Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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I - O STJ pode e deve avaliar da legalidade do uso dos poderes de livre apreciação da prova e do princípio processual 'in dubio pro reo' até onde tal lhe for possível, ou seja, ao menos, até à exigência de que tal processo de formação da convicção seja devidamente objectivado e motivado e que o resultado final esteja em consonância com essa objectivação suficiente e racionalmente motivada.
II - O que o princípio da 'livre convicção' ordena ao juiz é que decida sobre a matéria de facto que não se veja afectada pela dúvida, tendo a regra da prova livre como último horizonte a verdade histórica ou material.
III - A livre apreciação das provas há-de ser, porém, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral, susceptível de motivação e controlo.
IV - Do mesmo modo, a dúvida relevante para desencadear o funcionamento o princípio 'in dubio pro reo', também controlável em via de recurso, há-de ser portadora da marca de razoabilidade ou racionalidade devidamente objectivada na sentença.
V - Quer-se com isto significar que nem tudo o que diz respeito à formação da convicção do tribunal mesmo em matéria de facto, constitui 'matéria de facto'. Há normas jurídicas que presidem a tal tarefa do tribunal. E aí o Supremo Tribunal deve intervir, se necessário e na medida do possível.
VI - Havendo duas resoluções distintas e suficientemente distanciadas e autonomizadas, não há que falar em um só crime - artigo 30.º, n.º 1, do CP.
         Proc. n.º 222/05 - 5.ª Secção Pereira Madeira (relator) * Simas Santos Santos Carvalho
 
Em princípio, o assistente carece de legitimidade para, em recurso por crime público, discutir a espécie e medida da pena aplicada ao arguido.
         Proc. n.º 4741/04 - 5.ª Secção Pereira Madeira (relator) * Simas Santos Santos Carvalho
 
I - Se o Tribunal Colectivo, condena o arguido como autor do crime de tráfico de menor gravidade, por deter 11 embalagens contendo heroína misturada com diazepam (TabelaV) e fenorbital (TabelaV), tudo com o peso líquido de 1,297 grs., e dá como provado que essa substância se destinava ao seu consumo e, em parte, a ser vendida, propondo-se, assim, a alimentar o seu vício e a auferir com a dita venda vantagem económica indevida, sendo que o arguido consumia 1 a 1,5 embalagens por dia, impunha se apurar se a satisfação do seu consumo era ou não a finalidade exclusiva da sua conduta e qual era o seu consumo diário, por relação às embalagens apreendidas, tomando em consideração a Portaria 94/96, de 26-03.
II - Não o tendo feito, verifica-se insuficiência da matéria de facto provada para a decisão, dada a necessidade de equacionar a aplicabilidade do tipo legal de traficante-consumidor, vício que o STJ pode conhecer oficiosamente e que determina o reenvio parcial para novo julgamento.
         Proc. n.º 456/05 - 5.ª Secção Simas Santos (relator) * Santos Carvalho Costa Mortágua
 
Se o STJ anula a decisão da 1.ªnstância para que, antes de englobar no cúmulo jurídico a que procedeu penas cuja execução estava, tomar posição expressa sobre a revogação dessa suspensão, precedendo o contraditório, e o Tribunal Colectivo se limita a dizer que, através do certificado de registo criminal se vê que essas penas ainda não estão extintas, pelo que inexiste qualquer obstáculo à sua cumulação com a pena imposta nestes autos, não foi dado cumprimento à decisão do STJ e o novo acórdão da 1.ªnstância tem de ser anulado.
         Proc. n.º 223/05 - 5.ª Secção Simas Santos (relator) * Santos Carvalho Costa Mortágua Rodrigues da Co
 
I - Sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos, o juiz tem o dever de suspender a execução da pena: esta é uma medida de conteúdo reeducativo e pedagógico, pelo que é necessário que, reportando-se ao momento da decisão e não ao da prática do crime, possa fazer um juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido, no sentido de que a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição.
II - Se o arguido não interiorizou as suas condutas delituosas, já foi condenado anteriormente em pena suspensa por tráfico de estupefacientes e o volta a praticar exactamente quando cumpre pena no estabelecimento prisional, nada justifica a fixação da pena no limite mínimo da moldura penal, nem a suspensão da execução da pena, pois não é possível fazer um juízo de prognose favorável, revelando a sua personalidade e conduta que não será suficiente a mera censura do facto e a ameaça de execução da pena.
         Proc. n.º 333/05 - 5.ª Secção Simas Santos (relator) * Santos Carvalho Costa Mortágua
 
I - A redacção do n.º 3 do art. 412.º do CPP, por confronto com o disposto no seu n.º 2 deixa alguma margem para dúvida quanto ao formalismo da especificação dos pontos de facto que no entender do recorrente foram incorrectamente julgados e das provas que impõem decisão diversa da recorrida, pois que, enquanto o n.º 2 é claro a prescrever que 'versando matéria de direito, as conclusões indicam ainda, sob pena de rejeição', já o n.º 3 se limita a prescrever que 'quando impugne a decisão proferida sobre matéria de facto, o recorrente deve especificar', sem impor que tal aconteça nas conclusões.
II - Perante esta margem de indefinição legal, e tendo o recorrente procedido à mencionada especificação no texto da motivação e não nas respectivas conclusões, ou a Relação conhecia da impugnação da matéria de facto ou, previamente, convidava o recorrente a corrigir aquelas conclusões.
         Proc. n.º 4716/04 - 5.ª Secção Simas Santos (relator) * Santos Carvalho Costa Mortágua Rodrigues da C
 
