ACSTJ de 11-05-2005
Peculato Dolo Obrigação de indemnizar
I - Para se verificar o preenchimento do elemento constitutivo do crime de peculato p. e p. pelo art. 375.º, n.º 1, do CP, a intenção de apropriação, o agente terá de ter a consciência e vontade de fazer seu o bem para seu próprio benefício ou de terceiro, sendo evidente que a intenção de restituir exclui o dolo de apropriação (Conceição Ferreira da Cunha, Comentário Conimbricense do Código Penal, pág. 699). Ponto é que se acentue que não basta uma qualquer vontade de restituir, sendo indispensável que o agente se represente como seguro que, no prazo e nas condições juridicamente devidas, efectuará a restituição da coisa recebida (Figueiredo Dias, op. cit., pág. 108). II - A circunstância de o recorrente ter agido 'num esquema de rotação', envolvendo o pagamento aos respectivos destinatários, tempos depois, do valor de vales de que se apropriara, não afasta o elemento doloso do crime, desde logo porque em relação a esses vales o seu pagamento se efectuou fora do prazo devido, e ainda porque o que está em causa são vales que o recorrente nunca pagou aos respectivos beneficiários. III - Resultando da matéria de facto provada que a demandante foi desapossada das quantias correspondentes aos vales, através da conduta criminosa do recorrente, verificou-se uma diminuição nessa medida do seu património, tendo sofrido danos ocasionados pelo crime dado que continuou obrigada a pagar os vales aos respectivos beneficiários, sendo irrelevante que não resulte da matéria de facto provada de forma clara que tenha efectuado esse pagamento, e tendo assim plena aplicação o princípio geral da obrigação de indemnização com fundamento em factos ilícitos consagrado no art. 483.º, n.º 1, do CC.
Proc. n.º 1016/05 - 3.ª Secção Silva Flor (relator) Soreto de Barros Armindo Monteiro Sousa Fonte
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