DL n.º 78/87, de 17 de Fevereiro CÓDIGO DE PROCESSO PENAL |
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- DL n.º 387-E/87, de 29/12 - Declaração de 31/03 1987
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SUMÁRIO Aprova o Código do Processo Penal. Revoga o Decreto-Lei n.º 16489, de 15 de Fevereiro de 1929 _____________________ |
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Depois de diversos propósitos e tentativas, algumas com começo de execução, que se foram esboçando ao longo dos anos, ingressa, por fim, na vida jurídica portuguesa um novo Código de Processo Penal. Só as obras não significativas são incontroversas; o Código, que agora passa a ocupar o espaço do de 1929 e da legislação avulsa que, dispersa e, por vezes, incoerentemente, o complementou, surge, no entanto, em resultado de uma ponderada preparação e de um debate institucional alargado.
Decorrerão da sua entrada em vigor modificações orgânicas e adaptações de vária índole; haverá mesmo que reconverter, até certo ponto, as mentalidades de alguns dos protagonistas do sistema. Daí a necessidade de diferir o início da sua aplicação, excluindo-se, para além disso, tal aplicação aos processos pendentes.
Uma excepção foi aberta; crê-se que com inteira justificação. Diz ela respeito à supressão da incaucionabilidade, por força da lei, quanto a certas categorias de crimes. Realmente, o princípio da caucionabilidade abstracta de todas as infracções é o que se adequa com o direito fundamental da liberdade pessoal. Pressupõe, aliás, uma reafirmação de confiança nos critérios dos juízes; trata-se de uma outorga de confiança que constituirá um elemento matricial de um Estado de direito. Daí a entrada em vigor desde já da revogação do Decreto-Lei n.º 477/82, de 22 de Dezembro; este diploma teve, de resto, o condão de suscitar uma quase unanimidade nas opiniões discordantes.
Noutro plano esteve, naturalmente, presente a intencionalidade de assegurar uma proporcionada compatibilização do novo Código com a legislação extravagante conexionável com o Código de 1929 até que se venha a concretizar a modificação geral dessa legislação. Assume o problema particular melindre no que respeita ao processamento das transgressões e contravenções que em legislação avulsa se vêm mantendo, não obstante o declarado movimento no sentido da consolação desses ilícitos penais para o direito contra-ordenacional. A fórmula encontrada - largamente preferível à da revivência do Código anterior naquilo em que ele continha uma forma especial para a tramitação de tais infracções - parece equilibrada e praticável; e nem será a eventualidade de reenvio para a forma comum que irá prejudicar a exequibilidade do sistema no que respeita ao julgamento de transgressões e contravenções puníveis com multa.
Assim:
No uso da autorização conferida pela Lei n.º 43/86, de 26 de Setembro, o Governo decreta, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 201.º da Constituição, o seguinte:
Artigo 1.º É aprovado o Código de Processo Penal publicado em anexo e que faz parte integrante do presente diploma.
Art. 2.º
1 - É revogado o Código de Processo Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 16489, de 15 de Fevereiro de 1929, com a redacção em vigor.
2 - São igualmente revogadas as disposições legais que contenham normas processuais penais em oposição com as previstas neste Código, nomeadamente as seguintes:
a) Decreto-Lei n.º 35007, de 13 de Outubro de 1945;
b) Decreto-Lei n.º 31843, de 8 de Janeiro de 1942;
c) Artigos 26.º, 27.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 32171, de 29 de Julho de 1942, Decreto-Lei n.º 47749, de 6 de Junho de 1967, e artigo 28.º do Decreto-Lei n.º 48587, de 27 de Agosto de 1968, todos na parte aplicável ao processo penal;
d) Artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 37047, de 7 de Setembro de 1948;
e) Artigo 67.º do Código da Estrada, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 39673, de 20 de Maio de 1954, com a redacção em vigor;
f) Decreto-Lei n.º 45108, de 3 de Julho de 1963;
g) Decreto-Lei n.º 605/75, de 3 de Novembro, com a redacção que lhe conferiu o Decreto-Lei n.º 377/77, de 6 de Setembro;
h) Lei n.º 38/77, de 17 de Junho;
i) Decreto-Lei n.º 377/77, de 6 de Setembro;
j) Decreto-Lei n.º 477/82, de 22 de Dezembro.
Art. 3.º
1 - As transgressões e contravenções previstas em legislação avulsa serão processadas:
a) Sob a forma de processo sumaríssimo, sempre que forem puníveis só com multa ou medida de segurança não detentiva ou ainda quando, não sendo puníveis com pena de prisão superior a seis meses, ainda que com multa, o Ministério Público entender que ao caso deverá ser concretamente aplicada só pena de multa ou medida de segurança não detentiva;
b) Sob a forma de processo sumário, sempre que forem puníveis com pena de prisão ou medida de segurança detentiva cometidas em flagrante delito e não houver lugar a processo sumaríssimo;
c) Sob a forma de processo comum, nos demais casos.
2 - No caso de transgressões ou contravenções que devam ser processadas em processo sumaríssimo, aplicam-se as disposições do Código anexo reguladoras do processo sumaríssimo, com as seguintes modificações:
a) Do requerimento mencionado no artigo 394.º do Código de Processo Penal constarão apenas as indicações tendentes à identificação do arguido e à descrição dos factos imputados e a menção às disposições legais violadas, a prova existente e a indicação da sanção proposta;
b) Com a notificação a que alude o n.º 1 do artigo 396.º do Código de Processo Penal é o arguido advertido de que pode aceitar, em audiência, a sanção proposta pelo Ministério Público, imposto de justiça e custas, as quais lhe serão especificadas, e de que, caso não aceite, será submetido a julgamento sob a forma sumária;
c) Havendo lugar a julgamento, nos termos da alínea anterior, aplicam-se-lhe, com as necessárias modificações, as disposições dos artigos 385.º, 389.º, 390.º e 391.º
3 - Não há lugar à constituição de assistente nem à dedução de pedido cível no processo penal.
Art. 4.º
Consideram-se efectuadas para as correspondentes disposições do presente Código de Processo Penal as remissões feitas em legislação avulsa para o Código anterior.
Art. 5.º
1 - Os processos cuja instrução esteja legalmente cometida aos tribunais de instrução criminal prosseguirão aí os seus termos até à conclusão da instrução.
2 - O Conselho Superior da Magistratura e a Procuradoria-Geral da República adoptarão, de forma articulada, as medidas necessárias à célere conclusão dos processos referidos no número anterior.
Art. 6.º
As somas em unidade de conta processual penal, tal como se encontram definidas na alínea h) do n.º 1 do artigo 1.º do Código, arrecadadas em processos nos quais seja decretada a condenação respectiva, terão o seguinte destino:
a) 20% para os cofres do Ministério da Justiça;
b) 20% para o Instituto de Reinserção Social;
c) 60% para o organismo ao qual for cometida competência em matéria de acesso ao direito.
Art. 7.º
1 - O Código de Processo Penal aprovado pelo presente diploma e as disposições antecedentes começarão a vigorar no dia 1 de Junho de 1987, mas só se aplicam aos processos instaurados a partir dessa data, independentemente do momento em que a infracção tiver sido cometida, continuando os processos pendentes àquela data a reger-se até ao trânsito em julgado da decisão que lhes ponha termo pela legislação ora revogada.
2 - Exceptua-se do disposto no número anterior o artigo 209.º do Código aprovado pelo presente diploma, bem como a revogação decretada pela alínea j) do n.º 2 do artigo 2.º deste decreto-lei, que produzem efeitos no dia imediato ao da publicação do presente diploma, sendo os processos em que tiver sido ordenada ou mantida prisão preventiva incaucionável ao abrigo daquele diploma, ora revogado, feitos conclusos ao juiz para que este, através de despacho fundamentado, se pronuncie no prazo de quinze dias quanto à subsistência da prisão ou quanto à concessão da liberdade provisória.
3 - Da decisão proferida ao abrigo do número anterior cabe recurso, nos termos gerais.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 4 de Dezembro de 1986. - Aníbal António Cavaco Silva - Mário Ferreira Bastos Raposo.
Promulgado em 22 de Janeiro de 1987.
Publique-se.
O Presidente da República, MÁRIO SOARES.
Referendado em 26 de Janeiro de 1987.
O Primeiro-Ministro, Aníbal António Cavaco Silva.
CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
I
1. A urgência de uma revisão sistemática e global do ordenamento processual penal constitui um dos tópicos mais consensuais da experiência jurídica contemporânea. Reclamada pelos cultores da doutrina processual penal, ansiosamente aguardada pelos práticos do direito, a reforma do processo penal tem também persistido como um compromisso invariavelmente inscrito nos programas dos sucessivos governos constitucionais.
Igualmente pacífica é hoje a convicção de que só uma nova codificação do direito processual penal poderá representar o início de uma resposta consistente aos múltiplos e ingentes desafios que neste domínio se colocam à sociedade portuguesa. Na verdade, de uma qualquer tentativa de revisão parcial da codificação ainda vigente mais não poderia esperar-se que o aumento da complexidade e a multiplicação das aporias, tanto no plano teórico como no da aplicação da lei. Iniciado em 1929, o ciclo de vigência do Código de Processo Penal anterior caracterizou-se por uma produção praticamente ininterrupta de novos diplomas legais em matéria de processo penal: umas vezes com o propósito de sancionar inovações a inscrever no próprio texto codificado, outras a engrossar o já incontrolável caudal das leis extravagantes. Tratou-se, além disso, de diplomas projectados em horizontes históricos vários, com diferente densidade ideológica e cultural, e, por isso mesmo, prestando homenagem a distintas concepções do mundo e da vida, do Estado e do cidadão, da comunidade e da pessoa, e portadores de programas político-criminais centrífugos e frequentemente antagónicos.
O quadro esboçado agravou-se ainda com as reformas ditadas e introduzidas pelas transformações iniciadas em 25 de Abril de 1974. De tudo resultou um ordenamento processual penal minado por contradições, desfasamentos e disfuncionalidades comprometedores; um ordenamento onde, às dificuldades de identificação, na multidão de regulamentações sobrepostas, do regime concretamente aplicável, se somavam as emergentes da impossibilidade de referenciar um sistema coerente, preordenado à realização de uma teleologia claramente perspectivada e assumida.