I - Não é recorrível a decisão que indeferir o requerimento de rectificações, esclarecimento ou reforma (art. 670.º, n.º 2, do CPC, aplicável por força do art. 4.º do CPP).
II - A decisão sobre a admissão de recurso para o Tribunal Constitucional de acórdão da Relação cabe ao Relator e é tomada por despacho (art. 414.º do CPP e 76.º, n.º 4, da LOFTC) e se o recurso foi interposto condicionalmente, não tem que ser apreciado se não se verificou a respectiva condição.
III - A jurisprudência do Tribunal Constitucional e, mais recentemente, a do STJ vão no sentido de que não pode deixar de ser conhecido um recurso, por deficiência das conclusões da motivação, sem que ao recorrente seja concedida a possibilidade de corrigir tal deficiência; o mesmo não se aplicando, no entanto, ao próprio texto da motivação que é, por um lado, imodificável e, por outro, o limite à correcção das conclusões. Não resulta assim, desta jurisprudência, nem da lei, um 'direito' do recorrente a ser convidado a corrigir as conclusões da motivação.
IV - Estando fixada jurisprudência (Ac. n.º 5/02, DR,S-A, de 17-07-02) no sentido de que 'a não documentação das declarações prestadas oralmente na audiência de julgamento, contra o disposto no art. 363.º do CPP, constitui irregularidade, sujeita ao regime estabelecido no art. 123.º do mesmo diploma legal, pelo que, uma vez sanada, o tribunal já dela não pode conhecer', se as declarações orais em audiência foram gravadas e transcritas mas não inseridas na acta, em nada é afectado o valor da sequência de actos que integram a audiência, nem fica prejudicada a possibilidade de impugnar em recurso a matéria de facto fixada pela 1.ªnstância, pelo que a irregularidade não pode 'afectar o valor do acto praticado' (n.º 2 do art. 123.º).
V - Sendo o interesse em agir a necessidade concreta de recorrer à intervenção judicial, à acção, ao processo, não pode recorrer o arguido da não inclusão na acta das transcrições dos depoimentos, pois sempre poderá recorrer quanto à questão de facto, dada a existência de gravações e subsequente transcrição.
VI - O art. 362.º do CPP não impõe a transcrição na acta de audiência dos depoimentos orais e da conjugação dos arts. 363.º, 364.º e n.º 3 do art. 412.º resulta um sistema de documentação que não exige aquela transcrição. A documentação das declarações orais em audiência é efectuada através da súmula (art. 389.º), ou através da gravação áudio magnética, seguida de transcrição (art. 412.º, n.º 3), transcrição que não faria qualquer sentido na tese contrária.
VII - Só devem ser objecto da discussão os factos da contestação que se relacionem directamente com a conduta em apreciação.
VIII - O dever constitucional de fundamentação da sentença basta-se com a exposição, tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, bem como o exame crítico das provas que serviram para fundar a decisão (n.° 2 do art. 374.º do CPP) e o exame crítico da prova, exige, como o fez o tribunal colectivo, a indicação dos meios de prova que serviram para formar a sua convicção, mas, também, os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do Tribunal se formasse em determinado sentido, ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência.
IX - Têm sido atribuídas à fundamentação da sentença as funções de:- contribuir para a sua eficácia, através da persuasão dos seus destinatários e da comunidade jurídica em geral;- permitir, ainda, às partes e aos tribunais de recurso fazer, no processo, pela via do recurso, o reexame do processo lógico ou racional que lhe subjaz;- constituir um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para a congruência entre o exercício desse poder e a base sobre a qual repousa: o dever de dizer o direito no caso concreto (iuris dicere), e, nessa medida, é garantia de respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões.
X - Os recursos são remédios jurídicos que se destinam a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada.
XI - Assim, o julgamento em 2.ªnstância não o é da causa, mas sim do recurso e tão só quanto às questões concretamente suscitadas e não quanto a todo o objecto da causa, em que estão presentes, face ao Código actual, alguns apontamentos da imediação (somente na renovação da prova, quando pedida e admitida) e da oralidade (através de alegações orais, se não forem pedidas e admitidas alegações escritas).
XII - Não é exacto que constitua uma regra de experiência comum inelutável que a depressão e o estado emocional de que sofria o arguido quando disparou contra ex-namorada, importe a sua inimputabilidade ou a sua imputabilidade diminuída.
XIII - O Tribunal começa por decidir qual a medida concreta da pena de prisão que vai aplicar e só se esta não for superior a 3 anos é que tem de encarar a possibilidade de suspender a sua execução e não o contrário. E compreende-se que a lei reserve a aplicabilidade daquela pena de substituição para os casos cuja gravidade não ultrapasse determinado patamar, escolhendo a medida concreta da pena a infligir como índice dessa gravidade. Essa técnica foi usada na substituição da pena curta de prisão por multa, na substituição por prisão por dias livres e na substituição pelo regime de semidetenção.
XIV - Com o crime de sequestro visa-se fundamentalmente proteger a liberdade individual, mais propriamente a liberdade física, o direito de se não ser aprisionado, encarcerado ou de qualquer modo fisicamente confinado por determinado período temporal, que relevantemente afecte a liberdade individual de locomoção a certo e determinado espaço.
XV - A intenção criminosa integra matéria de facto da exclusiva competência dos tribunais de instância.
XVI - Sendo distintos os bens jurídicos tutelados pelos tipos legais de crime de sequestro (liberdade ambulatória das pessoas, a capacidade de cada homem se fixar ou movimentar livremente no espaço físico contra a ilícita restrição, como se viu acima) e de homicídio (a vida humana) e não se verificando, entre eles, qualquer relação de especialidade, subsidiariedade ou consumpção nem se configurando nenhum dos crimes em relação ao outro como facto posterior não punível deve entender-se que a conduta do agente que sequestra uma pessoa e depois a vem a (tentar) matar comete, efectivamente, em concurso real, um crime de sequestro e um crime (tentado) de homicídio.
XVII - A distinção a fazer, e que tem sido feita pelo STJ, reside em determinar se o sequestro se limita ao essencial, ao estritamente necessário para cometer o 'crime fim', caso em que se entende que ocorre a consumpção.
XVIII - Estando provado que, devido à ruptura do namoro com a ofendida o arguido ficou profundamente perturbado psicológica e emocionalmente, com depressão nervosa e que após os factos o arguido foi sujeito a tratamento psiquiátrico, foi medicado e está controlado, mas estando não provado que tenha tido apenas uma conduta negligente, causada pelo estado de doença e de perturbação e que a depressão nervosa porque o arguido passou limitou-lhe a liberdade de agir e a capacidade psicológica, entendida esta no sentido de que não podia avaliar a ilicitude ou as consequências dos seus actos, não está estabelecido que tenha agido em desespero.
XIX - As situações a que se referem as diversas als. do n.° 2 do art. 72.º do C. Penal (atenuação especial da pena) não têm, por si só, na sua existência objectiva, um valor atenuativo especial, tendo de ser relacionados com um determinado efeito que terão de produzir: a diminuição acentuada da ilicitude do facto ou da culpa do agente.
XX - Sendo aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta proteja de forma adequada e suficiente os bens jurídicos e assegure a reintegração do agente na sociedade. Se o arguido se introduziu ilegalmente no domicilio da ofendida detendo ilegalmente uma arma com a qual a veio a tentar matar nesse local, não é adequada a opção pela de multa quanto aos crimes de violação de domicílio e detenção ilegal de arma.
         Proc. n.º 58/05 - 5.ª Secção Simas Santos (relator) * Santos Carvalho Costa Mortágua Quinta Gomes
 
