Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa
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    Sumários do STJ (Boletim) -
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ACSTJ de 22-02-2005
 Contrato de compra e venda Doação Simulação Prova testemunhal Admissibilidade Partilha Bens comuns do casal Bens próprios Resposta aos quesitos Alteração Poderes da Relação
I - Considerando que o contrato promessa que iria reconduzir à celebração do contrato definitivo tinha clausulado a possibilidade de o prédio ser vendido aos promitentes compradores ou a quem ele indicasse, uma vez provado por tal documento que o sinal foi pago pelo pai do réu e posteriormente o preço, e que a escritura definitiva foi feita na proporção de metade para cada um dos seus dois filhos, tudo isto traduz, efectivamente, uma aparência de prova acerca do intuito simulatório, que posteriormente teve a sua concretização na escritura de compra e venda.
II - Ora, tais documentos não dissipam todas as dúvidas que possam permanecer no espírito do julgador, pelo que, se dos textos resultam factos que se querem provar, isto é, se dos mesmos emergirem fac-tos concludentes ou dos mesmos possa resultar qualquer presunção, não restam dúvidas de que a prova testemunhal era admissível no caso.
III - A interpretação do art.º 241, n.º 2, do CC, não pode ser efectuada no sentido de que é necessário que o negócio dissimulado conste de um acto solene, o que seria absurdo, uma vez que, se o negócio é dissimulado, não pode estar exteriorizado no acto dissimulado.
IV - Assim, se se pretende fazer uma doação e se simula uma compra e venda, teremos que concluir que não é necessária a contra declaração do animus donandi para se ter por válido o negócio dissimula-do.
V - Mas, pode chegar-se à mesma conclusão entendendo que o que efectivamente os pais dos comprado-res do imóvel lhe doaram, não foi o prédio em si, mas sim o dinheiro necessário para que eles o adquirissem. Efectivamente, quem pagou o preço do imóvel foram os pais e não o réu, e a doação radica no pagamento do preço, que veio a enriquecer o réu, sendo uma doação directa.
VI - Sempre que não esteja em jogo o interesse de qualquer terceiro, deve ser afastada a literalidade da norma, admitindo-se que o cônjuge, que pretenda demonstrar que os valores utilizados na aquisição de um bem provieram do seu património, ofereça qualquer prova capaz de afastar a qualificação do novo bem como comum, qualificação que resulta da inobservância dos requisitos estabelecidos no art.º 1723, al. c), e que assenta, em última análise, na presunção de comunhão do art.º 1724.
VII - No caso em apreço não restam quaisquer dúvidas de que não estão em jogo interesses de terceiros e que está provado que o dinheiro foi dado ao réu pelos pais e com ele adquiriu a ½ do imóvel, pelo que, quer admitindo que o negócio foi simulado e que o negócio dissimulado é válido, quer através da sub-rogação indirecta, o bem em litígio tem que ser considerado como um bem próprio do réu.
VIII - A Relação fez uso do disposto no art.º 712 do CPC, por entender que não era admissível a prova testemunhal aos quesitos cuja resposta alterou de provado para não provado, mas como esse tipo de prova é de admitir, tem que se revogar tal decisão.
Revista n.º 10/05 - 6.ª Secção Ribeiro de Almeida (Relator) Nuno Cameira Sousa Leite