ACSTJ de 23-02-2005
Transferência de trabalhador Rescisão pelo trabalhador Prejuízo sério Ónus da prova
I - O art. 24.º, n.º 2, da LCT, estabelece uma inversão do ónus da prova (art. 344.º do CC), fazendo recair sobre a entidade patronal o ónus de provar que a mudança de local de trabalho não causa ao trabalhador prejuízo sério. II - Mas tal não significa que o autor fique dispensado do ónus de alegação dos factos concretos que constituem o prejuízo sério. III - Com efeito, o beneficiário da presunção, se bem que dispensado da prova do facto jurídico presumido, deverá alegar a realidade que o suporta, pois só assim será possível à contraparte ilidir a presunção.IV- O qualificativo de prejuízo sério para efeitos do disposto no art. 24.º da LCT indica que não é qualquer incómodo ou transtorno causado pela mudança do local de trabalho que dá direito a indemnização: a transferência tem que provocar uma importante e grave perturbação nas condições de vida do trabalhador, ou seja, uma situação tal que não seja exigível a este suportá-la. V - Para efeitos de avaliação do prejuízo sério, a comparação tem que ser feita entre as condições existentes antes e depois da transferência e não no confronto com outras situações estranhas, o que levaria a que se concluísse não haver prejuízo sério sempre que existissem trabalhadores sujeitos a condições idênticas ou piores do que as que advinham para o trabalhador em causa da mudança de estabelecimento. VI - Verifica-se prejuízo sério para a autora na mudança do local de trabalho de Sintra, onde residia, para Lisboa, numa situação em que se prova que sofreu uma grave doença (carcinoma e foi sujeita a mastectomia) e que o seu estado de saúde ficou muito fragilizado, sendo-lhe aconselhável repouso e um estilo de vida tranquilo, que a transferência do local de trabalho aumentaria o tempo de deslocação para o emprego em cerca de 2h30m por dia, o que lhe retiraria tempo de descanso, e ainda que com a transferência do local de trabalho a autora teria que utilizar, em 'horas de ponta', transportes públicos, designadamente, o metro, o que constituiria um meio pouco cómodo e nada conveniente para a saúde daquela, além de que teria acréscimo de despesas com a deslocação e a entidade patronal não provou que custeasse as mesmas.
Recurso n.º 3586/04 - 4.ª Secção Maria Laura Leonardo (Relator) Sousa Peixoto Vítor Mesquita
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