I - O recurso em matéria de facto para a Relação não constitui um novo julgamento em que toda a prova documentada é reapreciada pelo Tribunal Superior que, como se não tivesse havido o julgamento em 1.ªnstância, estabeleceria os factos provados e não provados e assim indirectamente validaria ou não a factualidade anteriormente assente, mas é antes um remédio jurídico que se destina a despistar e corrigir erros in judicando ou in procedendo, que são expressamente indicados pelo recorrente, com referência expressa e específica aos meios de prova que impõem decisão diferente, quanto aos pontos de facto concretamente indicados, ou com referência à regra de direito respeitante à prova que teria sido violada, com indicação do sentido em que foi aplicada e qual o sentido com que devia ter sido aplicada.
II - Se o recorrente aceita que o teor expresso dos depoimentos prestados permite que a 1.ªnstância tenha estabelecido a factualidade apurada da forma como o fez e questiona tão só a credibilidade que, no seu entender, não deveria ter-lhes sido concedida, sem indicar elementos objectivos que imponham a sua posição, a sua pretensão fracassa pois a credibilidade dos depoimentos, quando estribadas em elementos subjectivos e não objectivos é um sector especialmente dependente da imediação do Tribunal, dado que só o contacto directo com os depoentes situados na audiência de julgamento, perante os outros intervenientes é que permite formar uma convicção que não pode ser reproduzidas na documentação da prova e logo reexaminada em recurso.
III - Se apesar de se esforçar, a 1.ªnstância não consegue estabelecer o motivo que levou o arguido a agir, mas estão presentes todos os elementos do respectivo tipo legal de crime, nenhuma dúvida se pode levantar sobre a culpabilidade do agente.
IV - Não é de optar pela pena de multa nos crimes de violação de domicílio e detenção ilegal de arma, quando o agente entra na casa do ofendido sem autorização, armado e dispara contra aquele, só não o matando por circunstâncias alheias à sua vontade.
V - Deve entender-se que do n.º 1 do art. 132.º do CP, que contém uma cláusula geral, resulta que o homicídio é qualificado, ou agravado, sempre que a morte for produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade; é essa a matriz da agravação, por forma a que sem especial censurabilidade ou perversidade, ela não ocorre. Depois, ao lado desse critério aferidor da qualificação assente na culpa e que recorta efectivamente o tipo incriminador, o legislador produz uma enumeração aberta, meramente exemplificativa pois, de indicadores ou sintomas de especial censurabilidade ou perversidade, de funcionamento não automático, como o inculca a expressão usada na lei 'é susceptível' (1.ª parte do corpo do n.º 2).
VI - Mas os indicadores enumerados não esgotam a inventariação e relevância de outros índices de especial censurabilidade ou perversidade que a vida real apresente, como resulta da expressão usada pelo legislador: 'entre outras' no segmento final do corpo do n.º 2. De concluir é, pois, que nem sempre que está presente algum dos indicadores das diversas alíneas do n.º 2 se verifica o crime qualificado, bastando para tanto que, no caso concreto, que esse indicador não consubstancie a especial censurabilidade ou perversidade a que se refere o n.º 1; mas que na presença deste último elemento, está-se perante um crime de homicídio qualificado mesmo que se não se verifique qualquer daqueles indicadores.
VII - Para impugnar a qualificação da conduta como constituindo homicídio qualificado, deve o arguido afirmar e demonstrar que a morte não foi produzida em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, designadamente o índice do n.º 2 do art. 132.º do CP que tiver sido invocado, pois que, independentemente da verificação de qualquer circunstância prevista naquele n.º 2 do art. 132.º, sempre se poderia considerar incluso na previsão do n.º 1 do mesmo artigo.
VIII - Decorre do princípio da proibição da reformatio in pejus que, se em recurso só trazido pelo arguido, for ordenada a devolução do processo, não poderá a instância vir a condenar o recorrente em pena mais grave do que a infligida anteriormente. Mas a compreensão daquele princípio integra o processo justo, o processo equitativo, tributário da estrutura acusatória do processo, consagrada constitucionalmente e do princípio da acusação, que impõe que nos casos em que a acusação se conforma com uma decisão e o recurso é interposto apenas pelo arguido, ou no seu interesse exclusivo, fiquem limitados os parâmetros da decisão e condicionado no processo o poder de decisão à não alteração em desfavor do arguido.
IX - Aceita-se que seja de esperar que o Tribunal Superior, que 'desqualificou' um determinado crime, entendendo que a conduta do arguido corporizava antes o tipo simples correspondente, diminua a pena aplicável, agora numa moldura penal abstracta mais favorável. Mas tal não se impõe inevitavelmente, mesmo que a pena aplicada pelo crime mais grave, se mostre justa e adequada na nova moldura, recorrendo-se então, para baixar a pena a uma 'proporcionalidade formal' com base na diferença das molduras, e uma ficção sobre o que faria o tribunal recorrido, em vez do Tribunal Superior aplicar, como lhe compete, autonomamente a lei.
         Proc. n.º 4324/04 - 5.ª Secção Simas Santos (relator) * Santos Carvalho Costa Mortágua Quinta Gomes
 
