ACSTJ de 14-05-2009
Recurso de revisão Novos factos Novos meios de prova Testemunha Impossibilidade de depor Receio de represálias
I -O processo penal assegura todas as garantias de defesa ao arguido (n.º 1 do art. 32.º da CRP), entre elas a de intervir no processo, estando presente a todos os actos que lhe digam directamente respeito e sendo ouvido pelo tribunal sempre que deva ser tomada qualquer decisão que pessoalmente o afecte, podendo oferecer provas e requerer as diligências que se lhe afigurem necessárias (art. 61.º do CPP). II - Por isso, a lei processual penal em sede de recurso extraordinário de revisão, em matéria de novo facto ou meio de prova, sob a epígrafe de produção de prova, estabelece, no n.º 2 do art. 453.º do CPP, que o requerente não pode indicar testemunhas que não tiverem sido ouvidas no processo, a não ser justificando que ignorava a sua existência ao tempo da decisão ou que estiveram impossibilitadas de depor. III - Deste modo, a admissão de testemunha, em recurso de revisão, quando não ouvida no processo, está dependente de uma de duas circunstâncias, a justificar (provar) pelo recorrente: -que ignorava a existência da testemunha ao tempo da decisão (condenação) a rever [conquanto a lei refira que a ignorância ou desconhecimento da testemunha terá de existir ao tempo da decisão, deve entender-se que essa ignorância deve existir no último momento em que o requerente podia indicá-la e obter a sua inquirição antes da decisão cuja revisão se pede – cf. Luís Osório, Comentário ao Código de Processo Penal Português, 6.º, 430]; -que essa testemunha estava impossibilitada de depor ao tempo da decisão a rever. IV - A lei, ao aludir à impossibilidade de depor, pretende contemplar aqueles casos ou situações em que a testemunha por motivos a si inerentes não pode prestar depoimento, ou seja, quando por razões atinentes à própria testemunha o depoimento não pode ser prestado. V - O eventual desconhecimento do paradeiro das testemunhas, como vem invocado, não constitui fundamento para a sua não oportuna indicação, tanto mais que a convocação das mesmas para o contraditório não competia ao recorrente, antes ao tribunal, entidade que dispunha dos meios necessários ao apuramento da respectiva residência. VI - Por outro lado, o receio de represálias e, por isso, de depor, como refere o recorrente como causa do “desaparecimento” das testemunhas que agora arrola, é circunstância bem distinta da impossibilidade de depor. VII - E é evidente que o receio da ocorrência de represálias, só por si, não é impeditivo da prestação de depoimento, tudo dependendo do grau de probabilidade de aquelas se virem a concretizar e da gravidade das mesmas, bem como de outros factores, designadamente da possibilidade de concessão de protecção policial adequada à testemunha. VIII - Porém, como nem vem articulada a ocorrência de qualquer ameaça ou o perigo concreto de as represálias se verificarem, limitando-se o recorrente a referir serem aquelas frequentes entre a etnia cigana, sem sequer as caracterizar, o que, obviamente, é manifestamente insuficiente para que se possa considerar que, em face das mesmas, as testemunhas indicadas ficaram impossibilitadas de depor, é de negar a revisão.
Proc. n.º 175/01.1SALSB-B.S1 -3.ª Secção
Oliveira Mendes (relator)
Maia Costa
Pereira Madeira
|