2. É dar resposta aos imperativos que relevam deste contexto que se destina o presente Código de Processo Penal. Para mais fácil apreensão do seu espírito e dos seus propósitos, e como forma de mediatizar a sua consensual e generalizada aceitação, importará assinalar alguns dos princípios que deliberadamente foram erigidos em matriz e étimo legitimador das soluções técnicas por que se optou. Como convirá por outro lado, e a título meramente exemplificativo, pôr em relevo algumas destas soluções, muitas delas de cariz inovador. Antes, porém, será oportuno explicitar algumas das coordenadas que definiram o ambiente em que a reforma teve de operar e que condicionaram, por isso, as linhas de equilíbrio e de superação de princípios de projecção muitas vezes antinómica, ditando deste modo, frequentemente, a preferência por uma certa solução técnica entre várias em princípio disponíveis.
Distinguir-se-á, para o efeito, entre condicionalismos exógenos e endógenos: os primeiros, derivados da cada vez mais intensa inserção de Portugal nas comunidades e organizações supranacionais e da cada vez mais acentuada sintonia com o ritmo dos grandes movimentos ideológicos, culturais, científicos, político-criminais e jurídicos que permanentemente agitam e renovam o rosto do mundo; os segundos, provenientes da experiência jurídica nacional e das idiossincrasias irrenunciáveis do nosso universo histórico-cultural.
3. No que aos factores exógenos respeita, ponderou-se atentamente a lição de direito comparado. Procurou-se, em particular, tirar vantagem dos ensinamentos oferecidos pela experiência dos países comunitários (Espanha, França, Itália, República Federal da Alemanha) com os quais Portugal mantém um mais extenso património jurídico e cultural comum; países de resto, todos eles, empenhados num processo de profunda renovação das instituições processuais penais. Igualmente se cuidou de analisar os resultados alcançados pelas aturadas investigações criminológicas empreendidas nalguns daqueles países e que incidem sobre a acção das diferentes instâncias que integram o sistema formal de controle da criminalidade. Sem se advogar nem pretender uma transposição mecânica de tais resultados, verdade é que não devem desatender-se as consistentes injunções político-criminais que deles emanam, na perspectiva de um sistema apostado em maximizar e racionalizar o seu funcionamento; apostado, noutros termos, em obviar às elevadas 'cifras negras' e às desigualdades que elas incorporam e em vencer os desajustamentos e disfuncionalidades entre as singulares instâncias e entre o sistema globalmente considerado e a comunidade ambiente.
Particularmente relevante para a elaboração do presente Código foi a ciência jurídico-processual penal dos países referidos. O que facilmente se compreende, certo como é ter sido a este poderoso movimento de elaboração dogmática que ficaram a dever-se os progressos registados na afirmação das implicações dos princípios basilares de um Estado de direito democrático e social sobre um processo penal que se quer sintonizado com tais princípios. A mesma doutrina devem, de resto, creditar-se os esforços mais consequentes na procura de alternativas susceptíveis de plasmar com maior eficácia, na experiência quotidiana, aqueles princípios e a axiologia última a que prestam homenagem.
Despicienda não foi, por último, a influência que irradia de um foro com o prestígio moral e cultural do Conselho da Europa, ao qual o nosso país se orgulha de pertencer. Recorde-se, a propósito, que inúmeros temas de processo penal - com destaque, v. g., para os problemas da prisão preventiva, das garantias e direitos dos arguidos, dos processos acelerados e simplificados, da posição jurídico-processual da vítima, do sentido e âmbito de aplicação do princípio da oportunidade, etc. - têm constituído objecto de reuniões científicas sob o seu patrocínio e, não raro, de recomendações ou deliberações dos seus órgãos competentes.
4. De entre as condicionantes endógenas deve evidenciar-se, em primeiro lugar, o relevo que no presente Código quis atribuir-se à tradição processual penal portuguesa. Procurou-se, com efeito, que a busca da inovação e da modernidade se não fizesse com sacrifício indiscriminado de instituições e de princípios que, apesar de tudo, devem ser preservados como sinais identificadores de uma maneira autónoma de estar no mundo, de fazer história e de criar cultura. Paradigmático a este respeito é o que se passa com o estatuto da vítima-assistente, que nos singulariza claramente no contexto do direito comparado e por cujo modelo começam agora a orientar-se os movimentos de reforma de muitos países, sob o impulso das mais recentes investigações criminológico-vitimológicas.
Importa referir, em segundo lugar, a Constituição da República e o Código Penal - dois diplomas que, pelo seu papel no contexto da ordem jurídica portuguesa, em muitos casos estreitam drasticamente o espectro das alternativas disponíveis, enquanto noutros casos predeterminam o sentido e o alcance das soluções a consagrar em processo penal. Assim, a Constituição da República elevou, por exemplo, à categoria de direitos fundamentais os princípios relativos à estrutura básica do processo penal, aos limites à prisão preventiva como medida que se quer decididamente subsidiária, à regularidade das provas, à celeridade processual compatível com as garantias de defesa, à assistência do defensor, ao juiz natural. Por seu turno, de entre os condicionalismos decorrentes do Código Penal pode salientar-se, desde logo, o que se prende com a sua fidelidade ao ideário socializador e que aponta por sua vez, por exemplo, para uma autonomia, ao menos relativa, do momento processual de determinação e de medida da pena. Menos óbvias e significativas não são, de resto, as implicações decorrentes da circunstância de o Código Penal ter definido a indemnização, arbitrada ao lesado como consequência de um crime, como uma prestação de natureza civilística; o que não pode deixar de contender, por exemplo, com o princípio de um generalizado arbitramento oficioso, vigente no direito anterior.
Relevante foi, em terceiro lugar, a representação - que se quis tão aproximada e verdadeira quanto possível - dos principais estrangulamentos e desvios registados na praxis dos nossos tribunais e responsáveis pela frustração de uma justiça tempestiva e eficaz. Tais disfuncionalidades foram principalmente diagnosticadas: na existência da instrução, como fase necessária à submissão do feito a julgamento nos crimes mais graves; no desregramento em matéria de continuidade e de disciplina da audiência de julgamento e na invencível anomia do desrespeito dos prazos em geral; num sistema de recursos que, por sobreinduzir ao abuso, se relevava paradoxalmente como oferecendo um segundo grau de recurso sem, simultaneamente, garantir uma dupla jurisdição sobre o mérito; numa pletora de formas comuns e especiais do procedimento. Tudo, de resto, se agravando com a desconfiança generalizada dos cidadãos quanto à idoneidade da justiça formal prestada, num processo de afastamento que se alimentava em espiral e induzia à procura de soluções informais de autotutela, de desforço ou vindicta, de composição e de ressarcimento privados.
II
5. Para se ganhar a perspectiva adequada à compreensão da estrutura básica do modelo de processo subjacente ao presente Código, dos seus princípios fundamentais e das suas soluções concretas, convirá começar por uma referência prévia aos fins ou metas que, em última instância, é legítimo esperar de um processo penal no quadro de um Estado de direito democrático e social.
São, com efeito, os valores e as formas deste modelo de organização comunitária que definem o horizonte em que o Código pretende inscrever-se. Este assume, em conformidade, a ideia mestra segundo a qual o processo penal tem por fim a realização da justiça no caso, por meios processualmente admissíveis e por forma a assegurar a paz jurídica dos cidadãos.
Sabe-se, porém, como estas três referências valem no processo penal como polarizadores autónomos de universos de valores e geradores de princípios de implicações inevitavelmente antiéticas. Afastada está pois, à partida, a possibilidade de se pôr de pé um sistema processual que dê satisfação integral às exigências decorrentes de cada uma daquelas três referências. Por maioria de razão deve, aliás, afastar-se, sem mais, toda a pretensão de absolutizar unilateralmente qualquer deles - sob pena de se abrir a porta às formas mais intoleráveis de tirania ou de se advogar soluções do mais inócuo ritualismo processual. O possível, e também - importa acentuá-lo - o desejável, é, assim, um modelo processual preordenado à concordância prática das três teleologias antinómicas, na busca da maximização alcançável e admissível das respectivas implicações.
No estado actual do conhecimento, e tendo presente o lastro da experiência histórica, seria ociosa qualquer demonstração das antinomias que medeiam entre, por exemplo, a liberdade e dignidade dos arguidos e a procura a todo o transe de uma verdade material ou entre o acréscimo de eficiência da justiça penal e o respeito das formas ou ritos processuais, que se apresentam como baluartes dos direitos fundamentais.
As transformações políticas e sociais mais recentes, e mesmo o avanço da reflexão teórica mais ou menos empenhada, têm entretanto feito aflorar novas e importantes linhas de clivagem e de conflitualidade entre os fins do processo penal.
Está no primeiro caso o triunfo do moderno Estado de direito social, cujos reflexos no processo penal (socialização, conciliação, transacção, oportunidade, etc.) podem colidir drasticamente com as exigências ancoradas em mais de dois séculos de afirmação da vertente meramente liberal do Estado de direito clássico.
Paradigmática, no que ao segundo caso respeita, é a antinomia que resulta da descoberta do relevo institucional de certos direitos fundamentais, a ponto de o Estado de direito contemporâneo os assumir como seus próprios valores simbólicos. O que se traduz, v. g., na sua irrenunciabilidade mesmo no contexto do processo penal, para mediatizar os seus fins e sob o envolvimento das suas garantias formais. O que se passa com as proibições de prova - que, por obediência aos imperativos constitucionais, o Código expressamente consagra -, cujo regime sobreleva de forma explícita o consentimento do arguido e a sua autonomia, constitui a manifestação porventura mais expressiva, mas não seguramente a única, desta postura do Estado de direito perante os direitos fundamentais. Ao erigi-los em 'instituição' e ao impô-los de certo modo contra o próprio titular, é também a 'instituição' de um processo penal plenamente legitimado que o Estado moderno procura preservar. Por via reflexa e em última instância, é a sua própria legitimação que o Estado procura acautelar.