I - O DL 401/82, de 23-09, não comporta uma aplicação cega e imediata do regime nele estabelecido só porque se trata de menor de 21 anos, sendo certo que o factor idade não sustenta só por si a aplicação da atenuação especial exigindo-se, ainda, que essa atenuação facilite a reinserção e que o juízo de probabilidade assente, não em mero subjectivismo, mas em elementos factuais provados que conduzam à conclusão de que a moldura penal comum não cumpre, por excessiva, os fins de ressocialização.
II - Resultando da factualidade provada que o arguido, estudante de engenharia, aproveitando-se da confiança que a menor, de 9 anos de idade, nele depositava e, com requintes de ordem sexual já bem determinados, sentou-a no colo e, a dado momento, colocou a menor no chão, baixou-lhe as calças e as cuecas e depois, já com o seu pénis de fora, sentou-a de novo no seu colo e segurando-a com ambas as mãos pela cintura, introduziu-lhe o pénis erecto na vagina, contra a vontade da menor, lacerando-lhe o hímen, que provocou na menor sensação dolorosa que a fez chorar, sangrando para as cuecas e calças, a forma como o arguido perpetrou o crime revela um grau elevado de ilicitude, não só pelo resultado do acto praticado, mas ainda pelas alterações a nível comportamental provocadas na ofendida, que deixou de ser comunicativa e passou a ser uma criança introvertida, triste e reservada, e que tem necessidade de acompanhamento médico-psiquiátrico.
III - E não é a circunstância de o arguido ter assumido a prática do acto nem o facto de possuir uma personalidade com alguma dificuldade em controlar as situações e emoções, que tornou possível que ignorasse todos os constrangimentos, o maior dos quais seria a própria idade da vítima que pode justificar a aplicação do diploma referido e uma atenuação especial da pena.
IV - Dentro da moldura penal de 3 a 10 anos de prisão, correspondente ao crime de abuso sexual de crianças p. e p. pelo art. 172.º, n.º 2, do CP, e considerando o modo de execução do crime, as graves consequências para a vítima, a idade do arguido (19 anos à data da prática do crime) e o tempo já decorrido desde o seu cometimento, a circunstância de o arguido nem sequer ter tentado reparar o mal do crime e, ainda, a circunstância de a grande consternação que sente pelo sucedido e a sua sensação de culpa assentar no impacto que possa ter para a sua própria vida e não pelas consequências que teve para a menor, com quem mantinha um relacionamento quase familiar, e o disposto no art. 71.º do CP, a pena ajustada ao comportamento do arguido será a de 4 anos de prisão, na qual beneficiará do perdão a que se refere o art. 1.º da Lei 29/99, de 12-05.
V - Tendo resultado bem patentes na factualidade provada os traumas que atingiram e ainda atingem a menor, a grande instabilidade emocional que a mesma passou a denotar, e os quadros de angústia e sofrimento que tem vivido ao longo destes anos, ao ponto de terem provocado uma diferente matriz de comportamento, com traços de tristeza e isolamento que substituíram o seu anterior padrão de criança comunicativa, entende-se como ajustada à situação criada pelo arguido em relação à menor e aos resultados de ordem patrimonial (danos apurados no montante de € 1.010,85) e moral por esta sofridos que o valor da global indemnização a pagar pelo arguido seja fixado em € 20.000,00.
         Proc. n.º 3663/04 - 3.ª Secção Rua Dias (relator) Pires Salpico Henriques Gaspar (tem voto de vencido
 
Nos termos do art. 2.º, n.º 2, da Lei 65/2003, de 23-08, será concedida a extradição com origem num mandado de detenção europeu, sem controlo da dupla incriminação do facto, sempre que os factos, de acordo com a legislação do Estado Membro da emissão, constituam as infracções mencionadas nas alíneas seguintes e sejam puníveis com pena ou medida de segurança privativas da liberdade de duração máxima não inferior a 3 anos.
         Proc. n.º 559/05 - 3.ª Secção Silva Flor (relator) Soreto de Barros Armindo Monteiro
 
I - É ponto assente na doutrina e na jurisprudência que as circunstâncias qualificativas previstas no n.º 2 do art. 132.º do CP não integram a tipicidade criminal, sendo antes um elemento da culpa, de funcionamento não automático; tudo está assim em saber se as circunstâncias em que o crime foi cometido e/ou a sua motivação revelam especial censurabilidade ou perversidade, no sentido de a atitude do arguido se mostrar particularmente desvaliosa, em termos de justificar a agravação da pena.
II - Se, como no caso, não só não se provou qualquer circunstância que diminuísse os naturais mecanismos inibitórios de atentar contra a vida dos progenitores, como se provou que o arguido agiu em circunstâncias que suscitam um forte juízo de censura: dirigiu-se a casa da mãe e, depois de lhe puxar os cabelos, encostou-lhe a pistola à cabeça, atrás da orelha esquerda, e disparou um tiro, com intenção de a matar, só não ocorrendo o efeito letal por circunstâncias alheias à sua vontade, tal conduta é reveladora de grande insensibilidade e até de desprezo pela vida da mãe, atingindo valores de justiça profundamente arreigados na comunidade, em termos geradores de um repúdio social muito mais acentuado do que se verificaria se se tratasse de um homicídio simples, sendo líquido que se verifica a circunstância qualificativa do crime de homicídio prevista na al. a) do art. 132.º do CP:III - A diminuição da imputabilidade não importa necessariamente uma atenuação da pena e menos ainda uma atenuação especial; pode haver casos em que a diminuição da imputabilidade conduza à não atenuação ou até mesmo à agravação da pena, quando as qualidades pessoais do agente que fundamentam o facto se revelem, apesar da diminuição da imputabilidade, particularmente desvaliosas e censuráveis, v. g., em casos como os da brutalidade e da crueldade que acompanham muitos factos dos psicopatas insensíveis, os da inconstância dos lábeis ou os da pertinácia dos fanáticos (cfr. Figueiredo Dias, Jornadas de Direito Criminal, pág. 77).
IV - No caso concreto, atentas as circunstâncias dos crimes, em que assume particular relevo o desígnio do arguido de matar a mãe, sendo o crime de detenção ilegal de arma instrumental daquele e tendo o crime de homicídio de que foi vítima o tio, irmão da mãe, ocorrido na sequência do primeiro, não se poderá falar de uma acentuada diminuição da culpa resultante de imputabilidade diminuída, ao que acresce que a especial censurabilidade da conduta que integra o crime de homicídio qualificado, na forma tentada, seria incompatível com essa diminuição.
         Proc. n.º 4708/04 - 3.ª Secção Silva Flor (relator) Soreto de Barros Armindo Monteiro Sousa Fonte
 
