ACSTJ de 10-05-2005
Fundamentação de facto Livre apreciação da prova Responsabilidade bancária
I - Na fundamentação da sentença, o juiz deve fazer o exame crítico das provas de que lhe cabe conhecer: artigo 659, n.º 3 do CPC. II - Essas provas, cujo exame crítico o juiz deve fazer na fundamentação da sentença, não são as mesmas provas de que fala o artigo 655 do CPC: a) quando decide a matéria de facto nos termos do art.º 655, o juiz aprecia as provas de livre apreciação; b) quando fundamenta a sentença nos termos do art.º 659, n.º 3, o juiz examina as provas que lhe cabe conhecer nesse momento, e que são as provas resultantes de presunções legais ou com valor legal fixado, se ainda não utilizadas, os ónus probatórios e os factos admitidos por acordo na audiência de julgamento. III - Por isso, se as provas produzidas foram todas provas de livre apreciação, não há provas cujo exame crítico deva ser feito na sentença, visto que o juiz não pode reapreciar na sentença as provas de livre apreciação, cujo exame crítico foi já feito no momento do julgamento da matéria de facto. IV - Se a sociedade autora, titular de conta no banco réu, demanda este por ter indevidamente transferido da sua conta para conta de terceiro determinada quantia, cujo reembolso pede na acção, tem a autora o ónus de alegar e provar a transferência, pelo banco, de fundos da sua conta para a conta de terceiro, por se tratar de facto constitutivo do seu direito ao reembolso dessa quantiaV - Se essa transferência foi feita dela entidade bancária em cumprimento de ordem de transferência dada pela autora, sua cliente, tal é facto impeditivo do direito da autora, por isso a alegar e provar pelo réu. VI - É por isso o banco réu quem tem de provar que a transferência foi devidamente autorizada pelo sócio gerente da autora, sua cliente, e, para tanto, que a assinatura aposta na ordem de transferência era do gerente da autora e tinha poderes bastantes para isso. VII - No entanto, o exame pericial (exame grafológico) é prova de livre apreciação, a apreciar no conjunto de todas as provas. VIII - Se a autora na acção nega que a assinatura aposta no documento de autorização para transferência seja do seu gerente, mas não nega que seja seu o carimbo aposto sob a assinatura, aquela alegação convence pouco, mas não constitui só por isso abuso de direito, na forma 'venire contra factum proprium', pois em teoria é sempre possível conciliar as duas coisas.
Revista n.º 963/05 - 1.ª Secção Reis Figueira (Relator) * Barros Caldeira Faria Antunes
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