6. São, assim, as antinomias a nível dos próprios fundamentos do processo penal que reclamam um regime integrado de soluções compromissórias, precludindo a possibilidade de um sistema alinhado segundo os ditames de uma lógica unilinear e absolutizada. As pressões no sentido de um sistema aberto mais se acentuam, de resto, quando se entra em linha de conta com duas considerações complementares: a primeira contende com a heterogeneidade da realidade sobre que versa o processo penal; a segunda tem a ver com a diversidade de atitude ou de ethos próprios das diferentes estruturas de interacção em que se analisa o drama processual. Noutros termos, e seguindo neste ponto a formulação de alguns processualistas contemporâneos, é possível inscrever todo o universo processual num sistema de coordenadas definido por um eixo horizontal e outro vertical.
a) Quanto ao primeiro eixo, convém não esquecer a importância decisiva da distinção entre a criminalidade grave e a pequena criminalidade - uma das manifestações típicas das sociedades modernas. Trata-se de duas realidades claramente distintas quanto à sua explicação criminológica, ao grau de danosidade social e ao alarme colectivo que provocam. Não poderá deixar de ser, por isso, completamente diferente o teor da reacção social num e noutro caso, máxime o teor da reacção formal. Nem será mesmo por acaso que a procura de novas formas de controle da pequena criminalidade representa uma das linhas mais marcantes do actual debate político-criminal. Concretamente, é sobretudo com os olhos postos nesta específica área da fenomenologia criminal que, cada vez com maior insistência, se fala em termos de oportunidade, diversão, informalidade, consenso, celeridade. Não se estranhará por isso que o presente Código preste uma moderada mas inequívoca homenagem às razões que estão por detrás destas sugestões político-criminais. Nem será outrossim difícil identificar soluções ou institutos que delas relevam directamente. Pelo seu carácter inovador e pelo seu peso na economia do diploma, merecem especial destaque a possibilidade de suspensão provisória do processo com injunções e regras de conduta e, sobretudo, a criação de um processo sumaríssimo - forma especial de processo destinado ao controle da pequena criminalidade em termos de eficácia e celeridade, sem os custos de uma estigmatização e de um aprofundamento da conflitualidade no contexto de uma audiência formal.
b) Um segundo eixo estabelece a fronteira entre aquilo que se pode designar por espaços de consenso e espaços de conflito no processo penal, embora em boa medida sobreponível com a anteriormente mencionada - no tratamento da pequena criminalidade devem privilegiar-se soluções de consenso, enquanto no da criminalidade mais grave devem, inversamente, viabilizar-se soluções que passem pelo reconhecimento e clarificação do conflito -, esta segunda distinção possui sentido autónomo.
Por um lado, abundam no processo penal as situações em que a busca do consenso, da pacificação e da reafirmação estabilizadora das normas, assente na reconciliação, vale como um imperativo ético-jurídico. Expressões do eco encontrado no presente Código por tais ideias são, entre outras: o relevo atribuído à confissão livre e integral, a qual pode dispensar toda a ulterior produção da prova; o acordo de vários sujeitos processuais como pressuposto de institutos como o da suspensão provisória do processo, o do processo sumaríssimo, a competência do juiz singular para o julgamento de casos em abstracto pertinentes à competência do tribunal colectivo, bem como as numerosas disposições cuja eficácia é posta na dependência do assentimento de um ou de vários intervenientes processuais.
Contudo, o Código não erige a procura do consenso em valor incondicionado. Pela natureza das coisas, também aqui a absolutização só seria possível à custa do arbítrio, subalternizando à 'paz' a própria vida e a autonomia humanas. Acresce que, não raro, o controle eficaz da criminalidade só pode lograr-se mediante a formalização da conflitualidade real. Paradigmática do respeito que esta consideração merece ao Código é, por exemplo, a possibilidade que assiste ao arguido de aceitar ou rejeitar a desistência da queixa ou da acusação particular. Da mesma postura relevam, em geral, todas as disposições que, como implicações do sistema acusatório, visam realizar, na medida do possível, a reclamada 'igualdade de armas' entre a acusação e a defesa. O mesmo poderá ainda afirmar-se a propósito do reforço da consistência do estatuto do assistente, com a intenção manifesta de consolidar o papel de um dos protagonistas no campo da conflitualidade real.
III
7. O que fica dito permitirá uma mais fácil identificação e explicação dos contornos mais salientes da arquitectura do processo penal previsto no presente Código. Três notas complementares ajudarão a evidenciar outros tantos aspectos que imprimem cunho ao sistema delineado.
a) A primeira nota tem a ver com a estrutura básica do processo. Por apego deliberado a uma das conquistas mais marcantes do progresso civilizacional democrático, e por obediência ao mandamento constitucional, o Código perspectivou um processo de estrutura basicamente acusatória. Contudo - e sem a mínima transigência no que às autênticas exigências do acusatório respeita -, procurou temperar o empenho na maximização da acusatoriedade com um princípio de investigação oficial, válido tanto para efeito de acusação como de julgamento; o que representa, além do mais, uma sintonia com a nossa tradição jurídico-processual penal.
b) Em segundo lugar, o Código optou decididamente por converter o inquérito, realizado sob a titularidade e a direcção do Ministério Público, na fase geral e normal de preparar a decisão de acusação ou de não acusação. Por seu turno, a instrução, de carácter contraditório e dotada de uma fase de debate oral - o que implicou o abandono da distinção entre instrução preparatória e contraditória -, apenas terá lugar quando for requerida pelo arguido que pretenda invalidar a decisão de acusação, ou pelo assistente que deseje contrariar a decisão de não acusação. Tal opção filia-se na convicção de que só assim será possível ultrapassar um dos maiores e mais graves estrangulamentos da nossa actual praxis processual penal. E esteia-se, por outro lado, no facto de que todos os actos processuais que contendam directamente com os direitos fundamentais do arguido só devem poder ter lugar se autorizados pelo juiz de instrução e, nalguns casos, só por este podem ser realizados. Refira-se ainda que, como decorrência directa da opção de fundo acabada de mencionar, os órgãos de polícia criminal são, na fase de inquérito, colocados na dependência funcional do Ministério Público.
c) Inovador a muitos títulos é, em terceiro lugar, o regime de recursos previsto neste Código. Com as inovações introduzidas procurou obter-se um duplo efeito: potenciar a economia processual numa óptica de celeridade e de eficiência e, ao mesmo tempo, emprestar efectividade à garantia contida num duplo grau de jurisdição autêntico.
Para alcançar o primeiro desiderato, tentou obviar-se ao reconhecido pendor para o abuso dos recursos, abrindo-se a possibilidade de rejeição liminar de todo o recurso por manifesta falta de fundamento. Complementarmente, procurou simplificar-se todo o sistema, abolindo-se concretamente a existência, por regra, de um duplo grau de recurso. Por isso os tribunais de relação passam a conhecer em última instância das decisões finais do juiz singular e das decisões interlocutórias do tribunal colectivo e do júri, devendo o recurso das decisões finais destes últimos tribunais ser directamente interposto para o Supremo Tribunal de Justiça.
Por outro lado, é logo a partir da 1.ª instância que se começa por dar expressão à garantia ínsita na existência de uma dupla jurisdição. Com efeito, o Código aposta confiadamente na qualidade da justiça realizada a nível da 1.ª instância, para o que não deixa de adoptar as medidas consideradas mais adequadas e de supor que outras - que a ele não cabe editar - não deixarão de ser consagradas nos lugares próprios. Entre estas avulta a da separação entre os juízes que hão-de actuar como juízes singulares e os que pertencem aos tribunais colectivos. No mesmo enquadramento deverá interpretar-se o alargamento da competência dos jurados, agora extensiva também à matéria de direito, combinado com a diminuição sensível do seu número, que deverá ser estatuída pela lei complementar sobre o júri. No que aos recursos especificamente respeita, estabelece o Código um regime aparentado com a ideia do recurso unitário, em princípio idêntico para a Relação e para o Supremo e abarcando, na medida possível e conveniente, tanto a questão de direito como a questão de facto. Com o mesmo propósito de emprestar ao recurso maior consistência, procura contrariar-se a tendência para fazer dele um labor meramente rotineiro executado sobre papéis, convertendo-o num conhecimento autêntico de problemas e conflitos reais, mediatizado pela intervenção motivada de pessoas. Por isso se submetem os recursos ao princípio geral - aliás jurídico-constitucionalmente imposto! - da estrutura acusatória, com a consequente exigência de uma audiência onde seja respeitada a máxima da oralidade.
8. Mesmo no contexto de uma apresentação sumária, não pode deixar de sublinhar-se outra das motivações que esteve na primeira linha dos trabalhos de reforma: a procura de uma maior celeridade e eficiência na administração da justiça penal.
Importa, contudo, prevenir que a procura da celeridade e da eficiência não obedeceu a uma lógica paramente economicista de produtividade pela produtividade. A rentabilização da realização da justiça é apenas desejada em nome do significado directo da eficiência para a concretização dos fins do processo penal: realização da justiça, tutela de bens jurídicos, estabilização das normas, paz jurídica dos cidadãos. A eficiência é, por um lado, o espelho da capacidade do ordenamento jurídico e do seu potencial de prevenção, que, sabe-se bem, tem muito mais a ver com a prontidão e a segurança das reacções criminais do que com o seu carácter mais ou menos drástico. A imagem de eficiência constitui, por outro lado, o antídoto mais eficaz contra o recurso a modos espontâneos e informais de autotutela ou ressarcimento, catalisadores de conflitos e violências dificilmente controláveis. Mas a eficiência - no sentido de redução das cifras negras e das desigualdades a que elas obedecem - pode também valer como a garantia da igualdade da lei em acção, critério fundamental da sua legitimação material e, por isso, da sua aceitação e interiorização colectiva.
Acresce que a celeridade é também reclamada pela consideração dos interesses do próprio arguido, não devendo levar-se a crédito do acaso o facto de a Constituição, sob influência da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, lhe ter conferido o estatuto de um autêntico direito fundamental. Há, pois, que reduzir ao mínimo a duração de um processo que implica sempre a compressão da esfera jurídica de uma pessoa que pode ser - e tem mesmo de presumir-se - inocente. Como haverá ainda que prevenir os perigos de uma estigmatização e adulteração irreversível da identidade do arguido, que pode culminar no compromisso com uma carreira delinquente. De resto, a aceleração processual redundará tanto mais em favorecimento do arguido quanto mais ela tiver por reverso - como sucede no presente Código - um reforço efectivo da sua posição processual.
