ACSTJ de 21-10-2009
Prescrição da infracção Princípio da igualdade Justa causa de despedimento Resposta à nota de culpa Direito de defesa Documento Factos não constantes da nota de culpa
I -Tendo os factos imputados ao Autor ocorrido entre 1997 e Março de 1999 e tendo a Ré instaurado o respectivo procedimento disciplinar em Setembro de 2003, verifica-se estarem prescritas as infracções disciplinares às quais aqueles factos se subsumiam. II - No âmbito de vigência da LCT, o prazo de prescrição das infracções laborais era de um ano contado da sua prática ou, tratando-se de infracções continuadas, da prática do último acto da continuação infraccional, independentemente da data em que o empregador teve conhecimento dessa prática. III - Atenta a natureza dos interesses e razões específicas que estiveram na base do disposto no n.º 3 do art. 27.º da LCT, não se verifica uma situação de lacuna de previsão ou de regulamentação desse preceito – no que toca ao prazo de prescrição e com referência às hipóteses em que a infracção disciplinar laboral reveste, simultaneamente, a natureza de ilícito penal, com prazo de prescrição do procedimento criminal superior a um ano – a carecer de ser integrada pelo recurso ao regime penal, directamente, ou conjugado com o disposto no art. 4.º n.º 3 do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo DL n.º 24/84, de 16 de Janeiro. IV - A norma do n.º 3 do art. 27.º da LCT, ao estabelecer o prazo de um ano para a prescrição das infracções disciplinares laborais, não padece de inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade, previsto no art. 13.º da CRP, e dos princípios constitucionais do Estado de Direito Democrático ou de tutela da integridade moral e do direito à identidade pessoal e ao desenvolvimento da personalidade, previstos, respectivamente, nos art.s 2.º, 9.º al. d), 25.º e 26.º da CRP. V - No âmbito da vigência do art. 9.º n.º 1 da LCCT, a noção de justa causa de despedimento exige a verificação cumulativa de dois requisitos: um comportamento ilícito e culposo do trabalhador, violador de deveres de conduta ou de valores inerentes à disciplina laboral, grave em si mesmo e nas suas consequências; que torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral. VI - Existe impossibilidade prática e imediata da subsistência da relação laboral quando ocorra uma situação de absoluta quebra de confiança entre a entidade empregadora e o trabalhador, susceptível de criar no espírito da primeira a dúvida sobre a idoneidade futura da conduta do último, deixando de existir o suporte psicológico mínimo para o desenvolvimento dessa relação laboral. VII - A nota de culpa delimita o objecto do processo disciplinar, devendo, por isso, conter a descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador, sendo que, na decisão final do processo, não podem ser invocados factos não constantes da nota de culpa, nem referidos na defesa escrita do trabalhador, salvo se atenuarem ou dirimirem a sua responsabilidade, e sendo que, na acção de impugnação do despedimento, o empregador apenas pode invocar factos constantes da decisão final do processo disciplinar. VIII - Assim, é absolutamente irrelevante, para efeitos de verificação da justa causa de despedimento, que na resposta à nota de culpa o trabalhador negue a prática de factos que anteriormente confessara. XIX - Não consubstancia a violação do direito de defesa do trabalhador em sede de procedimento disciplinar, com a consequente nulidade deste último, a circunstância de, aquando o período de consulta, não estar disponível um documento que nele foi posteriormente incorporado, quando é certo conter a nota de culpa a descrição circunstanciada dos factos, denotando o trabalhador, na sua resposta, tê-los compreendimento perfeitamente, tendo exercido, cabalmente, o contraditório. X - De acordo com o disposto nos termos conjugados dos art.s 10.º n.º 1 e 9 e 12.º n.º 4 da LCCT, a consequência legal de, na contestação, a Ré ter invocado factos não constantes da nota de culpa e pelos quais imputava ao Autor comportamento passível de constituir infracção disciplinar é a de esses factos não serem atendíveis como fundamento de justa causa do despedimento levado a cabo pela Ré, isto é, de os mesmos não relevarem para esse efeito. XI - Constitui justa causa de despedimento o comportamento do trabalhador que, tendo na empresa especiais responsabilidades, não comunica imediatamente a esta ou aos seus superiores hierárquicos notícias sobre graves irregularidades que teriam sido cometidas por trabalhadores seus subordinados, irregularidades essas susceptíveis de integrar ilícito criminal e colocar em causa o bom nome e prestígio da empresa.
Recurso n.º 621/09 -4.ª Secção Mário Pereira (Relator)*Sousa Peixoto Sousa Grandão
|