ACSTJ de 22-03-2007
Tráfico de estupefacientes Tráfico de menor gravidade Correio de droga Medida concreta da pena Autoria Co-autoria Cumplicidade Culpa Prevenção geral Atenuação especial da pena Suspensão da execução da pena Perda de bens a favor do Estado
I - Não obstante tratar-se de haxixe, uma substância menos danosa do que a heroína e a cocaína, e de um simples transporte, a pena de 8 anos de prisão mostra-se ajustada a um indivíduo que se dispôs a ir a Marrocos efectuar um carregamento de 270 kg daquela substância estupefaciente, a troco de € 5000, utilizando uma aeronave da sua propriedade, equipada com instrumentos a bordo, nomeadamente um sistema de GPS, que lhe permitiu aterrar em Marrocos, e tendo contratado por € 1000 a deduzir daqueles € 5000, um outro indivíduo que o acompanhou, recolheu em Marrocos os fardos de haxixe, enquanto ele ficou aos comandos da aeronave, que conservou sempre com o motor a trabalhar, voltando a levantar voo logo de seguida, para aterrar, horas depois, no aeródromo de Beja, tendo o acompanhante lançado os referidos fardos à pista, onde já se encontravam outros indivíduos arguidos à espera. II - A colaboração prestada pelo referido acompanhante é de co-autoria e não de cumplicidade. III - Tendo o arguido que conduziu o veículo automóvel onde foram acondicionados os fardos lançados à pista se apercebido, só nesse momento, de que o produto em causa era droga – visto que fora abordado por outro arguido, seu acompanhante, para fazer esse transporte, sem menção da sua natureza e sem se ter provado qualquer contrapartida por esse trabalho – mas, mesmo assim, se dispôs a ajudar a recolher os referidos fardos e a acondicioná-los naquele veículo, conduzindo este, depois, com o fito de chegar ao destino – objectivo que foi frustrado por acção policial –, cometeu esse arguido, a título de co-autoria, o crime de tráfico de estupefacientes do art. 21.º, n.º 1, do DL 15/93, de 22-01, e não o tráfico de menor gravidade, previsto e punido no art. 25.º, n.º 1. IV - A sua culpa é, no entanto, bastante menos acentuada, face a todo o condicionalismo objectivo, que não pode ter deixado de influenciar a sua liberdade de determinação, justificando-se a atenuação especial da pena. V - Porém, já não é de aplicar a suspensão da execução da pena, por a isso se oporem as exigências de prevenção geral, ou seja, por aquela não ser adequada a satisfazer as necessidades de punição do facto. VI - A perda da aeronave a favor do Estado, nos termos do art. 35.º do DL 15/93, de 22-01, não merece censura, mesmo à luz daquela jurisprudência mais rigorosa, que exige que entre o objecto e a prática da infracção interceda uma relação de funcionalidade ou de instrumentalidade em termos de causalidade adequada, dado que aquela aeronave serviu de instrumento essencial à prática do crime.
Proc. n.º 4808/06 - 5.ª Secção
Rodrigues da Costa (relator, com declaração de voto em matéria não
sumariada) *
Arménio Sottomayor
Reino Pires
Carmona da Mota
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