I -O STJ tem afirmado, de modo constante, que a suspensão da execução da pena deverá ter na sua base uma prognose favorável aos arguidos, a esperança de que eles sentirão a sua condenação como uma advertência e que não cometerão no futuro nenhum outro crime. II - Contudo, antes de se partir para a avaliação desse juízo de prognose – que se prende essencialmente com a personalidade e o modo de vida evidenciados pelos arguidos –, há que verificar, caso a caso, se a suspensão da pena salvaguarda as demais e não menos importantes finalidades das penas, quais sejam as de reafirmar a necessidade da existência da norma punitiva e as de prevenção geral, sem ignorar, ainda, as de prevenção especial, que, respeitando embora, na sua essência, à visada ressocialização dos agentes, podem até requerer estadias mais ou menos prolongadas em estabelecimento prisional, no fito de isso mesmo contribuir para uma adequada reflexão sobre o mal causado à sociedade, permitindo, pela via de uma real interiorização, uma efectiva reeducação, sem significativo risco de recaída. III - Assim, a suspensão da execução da pena nos casos de tráfico comum e de tráfico agravado de estupefacientes, em que não se verifiquem razões ponderosas para uma atenuação extraordinária da pena, tem de ser encarada como absolutamente excepcional, pois se afigura incompatível, de raiz, com a necessidade estratégica nacional e internacional de combate a esse tipo de crime, defraudando as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e não servindo, desde logo, os imperativos de prevenção geral.
Proc. n.º 313/03.0JABRG.S1 -5.ª Secção
Soares Ramos (relator, por vencimento)
Arménio Sottomayor (com voto de vencido, entendendo que “… deveria o processo ser
enviado à Relação para novo julgamento do recurso de acordo com a mat
I -A corrente largamente maioritária no STJ é a de que o cúmulo jurídico deve incluir todas as penas de prisão, independentemente de terem sido, ou não, declaradas suspensas. II - A lei nova só pode ser aplicada retroactivamente em detrimento da lei vigente à data dos factos se se mostrar concretamente mais favorável ao arguido e, numa situação em que tenha ocorrido alteração da lei penal, o tribunal tem de indagar qual dos regimes, globalmente considerados, é o que se revela concretamente mais favorável ao agente, se o contemporâneo da prática dos factos, se o que lhe sucedeu – o que implica necessariamente o confronto das concretas consequências jurídicas da aplicação ao caso de uma e da outra lei, operação esta que terá de ficar registada na decisão, como imprescindível fundamentação da opção tomada. III - Não tendo feito esse exercício demonstrativo de qual é o regime mais favorável ou não evidenciando tê-lo feito, a respectiva decisão padece de nulidade, por falta de fundamentação e/ou por omissão de pronúncia IV -O tribunal que, ao englobar em cúmulo jurídico uma pena suspensa, sem averiguar se a mesma está extinta ou foi revogada deixa de se pronunciar sobre questão que era obrigado a conhecer, o que integra nulidade por omissão de pronúncia, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 2.º, n.º 4, do CP, e 379.º, n.º 1, al. c), do CPP.
Proc. n.º 254/03.0JACBR.S1 -3.ª Secção
Sousa Fonte (relator) (“vencido, como relator, quanto à matéria do ponto 3.2. por
continuar a entender que penas de prisão suspensas na sua execução não podem integrar a
formação de cúmulo
I -No que diz respeito à indemnização pelo dano morte, a Portaria 377/2008, de 26-05, tem um âmbito institucional específico de aplicação extrajudicial, sendo que, por outro lado, e, pela natureza do diploma que é, não derroga Lei ou DL, situando-se em hierarquia inferior, pelo que o critério legal necessário e fundamental, em termos judiciais, é o definido no CC. II - À míngua de outro critério legal, na determinação do concernente quantum compensatório importa ter em linha de conta, por um lado, a própria vida em si, como bem supremo e base de todos os demais. E, por outro lado, conforme os casos, a vontade e a alegria de viver da vítima, a sua idade, a saúde, o estado civil, os projectos de vida e as concretizações do preenchimento da existência no dia a dia, designadamente a sua situação profissional e sócio-económica. III - Tendo em conta que: -o acidente de viação ocorreu em 01-05-07; -o falecido encontrava-se a trabalhar como engenheiro informático, a exercer funções de desenvolvimento de “software”; concluiu com sucesso um curso na Oracle University; -à data do seu falecimento a vítima auferia mensalmente a quantia de € 1450, a título de vencimento base, acrescida da importância diária de € 6,05 a título de subsídio de refeição; -faleceu com 33 anos de idade; -era um amigo muito dedicado a todos os seus amigos, que o estimavam e admiravam; -era doador de sangue e encontrava-se inscrito para doar medula óssea; -possuía uma cultura geral acima da média e interessava-se sobre uma variedade enorme de assuntos; -praticava frequentemente natação e corrida; -tinha uma relação muito próxima com o demandante, seu filho único, existindo entre ambos um entendimento profundo e muito afectivo; -era o melhor amigo do demandante; -apoiava e orientava em tudo o demandante, acompanhando-o na evolução do ensino, dedicando-lhe todos os tempos livres e aproveitando por inteiro todo o tempo que o regime de visitas estipulado na regulação do poder paternal lhe permitia aproveitar; -dava assistência ao demandante em relação aos seus estudos e actividades escolares, entende-se adequada a indemnização pelo dano morte de € 60 000. IV - O âmbito da prestação de alimentos devida a filho menor da vítima abrange as despesas com a saúde e com a educação, que seriam a suportar pelo progenitor se não tivesse falecido, e traduzem um dano advindo da sua privação pelo falecimento do progenitor, e deve atender ao momento da sua maioridade ou emancipação, sem prejuízo da prestação alimentar e referidas despesas continuarem a ser suportadas pela demandada Companhia de Seguros após a maioridade ou emancipação do demandante, nos termos do art. 1880.º do CC, caso o interessado o requeira demonstrando os respectivos pressupostos.
