ACSTJ de 07-03-2007
Escutas telefónicas Formalidades Nulidade sanável Nulidade insanável Proibição de prova Prorrogação do prazo Controle judicial Apresentação imediata
I - Estando a escuta telefónica autorizada, no caso de preterição das formalidades prescritas no art. 188.º do CPP não estamos na presença de um meio proibido de prova. As infracções às regras relativas à obtenção de tais meios de prova configuram meras prescrições ordenativas de produção de prova, no dizer de Figueiredo Dias (Processo Penal, pág. 446). II - E, de facto, não se justifica o regime da nulidade absoluta, insanável, mais adequado aos vícios de maior gravidade, na total acepção da palavra, havendo que distinguir, na cominação estabelecida no art. 189.º do CPP, que fala genericamente em nulidade para a infracção às regras prescritas nos arts. 187.º e 188.º do CPP, entre pressupostos substanciais de admissão das escutas, com previsão no art. 187.º do CPP, e condições processuais da sua aquisição, enunciadas no predito art. 188.°, para o efeito de assinalar ao vício que atinja os primeiros a nulidade absoluta e à infracção às segundas a nulidade relativa, sanável, sujeita a invocação até ao momento temporal previsto no art. 120.º, n.º 3, al. c), do CPP, dependente de arguição do interessado na sua observância. III - Esta a posição que tem sido perfilhada na jurisprudência deste Supremo Tribunal. IV - A nulidade sanável, respeitando ao inquérito ou à instrução, deve ser arguida até ao encerramento do debate instrutório, ou, não havendo lugar a instrução, até 5 dias após notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito, “nos termos do art. 120.º, n.º 3, al. c), do CPP, estando vedado ao julgador decretar, oficiosamente, sem arguição, a consequência da nulidade desse meio de prova assim obtido. V - Mostra-se preterido o formalismo da apresentação “imediata” do material escutado ao juiz, com atropelo pelos direitos de defesa do arguido, se se determina a prorrogação do prazo inicial sem prévia análise, contacto expresso com esse mesmo material, para indagar da necessidade de prorrogação. VI - Porém, segundo o Ac. do TC n.º 4/2006, de 03-01, após as alterações introduzidas pelo DL 320-C/2000, de 11/02, já a concessão de um prazo de 60 dias sem fiscalização intercalar não parece representar um descontrole intolerável das escutas. VII - Na verdade, após a alteração decorrente da reforma introduzida pelo DL 320-C/2000 impõe-se uma maior compreensão e flexibilidade quanto ao sentido da imediatividade imposta no art. 188.º, n.º 1, CPP, porque o formalismo legal se tornou mais complexo, no sentido de a própria autoridade de polícia criminal ter de, por sistema, tomar conhecimento do conteúdo das intercepções efectuadas, o que afasta o contacto meramente acidental do regime antecedente, para passar a ser de dispêndio de actividades morosas, como audição de gravações, mesmo em língua estrangeira, indicação dos seus intervenientes, e, sobretudo, de ponderação da sua utilidade à investigação, o que é passível de «condicionar o critério de imediatividade» a que se refere o art. 188.º, n.º 1, do CPP, escreveu-se na decisão sumária n.º 252/2005 do TC, como já acontecera no Ac. do TC n.º 699/2004. VIII - Mostram-se cumpridas as formalidades legais inerentes, não se verificando qualquer nulidade, se os autos demonstram que as escutas telefónicas foram realizadas respeitando os prazos (judicialmente predefinidos) dentro dos quais deveriam ter lugar (60 e 90 dias, prorrogados), a sua sustentação se fez por despacho judicial justificando a realização em vista de se estar em presença de crime de catálogo – tráfico de estupefacientes –, sendo essenciais à decisão da causa, e a transcrição efectuou-se sempre decorridos escassos dias sobre o termo da escuta, após o decurso de prazo perfeitamente aceitável e nunca implicando objectivamente abandono do controle judiciário à escuta. IX - Da afirmação de aceitação da credibilidade dos segmentos escutados, seleccionados pela PJ, não pode concluir-se seguramente que os JIC não tenham lido as gravações e que tenha sido a autoridade policial a sobrepor-se a uma operação da responsabilidade última do juiz de instrução, à margem de exigível acompanhamento. X - De resto, a lei não obriga a que fique certificada, em auto, a leitura dos suportes técnicos pelo JIC.
Proc. n.º 4797/06 - 3.ª Secção
Armindo Monteiro (relator)
Oliveira Mendes
Maia Costa
Pires da Graça
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