I - Resultando da matéria de facto provada que:- no dia 02-04-2004, o arguido foi detido por agentes da PSP quando tinha na sua posse 6 'sabonetes' de haxixe, com o peso líquido de 1.469,237 grs., que acabara de comprar no bairro da Amadora;- despendeu a quantia de 800€ na aquisição do produto;- à data dos factos, trabalhava na Casa da Moeda e auferia vencimento mensal de 817€, local onde trabalhava desde Janeiro de 2000 e vivia com os pais;- tem o 12.º ano de escolaridade e neste momento está desempregado em virtude de ter sido despedido com justa causa;- não tem antecedentes criminais e é tido pelos amigos e conhecidos como sendo uma pessoa honesta e trabalhadora;e não se provando que o arguido era consumidor de haxixe ou qual o destino que seria dado ao estupefaciente que detinha, podemos, em síntese, afirmar que o arguido teve na sua posse a referida quantidade de estupefacientes por escassos momentos, não tinha qualquer ligação a redes de tráfico, não dispunha de meios logísticos e constituiu este um acto isolado na sua vida.
II - Estas circunstâncias, por revelarem considerável diminuição da ilicitude do facto, apenas reclamam a aplicação da previsão sancionatória do art. 25.º do DL 15/93, de 22-01 - e não a do art. 21.º, n.º 1, do mesmo diploma, como decidiu o tribunal a quo -, mostrando-se adequada e proporcionada a pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo período de 3 anos, mediante acompanhamento por técnico de reinserção social, a quem o arguido se deve apresentar, no prazo de 30 dias, e posteriormente, com a regularidade e periodicidade que lhe for indicada.
         Proc. n.º 4552/04 - 3.ª Secção Antunes Grancho (relator) Silva Flor Soreto de Barros Armindo Monteiro
 
I - Se o recorrente quer impugnar validamente a matéria de facto, gravada em audiência, em vista da sua modificabilidade pela Relação, ao abrigo do art. 431.º, al. b), do CPP, por a entender incorrectamente julgada, cabe-lhe o incontornável ónus de especificar os pontos de facto incorrectamente julgados, as provas que fundam decisão diversa da proferida, a sua identificação nos suportes técnicos das provas, havendo lugar a transcrição, que incumbe ao tribunal recorrido, nos termos dos n.ºs 3, als. a) e b), e 4, do art. 412.º do CPP.
II - E a especificação a que alude o preceito - que apresenta paralelismo quase coincidente com o art. 690.º-A, n.º 1, als. a) e b), do CPC - é a indicação individualizada, ponto por ponto, do facto, não bastando a remissão genérica para as provas e factos globalmente fixados pelo tribunal.
III - Tendo o Mº Juiz Desembargador relator convidado o arguido a dar cumprimento a tal ónus, sob cominação de rejeição do recurso quanto à matéria de facto, dando-lhe conhecimento, nesse mesmo despacho, de que as transcrições dos depoimentos prestados em audiência de julgamento se mostravam incorporadas nos autos, estava o arguido em plenas condições de corresponder à estruturação do recurso nas condições legais.
IV - Aliás o arguido nem sequer carecia de conhecer as transcrições - bastando-lhe que indicasse nas conclusões os locais dos suportes magnéticos onde figuram os factos incorrectamente provados e os meios de prova a justificar diversa fixação -, pois as transcrições servem, apenas, para o tribunal de recurso analisar a prova que daquelas resulta, não sendo motivo impeditivo do direito ao recurso a sua falta e nem de suspensão do prazo peremptório de interposição de recurso.
V - Tendo o recorrente preferido requerer à Relação que lhe fossem remetidas as cópias das transcrições e não tendo reagido perante a resposta da sua disponibilidade no processo, onde podiam ser consultadas, só a si se devem imputar as consequências da inobservância do art. 412.º, n.ºs 3, als. a) e b), e 4, do CPP, conducente à rejeição do recurso em sede de matéria de facto, após lhe ter sido dada a oportunidade de corrigir as deficiências de que enfermava a respectiva petição.
VI - O CP, no seu art. 30.º, n.º 2, partilha, na estruturação do crime continuado, do entendimento da criação de condições exteriores ao agente reduzindo-lhe a culpa, redução que não é possível focalizar na convivência mantida entre o arguido e a vítima, em condições análogas às dos cônjuges e na conjugal, isto porque preponderam mais tratos físicos e psíquicos de forma repetida e em grau crescente de gravidade, trazendo, por essa praticabilidade, maior ilicitude e culpa mais censurável.
VII - Se o agente do crime, 'em crescendo', faz desencadear, durante anos a fio, sem emenda, uma personalidade violenta, que nunca recua ante a ofensa e pelo contrário mais a agudiza, desrespeitadora de regras basilares de convivência entre aquela que, primeiro, foi sua companheira e depois esposa, não é descortinável uma situação exterior ao crime, que diminua consideravelmente a culpa do agente, em grau elevadíssimo, a menos que, contraditoriamente, se houvesse de entender dever funcionar a vida em comum como que um palco autorizando a prática de violência física e psíquica.
VIII - O crime continuado está reservado para situações em que se criou, após a primeira actividade criminosa, uma certa relação, um acordo entre os sujeitos à prática do crime, uma outra situação é voltar a verificar-se a mesma oportunidade que já foi aproveitada ou arrastou o agente para a primeira conduta criminosa ou uma solicitação criminosa exercida sobre o agente em consequência da perduração do meio apto para realizar um delito, que se criou ou adquiriu com vista a executar a primeira conduta criminosa, enquadramento factual inteiramente de arredar.
IX - Sendo de excluir a natureza continuada do crime de maus tratos, este integra um só ilícito, materializado numa pluralidade de factos praticados ao longo de vinte anos, unificados por uma mesma resolução criminosa, reafirmada e mantida ao longo dos anos de convivência entre o arguido e sua falecida esposa - é uma prática criminosa reiterada, não continuada no sentido técnico-jurídico.
X - A consagração de qualquer das circunstâncias enunciadas no art. 132.º, n.º 2, do CP, desencadeia o grupo valorativo dos casos agravados de homicídio, e para detecção de qualquer dos efeitos-padrão ali enumerados usa-se o método que atende ao princípio da ponderação global do facto e do autor.
XI - Significa, assim (escreve Teresa Serra, in Homicídio Qualificado, - Tipo de Culpa e Medida da Pena, Ed. Almedina, 2003. pág. 67), que só a existência de circunstâncias especiais no facto ou na pessoa do agente podem atenuar substancialmente o conteúdo do ilícito ou da culpa, de tal modo que se imponha a revogação do efeito de indício, e essas circunstâncias só logram afastar os exemplos-padrão se possuírem um significado essencial alterando a imagem global do facto, convergindo na pessoa do agente do crime ou sua acção circunstâncias extraordinárias que destaquem a sua ilicitude ou a sua culpa, claramente, do exemplo-padrão.
XII - O STJ tem vindo a fixar jurisprudência no sentido de que, para a ocorrência do 'motivo fútil', além da desproporção manifesta entre a gravidade do facto e o motivo que impeliu à acção, deve acrescer a mais alta insensibilidade moral, manifestada na brutal malvadez do agente, que se traduz em motivos subjectivos ou antecedentes psicológicos que, pela sua insignificância ou frivolidade, sejam desproporcionados com a acção; motivo fútil é aquele que não tem relevo, que não chega a ser motivo, a ausência de motivo, que não pode razoavelmente explicar (e muito menos justificar) a conduta criminosa.
XIII - O abandono do lar conjugal por parte de um dos cônjuges, sem justificar de modo algum a supressão do direito à vida do outro ou maus tratos, é, segundo as regras da experiência comum, fonte de grave perturbação pessoal e, como o divórcio, à luz das concepções sociais dominantes, nem sempre e por todos bem aceite, e é, igualmente, produtor, por vezes, de reflexos socialmente negativos para o atingido, pelo que, no desencadear da acção homicida, não se pode ver natureza frívola, fútil.
XIV - Não obsta à verificação da qualificativa prevista no art. 132.º, n.º 2, al. i), do CP (persistência na ideação criminosa por mais de 24 horas) a circunstância de o arguido ter municiado a arma, instrumento do crime, no 'dia do acto fatal', antes de matar a esposa, porque esse acto é resultante daquele desígnio criminoso pré-formado, ao pormenor, dias antes, maneira de lhe assegurar praticabilidade, nada tendo de inconciliável com tal qualificativa, inscrevendo-se no seu processo executivo, sem o interromper: o desígnio criminoso foi formado mais de 7 dias sobre a morte, preparada ao pormenor, desde logo pelo seguimento prévio dos passos e movimentos da vítima, escolha do local de consumação, em local ermo, descampado, onde o auxílio à vítima era impensável e a sua indefesa uma realidade certa, colhendo-a de surpresa, fazendo-lhe uma espera, pelo uso de uma arma, que sabia manusear bem, em obediência a um plano previamente reflectido sobre os meios de execução, frio, infalível, calculista e inflexível no propósito homicida, próprio de uma personalidade violenta, fria e embotada, no domínio da relação familiar, especialmente censurável, que também evidencia especial perversidade quando, vendo a vítima tombada no solo, já depois de a ter atingido com dois tiros, para se certificar que não escaparia à sua intenção homicida, dispara sobre ela ainda mais dois sobre a cabeça.
         Proc. n.º 3131/04 - 3.ª Secção Armindo Monteiro (relator) Sousa Fonte Pires Salpico Rua Dias
 