9. Como facilmente se intuirá, o propósito de aceleração processual aflora já em algumas das alterações e inovações mencionadas noutros contextos. Para além delas, e sempre a título meramente exemplificativo, outras poderão mencionar-se: umas directamente preordenadas à aceleração processual, outras apresentando pelo menos uma inquestionável valência neste sentido.
A favor directamente da aceleração processual estão sem dúvida: a introdução de um incidente autónomo de aceleração do processo; a nova disciplina em matéria de prazos, com cominações que se espera eficazes; o poder de disciplina e direcção conferido às autoridades judiciárias, máxime ao juiz na fase da audiência de julgamento; a estruturação desta audiência e o seu desenvolvimento em termos de continuidade e concentração reforçada; a simplificação e desburocratização de numerosos actos processuais, nomeadamente as notificações.
O mesmo efeito se espera da criteriosa definição, delimitação e articulação da competência das diversas instâncias de controle, como, por exemplo, do Ministério Público e do juiz, sobretudo do juiz de instrução, prevenindo assim eventuais conflitos e desfasamentos, inevitavelmente geradores de demoras e delongas.
É também à ideia de aceleração que em boa medida deve imputar-se a redução substancial das formas de processo. Na verdade, a par de uma única forma de processo comum (comportando apenas as particularidades impostas pela circunstância de o processo decorrer perante o juiz singular, o tribunal colectivo ou o tribunal do júri), prevêem-se apenas duas formas de processo especial: o sumário e o sumaríssimo. A este propósito, a forma de processo especial cuja falta será mais notada é naturalmente a do processo de ausentes. O Código optou decididamente por fugir aos inconvenientes do processo de ausentes tradicional, nomeadamente numa perspectiva de desincentivação da ausência, privilegiando um conjunto articulado de medidas drásticas de compressão da capacidade patrimonial e negocial do contumaz, que se espera sejam suficientes e eficazes.
10. Por último, o estatuto dos diferentes sujeitos e intervenientes processuais constitui outro dos domínios onde as alterações são, a par de menos ostensivas, igualmente de tomo. De um modo geral, elas operaram-se em três direcções: em uma mais cuidadosa delimitação legal; num alargamento e reforço das competências dos órgãos das diferentes instâncias formais de controle, em ordem à viabilização efectiva das tarefas que lhes são cometidas, e no reforço da posição jurídica do arguido.
A mais precisa definição das competências relativas das diferentes autoridades processuais é, desde logo, ditada por obediência às exigências do princípio acusatório. Por seu lado, a ampliação dos meios ao seu dispor explica-se pela necessidade de maximizar a eficiência e pelo propósito de salvaguardar o prestígio dos órgãos processuais nas suas relações com a comunidade, em ordem a um mais cabal adimplemento das obrigações de colaboração na realização da justiça penal. Nesta linha avultam as chamadas medidas cautelares de polícia e as medidas de coacção e de garantia patrimonial a que podem recorrer, nos casos e nos termos especificamente previstos, o juiz, o Ministério Público e a polícia criminal. De recordar que ao Ministério Público é deferida a titularidade e a direcção do inquérito, bem como a competência exclusiva para a promoção processual: daí que lhe seja atribuído, não o estatuto de parte, mas o de uma autêntica magistratura, sujeita ao estrito dever de objectividade.
Na redefinição do estatuto do arguido começa logo por sobressair o cuidado e uma certa solenidade com que se rodeia a sua constituição formal. Por outro lado, não será difícil verificar que o regime do Código, globalmente considerado, redonda num inquestionável aumento e consolidação dos direitos processuais do arguido. Também aqui, de resto, o respeito intransigente pelo princípio acusatório leva o Código a adoptar soluções que se aproximam de uma efectiva 'igualdade de armas', bem como à preclusão de todas as medidas que contendam com a dignidade pessoal do arguido.
Uma última referência merecem, neste contexto, as disposições relativas às medidas de coacção - categoria que integra, entre outras, a figura da prisão preventiva. Por um lado, o Código submete todas estas medidas aos princípios da legalidade, da proporcionalidade e da necessidade. Por outro lado, alarga o respectivo espectro, introduzindo, a par das medidas de coacção já clássicas, novas modalidades, como, por exemplo, a obrigação de permanência na habitação. Este alargamento permite uma maior maleabilidade na escolha das soluções concretamente aplicáveis, com respeito pelos ditames da proporcionalidade e da necessidade. Mas permite, acima de tudo, a realização efectiva do princípio constitucional da subsidiariedade da prisão preventiva, em homenagem ao qual, de resto, o Código extingue a categoria dos crimes incaucionáveis.
IV
11. Pensa-se que, pela forma sumariamente descrita, o Código que em seguida se apresenta poderá constituir uma peça fundamental do diálogo, sempre em aberto e sempre renovado, entre a vertente liberal e a vertente social do Estado de direito democrático, entre a justiça e a eficiência na aplicação da lei penal, entre as exigências de segurança da comunidade e de respeito pelos direitos das pessoas. Se assim for, do Código de Processo Penal - a pedra essencial que faltava no edifício renovado da nossa legislação penal - poderá legitimamente esperar-se que cumpra a função decisiva que lhe cabe na tarefa ingente de controle e domínio da criminalidade.
| Disposições preliminares e gerais
| Artigo 1.º (Definições legais) |
1- Para efeitos do disposto no presente Código considera-se:
a) Crime: o conjunto de pressupostos de que depende a aplicação ao agente de uma pena ou de uma medida de segurança criminais;
b) Autoridade judiciária: o juiz, o juiz de instrução e o Ministério Público, cada um relativamente aos actos processuais que cabem na sua competência;
c) Órgãos de polícia criminal: todas as entidades e agentes policiais a quem caiba levar a cabo quaisquer actos ordenados por uma autoridade judiciária ou determinados por este Código;
d) Autoridade de polícia criminal: os directores, oficiais, inspectores e subinspectores de polícia e todos os funcionários policiais a quem as leis respectivas reconhecerem aquela qualificação;
e) Suspeito: toda a pessoa relativamente à qual existia indício de que cometeu ou se prepara para cometer um crime, ou que nele participou ou se prepara para participar;
f) Alteração substancial dos factos: aquela que tiver por efeito a imputação ao arguido de um crime diverso ou a agravação dos limites máximos das sanções aplicáveis;
g) Relatório social: documento elaborado por serviços de reinserção social, com competência de apoio técnico aos tribunais na aplicação e na execução de sanções criminais, que tem por objectivo auxiliar o tribunal ou o juiz no conhecimento da personalidade do arguido, e eventualmente também da vítima, incluída a sua inserção familiar e sócio-profissional;
h) Unidade de conta processual penal (UC): quantia em dinheiro equivalente a um quarto do salário mínimo nacional mais elevado, garantido no momento da aplicação da sanção, arredondado, quando necessário, para a centena de escudos imediatamente superior.
2 - Para efeitos do disposto no presente Código, apenas podem considerar-se como casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada as condutas que:
a) Integrarem os crimes previstos nos artigos 287.º, 288.º ou 289.º do Código Penal; ou
b) Dolosamente se dirigirem contra a vida, a integridade física ou a liberdade das pessoas e forem puníveis com pena de prisão de máximo igual ou superior a cinco anos. |
Contém as alterações dos seguintes diplomas: - Declaração de 31/03 1987
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Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 78/87, de 17/02
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Artigo 2.º (Legalidade do processo) |
A aplicação de penas e de medidas de segurança criminais só pode ter lugar em conformidade com as disposições deste Código. |
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Artigo 3.º (Aplicação subsidiária) |
As disposições deste Código são subsidiariamente aplicáveis, salvo disposição legal em contrário, aos processos de natureza penal regulados em lei especial. |
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Artigo 4.º (Integração de lacunas) |
Nos casos omissos, quando as disposições deste Código não puderem aplicar-se por analogia, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal e, na falta delas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal. |
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Artigo 5.º (Aplicação da lei processual penal no tempo) |
1 - A lei processual penal é de aplicação imediata, sem prejuízo da validade dos actos realizados na vigência da lei anterior.
2 - A lei processual penal não se aplica aos processos iniciados anteriormente à sua vigência quando da sua aplicabilidade imediata possa resultar:
a) Agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito de defesa; ou
b) Quebra da harmonia e unidade dos vários actos do processo. |
Contém as alterações dos seguintes diplomas: - DL n.º 387-E/87, de 29/12
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Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 78/87, de 17/02
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Artigo 6.º (Aplicação da lei processual penal no espaço) |
A lei processual penal é aplicável em todo o território português e, bem assim, em território estrangeiro nos limites definidos pelos tratados, convenções e regras do direito internacional. |
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Artigo 7.º (Suficiência do processo penal) |
1 - O processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele se resolvem todas as questões que interessarem à decisão da causa.
2 - Quando, para se conhecer da existência de um crime, for necessário julgar qualquer questão não penal que não possa ser convenientemente resolvida no processo penal, pode o tribunal suspender o processo para que se decida esta questão no tribunal competente.
3 - A suspensão pode ser requerida, após a acusação ou o requerimento para abertura da instrução, pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, ou ser ordenada oficiosamente pelo tribunal. A suspensão não pode, porém, prejudicar a realização de diligências urgentes de prova.
4 - O tribunal marca o prazo da suspensão, que pode ser prorrogado até um ano se a demora na decisão não for imputável ao assistente ou ao arguido. O Ministério Público pode sempre intervir no processo não penal para promover o seu rápido andamento e informar o tribunal penal. Esgotado o prazo sem que a questão prejudicial tenha sido resolvida, ou se a acção não tiver sido proposta no prazo máximo de um mês, a questão é decidida no processo penal. |
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Parte I
LIVRO I
Dos sujeitos do processo
TÍTULO I
Do juiz e do tribunal
CAPÍTULO I
Da jurisdição
| Artigo 8.º (Administração da justiça penal) |
Os tribunais judiciais são os órgãos competentes para decidir as causas penais e aplicar penas e medidas de segurança criminais. |
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Artigo 9.º (Exercício da função jurisdicional penal) |
1 - Os tribunais judiciais administram a justiça penal de acordo com a lei e o direito.
