ACSTJ de 14-05-2009
Cedência ocasional de trabalhador Subordinação jurídica Contrato de prestação de serviço Outsourcing Nulidade de acórdão Matéria de facto Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
I -Não deve ser conhecida pelo Supremo Tribunal de Justiça, por extemporânea, a nulidade de acórdão da Relação proferido em processo laboral que não foi arguida no requerimento de interposição de recurso, mas apenas nas respectivas alegações. II - O poder censório consentido ao STJ em sede de matéria de facto não abrange o de sindicar a factualidade que as instâncias consideraram assente com base em prova testemunhal ou em prova documental sem força probatória plena, uma vez que tal questão se situa apenas no domínio da relevância concedida pelas instâncias a um meio probatório que se enquadra no princípio da livre apreciação da prova. III - A “cedência ocasional de trabalhadores”, à luz do Decreto-Lei nº 358/89, de 17-10 (LTT), é o negócio através do qual uma empresa cede provisoriamente um ou mais trabalhadores do seu quadro de pessoal próprio a uma outra, colocando-os sob a autoridade e direcção da entidade cessionária, mas conservando, no entanto, o vínculo jurídico-laboral que com eles mantém. IV - Verifica-se, nesta figura, um fraccionamento dos poderes do empregador: embora o trabalhador cedido continue a pertencer ao quadro da empresa cedente, a qual mantém a titularidade exclusiva do poder disciplinar, o poder de direcção e de conformação da prestação laboral cabe à empresa cessionária e o trabalho prestado desenvolve-se sob a direcção desta e demais condições nela existentes. V - Nos casos em que ocorre o exercício de funções profissionais em instalações de terceiros, sem subordinação jurídica a esses terceiros, em execução de um contrato de prestação de serviço, em qualquer das suas modalidades, as instalações do terceiro mais não são do que um local de prestação do trabalho ao serviço do empregador, não havendo qualquer dissociação das prerrogativas patronais, nem a afectação do trabalhador a um posto de trabalho inserido, orgânica e funcionalmente, na empresa terceira. VI - O direito de optar pela integração no quadro de pessoal da empresa “cessionária” que o art. 30.º da LTT consagra, com as inerentes consequências em termos da vinculação contratual do trabalhador a esta empresa, através de um contrato individual de trabalho sem termo, tem, como pressupostos fundamentais, a verificação de uma cedência ocasional de trabalhadores que abranja o pretenso titular do direito e a demonstração da ilicitude de tal cedência. VII - Se o acervo fáctico torna patente que se não figura no caso uma real situação de prestação de serviço à empresa em cujas instalações o trabalhador exerce as suas funções por banda da empresa que com ele firmou o contrato de trabalho, vindo a primeira empresa (e não a segunda) a exercer perante o trabalhador os poderes característicos do empregador no que tange ao exercício de autoridade, direcção, fiscalização e conformação do trabalho, o que se figura é uma cedência de trabalhador. VIII - Só haveria um efectivo outsourcing -com a inerente satisfação, por uma empresa externa, de necessidades que não se prendem directamente com o objecto principal da empresa beneficiária, que aquela empresa externa executaria com trabalhadores a si juridicamente subordinados -se ficasse demonstrado que o autor exerceu a sua actividade profissional nos espaços da beneficiária juridicamente subordinado à prestadora de serviços, e envolvido na execução por esta do serviço a que se obrigou perante aquela. IX - Não se verificando qualquer das situações em que é afastada a proibição da cedência ocasional de trabalhadores constante do nº 1 do artº 26º da LTT (cfr. nº 2 desse mesmo artigo) é de reconhecer ao trabalhador cedido o direito de opção a que alude o art. 30.º da mesma LTT.
Recurso n.º 2315/2008 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)* Sousa Peixoto Sousa Grandão
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