ACSTJ de 19-05-2005
Contrato de compra e venda Gestão de negócios Ratificação Ineficácia Indemnização Abuso do direito
I - Constando expressamente na escritura pública de compra e venda que o Réu intervinha como declarante vendedor, por si e como gestor de negócios de sua mulher, do mesmo passo que a senhora notária fez consignar no documento ter prevenido da ineficácia do acto enquanto não fosse ratificado, não é pelo facto de o notário ter admitido o outorgante vendedor a intervir a coberto da gestão de negócios e de ter feito a advertência respectiva, que o julgador fica vinculado a esse juízo qualificativo. II - Efectivamente, enquanto juízo pessoal do documentador, excluída do acervo dos factos praticados pelo notário ou dos mencionados com base nas suas percepções, a qualificação da actuação do Réu como gestor de negócios vale apenas como elemento probatório sujeito à livre apreciação do Tribunal (art.º 371, n.º 1, do CC). III - A situação referida em não se enquadra no âmbito da alienação de bens comuns sem consentimento do outro cônjuge nos termos previstos no art.º 1687, n.ºs 1 e 2, do CC, antes integra os requisitos do instituto da gestão de negócios previstos no art.º 464 do CC. IV - O regime do art.º 1687 aplica-se aos casos em que o cônjuge intervém no acto em nome próprio e não também invocando a qualidade de gestor de negócios do outro cônjuge. V - Embora posteriormente à escritura, o Réu tenha afirmado algumas vezes perante os Autores que a vontade da mulher era vender a sua parte e a Ré tenha dito, numa ocasião, quando interpelada pelo Autor, que ratificaria o negócio, não há abuso do direito na posição dos Réus, sendo legítima a sua actuação. VI - Os Autores não poderiam nunca excluir a recusa da Ré como uma das consequências possíveis e legalmente previstas dos termos em que aceitaram formalizar a compra, não se revestindo a contrariedade sofrida e os incómodos que lhe estão associados de gravidade suficiente para merecerem a tutela que o art.º 496 do CC confere aos danos de natureza não patrimonial.
Revista n.º 3297/04 - 1.ª Secção Alves Velho (Relator) Moreira Camilo Lopes Pinto
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