2 - No exercício da sua função, os tribunais e demais autoridades judiciárias têm direito a ser coadjuvados por todas as outras autoridades; a colaboração solicitada prefere a qualquer outro serviço. |
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CAPÍTULO II
Da competência
SECÇÃO I
Competência material e funcional
| Artigo 10.º (Disposições aplicáveis) |
A competência material e funcional dos tribunais em matéria penal é regulada pelas disposições deste Código e, subsidiariamente, pelas leis de organização judiciária. |
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Artigo 11.º (Competência do Supremo Tribunal de Justiça) |
1 - Compete ao plenário do Supremo Tribunal de Justiça, em matéria penal:
a) Julgar o Presidente da República pelos crimes praticados no exercício das suas funções;
b) Julgar os recursos de decisões proferidas, em 1.ª instância, pelo plenário das secções;
c) Conhecer dos conflitos de competência entre secções;
d) Exercer as demais atribuições conferidas por lei.
2 - Compete ao plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, em matéria penal:
a) Julgar processos por crimes cometidos por juízes do Supremo Tribunal de Justiça e das relações e magistrados do Ministério Público que exerçam funções junto destes tribunais ou equiparados;
b) Julgar os recursos de decisões proferidas, em 1.ª instância, pelas secções;
c) Uniformizar a jurisprudência, nos termos dos artigos 437.º e seguintes;
d) Conhecer dos pedidos de revisão;
e) Decidir sobre o pedido de atribuição de competência a outro tribunal da mesma espécie e hierarquia, nos casos de obstrução ao exercício da jurisdição pelo tribunal competente.
3 - Compete às secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, em matéria penal:
a) Praticar os actos jurisdicionais relativos ao inquérito, dirigir a instrução, presidir ao debate instrutório e proferir despacho de pronúncia ou não pronúncia nos processos referidos na alínea a) do número anterior;
b) Julgar os recursos que não sejam da competência do plenário das secções ou do tribunal;
c) Conhecer dos conflitos de competência entre relações, entre estas e os tribunais de 1.ª instância ou entre os tribunais de 1.ª instância de diferentes distritos judiciais;
d) Conhecer dos pedidos de habeas corpus em virtude de prisão ilegal;
e) Exercer as demais atribuições conferidas por lei. |
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Artigo 12.º (Competência das relações) |
1 - Compete ao plenário das relações, em matéria penal:
a) Conhecer dos conflitos de competência entre secções;
b) Exercer as demais atribuições conferidas por lei.
c) Exercer as demais atribuições conferidas por lei.
2 - Compete às secções criminais das relações, em matéria penal:
a) Julgar processos por crimes cometidos por juízes de direito, procuradores da República e delegados do procurador da República;
b) Praticar os actos jurisdicionais relativos ao inquérito, dirigir a instrução, presidir ao debate instrutório e proferir despacho de pronúncia ou não pronúncia nos processos referidos na alínea anterior;
c) Julgar recursos;
d) Conhecer dos conflitos de competência entre tribunais de 1.ª instância do respectivo distrito judicial;
e) Julgar os processos judiciais de extradição;
f) Julgar os processos de revisão e confirmação de sentença penal estrangeira;
g) Exercer as demais atribuições conferidas por lei. |
Contém as alterações dos seguintes diplomas: - DL n.º 387-E/87, de 29/12
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Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 78/87, de 17/02
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Artigo 13.º (Competência do tribunal do júri) |
1 - Compete ao tribunal do júri julgar os processos que, tendo a intervenção do júri sido requerida pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, respeitarem a crimes previstos no título II e no capítulo I do título V do livro II do Código Penal.
2 - Compete ainda ao tribunal do júri julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo Tribunal singular e tendo a intervenção do júri sido requerida pelo Ministério Público, pelo assistente ou pelo arguido, respeitarem a crimes cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a oito anos de prisão.
3 - O requerimento do Ministério Público e o do assistente devem ter lugar no prazo para dedução da acusação, e o do arguido, no prazo de cinco dias a contar da notificação da acusação ou da pronúncia, se a ela houver lugar.
4 - O requerimento de intervenção do júri é irretractável. |
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Artigo 14.º (Competência do tribunal colectivo) |
1 - Compete ao tribunal colectivo, em matéria penal, julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal do júri, respeitarem a crimes previstos no título II e no capítulo I do título V do livro II do Código Penal.
2 - Compete ainda ao tribunal colectivo julgar os processos que, não devendo ser julgados pelo tribunal singular, respeitarem a crimes:
a) Dolosos ou agravados pelo resultado, quando for elemento do tipo a morte de uma pessoa; ou
b) Cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a três anos de prisão. |
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Artigo 15.º (Determinação da pena aplicável) |
Para efeito do disposto nos artigos 13.º e 14.º, na determinação da pena abstractamente aplicável são levadas em conta todas as circunstâncias que possam elevar o máximo legal da pena a aplicar no processo. |
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Artigo 16.º Competência do tribunal singular |
1 - Compete ao tribunal singular, em matéria penal, julgar os processos que por lei não couberem na competência dos tribunais de outra espécie.
2 - Compete também ao tribunal singular, em matéria penal, julgar os processos que respeitarem a crimes:
a) Previstos no capítulo II do título V do livro II do Código Penal;
b) De emissão de cheque sem provisão; ou
c) Cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for igual ou inferior a três anos de prisão.
3 - Compete ainda ao tribunal singular julgar os processos por crimes previstos no artigo 14.º, n.º 2, mesmo em caso de concurso de infracções, quando o Ministério Público, na acusação, ou em requerimento, quando for superveniente o conhecimento do concurso, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a três anos ou medida de segurança de internamento por mais do que esse tempo.
4 - No caso previsto no número anterior, o tribunal não pode aplicar pena de prisão ou medida de segurança de internamento superior a três anos. |
Contém as alterações dos seguintes diplomas: - DL n.º 387-E/87, de 29/12
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Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 78/87, de 17/02
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Artigo 17.º (Competência do juiz de instrução) |
Compete ao juiz de instrução proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer as funções jurisdicionais relativas ao inquérito, nos termos prescritos neste Código. |
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Artigo 18.º (Tribunal de execução de penas) |
A competência do tribunal de execução de penas é regulada em lei especial. |
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SECÇÃO II
Competência territorial
| Artigo 19.º (Regras gerais) |
1 - É competente para conhecer de um crime o tribunal em cuja área se tiver verificado a consumação.
2 - Para conhecer de crime que se consuma por actos sucessivos ou reiterados, ou por um só acto susceptível de se prolongar no tempo, é competente o tribunal em cuja área se tiver praticado o último acto ou tiver cessado a consumação.
3 - Se o crime não tiver chegado a consumar-se, é competente para dele conhecer o tribunal em cuja área se tiver praticado o último acto de execução ou, em caso de punibilidade dos actos preparatórios, o último acto de preparação. |
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Artigo 20.º (Crime cometido a bordo de navio ou aeronave) |
1 - É competente para conhecer de crime cometido a bordo de navio o tribunal da área do porto português para onde o agente se dirigir ou onde ele desembarcar; e, não se dirigindo o agente para território português ou nele não desembarcando, ou fazendo parte da tripulação, o tribunal da área da matrícula.
2 - O disposto no número anterior é correspondentemente aplicável a crime cometido a bordo de aeronave.
3 - Para qualquer caso não previsto nos números anteriores é competente o tribunal da área onde primeiro tiver havido notícia do crime. |
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Artigo 21.º (Crime de localização duvidosa ou desconhecida) |
1 - Se o crime estiver relacionado com áreas diversas e houver dúvidas sobre aquela em que se localiza o elemento relevante para determinação da competência territorial, é competente para dele conhecer o tribunal de qualquer das áreas, preferindo o daquela onde primeiro tiver havido notícia do crime.
2 - Se for desconhecida a localização do elemento relevante, é competente o tribunal da área onde primeiro tiver havido notícia do crime. |
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Artigo 22.º (Crime cometido no estrangeiro) |
1 - Se o crime for cometido no estrangeiro, é competente para dele conhecer o tribunal da área onde o agente tiver sido encontrado ou do seu domicílio. Quando ainda assim não for possível determinar a competência, esta pertence ao tribunal da área onde primeiro tiver havido notícia do crime.
2 - Se o crime for cometido em parte no estrangeiro, é competente para dele conhecer o tribunal da área nacional onde tiver sido praticado o último acto relevante, nos termos das disposições anteriores. |
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Artigo 23.º (Processo respeitante a magistrado ou seus parentes) |
Se num processo for arguido, ofendido, pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil um magistrado, e para o processo devesse ter competência, por força a das disposições anteriores, o tribunal onde o magistrado exerce funções, é competente o tribunal da mesma hierarquia ou espécie com sede mais próxima, salvo tratando-se do Supremo Tribunal de Justiça. |
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SECÇÃO III
Competência por conexão
| Artigo 24.º (Casos de conexão) |
1 - Há conexão de processos quando:
a) O mesmo agente tiver cometido vários crimes através da mesma acção ou omissão, na mesma ocasião ou lugar, sendo uns causa ou efeito dos outros, ou destinando-se uns a continuar ou a ocultar os outros;
b) O mesmo crime tiver sido cometido por vários agentes em comparticipação; ou
c) Vários agentes tiverem cometido diversos crimes em comparticipação, reciprocamente, na mesma ocasião ou lugar, sendo uns causa ou efeito dos outros, ou destinando-se uns a continuar ou a ocultar os outros.
