ACSTJ de 14-05-2009
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça Matéria de facto Causa de pedir Actividades perigosas Teoria da substanciação Princípio dispositivo Alteração da qualificação jurídica Responsabilidade contratual Responsabilidade extracontratual
I -O STJ, salvo as situações de excepção legalmente previstas só conhece matéria de direito, sendo que, no âmbito do recurso de revista, o modo como a Relação fixou os factos materiais só é sindicável se foi aceite um facto sem a produção do tipo de prova para tal legalmente imposta ou tiverem sido incumpridos os preceitos reguladores da força probatória de certos meios de prova. II - É à Relação que compete a censura das respostas aos artigos da base instrutória no uso normal dos poderes que lhe conferem os n.ºs 1 e 4 do art. 712.º do CPC. III - O STJ só pode usar da faculdade do n.º 3 do art. 729.º do CPC, perante patente contradição da matéria de facto apurada pelas instâncias ou se a mesma for de tal modo omissa que se revele insuficiente para ulterior subsunção, essencial para a sorte da demanda. IV - O conceito de causa de pedir é delimitado pelos factos jurídicos dos quais procede a pretensão que o demandante formula, cumprindo às partes a alegação desses factos, apenas nos quais o juiz funda a sua decisão, embora possa atender, ainda que ex officio, aos instrumentais, que resultem da instrução e da discussão e aos que sejam complemento ou concretização de outros. V - O juiz está limitado pelo princípio do dispositivo, mas a substanciação (ou consubstanciação) permite-lhe definir livremente o direito aplicável aos factos que lhe é lícito conhecer, buscando e interpretando as normas jurídicas. VI - Tal princípio pode implicar uma convolação da situação jurídica alegada pelas partes e a sua submissão a diferentes normas. VII - Perante uma causa de pedir complexa, traduzida em factos que podem integrar quer a responsabilidade contratual, quer a responsabilidade aquiliana, o julgador pode inseri-los em qualquer dos institutos desde que, a final, não condene quantitativamente ou qualitativamente para além do pedido, isto é se mantenha nos limites do n.º 1 do art. 661.º CPC. VIII - Embora na responsabilidade contratual exista uma presunção de culpa (n.º 1 do art. 799.º do CC) que o devedor tem de ilidir, alegando e demonstrando factos, ou circunstâncias, excepcionais que reduzam ou neutralizem a censurabilidade da sua conduta, também na responsabilidade extracontratual (cuja regra é o ónus da prova da culpa cumprir ao lesado (n.º 1 do art. 487.º CC) existem casos de culpa presumida, sendo um deles a do n.º 2 do art. 493.º do CC. IX - Se o juiz pode subsumir livremente ao factos ao direito e não está vinculado à qualificação jurídica do demandante, o demandado tem de lidar com os factos alegados, negando-os, desvalorizando-os ou justificando-os, não sendo surpreendido pela integração que o julgador fez. X - Ademais, à responsabilidade contratual sempre se aplicam subsidiariamente as normas da responsabilidade aquiliana, que é matriz de toda a responsabilidade civil. XI - A qualificação de uma actividade como perigosa – quer em si mesmo, quer no seu exercício – deve ser feita casuisticamente atentando no estado de perigo anormal criado em concreto e baseando-se em indícios consistentes na experiência comum, no sentir do homem médio e na sensibilidade do legislador (que, em regra baseado em pareceres técnico-científicos) a regulou como tal. XII - A operação de montagem e desmontagem de uma viga de lançamento (com cerca de 100 toneladas e a 30 metros de altura) constituída por várias peças, é uma actividade perigosa e como tal qualificada no Anexo II n.º 10, reportado ao n.º 3 do art. 6.º do DL n.º 155/95, de 01-07, que transpôs para o direito interno a Directiva n.º 92/57 CEE do Conselho, de 01-07.
Revista n.º 162/09.1YFLSB -1.ª Secção Sebastião Póvoas (Relator) * Moreira Alves Alves Velho
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