Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) - Criminal
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ACSTJ de 23-06-2005
 Homicídio privilegiado Compreensível emoção violenta Desespero Culpa Competência do Supremo Tribunal de Justiça Medida de pena
I - 'A compreensível emoção violenta e o desespero privilegiam [o homicídio] não quando afectam o poder de resistência do agente à pulsão interior, mas apenas quando diminuem de forma sensível a exigibilidade de outro comportamento', constituindo, tal como o 'motivo de relevante valor social ou moral', 'elementos exclusivamente atinentes à culpa do agente' (Comentário Conimbricense,-48).
II - Sendo assim, e 'tal qual sucede com a ideia da exigibilidade como componente da culpa jurídico-penal', 'o efeito diminuidor da culpa ficar-se-á a dever ao reconhecimento de que, naquela situação (endógena e exógena), também o agente normalmente 'fiel ao direito' teria sido sensível ao conflito espiritual que lhe foi criado e por ele afectado na sua decisão'.
III - Daí que a 'emoção violenta', o 'desespero' e o 'motivo de relevante valor social ou moral' não funcionem automaticamente ('por si e em si mesmos'), mas 'só quando conexionados com uma concreta situação de exigibilidade diminuída por eles determinada', ou seja, apenas quando 'o agente actue dominado por aqueles estados ou motivos'.
IV - No caso, já haviam decorrido, à data do crime, 11 meses sobre aquela em que o arguido soubera da 'relação amorosa' da companheira (com a qual nem sequer era casado), 'facto que, provocando-lhe muitos ciúmes, deteriorou ['profundamente'] o seu relacionamento', e 21 dias sobre aquele em que se lhe tornara 'evidente que a companheira o preteria' e que a sua nova relação era duradoira e sem retorno. É certo que 'cerca de um mês antes, o arguido passara a ser abordado por amigos e conhecidos que lhe falavam do [tal] relacionamento' e que na casa de pasto que ele e a companheira exploravam, passara a ser 'objecto de chacota por parte dos frequentadores'. E que o arguido 'desde que se soube dos factos', 'passou a viver, por causa deles, num estado de grande tristeza, angústia e desolação'. Todavia, estes ciúmes, 'desespero', desdém, frustração e abatimento não constituem 'motivo de valor social ou moral' tão 'relevante' que mesmo um agente normalmente 'fiel ao direito' fosse 'sensível' a esse conflito espiritual, a ponto de o 'afectar', 'dominando-o' determinantemente, na sua decisão (nesse caso, 'compreensível') de matar outra pessoa.
V - Concluindo o STJ pela 'correcção' das operações do tribunal a quo de determinação da pena, de aplicação dos princípios gerais de determinação da pena, de indicação dos factores penalmente relevantes e admissíveis e de decisão das questões do limite ou da moldura da culpa e da forma de actuação dos fins da pena no quadro da prevenção, e, bem assim, não só pela proporcionalidade da quantificação operada no tribunal de instância como pela sua conformidade com as regras de experiência, restar-lhe-ia a pronúncia sobre a justiça do 'quantum exacto da pena'.
VI - Quanto a este aspecto, porém, o recurso de revista mostra-se algo 'inadequado para o seu controlo'. Não, porém, porque essa controlabilidade deva imputar-se a outro tribunal (intermédio) de recurso, mas, exactamente, porque - em recursos limitados às questões de direito - é (praticamente) incontrolável - dentro dos estreitíssimos limites da margem de liberdade do julgador ante os parâmetros definidos no topo pela culpa, na base pelas exigências de prevenção geral e, no espaço intermédio, pelas exigências de prevenção especial e de ressocialização do criminoso - a justiça dessa 'exacta quantificação'.
Proc. n.º 2047/05 - 5.ª Secção Carmona da Mota (relator) ** Pereira Madeira Simas Santos