2 - A conexão só opera relativamente aos processos que se encontrarem simultaneamente na fase de inquérito, de instrução ou de julgamento. |
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Artigo 25.º (Conexão de processos da competência de tribunal de competência genérica e de tribunal de competência especializada) |
Se algum ou alguns dos processos conexos forem da competência de tribunal de competência genérica e outro ou outros da competência de tribunal de competência especializada, é este último competente para de todos conhecer. |
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Artigo 26.º (Limites à conexão) |
A conexão não opera entre processos que sejam e processos que não sejam da competência:
a) De tribunais militares;
b) De tribunais de menores;
c) Do Supremo Tribunal de Justiça ou das relações, sempre que funcionarem em 1.ª instância e se se tratar de hipótese cabida no artigo 24.º, n.º 1, alíneas b) e c). |
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Artigo 27.º (Competência material e funcional determinada pela conexão) |
Se os processo conexos devessem ser da competência de tribunais de diferente hierarquia ou espécie, é competente para todos o tribunal de hierarquia ou espécie mais elevada. |
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Artigo 28.º (Competência territorial determinada pela conexão) |
Se os processos conexos devessem ser da competência de tribunais com jurisdição em diferentes áreas, é competente para conhecer de todos:
a) O tribunal competente para conhecer do crime a que couber pena mais grave;
b) Em caso de crimes de igual gravidade, o tribunal a cuja ordem o arguido estiver preso ou, havendo vários arguidos presos, aquele à ordem do qual estiver preso o maior número;
c) Se não houver arguidos presos ou o seu número for igual, o tribunal da área onde primeiro tiver havido notícia de qualquer dos crimes. |
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Artigo 29.º (Unidade e apensação dos processso) |
1 - Para todos os crimes determinantes de uma conexão, nos termos das disposições anteriores, organiza-se um só processo.
2 - Se tiverem já sido instaurados processos distintos, logo que a conexão for reconhecida procede-se à apensação de todos àquele que respeitar ao crime determinante da competência por conexão. |
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Artigo 30.º (Separação dos processos) |
1 - Oficiosamente, ou a requerimento do Ministério Público, do arguido, do assistente ou do lesado, o tribunal faz cessar a conexão e ordena a separação de algum ou alguns processos sempre que:
a) Houver na separação um interesse ponderoso e atendível de qualquer arguido, nomeadamente no não prolongamento da prisão preventiva;
b) A conexão puder representar um grave risco para a pretensão punitiva do Estado, para o interesse do ofendido ou do lesado;
c) A conexão puder retardar excessivamente o julgamento de qualquer dos arguidos; ou
d) Houver declaração de contumácia, nos termos do artigo 336.º, n.º 2.
2 - A requerimento de algum ou alguns dos arguidos, o tribunal pode ainda tomar a providência referida no número anterior quando outro ou outros dos arguidos tiverem requerido a intervenção do júri.
3 - O requerimento referido no princípio do número anterior tem lugar nos cinco dias posteriores à notificação do despacho que tiver admitido a intervenção do júri. |
Contém as alterações dos seguintes diplomas: - Declaração de 31/03 1987
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Consultar versões anteriores deste artigo: -1ª versão: DL n.º 78/87, de 17/02
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Artigo 31.º (Prorrogação da competência) |
A competência determinada por conexão, nos termos dos artigos anteriores, mantém-se:
a) Mesmo que, relativamente ao crime ou aos crimes determinantes da competência por conexão, o tribunal profira uma absolvição ou a responsabilidade criminal se extinga antes do julgamento;
b) Para o conhecimento dos processos separados nos termos do artigo 30.º, n.º 1. |
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CAPÍTULO III
Da declaração de incompetência
| Artigo 32.º (Conhecimento e dedução da incompetência) |
1 - A incompetência do tribunal é por este conhecida e declarada oficiosamente e pode ser deduzida pelo Ministério Público, pelo arguido e pelo assistente até ao trânsito em julgado da decisão final.
2 - Tratando-se de incompetência territorial, ela somente pode ser deduzida e declarada:
a) Até ao início do debate instrutório, tratando-se de juiz de instrução; ou
b) Até ao início da audiência de julgamento, tratando-se de tribunal de julgamento. |
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Artigo 33.º (Efeitos da declaração de incompetência) |
1 - Declarada a incompetência do tribunal, o processo é remetido para o tribunal competente, o qual anula os actos que se não teriam praticado se perante ele tivesse corrido o processo e ordena a repetição dos actos necessários para conhecer da causa.
2 - O tribunal declarado incompetente pratica os actos processuais urgentes.
3 - As medidas de coacção ou de garantia patrimonial ordenadas pelo tribunal declarado incompetente conservam eficácia mesmo após a declaração de incompetência, mas devem, no mais breve prazo, ser convalidadas ou infirmadas pelo tribunal competente.
4 - Se para conhecer de um crime não forem competentes os tribunais portugueses, o processo é arquivado. |
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CAPÍTULO IV
Dos conflitos de competência
| Artigo 34.º (Casos de conflito e sua cessação) |
1 - Há conflito, positivo ou negativo, de competência quando, em qualquer estado do processo, dois ou mais tribunais, de diferente ou da mesma espécie, se considerarem competentes ou incompetentes para conhecer do mesmo crime imputado ao mesmo arguido.
2 - O conflito cessa logo que um dos tribunais se declarar, mesmo oficiosamente, incompetente ou competente, segundo o caso. |
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Artigo 35.º (Denúncia do conflito) |
1 - O tribunal logo que se aperceber do conflito suscita-o junto do tribunal competente para o decidir, remetendo-lhe cópia dos actos e todos os elementos necessários à sua resolução, com indicação do Ministério Público, do arguido, do assistente e dos advogados respectivos.
2 - O conflito pode ser suscitado também pelo Ministério Público, pelo arguido ou pelo assistente mediante requerimento dirigido ao presidente do tribunal competente para a resolução, ao qual se juntam os elementos mencionados na parte final do número anterior.
3 - A denúncia ou o requerimento previstos nos números anteriores não prejudicam a realização dos actos processuais urgentes. |
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Artigo 36.º (Resolução do conflito) |
1 - O conflito é dirimido pelo tribunal de menor hierarquia com jurisdição sobre os tribunais em conflito.
2 - O relator comunica imediatamente aos tribunais em conflito a denúncia recebida e fixa-lhes prazo para resposta, não superior a oito dias.
3 - Juntamente com as respostas são transmitidas as cópias e os elementos a que se refere o n.º 1 do artigo anterior.
4 - Terminado o prazo para recepção das respostas, são notificados o arguido e o assistente para, em cinco dias, alegarem; pelo mesmo tempo e para igual efeito vão os autos com vista ao Ministério Público. Seguidamente, e depois de recolhidas as informações e as provas que reputar necessárias, o tribunal competente resolve o conflito.
5 - A decisão é imediatamente comunicada aos tribunais em conflito e ao Ministério Público junto deles e notificada ao arguido e ao assistente.
6 - É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 33.º, n.º 3. |
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CAPÍTULO V
Da obstrução ao exercício da jurisdição
| Artigo 37.º (Pressupostos e efeito) |
Quando, em qualquer estado do processo posterior ao despacho que designar dia para a audiência, em virtude de graves situações locais idóneas a perturbar o desenvolvimento do processo:
a) O exercício da jurisdição pelo tribunal competente se revelar impedido ou gravemente dificultado;
b) For de recear daquele exercício grave perigo para a segurança ou a tranquilidade públicas;
ou
c) A liberdade de determinação dos participantes no processo se encontrar gravemente comprometida;
a competência é atribuída a outro tribunal da mesma espécie e hierarquia onde a obstrução previsivelmente se não verifique e que se encontre o mais próximo possível do obstruído. |
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Artigo 38.º (Apreciação e decisão) |
1 - Cabe ao plenário das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça decidir do pedido de atribuição de competência que lhe seja dirigido pelo tribunal obstruído, pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis. O pedido é logo acompanhado dos elementos relevantes para a decisão.
2 - É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 36.º, n.os 4 e 5, bem como no artigo 33.º, n.º 3.
3 - O pedido de atribuição de competência não tem efeito suspensivo, mas este pode ser-lhe conferido, atentas as circunstâncias do caso, pelo tribunal competente para a decisão. Neste caso o tribunal obstruído pratica os actos processuais urgentes.
4 - Se o pedido for deferido, o tribunal designado declara se e em que medida os actos processuais já praticados conservam eficácia ou devem ser repetidos perante ele.
5 - Se o pedido do arguido, do assistente ou das partes civis for considerado manifestamente infundado, o requerente é condenado ao pagamento de uma soma entre seis e vinte UCs. |
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CAPÍTULO VI
Dos impedimentos, recusas e escusas
| Artigo 39.º (Impedimentos) |
1 - Nenhum juiz pode exercer a sua função num processo penal:
a) Quando for, ou tiver sido, cônjuge ou representante legal do arguido, do ofendido ou de pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil;
b) Quando ele, ou o seu cônjuge, for ascendente, descendente, parente até ao 3.º grau, tutor ou curador, adoptante ou adoptado do arguido, do ofendido, de pessoa com a faculdade de se constituir assistente ou parte civil ou for afim destes até àquele grau;
c) Quando tiver intervindo no processo como representante do Ministério Público, órgão de polícia criminal, defensor, advogado do assistente ou da parte civil ou perito; ou
d) Quando, no processo, tiver sido ouvido ou dever sê-lo como testemunha.
2 - Se o juiz tiver sido oferecido como testemunha, declara, sob compromisso de honra, por despacho nos autos, se tem conhecimento de factos que possam influir na decisão da causa. Em caso afirmativo verifica-se o impedimento; em caso negativo deixa de ser testemunha.
3 - Não podem exercer funções, a qualquer título, no mesmo processo juízes que sejam entre si cônjuges, parentes ou afins até ao 3.º grau. |
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Artigo 40.º (Impedimento por participação em processo) |
Nenhum juiz pode intervir em recurso ou pedido de revisão relativos a uma decisão que tiver proferido ou em que tiver participado, ou no julgamento de um processo a cujo debate instrutório tiver presidido. |
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Artigo 41.º (Declaração de impedimento e seu efeito) |
1 - O juiz que tiver qualquer impedimento nos termos dos artigos anteriores declara-o imediatamente por despacho nos autos.
2 - A declaração de impedimento pode ser requerida pelo Ministério Público ou pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis logo que sejam admitidos a intervir no processo, em qualquer estado deste; ao requerimento são juntos os elementos comprovativos. O juiz visado profere o despacho no prazo máximo de cinco dias.
3 - Os actos praticados por juiz impedido são nulos, salvo se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo. |
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1 - O despacho em que o juiz se considerar impedido é irrecorrível. Do despacho em que ele não reconhecer impedimento que lhe tenha sido oposto cabe recurso para o tribunal imediatamente superior.