I - A suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que for considerada mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos.
II - Deste modo, as penas de prisão aplicadas em medida não superior a 3 anos devem ser, por princípio, suspensas na sua execução, salvo se o juízo de prognose sobre o comportamento futuro do agente se apresente claramente desfavorável, e a suspensão for impedida por prementes exigências de prevenção geral.
III - A circunstância de o recorrente ter sofrido condenação anterior em pena de prisão, suspensa na sua execução, não constitui impedimento ou razão que desaconselhe ou impeça essa medida.
IV - No caso concreto, bem em diverso, aponta para o reforço da sua conveniência e mesmo necessidade no plano da prevenção especial, pois aquela primeira condenação respeita a factos contemporâneos daqueles por que o recorrente vem condenado no processo, praticados em determinada idade (21 anos), mantendo validade os pressupostos da anterior condenação em pena suspensa.
         Proc. n.º 3491/04 - 3.ª Secção Henriques Gaspar (relator) Antunes Grancho Silva Flor
 
I - A decisão do tribunal da Relação proferida, não como instância formal de recurso, mas como instância de decisão no processo, em outro grau, sobre questão incidental cujo conhecimento a lei lhe defira, não se integra em qualquer das hipóteses de recurso para o Supremo Tribunal do Justiça previstas no art. 432.° do CPP.
II - Não se trata, de decisão proferida pela Relação em primeira instância (art. 432.°, n.° 1, al. a), do CPP), isto é, em que a competência em razão da matéria e da hierarquia para a decisão do caso e do objecto do processo caiba, em primeiro grau de conhecimento, e segundo as leis de organização e competências dos tribunais, aos tribunais da Relação, e não constitui também situação que se enquadre nas als. c), d) e e) do art. 432.° do CPP.
III - A al. b) do art. 432.º do CPP tem de ser interpretada em equilíbrio sistémico com o art. 400.°, n.° l, al. c), do CPP.
IV - A norma da al. c) do n.° l do art. 400°, quando se refere a decisões proferidas, em recurso, pelas Relações, que não tenham posto termo à causa, quer significar que a competência em razão da hierarquia para proferir decisões que não ponham termo à causa cabe às Relações, que decidem, em matérias interlocutórias, em última instância - quer seja decisão proferida em recurso, quer seja por ocasião de um recurso ou por intervenção incidental directamente deferida pela lei.
         Proc. n.º 4551/04 - 3.ª Secção Henriques Gaspar (relator) * Antunes Grancho Silva Flor
 