Proc. n.º 205/07.3GTLRA.C1 -3.ª Secção
Pires da Graça (relator)
Raul Borges
I -O STJ não pode conhecer de facto novo invocado apenas no recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação. II - Não há critérios legais para fixar a percentagem a “descontar” ou a “abater” ao capital correspondente ao montante indemnizatório relativo a danos futuros recebido de imediato e de uma só vez, pelo que tal deve ser efectuado com recurso à equidade, parecendo justa a percentagem de cerca de 30%. III - O recebimento imediato de todo o capital correspondente a despesas relativas a próteses não deve dar lugar a qualquer abatimento ou desconto, pois as vantagens do recebimento imediato e duma só vez são “compensadas” ou “eliminadas” pelo previsível aumento dos custos da renovação e da substituição da referida prótese, ao longo dos anos (atendendo à esperança de vida de 39 anos). IV - Relativamente aos danos não patrimoniais próprios, há que ter em atenção que a indemnização pelos danos não patrimoniais visa, simultaneamente, compensar o lesado e sancionar o lesante. V - Salvo caso de manifesto arbítrio na fixação da indemnização, o STJ não pode sobrepor-se ao Tribunal da Relação na apreciação do quantum indemnizatório por esta julgado equitativo. VI - Há que ter em conta que a indemnização por danos não patrimoniais tem de assumir um papel significativo, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação”, não se compadecendo com a atribuição de valores meramente simbólicos, nem com miserabilismos indemnizatórios. VII - No caso de lesões que revestem inequívoca gravidade – delas resultou, nomeadamente, uma incapacidade genérica permanente parcial de 71,5%, a amputação do membro inferior esquerdo, a claudicação por inadaptação à prótese do referido membro e o uso externo de uma canadiana, um dano estético de grau 5, numa escala de 1 a 7, o quantum doloris de grau 6, numa escala de 1 a 7, e a impossibilidade definitiva de jogar futebol, actividade de lazer a que se dedicava –, afigura-se justa a indemnização de € 75 000 arbitrada quanto a danos não patrimoniais próprios.
Proc. n.º 1145/05.6TAMAI.C1 -3.ª Secção
Fernando Fróis (relator)
Henriques Gaspar
I -Ao instituto de revisão de sentença penal, com consagração constitucional, subjaz o propósito da reposição da verdade e da realização da justiça, verdadeiro fim do processo penal. II - O princípio res judicata pro veritate habetur não pode obstar a um novo julgamento, quando posteriores elementos de apreciação põem seriamente em causa a justiça do anterior. O direito não pode querer e não quer a manutenção de uma condenação, em homenagem à estabilidade de decisões judiciais, à custa da postergação de direitos fundamentais dos cidadãos. III - A circunstância de os factos alegados pelo recorrente – matrimónio e nascimento do filho – terem sido ponderados no acórdão revidendo afasta a conclusão de que se esteja perante novo facto ou meio de prova. IV - Não pugnando o recorrente pela sua absolvição, mas apenas pela revogação da pena acessória de expulsão em que foi condenado, verifica-se uma mera discordância em relação ao que foi decidido, sem qualquer novidade em termos de factos ou meios de prova, o que não integra fundamento legal de revisão de sentença.
Proc. n.º 779/05.3GBMTA-D.S1 -3.ª Secção
Oliveira Mendes (relator)
Maia Costa
Pereira Madeira
I -A razão de ser da agravação por via da al. h) do art. 24.º do DL 15/93, por efeito da conduta integrante haver tido lugar em estabelecimento prisional reside na perturbação do processo de ressocialização dos reclusos e no grave transtorno da ordem e organização das cadeias que o tráfico comporta. Os estabelecimentos prisionais face aos inevitáveis problemas e questões que a clausura gera, estados de depressão e inactividade dos reclusos, concentração e massificação das pessoas, conflitos pessoais, carências afectivas, sentimentos de frustração, perda de auto-estima, são particularmente propícios ao consumo de estupefacientes e, consequentemente, constituem um dos alvos prioritários dos traficantes. II - Sendo essa a razão de ser daquela agravante modificativa, e não o desrespeito pela autoridade do Estado, a mesma só deverá funcionar perante comportamentos através dos quais se haja processado a difusão de substâncias estupefacientes pelos estabelecimentos prisionais ou, pelo menos, face a condutas potenciadoras desse perigo. III - No caso de mera detenção, por parte de recluso, de pequenas quantidades de heroína e de canabis, sendo o arguido consumidor de substâncias estupefacientes, não se pode configurar a existência de difusão ou perigo de difusão da droga pelos reclusos, havendo que afastar a aplicabilidade da al. h) do art. 24.º do DL 15/93. IV - O crime de tráfico de menor gravidade, previsto no art. 25.º do DL 15/93, como a sua própria denominação legal sugere, caracteriza-se por constituir um minus relativamente ao crime matricial, ou seja, ao crime do art. 21.º do DL 15/93. V - Trata-se de um facto típico cujo elemento distintivo do crime tipo reside, apenas, na diminuição da ilicitude do facto, redução que o legislador impõe seja considerável, indicando como factores aferidores de menorização da ilicitude do facto, a título meramente exemplificativo, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção e a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. VI - É a partir do tipo fundamental, concretamente da ilicitude nele pressuposta, que se deve aferir se uma qualquer situação de tráfico se deve ou não qualificar como de menor gravidade. VII - Para além das circunstâncias atinentes aos factores de aferição da ilicitude indicados no texto do art. 25.º do DL 15/93, há que ter em conta todas as demais circunstâncias susceptíveis de interferir na graduação da gravidade do facto, designadamente as que traduzam uma menor perigosidade da acção e/ou desvalor do resultado, em que a ofensa ou o perigo de ofensa aos bens jurídicos protegidos se mostre significativamente atenuado, sendo certo que para a subsunção de um comportamento delituoso (tráfico) ao tipo privilegiado do art. 25.º do DL 15/93, torna-se necessária a valorização global do facto, tendo presente que o legislador quis aqui incluir os casos de menor gravidade, ou seja, aqueles casos que ficam aquém da gravidade justificativa do crime tipo, o que tanto pode decorrer da verificação de circunstâncias que, global e conjuntamente sopesadas, se tenham por consideravelmente diminuidoras da ilicitude do facto, como da não ocorrência (ausência) daquelas circunstâncias que o legislador pressupôs se verificarem habitualmente nos comportamentos e actividades contempladas no crime tipo, isto é, que aumentam a quantidade do ilícito colocando-o ao nível ou grau exigível para integração da norma que prevê e pune o crime tipo. VIII - No caso concreto, face à mera detenção dos estupefacientes, a pequena quantidade detida e o facto de o arguido ser consumidor, entende-se qualificar os factos como tráfico de menor gravidade. IX - A culpa como expressão da responsabilidade individual do agente pelo facto e como realidade da consciência social e moral, fundada na existência de liberdade de decisão do ser humano e na vinculação da pessoa aos valores juridicamente protegidos (dever de observância da norma jurídica), é o fundamento ético da pena e, como tal, seu limite inultrapassável. X - Dentro deste limite a pena é determinada dentro de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico, só então entrando considerações de prevenção especial, pelo que dentro da moldura de prevenção geral de integração, a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa ou de intimidação ou segurança individuais. XI - Considerando que: -o arguido tem 29 anos de idade; -abandonou a escola com 16 anos, com o 9.º ano de escolaridade; -trabalhou como pedreiro, estabelecendo-se em oficina própria; -casou com 23 anos de idade; -em Setembro de 2005 separou-se em resultado da sua situação de consumidor de substâncias estupefacientes; -tem uma filha menor, que vive com a mãe; -à data dos factos era consumidor de estupefacientes; -já foi condenado por dez vezes, fixa-se a pena em 3 anos e 6 meses de prisão. XII - São considerações de natureza exclusivamente preventiva, de prevenção geral e de prevenção especial, que justificam e impõem a preferência por uma pena alternativa ou por uma pena de substituição e a sua efectiva aplicação. XIII - Quanto à função e ao papel a desempenhar por aquelas exigências preventivas, há que atribuir prevalência às considerações de prevenção especial, por serem sobretudo elas que justificam, em perspectiva político-criminal, todo o movimento de luta contra a pena de prisão. Desde que impostas ou aconselhadas à luz das exigências de socialização, a pena alternativa ou a pena de substituição só não serão aplicadas se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam irremediavelmente postas em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e a estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias. XIV - Atento o passado criminal do arguido, com dez condenações, algumas sancionadas com pena privativa da liberdade, é evidente a necessidade daquele cumprir em clausura a pena cominada de 3 anos e 6 meses de prisão.
