ACSTJ de 05-05-2005
Presunções judiciais Poderes da Relação Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Abalroação Navio Comandante de navio Responsabilidade
I - Presunções são as ilações que a lei ou o julgador tiram de um facto conhecido para firmar um outro desconhecido, sendo as judiciais unicamente admitidas nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art.ºs 349 e 351 do CC). II - As presunções judiciais inspiram-se nas regras da experiência, nos juízos correntes de possibilidade, nos princípios da lógica ou nos próprios dados da intuição humana, traduzem-se em juízos de valor formulados perante os factos provados e reconduzem-se ao julgamento da matéria de facto, pelo que são insindicáveis pelo STJ (art.ºs 26 da LOFTJ e 722, n.º 2, e 729, n.º 2, do CPC). III - Porém, são passíveis de censura pelo STJ as presunções judiciais feitas pelas instâncias em violação do disposto nos art.ºs 349 e 351 do CC e as que conflituam com as respostas dadas aos quesitos. IV - É vedado, pois, estabelecer presunções judiciais a partir de factos não provados, como impedido é o uso daquelas para contrariar respostas restritivas ou negativas aos quesitos. V - Resultando dos factos provados que o arrastão de pesca X navegava a uma velocidade de cerca de 11 nós e que o navio de carga Y seguia a uma velocidade entre os 10 e 11 nós, deve ter-se por correctamente extraída a presunção judicial de que qualquer das embarcações poderia navegar a maior ou menor velocidade que a outra, pois é de admitir uma certa faixa de sobreposição da velocidade do barco X com a velocidade do barco Y. VI - Esta presunção judicial, por resultar de uma dedução lógica ou num juízo de valor perante a matéria de facto provada (alicerçada, entre outras, na prova testemunhal), é insindicável pelo STJ. VII - Não sendo feita a prova de qual o navio alcançante e qual o alcançado (por ignorar-se, nomeadamente, que navio seguia à frente ou por trás e a velocidade mais lenta do que a do alcançante), é impossível concluir, em razão do posicionamento recíproco e da velocidade a que navegavam os navios, que foi violada por qualquer deles, em especial pelo arrastão X, a Regra n.º 13 do RIPEAM. VIII - Resultando dos factos assentes que: - os barcos X e Y navegavam com rumos diferentes que se cruzavam e que a sua marcha tornava inevitável a colisão entre as duas embarcações; - o barco X procedia do lado de estibordo do barco Y e como tal era a este que competia manobrar com a antecedência necessária para evitar o abalroamento; - o comandante do barco Y, em vez de prevenir a tempo que o rumo da sua embarcação cortasse a prova do X, confiou que seria este a alterar o seu rumo e, pois, que o evento não aconteceria; - o barco X manteve o seu curso, tendo então o comandante do barco Y ordenado a execução da manobra de viragem integral a bombordo, à qual o navio demorou algum tempo a responder, dando-se a colisão (por actuação tardia); deve concluir-se que o comandante do navio de carga Y agiu por forma a infringir as obrigações que lhe eram impostas pelas Regras n.ºs 15 e 16 do RIPEAM, responsabilidade essa que não sai prejudicada pela ausência de manobra do arrastão X 'para fugir' ao seu abalroamento (sem que infringisse a Regra n.º 13). IX - A actuação culposa do comandante do barco Y deve ter-se por culposa (art.ºs 487 do CC e 665 do CCom).
Revista n.º 817/05 - 7.ª Secção Ferreira de Sousa (Relator) Armindo Luís Pires da Rosa
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