ACSTJ de 03-06-2009
Factos conclusivos Contrato de trabalho Constitucionalidade Objecto do recurso
I -A norma do n.º 4 do artigo 646.º do Código de Processo Civil tem subjacente a distinção entre matéria de facto e matéria de direito, que se reflecte no julgamento separado — quer do ponto de vista do momento lógico quer no tocante aos poderes de cognição do julgador — das questões de facto e de direito. II - Para efeitos processuais, é questão de facto tudo o que respeita ao apuramento de ocorrências da vida real e é questão de direito tudo o que diz respeito à interpretação e aplicação da lei. III - O juízo sobre a existência de subordinação jurídica, pressupondo a verificação de que o trabalhador executa o contrato sob a autoridade e direcção do empregador, só é possível de alcançar mediante o apuramento de factos concretos — que revelem a interacção das partes na execução do contrato — e a respectiva subsunção nos referidos conceitos legais, o que implica a interpretação destes. IV - Sendo tal juízo o ponto essencial da discussão entre as partes, a questão da subordinação jurídica apresenta-se como o thema decidendum, situando-se no domínio das realidades cujo conhecimento só pode ser adquirido através da interpretação e aplicação da lei, apresentando-se, pois, como questão de direito, que não pode ser resolvida no âmbito da decisão proferida sobre a matéria de facto. V - As afirmações de que alguém, no âmbito de um contrato, frequentou um estágio com vista a exercer a sua actividade subordinada para o outro contraente; de que alguém, desde sempre exerceu, em concreto, sob as ordens, direcção, fiscalização e responsabilidade de outrem; de que executou o contrato, assumindo e exercendo as funções enquadráveis na categoria profissional de 'Director Comercial'; e de que resolveu o contrato de trabalho (...), tendo o contrato findado para todos os efeitos legais em determinada data, por força da rescisão operada desse modo, contêm, todas elas, valorações jurídico normativas, não podendo ser aceite a sua inclusão na decisão sobre a matéria de facto. VI - O sentido alcançado com esta interpretação do art. 646.º do CPC, nada tem de arbitrário, inserindo-se num quadro razões de ordem lógico-processual que não distingue ou discrimina cidadãos colocados em idênticas situações contenciosas a que deva aplicar-se aquele preceito, pelo que não afecta o princípio da igualdade consagrado no art. 13.º da Constituição da República. VII - Não constando das conclusões da revista qualquer reparo ao modo como o Tribunal da Relação operou a qualificação do contrato com base na factualidade expurgada das expressões que eliminou, fundando-se a pretensão do autor recorrente, exclusivamente, em deverem considerar-se escritas as mesmas expressões, não vindo este fundamento a ser atendido pelo Supremo, não pode este apreciar o decidido pela Relação no sentido de não poder concluir-se pela existência de um contrato de trabalho.
Recurso n.º 3619/08 -4.ª Secção Vasques Dinis (Relator) Bravo Serra Mário Pereira
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