ACSTJ de 20-05-2009
Caducidade do contrato de trabalho Impossibilidade superveniente Impossibilidade definitiva Dirigente sindical Faltas justificadas Suspensão do contrato de trabalho Encerramento da empresa Despedimento colectivo Abuso do direito
I – A impossibilidade de o trabalhador prestar o trabalho, ou de o empregador o receber, a que se reportam os artigos 384.º, alínea a) e 387.º, alínea b), ambos do Código do Trabalho de 2003, bem como o artigo 4.º, alínea b), da LCCT, deve ser entendida nos termos gerais de direito, isto é, em moldes similares ao regime comum da impossibilidade do cumprimento não imputável ao devedor constante do artigo 790.º e seguintes do Código Civil, regime para que remetem aqueles normativos legais e à luz do qual essa impossibilidade é caracterizada como superveniente, absoluta e definitiva. II – Quer no âmbito da LCCT, quer no âmbito do Código do Trabalho de 2003, a jurisprudência do STJ tem entendido, de modo uniforme, que a impossibilidade de o trabalhador prestar o trabalho, ou de o empregador o receber, para determinar a caducidade do contrato de trabalho deve ser superveniente (no sentido de que não se verificava, não tinha sido prevista, nem era previsível na data da celebração do contrato), absoluta (o que se traduzia numa efectiva inviabilidade, à luz dos critérios normais de valorização da prestação) e definitiva (no sentido de que face a uma evolução normal e previsível, não seria mais viável a respectiva prestação). III – Embora, em regra, a caducidade do contrato de trabalho opere automaticamente, não necessitando de ser invocada por qualquer das partes, no processo pelo qual o contrato de trabalho caduca intervêm sempre, de uma maneira ou de outra, momentos volitivos que se exprimem através de declarações ou manifestações com carácter para-negocial. IV – As faltas dadas por membros da direcção das associações sindicais para o desempenho das suas funções consideram-se justificadas e, não sendo tais faltas remuneradas, se as mesmas se prologarem por mais de 30 dias, levam à aplicação do regime da suspensão do contrato de trabalho por impedimento prolongado. V – A protecção especial da segurança no emprego dos representantes eleitos dos trabalhadores, que a Constituição garante (artigo 55.º), não se limita ao campo das suas actuações no exercício de funções de representação, visando também obstar a que o empregador recorra ao despedimento como meio de atacar os representantes dos trabalhadores enquanto tais, mesmo que a pretexto de uma conduta alheia ao exercício de funções de representação. VI – Neste sentido, deve entender-se que um trabalhador, dirigente sindical, pode faltar, justificadamente, para o exercício dessas funções, sem limite temporal, embora, naturalmente, considerando o interesse do empregador, com perda de remuneração. VII – Assim, tendo o autor iniciado o exercício das funções de dirigente sindical em 1977, para que, posteriormente, foi sendo sucessivamente reeleito, funções essas que se mantinham em 2005, o contrato de trabalho suspendeu-se, inicialmente, ao abrigo do artigo 73.º e segts da LCT, após, com a publicação do Decreto-Lei n.º 398/83, de 2 de Novembro, ao abrigo do regime constante deste diploma e, finalmente, com a publicação do Código do Trabalho de 2003 e Regulamento, ao abrigo dos artigos 333.º e 403.º, respectivamente, destes compêndios legais. VIII – No âmbito das leis do trabalho, a noção de estabelecimento comercial coincide com a noção de empresa, sendo indistintamente usadas as duas expressões. IX – Com vista a apurar das situações em que existe, ou não, encerramento definitivo da empresa, deve atender-se à desintegração, ou não, da unidade jurídica que o estabelecimento ou empresa supõem, não contando tanto o facto de a empresa ter deixado de produzir, mas a circunstância de ser desintegrada, o que se tornará patente e eficaz em face dos trabalhadores ao seu serviço quando se verifique, globalmente, que os contratos de trabalho deixaram de formar com os restantes complexos empresariais (máquinas, clientela, direito de arrendamento, etc.) a unidade que permita a existência de uma organização produtiva. X – Verifica-se o encerramento definitivo da empresa num circunstancialismo em que se apura que a ré, que se dedicava à produção de um jornal, a partir de final de Julho de 2005 deixou de o produzir, de seguida negociou a rescisão dos contratos de trabalho com os trabalhadores (com excepção do autor, que não considerava seu trabalhador) deixou as instalações onde, até então, produzia o jornal e, cerca de 10 meses depois, numa comunicação que enviou ao Sindicato onde o autor exercia as funções de dirigente sindical a tempo inteiro, deixou consignado que era alheia à relação laboral do autor, não pretendendo, fosse quando fosse, aceitar o regresso ao trabalho por parte deste. XI – No Código do Trabalho/2003, ao contrário da LCCT, a distinção entre a cessação do contrato de trabalho por despedimento colectivo ou por caducidade deixou de basear-se na diferença entre o encerramento programado, por vontade do empregador, e o encerramento imprevisto ou por facto estranho à vontade do empregador, para passar a assentar na distinção entre o encerramento total ou parcial do estabelecimento: assim se o encerramento do estabelecimento é total e definitivo, há caducidade do contrato de trabalho; se, ao invés, o encerramento é parcial, pode recorrer-se à resolução do contrato com fundamento em despedimento colectivo. XII – Estando em causa um encerramento total e definitivo do estabelecimento e, portanto, a caducidade do contrato de trabalho, deve o empregador observar, com as necessárias adaptações, o procedimento previsto no artigo 419.º e sgts do CT/2003. XIII – Porém, a inobservância deste procedimento não torna ineficaz a caducidade do contrato de trabalho, tendo o trabalhador direito à compensação de um mês de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, sendo que no caso de fracção do ano, esse valor de referência é calculado proporcionalmente. XIV – Perante a inobservância do referido procedimento, o empregador poderá incorrer em responsabilidade civil pela correspondente omissão, ou até por factos que provocaram a cessação do contrato de trabalho por caducidade, mas não propriamente por esta. XV – Não configura abuso do direito, o facto de o autor se encontrar há cerca de 30 anos, a tempo inteiro, no exercício das funções sindicais (o que era do conhecimento da ré) e ter peticionado compensação pela caducidade do contrato de trabalho, quando, é certo, aquele exercício era temporário (enquanto fosse eleito) e não com carácter duradouro, pelo que pressupunha não só a candidatura aos cargos dirigentes em causa, como também a sua eleição, o que implicava que se o autor, por qualquer motivo deixasse de exercer as referidas funções deveria regressar ao seu posto de trabalho e, tendo o contrato cessado por caducidade, isso acarretar-lhe-ia prejuízos (materiais e de estabilidade no emprego). XVI – O tempo de suspensão do contrato de trabalho conta para efeitos de antiguidade (artigos 73.º, n.º 2, da LCT, 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 398/83, de 02-11 e 331.º, n.º 2, do CT/2003), pelo que para o cômputo da compensação devida ao autor deverá atender-se a todo o tempo decorrido desde o inicio até à cessação do contrato de trabalho.
Recurso n.º 3258/08/ -4.ª Secção Sousa Grandão (Relator)* Pinto Hespanhol Vasques Dinis
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