Proc. n.º 52/07.2PEPDL.S1 -3.ª Secção
Oliveira Mendes (relator)
Maia Costa
I -O recurso de revisão consiste num recurso extraordinário que visa a impugnação de uma sentença transitada em julgado e a obtenção de uma nova decisão, mediante a repetição do julgamento. II - O fundamento da revisão da al. a) do n.º 1 do art. 449.º do CPP exige que uma outra sentença transitada em julgado tenha considerado falsos os meios de prova de que o colectivo lançou mão, tornando-se necessário que a falsidade tenha sido constatada, declarada, atestada, certificada ou reconhecida, por forma consolidada, segura e definitiva, por uma outra sentença passada em julgado. III - No caso de não haver nenhuma sentença que tenha tido por objecto ajuizar da veracidade ou falsidade do depoimento da ofendida, concluindo pela falsidade, antes um mero papel, contendo uma declaração manuscrita pela ofendida e por ela assinada, apresentando uma nova versão dos factos, não se mostrando reconhecida a falsidade do depoimento que contribuiu para a formação da convicção do colectivo, é manifestamente infundada a pretensão de revisão.
Proc. n.º 60/02.0TAMBR-A.S1 -3.ª Secção
Raul Borges (relator)
Fernando Fróis
Pereira Madeira
I -O caso de acórdão da Relação absolutório, não confirmatório, sendo que a condenação em 1.ª instância o foi em pena não privativa de liberdade (em pena de multa), não cabe em nenhuma das alíneas do art. 400.º do CPP, atendendo à nova versão da lei adjectiva penal decorrente da Lei 48/2007, de 29-08. II - Poderá colocar-se a questão de saber se, em face da lacuna da lei, poderá afirmar-se a recorribilidade, por argumento a contrario, à luz da al. d), visto tratar-se de decisão absolutória proferida, em recurso, pela Relação, mas que não confirma a de 1.ª instância, ou tendo por base a al. e), no caso, por o acórdão recorrido não ter aplicado pena não privativa da liberdade. III - Das alíneas supra referidas, apenas a al. b) manteve a redacção anterior e no que toca à al. e), a inadmissibilidade de recurso colocava-se dantes relativamente a “acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações, em processo por crime a que seja aplicável pena de multa ou pena de prisão não superior a 5 anos, mesmo em caso de concurso de infracções, ou em que o MP tenha usado da faculdade prevista no art. 16.º, n.º 3”. IV - Este círculo de irrecorribilidade assim definido teria de ser tido em conta na interpretação da al. d), no sentido de que a recorribilidade de um acórdão absolutório da Relação que não confirmasse a decisão de 1.ª instância, só ganharia viabilidade recursória se e quando se não contivesse nos limites da al. e), ou seja, quando o crime em questão ultrapassasse o nível ou escalão de criminalidade ali acolhido e definido em razão da moldura penal. V - É de ter em conta o pensamento legislativo de restringir os recursos, limitando-os aos casos de maior complexidade e importância, deles se excluindo a média e pequena criminalidade, e procurar simplificar o sistema, abolindo concretamente a existência, por regra, de um duplo grau de recurso. VI - O Tribunal da Relação encerra, atento o disposto nos arts. 427.º e 428.º do CPP, o ciclo do julgamento das decisões proferidas por tribunal singular. VII - Seria incongruente que, como resulta do art. 432.º, al. c), do CPP, relativamente a acórdãos finais proferidos pelo tribunal do júri ou tribunal colectivo que aplicassem penas de prisão até 5 anos – independentemente da penalidade –, não houvesse recurso para o STJ e se possibilitasse um duplo grau de recurso de decisões proferidas por tribunal singular. VIII - A mesma incoerência se detectaria em caso de acórdão da Relação que confirme acórdão de colectivo que aplique pena de prisão efectiva inferior a 8 anos, pois nesse caso estará vedado o recurso nos termos da al. f) do n.º 1 do art. 400.º. IX - É de concluir que a intervenção do STJ se verifica a partir da aplicação de pena superior a 5 anos.
Proc. n.º 2554/04.3TBACB.C1.S1 -3.ª Secção
Raul Borges (relator)
Fernando Fróis
I -O art. 40.º do CPP na actual redacção, entrada em vigor a 15-09-2007, refere que “Nenhum juiz pode intervir em (…) recurso (…) relativo[s] a processo em que tiver (…) participado em decisão de recurso”. II - O Sr. Vice-Presidente do Tribunal da Relação de … foi um dos subscritores do Acórdão de 28-10-2003, que consta do Proc. n.º …, pelo que importa ver se esse facto é impedimento suficiente para que decida a reclamação de não admissão de recurso, no Proc. n.º…., do Tribunal da Relação (processo diferente, devido à subida em separado, da reclamação). Por outras palavras, interessa ver se decidir uma reclamação, nos termos do art. 405.º do CPP, tem o sentido de “intervir em recurso” para efeitos do art. 40.º do CPP. III - Dos autos apura-se que, tendo sido lavrado despacho de não pronúncia, de que foi interposto recurso, por Acórdão de 28-10-2003, do Tribunal da Relação, foi confirmada a decisão de não pronúncia, ali tendo intervindo como adjunto, o actual Sr. Vice-Presidente desse Tribunal da Relação. IV - Ora, decidir a reclamação sobre inadmissibilidade de recurso não deve ser equiparado a “intervir em recurso”, para efeitos de impedimento do art. 40.º do CPP: este impedimento protege a imparcialidade do juiz. Ora, só faz sentido que se proíba um juiz de intervir num recurso, se já interveio noutro recurso do mesmo processo, se na última decisão que lhe é pedida influir (ou puder parecer que influiu) uma convicção previamente formada aquando da decisão do primeiro recurso. V - Não se vê como é que, no caso, a motivação jurídica subjacente à decisão da reclamação, e, designadamente, a confirmação dos despachos recorridos como de mero expediente, seja susceptível de ser influenciada pela decisão sobre a verificação ou não verificação de certas e determinadas nulidades, que foi o que se decidiu no acórdão da Relação acima referido e que é de mais de quatro anos antes. VI - Acresce que o requerimento para declaração de impedimento se apresenta como claramente intempestivo, tendo o arguido intervindo nos autos várias vezes desde que tomou conhecimento da identidade do Sr. Vice-Presidente do Tribunal da Relação de …, a quem foi atribuída a competência, por delegação para decidir da reclamação em foco. VII - Assim sendo, considera-se válida a decisão proferida pelo Sr. Vice-Presidente do Tribunal da Relação, que conheceu da reclamação de não admissão do recurso.
