar as Formação profis
medidas adequadas por forma a assegurar as estratégias próprias definidas para a emissão. Pode coordenar equipas de trabalho por delegação de competências. sional adequada.
Realiza trabalho técnico consubstanciado na definição das prioridades e fluxos de trabalho mediante necessidades de emissão com recurso a otimização dos meios existentes. É responsável pelo planeamento e execução de tarefas .de elevada responsabilidade; por delegação de competPn cias Possui domínio de conhecimentos técnicos para, em conformidade com as linhas orientadoras traçadas pela Direção de Programas, tomar as medidas adequadas perante alterações e anomalias, assegurando as estratégias próprias definidas para cada uma das Emissões, Coordena toda a atividade técnico-operacional inerente ao bom funcionamento do Centro de Produção de Emissão. Coordena equipas de trabalho.
Afigura-se-nos que este ponto responde à questão dos autos. O nível III não tem um conteúdo abstrato do ponto de vista funcional, que permita a diferenciação da situação dos trabalhadores dentro da categoria; tem antes um conteúdo concreto, abrangendo funções bem definidas.
Sendo assim, não é possível, dentro deste quadro, estabelecer distinções retributivas e funcionais com fundamento designadamente na antiguidade maior ou menor do trabalhador: exercendo as mesmas tarefas, dedicando-se às mesmas atividades, se elas correspondem, corno é o caso, ao nível de desenvolvimento III, os trabalhadores têm de ser classificados com esse nível, com todas as consequências. Estabelecer distinções de níveis entre trabalhadores que têm as mesmas funções não é razoável, quer dizer, não é compreensível aos olhos de um homem médio, que não logrará entender porque à 3 níveis de atividade, os trabalhadores desempenham todos as atividades do mesmo nível e ainda assim estão classificados de forma diferente.
Não se objetar que concluir nestes termos é dar por não dito aquilo que aceitámos acima, que à face da lei são admissíveis diferenciações entre trabalhadores que até podem executar as mesmas tarefas. Não é a mesma coisa: são admissíveis distinções para as quais se encontram motivos razoáveis, pertinentes, enfim, que têm uma razão de ser compreensível e portanto não são discriminatórios. Não é este o caso, embora a R. tente situar nesses termos a discussão, esgrimindo desde logo com a antiguidade do JT.... É que esta antiguidade poder-se-ia refletir, compreensivelmente, em sede de diuturnidades; mas aqui vai-se mais longe, recusando reconhecer o nível em que eles prestam a atividade. Ali haveria uma compreensível distinção quantitativa, compensadora da antiguidade, promotora da transmissão de conhecimentos e experiencias do mais velho para os mais novos; aqui (no não reconhecimento do nível), há uma diferenciação para a qual não se encontra fundamento, que choca contra o teor do dito anexo do IRCT e que recusa reconhecer - mal - que dois trabalhadores desempenham a mesma atividade, nas mesmas condições, do que um terceiro, classificado - e bem - num nível superior.
E não se vê que os critérios indicados pela recorrente tenham sido acolhidos no IRCT ou em qualquer normativo com vista a diferenciar trabalhadores que materialmente exercem as mesmas atividades, classificando-os noutro nível.
Destarte, não vislumbramos que o Tribunal recorrido tenha feito agravo à recorrente, ao concluir existir uma desigualdade intolerável e ao condená-la nos termos em que o fez.

DECISÃO
Pelo exposto, o Tribunal julga improcedente o recurso e confirma a sentença recorrida.
Custas da ação e do recurso pela R.
Lisboa, 20 de novembro de 2019
Sérgio Almeida
Francisca Mendes
Celina Nóbrega
I. Não há discriminação retributiva, nem violação do princípio trabalho igual salário igual, quando a diferença se funda em razões objetivas, como quando o trabalhador prestar trabalho de diferente natureza, quantidade e qualidade do que as colegas com a mesma categoria, ou, prestando a mesma atividade, tem mais antiguidade, refletida em diuturnidades.
II. Mas existe discriminação quando, prestando a mesma atividade, a empregadora não lhe reconhece o nível da categoria correspondente, e o classifica num nível inferior.
Sumário do relator, art.° 653/7, CPC