2 - Se o impedimento for oposto a juiz do Supremo Tribunal de Justiça, o recurso é decidido pela secção criminal deste mesmo Tribunal sem a participação do visado.
3 - O recurso tem efeito suspensivo, sem prejuízo de serem levados a cabo, mesmo pelo juiz visado, se tal for indispensável, os actos processuais urgentes. |
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Artigo 43.º (Recusas e escusas) |
1 - A intervenção de um juiz no processo pode ser recusada quando correr o risco de ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade.
2 - A recusa pode ser requerida pelo Ministério Público, pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis.
3 - O juiz não pode declarar-se voluntariamente suspeito, mas pode pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições do n.º 1 deste artigo.
4 - Os actos processuais praticados por juiz recusado ou escusado até ao momento em que a recusa ou a escusa forem solicitadas só são anulados quando se verificar que deles resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo; os praticados posteriormente só são válidos se não puderem ser repetidos utilmente e se se verificar que deles não resulta prejuízo para a justiça da decisão do processo. |
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O requerimento de recusa e o pedido de escusa são admissíveis até ao início da audiência, até ao início da conferência nos recursos ou até ao início do debate instrutório. Só o são posteriormente, até à sentença, ou até à decisão instrutória, quando os factos invocados como fundamento tiverem tido lugar, ou tiverem sido conhecidos pelo invocante, após o início da audiência ou do debate. |
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Artigo 45.º (Processo e decisão) |
1 - A recusa deve ser requerida e a escusa deve ser pedida, a ela se juntando logo os elementos comprovativos, perante:
a) O tribunal imediatamente superior;
b) A secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça, tratando-se de juiz a ele pertencente, decidindo aquela sem a participação do visado.
2 - O juiz visado pronuncia-se sobre o requerimento, por escrito, em cinco dias, juntando logo os elementos comprovativos.
3 - O tribunal, se não recusar logo o requerimento ou o pedido por manifestamente infundados, ordena as diligências de prova necessárias à decisão.
4 - É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 42.º, n.º 3.
5 - Se o tribunal recusar o requerimento do arguido, do assistente ou das partes civis por manifestamente infundado, condena o requerente ao pagamento de uma soma entre seis e vinte UCs. |
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Artigo 46.º (Termos posteriores) |
O juiz impedido, recusado ou escusado remete logo o processo ao juiz que, de harmonia com as leis de organização judiciária, deva substituí-lo. |
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Artigo 47.º (Extensão do regime de impedimentos, recusas e escusas) |
1 - As disposições do presente capítulo são aplicáveis, com as adaptações necessárias, nomeadamente as constantes dos números seguintes, aos peritos, intérpretes e funcionários de justiça.
2 - A declaração de impedimento e o seu requerimento, bem como o requerimento de recusa e o pedido de escusa, são dirigidos ao tribunal ou ao juiz de instrução perante os quais correr o processo em que o incidente se suscitar e são por eles apreciados e imediata e definitivamente decididos, sem submissão a formalismo especial.
3 - Se não houver quem legalmente substitua o impedido, recusado ou escusado, o tribunal ou o juiz de instrução designam o substituto. |
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TÍTULO II
Do Ministério Público e dos órgãos de polícia criminal
| Artigo 48.º (Legitimidade) |
O Ministério Público tem legitimidade para promover o processo penal, com as restrições constantes dos artigos 49.º a 52.º |
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Artigo 49.º (Legitimidade em procedimento dependente de queixa) |
1 - Quando o procedimento criminal depender de queixa, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas dêem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo.
2 - Para o efeito do número anterior, considera-se feita ao Ministério Público a queixa dirigida a qualquer outra entidade que tenha a obrigação legal de a transmitir àquele.
3 - A queixa é apresentada pelo titular do direito respectivo ou por mandatário munido de poderes especiais.
4 - O disposto nos números anteriores é correspondentemente aplicável aos casos em que o procedimento criminal depender da participação de qualquer autoridade. |
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Artigo 50.º (Legitimidade em procedimento dependente de acusação particular) |
1 - Quando o procedimento criminal depender de acusação particular, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas se queixem, se constituem assistentes e deduzam acusação particular.
2 - O Ministério Público procede oficiosamente a quaisquer diligências que julgar indispensáveis à descoberta da verdade e couberem na sua competência, participa em todos os actos processuais em que intervier a acusação particular, acusa conjuntamente com esta e recorre autonomamente das decisões judiciais.
3 - É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo anterior. |
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Artigo 51.º (Homologação da desistência da queixa ou da acusação particular) |
1 - Nos casos previstos nos artigos 49.º e 50.º, a intervenção do Ministério Público no processo cessa com a homologação da desistência da queixa ou da acusação particular.
2 - Se o conhecimento da desistência tiver lugar durante o inquérito, a homologação cabe ao Ministério Público; se tiver lugar durante a instrução ou o julgamento, ela cabe, respectivamente, ao juiz de instrução ou ao presidente do tribunal.
3 - Logo que tomar conhecimento da desistência, a autoridade judiciária competente para a homologação notifica o arguido para, em três dias, declarar, sem necessidade de fundamentação, se a ela se opõe. A falta de declaração equivale a não oposição. |
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Artigo 52.º (Legitimidade no caso de concurso de crimes) |
1 - No caso de concurso de crimes, o Ministério Público promove imediatamente o processo por aqueles para que tiver legitimidade, se o crime mais grave não depender de queixa ou de acusação particular, ou se os crimes forem de igual gravidade.
2 - Se o crime pelo qual o Ministério Público pode promover o processo for de menor gravidade, as pessoas a quem a lei confere o direito de queixa ou de acusação particular são notificadas para declararem, em três dias, se querem ou não usar desse direito. Se declararem:
a) Que não pretendem apresentar queixa ou acusação, ou nada declararem, o Ministério Público promove o processo pelos crimes que puder promover;
b) Que pretendem apresentar queixa, considera-se esta apresentada;
c) Que pretendem deduzir acusação e o não fizerem em dez dias, o Ministério Público promove o processo pelos crimes que puder promover. |
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Artigo 53.º (Posição e atribuições do Ministério Público no processo) |
1 - Compete ao Ministério Público, no processo penal, colaborar com o tribunal na descoberta da verdade e na realização do direito, obedecendo em todas as intervenções processuais a critérios de estrita objectividade.
2 - Compete em especial ao Ministério Público:
a) Receber as denúncias, as queixas e as participações e apreciar o seguimento a dar-lhes;
b) Dirigir o inquérito;
c) Deduzir acusação e sustentá-la efectivamente na instrução e no julgamento;
d) Interpor recursos, ainda que no exclusivo interesse da defesa;
e) Promover a execução das penas e das medidas de segurança. |
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Artigo 54.º (Impedimentos, recusas e escusas) |
1 - As disposições do capítulo VI do título I são correspondentemente aplicáveis, com as adaptações necessárias, nomeadamente as constantes dos números seguintes, aos magistrados do Ministério Público.
2 - A declaração de impedimento e o seu requerimento, bem como o requerimento de recusa e o pedido de escusa, são dirigidos ao superior hierárquico do magistrado em causa e por aquele apreciados e definitivamente decididos, sem obediência a formalismo especial; sendo visado o procurador-geral da República, a competência cabe à secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça.
3 - A entidade competente para a decisão, nos termos do número anterior, designa o substituto do impedido, recusado ou escusado. |
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Artigo 55.º (Competência dos órgãos de polícia criminal) |
1 - Compete aos órgãos de polícia criminal coadjuvar as autoridades judiciárias com vista à realização das finalidades do processo.
2 - Compete em especial aos órgãos de polícia criminal, mesmo por iniciativa própria, colher notícia dos crimes e impedir quanto possível as suas consequências, descobrir os seus agentes e levar a cabo os actos necessários e urgentes destinados a assegurar os meios de prova. |
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Artigo 56.º (Orientação e dependência funcional dos órgãos de polícia criminal) |
Nos limites do disposto no n.º 1 do artigo anterior, os órgãos de polícia criminal actuam, no processo, sob a direcção das autoridades judiciárias e na sua dependência funcional. |
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TÍTULO III
Do arguido e do seu defensor
| Artigo 57.º (Qualidade de arguido) |
1 - Assume a qualidade de arguido todo aquele contra quem for deduzida acusação ou requerida instrução num processo penal.
2 - A qualidade de arguido conserva-se durante todo o decurso do processo. |
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Artigo 58.º (Constituição de arguido) |
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, é obrigatória a constituição de arguido logo que:
a) Correndo inquérito contra pessoa determinada, esta prestar declarações perante qualquer autoridade judiciária ou órgão de polícia criminal;
b) Tenha de ser aplicada a qualquer pessoa uma medida de coacção ou de garantia patrimonial;
c) Um suspeito for detido, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 254.º a 261.º; ou
d) For levantado auto de notícia que dê uma pessoa como agente de um crime e aquele lhe for comunicado.
2 - A constituição de arguido opera-se através da comunicação, oral ou por escrito, feita ao visado por uma autoridade judiciária ou um órgão de polícia criminal, de que a partir desse momento aquele deve considerar-se arguido num processo penal e da indicação e, se necessário, explicação dos direitos e deveres processuais referidos no artigo 61.º que por essa razão passam a caber-lhe.
3 - A omissão ou violação das formalidades previstas nos números anteriores implica que as declarações prestadas pela pessoa visada não podem ser utilizadas como prova contra ela. |
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Artigo 59.º (Outros casos de constituição de arguido) |
1 - Se, durante qualquer inquirição feita a pessoa que não é arguido, surgir fundada suspeita de crime por ela cometido, a entidade que procede ao acto suspende-o imediatamente e procede à comunicação e à indicação referidas no n.º 2 do artigo anterior.
2 - A pessoa sobre quem recair suspeita de ter cometido um crime tem direito a ser constituída, a seu pedido, como arguido sempre que estiverem a ser efectuadas diligências, destinadas a comprovar a imputação, que pessoalmente a afectem.
