ACSTJ de 09-06-2005
Prescrição do procedimento criminal Questão prévia Princípio da preclusão Tráfico de estupefacientes Atenuação especial da pena Dispensa de pena Distribuição por grande número de pessoas Avultada comp
I - Uma questão que não foi objecto de conhecimento pelo acórdão recorrido é uma questão nova de que o Supremo não pode conhecer em recurso, que, como se sabe, é um meio de corrigir o que foi decidido e, não, um processo de obter decisões novas. II - Se perante a matéria de facto se der conta de que, afinal, ninguém sabe, porque as instâncias não cuidaram ou não conseguiram precisá-lo, qual o número, sequer aproximado, de pessoas por quem a droga foi 'difundida', se daquela matéria de facto não resulta que ela tenha sido distribuída senão pela escassa meia dúzia de pessoas ali referenciadas, ignorando-se se, depois disso, foi ou não entregue, vendida ou cedida, a qualquer título, a outras pessoas e qual o número, ao menos aproximado delas, enfim, o destino final que teve, não passa de mera redundância a afirmação feita pelo tribunal recorrido, segundo a qual 'Do exposto resulta […] que a conduta da arguida … integra a previsão normativa do crime de tráfico de estupefacientes agravado, p. e p., pelos arts. 21.º, n.º 1, e 24.º, als. b) e c), do DL 15/93, de 22-01, cuja moldura penal abstracta corresponde a 5 anos e 4 meses a 16 anos de prisão'. III - Nestas circunstâncias, a conclusão por pretensa difusão da droga 'por grande número de pessoas' a que chegou o entendimento do tribunal recorrido, não passa disso mesmo: uma mera conclusão não confortada na extensão exigível, em factos provados. IV - E não havendo outros elementos que elucidem a tal ponto, na dúvida ora insuperável em que a matéria de facto nos deixa, o caminho a seguir é conhecido: há que tê-la pro reo, o que quer dizer mais precisamente que não pode haver-se como provado em desfavor da recorrente que a droga tenha sido difundida por 'grande número de pessoas', já que nem sequer aproximativamente os factos provados deixam a ideia do número de pessoas atingidas pela difusão. V - Resultando, porém, provado que a arguida procedeu a depósitos bancários, entre Janeiro de 1999 e Maio de 2000, no montante global de Esc. 20.476.500$00 (vinte milhões, quatrocentos e setenta e seis mil e quinhentos escudos), e sabendo-se que tamanha quantia monetária proveio do 'negócio' de venda de estupefacientes, pode afirmar-se com segurança que, nas circunstâncias socio-económicas actuais e comuns no País, ela constitui, inquestionavelmente, mesmo em termos absolutos, uma 'elevada compensação remuneratória', o que permite manter a qualificação do tráfico como agravado por esta via. VI - O que subjaz ao prémio do art. 31.º do DL 15/93, é, concerteza, uma atitude activa e decidida, espontânea e voluntariamente assumida pelo agente no sentido de abandonar a actividade ou minimizar os seus efeitos, ou auxiliar na recolha de provas decisivas, para a identificação e captura de outros responsáveis. VII - Assim, uma confissão, embora de algum relevo (não decisivo) mas prestada com evidente calculismo e a reboque dos acontecimentos terá o seu lugar próprio de valoração no âmbito do art. 71.º, n.º 2, do CP, mas não mais do que isso, já que a norma especial do citado art. 31.º, premeia um comportamento também ele especial, não apenas de abandono activo da actividade traficante, como de colaboração activa e relevante, através de actos que inequivocamente revelem que o agente transpôs a barricada do crime para se assumir como um seu combatente activo.
Proc. n.º 3992/04 - 5.ª Secção Pereira Madeira (relator) * Simas Santos Santos Carvalho Costa Mortágu
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