ACSTJ de 19-05-2005
Contrato-promessa de compra e venda Incumprimento Erro sobre o objecto do negócio
I - Resultado dos factos assentes que: - os Réus sabiam que o Autor apenas celebraria o contrato prometido se a área dos prédios prometidos vender permitisse a construção de uma moradia unifamiliar; - os Réus asseguraram ao Autor que tais prédios tinham uma área de 19.984 m2 e comprometeram-se a, antes da celebração da escritura prometida, procederem à rectificação das áreas constantes da matriz predial, por forma a daí constar a área real de 19.984 m2; - o que levou o Autor a outorgar o contrato-promessa de compra e venda dos prédios em apreço, na convicção de que estes tinham a área de 19.984 m2; - os Réus não procederam à rectificação das áreas dos prédios, os quais, no seu conjunto têm uma área não superior a 18.113 m2; deve concluir-se que os Réus não têm razão quando afirmam que o Autor, ao não comparecer num determinado Cartório Notarial na data previamente comunicada para a celebração da escritura do contrato prometido, incumpriu o contrato-promessa, assistindo-lhes, assim, o direito à resolução do mesmo e a fazer seu o sinal que aquele lhes entregou. II - Na verdade, os Réus comprometeram-se a vender dois prédios com uma determinada área - área que era essencialmente determinante para o Autor, o que era do seu conhecimento -, sucedendo que o tamanho dos terrenos não correspondia àquele que eles supunham que seria o tamanho real, tendo até prometido para o efeito proceder à rectificação das estremas dos prédios. Porém, não procederam à rectificação das áreas dos prédios, pela própria limitação física dos mesmos, os quais têm, no seu conjunto, uma área não superior a 18.113 m2. III - Ou seja, o incumprimento que os Réus imputam ao Autor ficou a dever-se ao facto de o objecto negocial que o segundo prometera comprar não corresponder ao objecto que determinou, decisivamente, a sua vontade de prometer comprar, falta de correspondência ou ausência de conhecimento essencial essas que não lhe podem ser imputadas (já que confiou na promessa dos Réus quanto à área do terreno que prometeu comprar, como condição essencial e determinativa da construção da moradia). IV - Daí que não se possa dizer que no caso vertente o Autor, que constituiu sinal, deixou de cumprir por causa que lhe seja imputável, incorrendo dessa forma na previsão do art.º 442, n.º 2, do CC. V - Assim como não se pode dizer que também os Réus ficaram incursos na mesma previsão legal, já que resultou provado que os mesmos estavam convencidos de que a dimensão real dos terrenos era a que correspondia à vontade do Autor, para o que rectificariam as estremas (igual convencimento tinha o Autor, já que foi apenas nessa base que prometeu e entregou o sinal); porém, a área real somada dos dois prédios ficava aquém do seu convencimento, como se veio a verificar, sendo que desta forma o Autor já não queria o negócio. VI - Perante isto, o cenário normativo mais adequadamente convocado para a relação em conflito é o que respeita à anulação do negócio jurídico, pois é elementar reconhecer que o comprador foi 'involuntariamente enganado' quanto à área que prometera comprar. VII - Na verdade, o objecto material (mediato) do negócio não correspondia ao desejo e interesse manifestados do declarante (Autor) para a celebração da escritura de compra e venda, antecedida pela promessa. E tratava-se de um elemento essencial do negócio, determinante da sua vontade, essencialidade que os declaratários (Réus) bem conheciam. VIII - Está-se, pois, perante um vício negocial que afectou a formação e formulação da vontade, atingindo o negócio pela forma e consequências previstas pelos art.ºs 251 e 247 do CC, impondo-se, pois, a anulação do contrato-promessa, com a reconstituição da situação como se o negócio não tivesse sido realizado, designadamente, a restituição do sinal em singelo.
Revista n.º 1084/05 - 7.ª Secção Neves Ribeiro (Relator) Araújo Barros Oliveira Barros
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