ACSTJ de 18-05-2005
Juiz Recusa Imparcialidade Discordância jurídica Princípio do juiz natural Competência/Poderes da Relação Competência/Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I - Porque o utente da justiça não tem o direito a escolher o seu juiz - princípio de acatamento universal -, a intervenção de um juiz num dado processo só pode ser recusada quando correr risco sério de ser considerada suspeita, por existir motivo sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade - art. 43.º, n.º 1, do CPP. II - mparcialidade é 'a alienidade do juiz em relação aos interesses das partes em causa' (cf. Justiça, Tribunais e Cidadãos, in Boletimnformativo da ASJP, Janeiro de 1997, págs. 17-19), é o dever de dizer o direito sem ninguém favorecer, situando-se num posicionamento externo e acima dos conflituantes, livre de pressões exteriores, fazendo àqueles justiça, funcionando este objectivo como dever seu, de natureza ético-social, ao invés de um privilégio de casta, autêntica garantia da realização do direito e cuja violação integra ilícito de denegação de justiça. III - E a imparcialidade é tanto a imparcialidade subjectiva, enquanto fortaleza de ânimo, carácter e personalidade moral do juiz para decidir acima de quaisquer pressões, alicerçada numa responsabilidade com aquelas dimensões, que devem, de resto, proporcionar-se-lhe, como é também a objectiva, que deve ser assegurada antes e depois do julgamento, pois se trata da confiança que os tribunais de uma sociedade democrática devem inspirar às partes, no sentido de confiança do público em que o juiz está em condições de administrar a justiça. IV - É pacífico o entendimento de que só razões objectivadas em factos reais e visíveis, portadores de gravidade, tanto aos olhos dos sujeitos processuais como aos da comunidade envolvente, à luz do entendimento reinante no homo medius, suposto como padrão pela ordem jurídica, não portador de conhecimentos jurídicos, alicerçam a convicção plausível de que o julgador não reúne condições pessoais, morais e éticas para decidir num posicionamento acima dos interesses em conflito, antes mergulhando na cedência ao favor e ao unilateralismo, que justificam o afastamento do juiz, não bastando uma mera impressão baseada num certo subjectivismo para declarar a parcialidade do julgador. V - As meras discordâncias jurídicas com os procedimentos processuais, eventuais desvios à ortodoxia processual, a não se revelar ostensivamente que, pela sua prática, o juiz, sem rigor, intenta deliberadamente o prejuízo, denotando de forma clara, falta de aptidão funcional, moral e ética, na solução do caso, colhem acolhimento pela via do recurso e não pela via gravosa da recusa. VI - A preterição do princípio do juiz natural assenta em pressupostos muito rígidos, irrefutavelmente denunciadores da falta de isenção na condução do processo, por isso o art. 47.º, n.º 3, do CPP faculta a realização de diligências complementares de prova, indagação que, incidente sobre os factos articulados no requerimento de recusa e as provas arroladas, cabe à Relação, e não ao STJ, dada a reserva de competência deste ao nível da matéria de direito - art. 434.º do CPP.
Proc. n.º 464/05 - 3.ª Secção Armindo Monteiro (relator) Sousa Fonte Pires Salpico Intervenção hi
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