ACSTJ de 28-05-2009
Omissão de pronúncia Matéria de facto Usucapião Posse de boa fé
I -Só existe omissão de pronúncia, nos termos do art. 668.º, n.º 1, al. d) (1.ª parte), do CPC, quando o tribunal deixe de apreciar questões submetidas pelas partes à sua apreciação, e não quando deixa de apreciar algum argumento por elas produzido ou apresentado. II - A asserção, constante da matéria de facto que as instâncias deram como assente “convencidos (os réus) de que exerciam um direito de passagem”, não é um mero juízo conclusivo -é um facto do foro psicológico que se insere, claramente, dentro do perímetro delimitativo da matéria de facto. III - A usucapião é um meio de aquisição originária de direitos reais de gozo que assenta em dois requisitos: a posse e o decurso de certo lapso de tempo. IV - No que toca ao requisito «posse», em caso de dúvida o exercício do corpus faz presumir a existência do animus possidendi. V - O segundo requisito varia, na sua extensão, conforme as circunstâncias previstas nos arts. 1294.º e segs. do CC, relevando sempre a circunstância de a posse ser de boa fé ou de má fé. VI - A posse diz-se de boa fé quando o possuidor ignorava, ao adquiri-la, que lesava o direito de outrem (art. 1260.º, n.º 1, do CC); o elemento constitutivo da boa fé é, pois, negativo, não tendo o possuidor que fazer a prova de estar convencido de que não lesa direito de outrem. VII - Este conceito de boa fé é de natureza psicológica e não de índole ética: possui de boa fé quem ignora que está a lesar os direitos de outrem, sem que se tenha de entrar em linha de conta com ser ou não tal ignorância censurável ou desculpável. VIII - Cabe ao juiz retirar da globalidade do circunstancialismo de facto dado como provado, como inferência do raciocínio lógico, segundo as regras práticas da experiência comum, os conhecimentos da vida ou da ciência e as leges artis, o juízo conclusivo sobre a existência da boa fé.
Revista n.º 349/09 -2.ª Secção Santos Bernardino (Relator) * Bettencourt de Faria Pereira da Silva
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