Proc. n.º 4028/08 -5.ª Secção
Souto Moura (relator) **
Soares Ramos (“vencido, porquanto não confirmaria o despacho recorrido entendendo,
antes, que deveria ter-se ordenado a sua substituição por outro em que se convidasse o
r
I -A admissibilidade do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência depende da existência de determinados pressupostos, uns de natureza formal (interposição do recurso no prazo de 30 dias posteriores ao trânsito em julgado do acórdão recorrido; invocação de acórdão anterior ao recorrido que sirva de fundamento ao recurso; identificação do acórdão fundamento, com o qual o recorrido se encontra em oposição, indicando-se o lugar da sua publicação, se estiver publicado; trânsito em julgado de ambas as decisões) e outros, substancial (justificação da oposição entre os acórdãos que motiva o conflito de jurisprudência; verificação de identidade de legislação à sombra da qual foram proferidas as decisões). II - O CPP não contém disposição que estabeleça o conceito de caso julgado, devendo recorrer-se, conforme estabelece o art. 4.º do CPP, à norma do processo civil, que estabelece: “A decisão considera-se passada em julgado, logo que não seja susceptível de recurso ordinário, ou de reclamação nos termos dos arts. 668º e 669º” (art. 677.º do CPC). III - No caso em análise, a decisão da Relação de que o arguido interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência não é ainda uma decisão definitiva no processo, pois apenas revogou a decisão de arquivamento que julgara extinto o procedimento criminal pela prática de violação de segredo de justiça, tendo determinado o prosseguimento do processo sem decidir definitivamente se os factos concretos cuja prática é imputada ao arguido foram, ou não, descriminalizados, por isso não o tendo condenado nem absolvido. IV - Da decisão, condenatória ou absolutória, poderá haver recurso ordinário e só quando os recursos ordinários se esgotarem, é que a decisão do processo se tornará definitiva, permitindo que seja lançada mão do recurso extraordinário. V - Falta assim um pressuposto essencial – o trânsito em julgado da decisão que ponha termo ao processo – para que possa ser admitido recurso extraordinário de fixação de jurisprudência, que o plenário das secções criminais do STJ deva apreciar.
Proc. n.º 479/06.7 -5.ª Secção
Arménio Sottomayor (relator) **
Souto Moura
I – A possibilidade de reforma de acórdão prevista na alínea a) do n.º 2 do artigo 669.º do Código de Processo Civil contempla o manifesto ou patente erro de julgamento sobre questões de direito, erro esse resultante de lapso grosseiro, por ignorância ou flagrante má compreensão do regime legal, ou seja, de total e errada interpretação dos preceitos legais, em consequência de desconhecimento, de menor atenção ou, até, de leviandade. II – Na alínea b) do mesmo artigo contemplam-se os casos de preterição de elementos probatórios, determinante de notório erro na apreciação das provas, ou de patente desconsideração de outros elementos, v.g. atinentes ao desenvolvimento da relação jurídica processual – designadamente por esquecimento, manifesta desatenção, deficiente estudo do processo, ou menor cuidado na preparação da decisão – que, a terem sido considerados, imporiam, inexoravelmente, decisão diversa da proferida. III – Excluídos da previsão das referidas alíneas, acham-se os erros de julgamento não devidos a lapsos manifestos ou gritantes, daí que a faculdade ali consignada não comporta a impugnação da sentença ou do acórdão com base em discordância sobre o decidido, seja quanto à interpretação dos factos disponíveis, seja quanto à selecção, interpretação ou aplicação das pertinentes normas jurídicas. IV – Por isso, não pode haver lugar à reforma se o respectivo pedido assenta em considerações que traduzem, apenas, uma interpretação do quadro factual e legal destinada a fazer valer uma das soluções possíveis do problema de saber se o tribunal devia ter conhecido da questão da descaracterização do acidente fundada em violação de condições de segurança previstas na lei, sem que se mostrem caracterizados o erro grosseiro e o lapso manifesto.
Recurso n.º 3441/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator) Bravo Serra Mário Pereira
I – Em sede de recurso, a pronúncia do tribunal sindicante está limitada pelas «conclusões» da minuta alegatória do recorrente – artigos 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi, do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo do Trabalho. II – Deste postulado decorre, desde logo, que o tribunal ad quem só pode apreciar as «questões» que se mostrem vertidas nas ditas «conclusões», estando impedido de o fazer relativamente a quaisquer outras que, não sendo de conhecimento oficioso, nelas se não mostrem expressamente tratadas. III – Por isso, as contra-alegações destinam-se, tão-somente, a contrariar a tese do recorrente, devendo circunscrever-se, daí, às «questões» que corporizam o objecto do recurso.IV – Quando se diz que as questões de conhecimento oficioso escapam à apontada regra, tal significa apenas que o órgão sindicante pode livremente suscitar quaisquer questões dessa natureza, sempre que o julgue oportuno, mas só está obrigado a fazê-lo quando esse conhecimento lhe for expressamente imposto. V – Inexistindo preceito legal que imponha a declaração oficiosa da inexistência de «inconstitucionalidades», não se verifica a nulidade do acórdão, por omissão de pronúncia que, não declara aquela inexistência.
