ACSTJ de 17-09-2009
Recurso de revisão Novos factos Novos meios de prova Testemunha Depoimento Documento Força probatória Proibição de prova Princípio da confiança
I -A revisão consiste num recurso extraordinário que visa a impugnação de uma sentença transitada em julgado e a obtenção de uma nova decisão, mediante a repetição do julgamento, apresentando-se como uma válvula de segurança do sistema, modo de reparar o erro judiciário cometido, sempre que, numa reponderação do decidido, possa ser posta em causa, através da consideração de factos-índice, taxativamente enumerados no art. 449.º do CPP, seriamente, a justiça da decisão ou do despacho que ponha termo ao processo. II - A invocação, pelo requerente, de circunstâncias que, a provarem-se, são susceptíveis de abalar a credibilidade de um depoimento (a testemunha teria feito um depoimento propositadamente falso, em resultado de ameaças, chantagem e coacção sobre a mesma exercidas), dado que diminuem a fé que a testemunha possa merecer, não integra o fundamento de revisão previsto na al. d) do n.º 1 do art. 449.º do CPP, por não respeitar a factos probandos, mas sim aos meios de prova e respectiva força probatória. III - Também a junção de uma carta que configura um meio de prova da alegada manipulação daquele meio de prova, não constitui, por si própria, um meio de prova da factualidade integradora do ilícito em causa, pelo que igualmente não integra o fundamento de revisão de sentença em análise. IV - Pelos mesmos motivos, também a análise da personalidade e do comportamento da ofendida, com vista a pôr em causa o depoimento da mesma prestado em audiência de julgamento, lançando dúvidas sobre a sua credibilidade, de forma a questionar o respectivo valor probatório, não integra o fundamento de revisão de sentença invocado pelo recorrente. V - Ao pôr em causa estes depoimentos prestados em julgamento, o recorrente fundamenta o recurso como se de um recurso ordinário se tratasse, impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto e não invocando quaisquer novos factos ou novos meios de prova, reportados aos factos constitutivos dos crimes ou dos quais possa inferir-se a existência ou inexistência dos elementos integradores dos ilícitos pelos quais foi condenado. VI - Quanto ao fundamento da revisão previsto na al. a) do n.º 1 do art. 449.º, impõe-se que os meios de prova tenham sido considerados falsos por sentença passada em julgado, sendo indispensável a verificação da falsidade por sentença transitada em julgado – e no caso não há nenhuma sentença que tenha tido por objecto ajuizar da veracidade ou falsidade do depoimento em causa, concluindo pela falsidade, sendo antes uma carta, contendo uma declaração manuscrita pela testemunha e por ela assinada – não se mostra reconhecida a falsidade do depoimento que contribuiu para a formação da convicção do colectivo. VII - A invocação da utilização de um depoimento manipulado, na decisão da matéria de facto que baseou a condenação do recorrente, poderá integrar a nova causa de revisão de sentença introduzida pela Lei 48/2007, de 29-08, e constante da al. e) do n.º 1 do art. 449.º, mas apesar de aí não se exigir que as provas tenham sido consideradas proibidas por uma outra sentença transitada em julgado, a garantia constitucional do respeito pela segurança e a certeza do caso julgado, e a confiança que devem merecer as decisões judiciais, impõem que este fundamento de revisão não possa considerar-se verificado com a mera invocação de que a decisão de facto incluída na sentença que se pretende rever se baseou em provas proibidas, mostrando-se necessário que tal afirmação seja densificada com elementos que a demonstrem com segurança, aquando da interposição do recurso de revisão, dado que, nos casos em que o fundamento de revisão for o previsto na al. e), não há lugar à fase de produção de prova prevista no art. 453.º do CPP para os casos da al. d). VIII - Uma vez que o recorrente não indica que factos terão sido considerados provados com base no depoimento da testemunha, nem sequer que algum dos factos integradores dos crimes pelos quais foi condenado tenha sido considerado provado unicamente com base naquele meio de prova, pode concluir-se que não resulta da fundamentação constante da decisão da 1.ª instância, nem da motivação do recurso extraordinário de revisão, que o depoimento que o recorrente sustenta ter sido manipulado tenha sido determinante para a respectiva condenação, e, como tal, igualmente se não verifica o fundamento de revisão de sentença previsto na al. e) do n.º 1 do art. 449.º do CPP.
Proc. n.º 1566/03.9PALCS-A.S1 -3.ª Secção
Raul Borges (relator)
Fernando Fróis
Pereira Madeira
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