I - A nova Lei de Acidentes de Trabalho e o diploma que a regulamentou - respectivamente, Lei n.º 100/97, de 13-09 (LAT), e DL n.º 143/99, de 30-04 (RLAT) - veio alterar as condições de remição de pensões, estendendo o novo regime às pensões fixadas anteriormente à sua vigência.
II - A data da fixação da pensão não pode ser entendida como a data da decisão judicial que a fixou, mas sim a partir da qual a pensão é devida: em caso de morte, o dia seguinte ao falecimento do sinistrado e em caso de incapacidade permanente, o dia seguinte ao da alta.
III - Para determinar se a pensão vitalícia é de reduzido montante atende-se ao critério que resulta do art. 56.º, n.º 1, a) do RLAT, reportando-se os respectivos elementos (valor da pensão e da remuneração mínima mensal garantida mais elevada) à data da fixação da pensão.IV- Para efeitos de concretização gradual das remições de pensão, segundo o quadro estabelecido no art. 74.º do RLAT, releva o valor actualizado da pensão.
         Recurso n.º 4233/04 - 4.ª Secção Maria Laura Leonardo (Relator) Sousa Peixoto Vítor Mesquita
 
I -nvocar a caducidade do direito de instaurar procedimento disciplinar ou invocar a caducidade do procedimento disciplinar é juridicamente a mesma coisa.
II - Por isso, tendo o autor alegado a caducidade do direito de instaurar o procedimento disciplinar, não há excesso de pronúncia pelo facto de na sentença se ter conhecido da caducidade do procedimento disciplinar.
III - O conhecimento daquela caducidade obriga a que o juiz aprecie da eventual relevância do processo prévio de inquérito no que diz respeito à suspensão do prazo de caducidade.
IV - O processo prévio de inquérito só suspende o prazo de caducidade do procedimento disciplinar se for necessário para elaborar a nota de culpa.
V - Aquela necessidade não existe se a participação disciplinar apresentada contra o trabalhador já contiver a descrição pormenorizada dos factos que lhe são imputados e se esses factos tiverem sido do conhecimento do superior hierárquico com competência disciplinar sobre o trabalhador.
VI - O processo prévio de inquérito também não suspende o prazo de caducidade do procedimento disciplinar se entre a sua conclusão e a notificação da nota de culpa mediarem mais de 30 dias.
VII - Tendo a ré sido condenada na sentença a pagar ao trabalhador as retribuições que ele teria auferido até à data da sentença e não tendo este interposto recurso da sentença, a Relação, ao apreciar o recurso de apelação interposto pela entidade empregadora, não pode alterar oficiosamente aquela decisão e condenar aquela a pagar as retribuições que o trabalhador teria auferido até à data do acórdão.
VIII - As retribuições auferidas pelo trabalho prestado nos dias feriados não integram o conceito de retribuição para efeitos de cômputo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal.
         Recurso n.º 3593/04 - 4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator) * Vítor Mesquita Fernandes Cadilha
 
I - O Supremo Tribunal de Justiça, em regra, só pode conhecer das questões de direito.
II - O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa só pode ser fundamento de recurso de revista, quando tiver havido ofensa de disposição legal expressa que exija certa espécie de prova para a existência de determinado facto ou quando tiver havido violação de norma legal expressa que fixe a força probatória de determinado meio de prova.
III - O recurso de revista com aquele fundamento compreende-se, porque o erro cometido acaba por ser um erro de direito.
IV - Tendo o autor sido admitido ao serviço da ré com a categoria de encarregado de serralharia civil, para exercer funções de supervisionamento na montagem de uma estrutura metálica numa obra que a ré estava a construir nos Emiratos Árabes Unidos; exercendo ele essas funções sem qualquer autonomia e cumprindo o horário de trabalho que lhe tinha sido fixado pela ré e que era igual ao dos demais trabalhadores; auferindo ele uma retribuição mensal e utilizando apenas os instrumentos que lhe eram fornecidos pela ré que lhe fornecia ainda alojamento e alimentação, dúvidas não há acerca da natureza laboral do vínculo jurídico que entre eles foi estabelecido.
V - Se a acção tiver sido julgada procedente com base em dois fundamentos e se a mesma proceder verificado que seja um desses fundamentos, não é de conhecer do recurso de revista que tenha por objecto apenas a apreciação de um dos fundamentos, uma vez que a eventual procedência do recurso seria inconsequente relativamente à decisão propriamente dita.
         Recurso n.º 3428/04 - 4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator) * Vítor Mesquita Fernandes Cadilha
 
I - Os Tribunais do Trabalho não têm competência para, em acção de impugnação de despedimento, conhecer do pedido de condenação do réu a pagar as contribuições devidas à Segurança Social.
II - A decisão da Relação que confirme a condenação por litigância de má fé é passível de recurso de revista, se, cumulativamente, o valor da acção for superior à alçada da Relação e o valor da sucumbência do recorrente exceder metade daquela alçada.
III - O Supremo não pode tomar conhecimento do recurso de revista na parte relativa à impugnação da matéria de facto, fundada em erro de valoração da prova testemunhal produzida no processo.
         Recurso n.º 3037/04 - 4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator) * Fernandes Cadilha Mário Pereira Paiva Gonça
 
I - Os motoristas da Carris (Companhia Carris de Ferro) têm direito a um complemento de reforma a calcular nos termos da cláusula 62.ª do acordo de Empresa, celebrado entre aquela empresa e o Sindicato Nacional dos Motoristas e publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 29, de 08-08-1999.
II - Da soma da pensão com aquele complemento não pode resultar um montante superior ao da retribuição que o trabalhador auferia no activo.
III - No cálculo daquele complemento de reforma deve ser levada em conta não só a pensão paga ao trabalhador pela Segurança Social (Centro Nacional de Pensões), mas também a que lhe foi atribuída pela Caixa Geral de Aposentações.
         Recurso n.º 2952/04 - 4.ª Secção Sousa Peixoto (Relator) * Vítor Mesquita Fernandes Cadilha Mário Pere
 
I - Os factos admitidos por acordo que não constem da matéria dada como provada pelas instâncias devem ser tidos em consideração pelo Supremo, se relevantes para a decisão do pleito.
II - Ao verificar se houve (ou não) confissão tácita de uma das partes perante os factos alegados pela outra, o Supremo mais não faz do que usar dos poderes conferidos pela 2.ª parte do art. 722.º, n.º 2 do CPC, ou seja, apreciar se ocorreu ou não ofensa de disposição expressa da lei sobre determinado meio de prova.
III - Considerar que se mostram admitidos por acordo factos não impugnados (art. 490.º n.º 2 do CPC) equivale a dizer que os mesmos se consideram plenamente provados mercê do acordo formado por declarações convergentes: sua afirmação por uma das partes e confissão tácita da outra.
         Recurso n.º 4094/04 - 4.ª Secção Maria Laura Leonardo (Relator) * Sousa Peixoto Vítor Mesquita
 