Proc. n.º 3445/08 – 4.ª secção Sousa Grandão (Relator) Pinto Hespanhol Vasques Dinis
I – A norma do n.º 4 do artigo 678.º do Código de Processo Civil, na redacção do Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, contempla os casos em que, por razões que não tenham a ver com a alçada do tribunal – valor da causa ou sucumbência -, seja vedado o recurso para o Supremo Tribunal, ou seja os casos em que a lei não consente o recurso, mesmo que o valor da causa seja superior à alçada do tribunal de que se recorre e o valor da sucumbência superior a metade dessa alçada. II – Aquele n.º 4, consigna, não uma excepção à regra geral estabelecida no n.º 1 do mesmo artigo 678.º -segundo o qual só é permitido o recurso quando o valor da causa seja superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade da alçada do tribunal que proferiu a decisão -, mas um desvio às normas que, estatuindo excepções à dita regra geral, proíbem o recurso mesmo quando verificados os requisitos daquele n.º1. III – Não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, com fundamento em contradição de acórdãos das Relações proferidos em recursos de apelação ou de agravo, em causa de valor igual ou inferior à alçada da Relação ou em que a decisão recorrida é desfavorável para o recorrente em valor igual ou inferior a metade da mesma alçada.
Proc. n.º 69/07.7TTMTS.S1 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator)* Bravo Serra Mário Pereira
I – A lei, ao fixar a força probatória das declarações exaradas em documentos particulares, nos termos dos n.os 1 e 2 do art.º 376.º, do CC, apenas pretende dar como assente que as declarações constantes de tais documentos são de atribuir ao seu autor, na medida em que elas sejam contrárias aos interesses do declarante, mas já não quanto à exactidão dos factos a que elas se reportam, não se excluindo a possibilidade do seu autor demonstrar a inveracidade daqueles factos, por qualquer meio de prova. II – A acta da Assembleia-Geral da ré (da qual consta ter sido aprovada uma proposta de contratação do autor como gerente único e “também com funções de Director Geral”), os recibos de vencimento (dos quais consta que a categoria do autor é a de Director Geral) e o contrato de trabalho a termo assinado pelos anteriores sócios-gerentes da ré são documentos particulares que não gozam de força probatória plena relativamente à relação profissional que realmente se processou entre o autor e a ré.
Recurso n.º 372/09 -4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator)* Sousa Grandão Pinto Hespanhol
I – O direito dos ascendentes e parentes sucessíveis à pensão por morte de vítima de acidente de trabalho depende do preenchimento de dois requisitos, a saber: (i) a contribuição do sinistrado, com carácter de regularidade, para o sustento dos beneficiários; (ii) a necessidade dessa contribuição para o seu sustento. II – Contribuindo, mensalmente, o sinistrado com uma quantia não concretamente apurada para as despesas comuns do agregado familiar, está verificado o primeiro requisito de que a lei faz depender o direito à pensão. III – A exigência da necessidade da contribuição do sinistrado para o sustento daqueles beneficiários funda-se na constatação de que o direito dos familiares da vítima à pensão, consagrado na alínea d) do n.º 1 do artigo 20.º da Lei n.º 100/97, é uma emanação do instituto da obrigação alimentar, e esta apenas existe a favor das pessoas que não podem prover integralmente ao seu sustento. IV – Provando-se que a irmã do sinistrado estava desempregada e não auferia qualquer rendimento, é de concluir que dependia dos rendimentos dos restantes elementos do agregado familiar, pelo que se mostra preenchido o requisito da necessidade da contribuição do sinistrado para o seu sustento.
Proc. n.º 715/03.1TTBRR.S1 -4.ª Secção Pinto Hespanhol (Relator)* Vasques Dinis Bravo Serra
I – O nosso sistema jurídico consagra a responsabilização das pessoas singulares ou colectivas de direito privado e de direito público não abrangidas por legislação especial pela reparação e demais encargos previstos na lei advindos dos acidentes sofridos pelos trabalhadores ao seu serviço, prescrevendo ainda que as entidades empregadoras são obrigadas a transferir a responsabilidade por aquela reparação para as entidades legalmente autorizadas a realizar o seguro de acidentes de trabalho (art. 37.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro e art. 11.º do Decreto-Lei n.º 143/99, de 30 de Abril). II – Por via desse sistema, impende sobre as seguradoras, por força do contrato de seguro realizado pelas entidades empregadoras, o asseguramento da realização das prestações devidas aos trabalhadores sinistrados ao serviço destas. III – Essa substituição no cumprimento da obrigação de reparação dos danos causados pelos acidentes de trabalho abarca, em princípio, tudo o que for devido em consequência desses acidentes, gizando a lei, contudo, não obstante a imposição do sistema de seguro obrigatório, dois tipos de situações em que não impenderá sobre a entidade seguradora a responsabilidade pelo pagamento total dos danos sofridos: (i) quando a responsabilidade das entidades empregadoras não se encontra totalmente transferida; (ii) quando o acidente tiver ocorrido nas hipóteses contempladas no artº 18 da Lei nº 100/97. IV – Se porventura a entidade empregadora impugnar a decisão judicial que a considerou responsável (seja a título de responsabilização meramente «em primeira linha», seja a título «agravado»), a consequência dessa impugnação não poderá deixar de ter repercussão nas obrigações da entidade empregadora decorrentes do contrato de seguro que outorgou com a entidade seguradora, pelo que o não trânsito da decisão que veio a considerar como responsável a entidade empregadora – não trânsito esse operado pelo recurso interposto por esta – igualmente se repercutirá no passo decisório que, no seguimento daquela decisão, veio a estabelecer qual a forma pela qual a entidade seguradora seria responsável. V – Por isso, não obstante se ter decidido não tomar conhecimento, qua tale, do objecto do recurso subordinado interposto pelos autores/beneficiários do sinistrado vítima de acidente de trabalho, no sentido da condenação da entidade seguradora, isso não significa, na hipótese do Supremo eventualmente vir a tomar uma decisão no sentido de o acidente dos autos se não dever ter como «descaracterizado» ou que o mesmo deva dar lugar à reparação nos termos do artº 18º, nº 1, da Lei nº 100/97, com a consequência de cobrar aplicação o que se comanda no nº 2 do artº 37º, que não possa a entidade seguradora ser condenada, a «título principal», a reparar os danos advindos do acidente. VI – Ainda que se admita que viola as regras de segurança (nomeadamente aquelas que constam do artº 41 do Regulamento de segurança aprovado pelo decreto nº 41.821, de 11 de Agosto de 1958) a entidade empregadora que dispõe de uma «placa» do tecto do rés-de-chão com vigas de betão afastadas entre si com espaços ou aberturas desprotegidos suficientemente largos de modo a permitir a queda em altura de uma pessoa, não se verifica nexo de causalidade entre essa violação e o acidente de trabalho que ocorre porque o sinistrado, desobedecendo às instruções daquela – no sentido de proceder à descarga das paletes de abobadilhas do camião para o solo e, só posteriormente, as abobadilhas serem transportadas para a placa, consoante o «andamento dos trabalhos» -, procedia à descarga directamente do camião para a placa, tendo sido precisamente quando separava um «porta-paletes» que o «garfo» da palete embateu em si, desequilibrando-o e fazendo-o cair do local onde se encontrava, isto é, na placa do tecto do rés-do-chão. VII – A descaracterização do acidente de trabalho prevista na alínea a) do artº 7º da Lei nº 100/97 exige, cumulativamente, os requisitos de (i) existência de regras ou condições de segurança estabelecidas pela lei ou pela entidade empregadora, (ii) verificação, por parte do sinistrado, de uma conduta violadora dessas regras ou