ACSTJ de 17-02-2005
Acção de reivindicação Pressupostos Ónus da prova Arrendamento para profissão liberal Sucessão na posição contratual Denúncia de contrato
I - Na acção de reivindicação compete ao autor a prova dos factos constitutivos do direito de proprieda-de (art.º 342, n.º 1, do CC), incumbindo, por seu lado, ao réu, ocupante no caso sub iudicio do 1.º andar direito reivindicado, a prova dos factos impeditivos ou extintivos (art.º 342, n.º 2, do CC), maxime integradores da alegada posição jurídica de arrendatário, titulando a legítima ocupação de todo o andar, ou de partes individualizadas deste. II - Na tónica desta alegação flúi, todavia, dos factos provados:a) que se trata de um único arrendamento para o exercício profissional da medicina (consultórios médicos) com dois co-inquilinos, o réu e outro médico, conquanto não simultâneos, mas sucessi-vos, por sub-ingresso do réu na posição de arrendatário, deixada vaga, de anterior colega;b) que os direitos dos co-arrendatários têm correspondentemente por objecto partes especificadas do andar reivindicado, segundo quotas distintas de algum modo expressas na diferente proporção das rendas a cargo de cada um (60% e 40%, respectivamente). III - Definindo-se consequentemente as posições recíprocas dos arrendatários nos termos delineados emI, a subsequente extinção do arrendamento, que veio a ter lugar por denúncia do médico co-arrendatário do réu, não atinge necessariamente a parte na titularidade deste, mas também não con-fere ao réu um 'direito de acrescer' sobre a parte do locado que estivera no gozo do primeiro. IV - Mercê das regras de repartição do ónus da prova definidas em, provados os factos constitutivos do direito de propriedade dos reivindicantes, e não tendo o réu logrado a prova de que o seu direito de arrendatário incide sobre a totalidade do andar, mas apenas sobre uma parte especificada do mes-mo, quiçá precisamente não individualizada, coexistindo com o direito de arrendatário do outro médico, preteritamente incidente sobre a parte restante, procede a reivindicação no tocante a esta outra parte do arrendado, assim ocupada indevidamente pelo réu. V - Condenado, por consequência, o demandado 'a restituir e entregar imediatamente aos autores a parte do 1.º andar direito do prédio correspondente à área que era ocupada pelo [outro médico co-arrendatário do réu], na proporção de 40% da totalidade do andar', compreende-se perfeitamente qual seja o objecto da restituição - que as partes no arrendamento bem conhecem e podem efectivar agindo como se lhes impõe conforme os ditames da boa fé em execução do contrato (art.º 762, n.º 2, do CC), se não individualizando-o, se for ainda caso disso, nos preliminares de procedimento executivo (art.º 802 do CPC).
Revista n.º 4131/04 - 2.ª Secção Lucas Coelho (Relator) * Bettencourt de Faria Moitinho de Almeida
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