ACSTJ de 0000-00-00
Responsabilidade extracontratual Ofensas à honra Denúncia de crime Colisão de direitos
I -Toda a participação criminal dirigida contra pessoa certa contém, objectivamente, ainda que a nível de suspeita sustentada por argumentos meramente indiciários, uma ofensa à honra e consideração do denunciado, por se traduzir na imputação de factos penalmente ilícitos. II -O acesso aos tribunais para fazer valer um direito é constitucionalmente garantido, e o direito de participar criminalmente pode, em certos casos constituir um dever cujo incumprimento será, por si, a comissão de um ilícito penal. Mas a participação não pode ser feita com a consciência da falsidade da imputação ou é crime de denúncia caluniosa. III -No crime de denúncia caluniosa os interesses protegidos pela incriminação são a administração da justiça, a não ser perturbada por impulsos inúteis e infundados e dos acusados a serem protegidos contra imputações falsas e temerárias lesivas da sua honra. Trata-se de um crime doloso, inadmitindo, sequer, o dado eventual como elemento subjectivo. IV -Ao direito à honra do denunciado contrapõe-se o direito à denúncia como “iter” de acesso á justiça e aos tribunais. V -Na colisão de direitos, que são desiguais, deve prevalecer o considerado superior. VI -Com princípio, o direito de denúncia prevalece notoriamente nos casos de denúncia vinculada (ou denúncia-dever funcional) e, em geral, porque como garantia de estabilidade, da segurança e da paz social no Estado de Direito deve assegurar-se ao cidadão a possibilidade quase irrestrita de denunciar factos que entende criminosos. VII -Para além da denúncia caluniosa, são restrições a linguagem ofensiva do texto (que não se limite à narração de factos mas lance epítetos ou emite juízos de valor sobre o denunciado) que, por si, pode ofender a honra, mas não esquecendo o princípio da necessidade do n.º 2 do artigo 154.º do CPC, sendo que, no mais (dever geral de diligência), deve ser feita uma avaliação casuística na ponderação do tipo de crime, na complexidade, sofisticação, necessidade de perícia e putativos agentes, que pode servir de critério para avaliar da grosseira leviandade da denúncia. VIII -O regular -ressalvando situações de abuso e de actividades perigosas -exercício do direito exclui a ilicitude (é causa de justificação) como pressuposto da responsabilidade civil.
Revista n.º 2680/08 -1.ª Secção Sebastião Póvoas (Relator) * Alves Velho Moreira Camilo Urbano Dias Garcia Calejo (voto de vencido)
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