condições, (iii) voluntariedade na assunção dessa conduta, sem que, para tanto, haja causa justificativa, e (iv) a existência de um nexo causal entre a conduta e a ocorrência do acidente. VIII – As condições de segurança a que alude o referido preceito são as normas ou instruções que visam acautelar ou prevenir a segurança dos trabalhadores, visando eliminar ou diminuir os riscos ou perigos para a sua saúde, vida ou integridade física.IX – Tendo a entidade empregadora dado instruções ao sinistrado para a descarga das paletes de abobadilhas ser feita, directamente, do camião para o solo e, só posteriormente, as abobadilhas serem transportadas para a placa (do imóvel em construção), consoante o «andamento dos trabalhos», o que o sinistrado conhecia, não é possível concluir, sem mais, que tais instruções se destinassem, por via directa ou indirecta, a acautelar ou proteger a segurança dos trabalhadores intervenientes na operação de descarga das abobadilhas do camião (podiam, por exemplo, tais instruções destinarem-se à organização e planificação da obra de construção que a empregadora levava a cabo). X – Em tal circunstancialismo não há lugar à descaracterização do acidente, ao abrigo da alínea a) do artº 7º da Lei 100/97, sendo que ónus da prova dos factos integradores da descaracterização, como impeditivos da responsabilidade accionada, cabia às entidades sobre as quais a lei faz impender a obrigação reparadora do acidente (artº 342º, n.º 2 do CC). XI – De igual modo, não se verifica descaracterização do acidente ao abrigo da alínea b) do referido artº 7.º , pois a violação ou desobediência, por parte do sinistrado – da instrução no sentido de as abobadilhas serem descarregadas do camião para o solo e só depois, serem transportadas para a placa, consoante o andamento dos trabalhos –, move-se marginal ou lateralmente à questão da negligência do sinistrado.
Proc. n.º 823/06.7TTAVR.C1.S1 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator) Sousa Peixoto Bravo Serra (votou vencido quanto ao n.º IX e 1.ª parte do n.º X)
I -O contrato sem termo celebrado entre uma trabalhadora e um Instituto Público na modalidade de serviço personalizado do Estado, com início de desempenho em 01-04-2000, é nulo, por proibição legal de tal modalidade de vinculação, nos termos do n.º 1 do art.º 43º, conjugado com os art.ºs 2º, n.º 1, 3º e 14º, n.º 1, todos do DL n.º 427/89, de 7-12, diploma que então regulava o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública. II - A subscrição, pelas partes, em 02-01-2002, de um denominado “contrato de avença”, continuando a autora a exercer as mesmas funções e a receber a retribuição que já anteriormente auferia, sem que se verifique qualquer hiato temporal na execução global deste contrato, é de ter como integrante da execução do inicial contrato verbal. III - Não há lugar, ao abrigo do art.º 293º do Código Civil, à conversão do contrato sem termo em contrato a termo certo, já que não foi observada a forma escrita na celebração do acordo inicial (art.ºs 14º, n.º 3 do DL n.º 427/89 e 42º, n.º 1 da LCCT), nem se mostra reduzido a escrito eventual fundamento justificativo da celebração do contrato de trabalho a termo (n.ºs 1 e 2 do art.º 18º do DL n.º 427/89, na redacção do DL n.º 218/98). IV - A invalidade do contrato de trabalho a que o réu pôs termo, com efeitos a partir de 31-12-2004, por carta datada de 26-10-2004, não tem os efeitos retroactivos próprios do regime geral do direito civil, antes está submetida ao regime próprio dos contratos de trabalho inválidos, estabelecido no art.º 15º da LCT e, na fase de execução ulterior à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, ao regime constante dos seus art.ºs 115º e 116º. V - Por força do disposto do disposto nos art.ºs 4º, n.º 5 e 14º, n.ºs 2 e 3 do DL n.º 427/89, a celebração do contrato de trabalho em causa não integrou a trabalhadora na categoria de Técnica Superior de 2ª Classe do quadro de pessoal do R., uma vez que o contrato celebrado, mesmo que tivesse revestido a natureza de contrato a termo certo, não é apto a conferir à trabalhadora a qualidade de funcionária pública e nem sequer a de agente administrativa, não a integrando nos respectivos quadro de pessoal, carreiras e categorias do réu, estabelecidos nos termos conjugados do DL n.º 248/85, de 15-07, do DL n.º 184/89, de 2.06 e da Portaria n.º 38/98, de 28-01 (que aprovou o respectivo quadro de pessoal). VI - O trabalhador não tem direito a diferenças salariais por ofensa do princípio constitucional trabalho igual salário igual se não demonstra que o seu trabalho é de considerar igual, em termos de quantidade, natureza e qualidade, ao dos demais técnicos superiores de 2.ª do quadro de pessoal do empregador. VII - Perante o que estabelecem os n.ºs 5 e 6 do art.º 3º do DL n.º 248/85, o contratado a termo certo, no quadro do emprego público, tem ou deve ter vencimento idêntico ao de categoria equiparável inserida em carreira, importando, para tanto, que demonstre serem as funções que desempenhou equiparadas às daquela categoria (no caso, a categoria de técnico superior de 2ª classe, tal como descritas no Mapa I anexo ao DL n.º 248/85). VIII - A comunicação feita à autora pelo réu, transmitindo a cessação do contrato para o dia 1 de Janeiro de 2005 e realçando a impossibilidade de permanência ao serviço após aquela data, sem invocar a nulidade do convénio, consubstancia um despedimento. IX - Se o empregador tiver despedido ilicitamente o trabalhador antes da declaração de invalidade do contrato, aplicar-se-ão as regras sobre os efeitos do despedimento ilícito, embora seja necessário fazer uma adaptação dessas regras tendo em vista a nulidade do contrato de trabalho: o despedimento tem como consequência, apenas, a obrigação de o empregador pagar as retribuições vencidas correspondentes ao tempo em que o contrato esteve em execução e a indemnização de antiguidade. X - Não tendo a autora peticionado quaisquer retribuições vencidas desde a data do despedimento até à declaração de nulidade, não podem as quantias correspondentes ser-lhe atribuídas. XI - Formulando a autora na petição inicial o pedido de condenação do réu no pagamento da compensação de € 7.075,52 pela cessação do contrato por caducidade em consequência da carta do réu de 26-10-2004, não está vedado ao Supremo conhecer da compensação ou indemnização devida pela cessação contratual que se verificou na sequência daquela mesma declaração do réu, embora qualificando juridicamente esta como um despedimento ilícito. XII - Na sua essência, a indemnização de antiguidade por despedimento ilícito tem, à semelhança da indemnização por caducidade, natureza compensatória do tempo de serviço prestado pelo trabalhador ao empregador, visando uma e outra acautelar, de algum modo, a eventualidade de o trabalhador que viu cessado o contrato de trabalho, por causa que não lhe é imputável, não arranjar emprego logo de seguida a essa cessação e ver-se confrontado, durante um período mais ou menos longo, com o não exercício da sua actividade e a consequente não angariação de rendimentos. XIII - Ao acolher a pretensão de condenação no pagamento da indemnização de antiguidade, apenas formulada na revista, não se está a atender a uma causa de pedir diferente ou a condenar-se em objecto diverso do pedido, apenas se efectuando um diferente enquadramento jurídico dos factos alegados e provados e dos seus efeitos, actuação permitida às instâncias e ao Supremo, nos termos do art.º 664º do CPC, desde que, na condenação, se não ultrapasse o valor compensatório peticionado. XIV - Justifica-se fixar a base de cálculo da indemnização de antiguidade no mínimo previsto no art. 439.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2003, ou seja, à razão de 15 dias de retribuição base, se era nulo o contrato que se fez cessar com o despedimento, o que legitimava que o próprio réu pudesse, a qualquer tempo, invocar a nulidade e fazer cessar a sua execução, sendo que a própria autora interiorizou esse carácter essencialmente precário do vínculo.