I - O elemento essencial de distinção entre o contrato de trabalho e o contrato de prestação de serviços reside na subordinação jurídica, que se traduz no poder do empregador conformar, através de ordens, directivas e instruções, a prestação a que o trabalhador se obrigou.
II - É de qualificar como de trabalho o contrato celebrado entre a ré e o autor, nos termos do qual este desempenhava as funções de vigilante, mediante fiscalização da ré - quer através de telefonemas, quer através de passagem com regularidade de supervisores -, em horário de trabalho definido pela ré, com material (farda e outros instrumentos de trabalho) fornecido por esta e mediante remuneração fixa.
         Recurso n.º 4087/04 - 4.ª Secção Paiva Gonçalves (Relator) Maria Laura Leonardo Sousa Peixoto
 
I - A violação do direito de ocupação efectiva por parte da entidade patronal consubstancia um ilícito continuado.
II - Daí que o prazo de rescisão - dentro dos 15 dias subsequentes ao conhecimento dos factos (art. 34.º, n.º 2, da LCCT) -, se tenha de contar a partir da cessação da violação, altura em que o trabalhador tem verdadeiramente conhecimento dos factos que justificam a rescisão.
III - O reconhecimento do direito do trabalhador à ocupação efectiva não se confunde com o direito ao trabalho consagrado na norma programática do n.º 1 do art. 58.º da CRP, na medida em que este visa, fundamentalmente, o direito à ocupação de um posto de trabalho de acordo com a obrigação do Estado de definição de políticas de criação de postos de trabalho, enquanto aquele se reporta a um momento posterior, onde o que está em causa é a própria realização pessoal do trabalho.
III - Constitui justa causa de rescisão do contrato pela autora - que ao serviço da ré executava funções ligadas ao serviço de escritório, nomeadamente, a tratar a correspondência, a conferir a facturação dos fornecedores, a pagar aos fornecedores, a arquivar os documentos relativos à facturação a pagamentos aos fornecedores e a conferir as relações do material abatido ao activo -, a seguinte factualidade:- a partir de Fevereiro de 2002, a ré transferiu para o escritório de Aveiro o serviço de facturação e de pagamento aos fornecedores, tendo, nessa altura, retirado à autora o tratamento da correspondência e a conferência de listas do material abatido ao activo;- a ré, depois de saber da recusa da autora em aceitar a proposta de revogação do contrato de trabalho, por mútuo acordo, esvaziou a secretária da trabalhadora de todo o material por ela utilizado no desempenho das suas funções, o que motivaria que, a partir daí e durante o horário de trabalho, a mantivesse sentada à secretária sem qualquer trabalho para executar.
         Recurso n.º 3679/04 - 4.ª Secção Paiva Gonçalves (Relator) Maria Laura Leonardo Sousa Peixoto
 
I - Constitui justa causa de despedimento o comportamento do autor, gerente bancário, que violando ordens dos seus superiores hierárquicos e os regulamentos da ré, autorizou descobertos para além dos seus poderes em termos de montante e tempo, autorizou a rotação de cheques e a destitularização de crédito, ocultou saldos devedores nas contas de terceiros e concedeu créditos sem as devidas garantias.
II - O abuso do direito pressupõe a existência de uma contradição entre o modo ou o fim com que o titular exerce o seu direito, e o interesse ou interesses a que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito.
III - Não se verifica abuso do direito no exercício do poder disciplinar, por parte da ré, instituição bancária, se se prova que o autor, gerente bancário e trabalhador daquela, teve um procedimento que não era corrente no desenvolvimento da actividade bancária em geral e, muito menos, junto da ré, que sempre agiu disciplinarmente nessa situação, e que não obstante terem sido pagos prémios de produtividade e de mérito ao autor, tal deveu-se ao desconhecimento, na altura, dos factos que vieram a fundamentar o respectivo processo disciplinar.
         Recurso n.º 2841/04 - 4.ª Secção Paiva Gonçalves (Relator) Maria Laura Leonardo Vítor Mesquita
 
I - Estabelecendo uma Circular - Ordem de Serviço, emitida por uma seguradora em 1970, entre o mais, que 'Só adquirem direito aos donativos de reforma por invalidez os empregados que tenham pelo menos 5 anos de serviço activo, no momento em que pela Caixa Sindical, lhes seja reconhecido o direito a essa reforma', é de concluir que a mesma não se aplica ao autor que, tendo trabalhado para a ré, veio a reformar-se por invalidez numa altura que já não tinha vínculo laboral com esta, por o contrato de trabalho ter cessado por despedimento com justa causa há cerca de um ano e meio.
II - A referida Ordem de Serviço visou compensar a antiguidade e fidelidade dos seus trabalhadores, atenuando, e até eliminando, a diferença entre os ordenados que auferiam e as pensões por invalidez que passassem a receber da Segurança social, por forma a esbater ou mesmo suprimir a diminuição de rendimentos dos mesmos aquando da passagem à reforma, permitindo-lhes manter um estatuto económico idêntico ao que tinham no activo.
III - Daí que o apontado objectivo e esquema só faça sentido quanto aos trabalhadores da ré e não quanto aos seus ex-trabalhadores.
IV - Porém, o autor tem direito à pensão complementar de reforma ao abrigo do CCT celebrado entre o Sindicato dos Trabalhadores de Seguros do Sul e Regiões Autónomas e a Associação Portuguesa de Seguradores, publicado no BTE, 1.ª série, n.º 20, de 29 de Maio de 199.
V - A cláusula 52.ª, n.º 21 do referido CCT, aplica-se aos ex-trabalhadores de seguros que preencham os requisitos ali previstos, independentemente dos motivos por que abandonaram a actividade seguradora, abrangendo, portanto, também os despedimentos com justa causa.
VI - Por força do reconhecimento do direito do autor à pensão complementar de reforma, tem igualmente direito ao 13.º mês, também designado 'subsídio de Natal', e 14.º mês, vulgarmente designado 'subsídio de férias', sobre essa pensão.
         Recurso n.º 345/04 - 4.ª Secção Mário Pereira (Relator) Salreta Pereira Paiva Gonçalves
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