Recurso n.º 3443/08 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)* Sousa Peixoto Sousa Grandão
I – A matéria atinente à prescrição e caducidade dos direitos, incluindo os efeitos que dela decorrem, é regulada pela lei civil, não tendo, quanto à mesma, aplicação o disposto no nº 2 do artº 289º do Código de Processo Civil. II – Para os efeitos previstos no nº 3 do artº 327º do Código Civil, é de imputar à autora a absolvição das rés da instância, por que veio a terminar uma acção, por decisão de 1 de Março de 2007, transitada em julgado em 19 seguinte, fundada na ineptidão da respectiva petição inicial, que se deveu à circunstância de se ter entendido existir ambiguidade, ininteligibilidade e incompatibilidade substancial dos pedidos formulados, vícios esses, que não obstante a autora, anteriormente, ter sido convidada a esclarecer, não foi possível ultrapassar, dado que ela, na sequência do convite, veio dizer naquele processo que não via necessidade de correcção do seu petitório. III – Por isso, não pode a autora, na acção que, posteriormente, em 18 de Abril de 2007, intentou contra as rés, gozar do prazo ou da ficção que deflui do referido nº 3 do artº 327º do Código Civil. IV – Daí que, tendo a relação laboral da autora com as rés cessado em Janeiro de 2004, aquela intentado contra estas, em 22 de Outubro de 2004, a acção emergente dessa relação, na qual foram citadas em 27 de Outubro de 2004, a partir desta data, por aplicação da regra inserida no nº 2 do artº 327º do Código Civil, começou a correr novo prazo prescricional, o qual, nos termos do artº 381º, nº 1, do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto) tem a duração de um ano. V – Em conformidade com as proposições anteriores, na acção intentada em 18 de Abril de 2007, já há muito estavam prescritos os direitos nela queridos exercer.
Proc. n.º 571/07.TTPRT.S1 Bravo Serra (Relator)* Mário Pereira Sousa Peixoto
I – A alínea b) do artº 387º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 99/2003, de 27 de Agosto) não impõe unicamente, para efeitos de caducidade do contrato de trabalho, que a impossibilidade superveniente, absoluta e definitiva deva ser perspectivada tão-somente do ponto de vista do trabalhador; permite, outrossim, que ela tenha reflexo no recebimento do trabalho pelo empregador. II – Tendo a autora, mercê da doença profissional de que padeceu, ficado impossibilitada, absoluta e permanentemente, de continuar a exercer as funções («gaspeadeira» de 2ª) que, até aí, exercia na ré, enfermando ainda de uma incapacidade permanente parcial de 5%, que a não impossibilitava do desempenho de tarefas – diferentes do exercício respeitante à categoria profissional que até então desenvolvia – compatíveis com a sua capacidade residual, encontrava-se a ré obrigada, face ao que se comanda no artº 9 do Decreto-Lei nº 248/99, de 2 de Julho, a assegurar-lhe na empresa a ocupação e função compatíveis com o respectivo estado e a respectiva capacidade residual. III – Cumpriu a referida obrigação a ré que, ciente da incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual de que a autora ficara afectada, e após esta se ter apresentado ao serviço em 7 de Julho de 2003, lhe comunica que se deveria apresentar para trabalhar na secção de embalagem, e que lhe seria disponibilizada uma máscara para trabalhar, máscara essa que era adequada ao estado de saúde da autora, não obstante lhe exigir um maior esforço na respiração. IV – Todavia, verifica-se uma situação superveniente, absoluta e definitiva da ré não poder receber o trabalho da autora, o que inviabilizou a referida «reconversão» e acarretou a caducidade do contrato de trabalho, num circunstancialismo em que se apura que a mesma autora, embora continuando a apresentar-se ao serviço de 7 de Julho de 2003 a 15 de Julho de 2004, não veio a exercer as «novas» funções que lhe foram destinadas pela ré – acobertando-se na circunstância de não terem sido acatadas as exigências, que formulou, de acordo com as quais lhe deviam ser dadas garantias, pela ré e pelos seus director de recursos humanos e médico, de que se responsabilizavam pessoalmente pelo ressarcimento de todos os danos físicos, morais e materiais que lhe pudessem ser originados pela prestação do trabalho que lhe queriam impor, ainda que a título experimental, e que a informassem se estavam em condições de lhe garantir, por escrito e de forma cientificamente fundamentada, que a prestação daquele trabalho não acarretava qualquer risco para a saúde – e não se extrai, no quadro organizacional da empresa, que houvesse outro lugar (que não aquele que lhe foi destinado pela empregadora) compatível com a capacidade residual de desempenho de funções pela autora.
Proc. n.º 703-05.3TTVFR.S1 -4.ª Secção Bravo Serra (Relator)* Mário Pereira Sousa Peixoto
I -A fundamentação da pena conjunta não se deve confundir com a fundamentação de cada uma das penas singulares. II - A fixação da pena conjunta há-de relevar a globalidade dos factos em interligação com a personalidade do agente, de forma a aquilatar-se, fundamentalmente, se o conjunto de factos reflecte uma personalidade propensa ao crime, ou é, antes, a expressão de uma pluriocasionalidade, que não encontra a sua razão de ser na personalidade do arguido. III - Não observa o rigor da fundamentação, a consideração vertida, a final, pelo Tribunal a quo, a propósito da pena conjunta, com a seguinte formulação “operando o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido, considerando em conjunto os factos e a personalidade do arguido, condena-se o mesmo na pena única de 9 anos de prisão”. IV - O acórdão recorrido enferma de falta de fundamentação na parte relativa à determinação da medida da pena conjunta imposta ao arguido, falta que é motivo de nulidade do acórdão, a qual é de conhecimento oficioso – art. 379.º, n.º 2, do CPP.
Proc. n.º 2956/07.3TDLSB -3.ª Secção
Oliveira Mendes (relator)
Maia Costa
I -Com a entrada em vigor da Lei 49/2004, de 24-08, firmou-se o entendimento que o advogado-arguido carece de constituir outro advogado que o defenda, atendendo a que o exercício da advocacia é incompatível com qualquer cargo, função ou actividade que afectem a isenção, independência e dignidade da função, idêntica disciplina se impondo quando seja arguido um magistrado. II - Na fase de recurso é obrigatória a assistência de arguido por advogado, sob pena de nulidade insanável – arts. 119.º, al. c), 62.º, e 64.º, al. d), do CPP –, vício que ocorre com o oferecimento de requerimento com motivação de recurso pela pena de arguido que seja também advogado. III - Porém, tendo sido proferido acórdão em 1.ª instância, com declaração de depósito nele aposta e sendo a motivação de recurso subscrita pelos arguidos, mas da mesma figurando a assinatura de outro causídico, a quem os arguidos conferiram procuração com poderes para interpor recurso, ratificando o processado, a apontada nulidade não se comunica ao seu advogado constituído, em obediência à regra utile non vitiatur e ao princípio do maior aproveitamento dos actos processuais. IV-A notificação para os fins do art. 417.º, n.º 2, do CPP deve ser endereçada ao defensor do arguido, por a ele validamente competir a prática do acto processual - resposta , atendendo ao seu conteúdo e estatuto profissional.
Proc. n.º 279/96.0TAALM.S1 -3.ª Secção
Armindo Monteiro (relator)
Santos Cabral
I -Para efeitos do disposto no art. 449.º, n.º 1, al. d), do CPP, a revisão da sentença transitada em julgado é admissível quando se descobrirem novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação. II - A jurisprudência tem-se dividido quanto a saber o que são factos novos ignorados ao tempo do julgamento. Para uma corrente – dominante – tal expressão não significa que tais factos não fossem ou não pudessem ser conhecidos pelo arguido no momento em que o julgamento teve lugar, mas tão-só que se trata de factos que não foram valorados no julgamento porque desconhecidos do tribunal. Para outros, não basta que os factos fossem desconhecidos do tribunal, importa ainda que fossem ignorados pelo arguido ao tempo do julgamento e que não pudessem ter sido apresentados antes deste. III - A dúvida relevante para a revisão tem de ser qualificada; há-de elevar-se do patamar da mera existência, para atingir a vertente da “gravidade” que baste, tendo os novos factos e ou provas de assumir o qualificativo da “gravidade da dúvida”. IV - Não é, consequentemente, admissível revisão de sentença penal com o único objectivo de corrigir a medida concreta da sanção aplicada.
Proc. n.º 319/04.1GBTMR-B.S1 -3.ª Secção
Raul Borges (relator)
Fernando Fróis
Pereira Madeira
I -Nos termos do prevenido no art. 380.º, n.º 2, do CPP, o Supremo Tribunal pode proceder à rectificação do acórdão do Tribunal da Relação no segmento da decisão em que verifica a existência de erro material. II - Ocorre um erro material ao se exarar no texto do acórdão elaborado por essa instância, a condenação em 7 meses de prisão ao invés de 7 anos de prisão, para cada um dos crimes de roubo por que o arguido veio a ser condenado. III - Possuindo o arguido 19 anos de idade à data dos factos, não tendo averbada condenação no seu registo criminal e como a prática dos factos ocorreu em simultâneo e direccionados à consumação de um único objectivo - a apropriação dos bens do casal de vítimas –, mostra-se adequada e suficiente a aplicação de uma pena única de 9 anos de prisão.
Proc. n.º 732/06.0GCFAR.S1 -3.ª Secção
Maia Costa (relator)
Pires da Graça
Pereira Madeira
I -O juízo de avaliação da vantagem da atenuação especial da pena centra-se fundamentalmente na importância que a mesma poderá ter no processo de socialização (reinserção social) do menor. II - Nesse juízo deve começar por se ponderar a gravidade do crime cometido, aferida pela medida da pena aplicável; depois, o Tribunal só deverá aplicar a atenuação especial a jovens delinquentes quando tiver sérias razões para crer que da atenuação resultem vantagens para a reinserção do jovem condenado, havendo nessa medida que apreciar, em cada caso concreto, a personalidade do jovem, a sua conduta anterior e posterior ao crime, a natureza e o modo de execução do crime e os seus motivos determinantes. III - Relativamente a jovens adultos a atenuação especial da pena de prisão apenas será de se afastar se contra-indicada por uma manifesta ausência de sérias razões para crer que dela possam resultar vantagens para a reinserção social. IV - Considerando que: -o arguido nasceu a 04-02-89; -praticou os factos entre 15-03-07 e 20-02-08; -é solteiro e encontrava-se desempregado antes de ser preso; -apesar de ter algum suporte familiar, revela grandes dificuldades em constituir um trajecto de vida socialmente integrado; -fora já condenado no âmbito no Processo Comum Singular nº 69/06.4PAVNF, do 1.º Juízo Criminal de …, pela prática de um crime de roubo em 31-01-06, por sentença proferida em 28-03-07 e transitada em julgado em 23-04-07, numa pena de 1 ano de prisão suspensa na execução pelo período de 2 anos, com regime de prova, verifica-se que não procedem sérias razões para a aplicação do regime penal especial para jovens, nos termos do art. 4.º do DL 401/82, de 23-09.
Proc. n.º 410/07.2 PAVNF.P1.S1 -3.ª Secção
Pires da Graça (relator)
Raul Borges
I -O CPP não regula conflitos de jurisdição, mas apenas conflitos de competência. II - É competente em razão da matéria para conhecer do recurso confinado à absolvição da instância por incompetência do Tribunal Judicial, o Tribunal dos Conflitos.
Proc. n.º 152/99.0PASXL.S1 -3.ª Secção
Pires da Graça (relator)
Raul Borges
Pereira Madeira
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