3 - É correspondentemente aplicável o disposto no n.º 3 do artigo anterior. |
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Artigo 60.º (Posição processual) |
Desde o momento em que uma pessoa adquirir a qualidade de arguido é-lhe assegurado o exercício de direitos e de deveres processuais, sem prejuízo da aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial e da efectivação de diligências probatórias, nos termos especificados na lei. |
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Artigo 61.º (Direitos e deveres processuais) |
1 - O arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e, salvas as excepções da lei, dos direitos de:
a) Estar presente aos actos processuais que directamente lhe disserem respeito;
b) Ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte;
c) Não responder a perguntas feitas, por qualquer entidade, sobre os factos que lhe forem imputados e sobre o conteúdo das declarações que acerca deles prestar;
d) Escolher defensor ou solicitar ao tribunal que lhe nomeie um;
e) Ser assistido por defensor em todos os actos processuais em que participar e, quando detido, comunicar, mesmo em privado, com ele;
f) Intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se lhe afigurarem necessárias;
g) Ser informado, pela autoridade judiciária ou pelo órgão de polícia criminal perante os quais seja obrigado a comparecer, dos direitos que lhe assistem;
h) Recorrer, nos termos da lei, das decisões que lhe forem desfavoráveis.
2 - A comunicação em privado referida na alínea e) do número anterior ocorre à vista quando assim o impuserem razões de segurança, mas em condições de não ser ouvida pelo encarregado da vigilância.
3 - Recaem em especial sobre o arguido os deveres de:
a) Comparecer perante o juiz, o Ministério Público ou os órgãos de polícia criminal sempre que a lei o exigir e para tal tiver sido devidamente convocado;
b) Responder com verdade às perguntas feitas por entidade competente sobre a sua identidade e, quando a lei o impuser, sobre os seus antecedentes criminais;
c) Sujeitar-se a diligências de prova e a medidas de coacção e garantia patrimonial especificadas na lei e ordenadas e efectuadas por entidade competente. |
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1 - O arguido pode constituir advogado em qualquer altura do processo.
2 - Nos casos em que a lei determinar que o arguido seja assistido por defensor e aquele o não tiver constituído ou o não constituir, o juiz nomeia-lhe defensor, de preferência advogado ou advogado estagiário; mas o defensor nomeado cessa as suas funções logo que o arguido constituir advogado.
3 - Nos casos previstos nos artigos 64.º, n.º 1, alínea c), e 143.º, n.º 2, a nomeação referida no número anterior pode ser feita pelo Ministério Público. |
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Artigo 63.º (Direitos do defensor) |
1 - O defensor exerce os direitos que a lei reconhece ao arguido, salvo os que ela reservar pessoalmente a este.
2 - O arguido pode retirar eficácia ao acto realizado em seu nome pelo defensor, desde que o faça por declaração expressa anterior a decisão relativa àquele acto. |
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Artigo 64.º (Obrigatoriedade de assistência) |
1 - É obrigatória a assistência do defensor:
a) No primeiro interrogatório judicial de arguido detido;
b) No debate instrutório e na audiência, salvo tratando-se de processo que não possa dar lugar à aplicação de pena de prisão ou de medida de segurança de internamento;
c) Em qualquer acto processual, sempre que o arguido for surdo, mudo, analfabeto, desconhecedor da língua portuguesa, menor de 21 anos, ou se suscitar a questão da sua inimputabilidade ou da sua imputabilidade diminuída;
d) Nos recursos ordinários ou extraordinários;
e) Nos casos a que se referem os artigos 271.º e 294.º;
f) Nos demais casos que a lei determinar.
2 - Fora dos casos previstos no número anterior pode o tribunal nomear defensor ao arguido, oficiosamente ou a pedido deste, sempre que as circunstâncias do caso revelarem a necessidade ou a conveniência de o arguido ser assistido. |
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Artigo 65.º (Assistência a vários arguidos) |
1 - Sendo vários os arguidos no mesmo processo, podem eles ser assistidos por um único defensor, se isso não contrariar a função da defesa.
2 - Se um ou alguns dos arguidos houverem constituído advogado e outros não, o tribunal pode nomear, de entre os advogados constituídos, um ou mais que tomem a defesa dos outros arguidos, se isso não contrariar a função da defesa. |
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Artigo 66.º (Defensor nomeado) |
1 - A nomeação de defensor é-lhe notificada quando não estiver presente no acto.
2 - O defensor nomeado pode ser dispensado do patrocínio se alegar causa que o tribunal julgue justa.
3 - O tribunal pode sempre substituir o defensor nomeado, a requerimento do arguido, por causa justa.
4 - Enquanto não for substituído, o defensor nomeado para um acto mantém-se para os actos subsequentes do processo.
5 - O exercício da função de defensor nomeado é sempre remunerado, nos termos e no quantitativo a fixar pelo tribunal, dentro de limites constantes de tabelas aprovadas pelo Ministério da Justiça ou, na sua falta, tendo em atenção os honorários correntemente pagos por serviços do género e do relevo dos que foram prestados. Pela retribuição são responsáveis, conforme o caso, o arguido, o assistente, as partes civis ou os cofres do Ministério da Justiça. |
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Artigo 67.º (Substituição de defensor) |
1 - Se o defensor, relativamente a um acto em que a assistência for necessária não comparecer, se ausentar antes de terminado ou recusar ou abandonar a defesa, o tribunal nomeia imediatamente outro defensor; mas pode também, quando a nomeação imediata se revelar impossível ou inconveniente, decidir-se por uma interrupção da realização do acto.
2 - Se o defensor for substituído durante o debate instrutório ou a audiência, pode o tribunal, oficiosamente ou a requerimento do novo defensor, conceder uma interrupção, para que aquele possa conferenciar com o arguido e examinar os autos.
3 - Em vez da interrupção a que se referem os números anteriores, pode o tribunal decidir-se, se isso for absolutamente necessário, por um adiamento do acto ou da audiência, que não pode, porém, ser superior a cinco dias. |
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TÍTULO IV
Do assistente
| Artigo 68.º (Assistente) |
1 - Podem constituir-se assistentes no processo penal, além das pessoas a quem leis especiais conferirem esse direito:
a) Os ofendidos, considerando-se como tais os titulares dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação, desde que maiores de 16 anos;
b) As pessoas de cuja queixa ou acusação particular depender o procedimento;
c) No caso de o ofendido morrer sem ter renunciado à queixa, o cônjuge sobrevivo não separado judicialmente de pessoas e bens e os descendentes ou, na falta deles, os ascendentes, os irmãos e seus descendentes, o adoptante, o adoptado e a pessoa que com o ofendido vivesse em condições análogas às dos cônjuges, salvo se alguma destas pessoas houver comparticipado no crime;
d) No caso de o ofendido ser incapaz, o seu representante legal, o cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e os descendentes ou, na falta deles, os ascendentes, os irmãos e seus descendentes, o adoptante, o adoptado e a pessoa que com o ofendido viver em condições análogas às dos cônjuges, salvo se alguma destas pessoas houver comparticipado no crime;
e) Qualquer pessoa, nos crimes de corrupção e de peculato.
2 - Os assistentes podem intervir em qualquer altura do processo, aceitando-o no estado em que se encontrar, desde que o requeiram ao juiz até cinco dias antes do início do debate instrutório ou da audiência, conforme os casos.
3 - O juiz, depois de dar ao Ministério Público e ao arguido a possibilidade de se pronunciarem sobre o requerimento, decide por despacho, que é logo notificado àqueles. |
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Artigo 69.º (Posição processual e atribuições dos assistentes) |
1 - Os assistentes têm a posição de colaboradores do Ministério Público, a cuja actividade subordinam a sua intervenção no processo, salvas as excepções da lei.
2 - Compete em especial aos assistentes:
a) Intervir no inquérito e na instrução, oferecendo provas e requerendo as diligências que se afigurarem necessárias;
b) Deduzir acusação independente da do Ministério Público e, no caso de procedimento dependente de acusação particular, ainda que aquele a não deduza;
c) Interpor recurso das decisões que os afectem, mesmo que o Ministério Público o não tenha feito. |
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Artigo 70.º (Representação judiciária dos assistentes) |
1 - Os assistentes são sempre representados por advogado. Havendo vários assistentes, são todos representados por um só advogado. Se divergirem quanto à escolha, decide o juiz.
2 - Ressalva-se do disposto na segunda parte do número anterior o caso de haver entre os vários assistentes interesses incompatíveis, bem como o de serem diferentes os crimes imputados ao arguido. Neste último caso, cada grupo de pessoas a quem a lei permitir a constituição como assistente por cada um dos crimes pode constituir um advogado, não sendo todavia lícito a cada pessoa ter mais de um representante. |
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TÍTULO V
Das partes civis
| Artigo 71.º (Princípio de adesão) |
O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei. |
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Artigo 72.º (Pedido em separado) |
1 - O pedido de indemnização civil pode ser deduzido em separado, perante o tribunal civil, quando:
a) O processo penal não tiver conduzido à acusação dentro de oito meses a contar da notícia do crime, ou estiver sem andamento durante esse lapso de tempo;
b) O processo penal tiver sido arquivado ou suspenso provisoriamente, ou o procedimento se tiver extinguido antes de a sentença transitar em julgado;
c) O procedimento depender de queixa ou de acusação particular;
d) Não houver ainda danos ao tempo da acusação, estes não forem conhecidos ou não forem conhecidos em toda a sua extensão;
e) A sentença penal não se tiver pronunciado sobre o pedido de indemnização civil, nos termos do artigo 82.º, n.º 2;
f) For deduzido contra o arguido e outras pessoas com responsabilidade meramente civil, ou somente contra estas e o arguido for chamado à demanda;
g) O valor do pedido permitir a intervenção civil do tribunal colectivo, devendo o processo penal correr perante tribunal singular;
h) O processo penal correr perante tribunal militar ou sob a forma sumária ou sumaríssima.
2 - No caso de o procedimento depender de queixa ou de acusação particular, a dedução do pedido perante o tribunal civil pelas pessoas com direito de queixa ou de acusação vale como renúncia a este direito. |
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Artigo 73.º (Pessoas com responsabilidade meramente civil) |
1 - O pedido de indemnização civil pode ser deduzido contra pessoas com responsabilidade meramente civil e estas podem intervir voluntariamente no processo penal.
2 - A intervenção voluntária impede as pessoas com responsabilidade meramente civil de praticarem actos que o arguido tiver perdido o direito de praticar. |
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Artigo 74.º (Legitimidade e poderes processuais) |
1 - O pedido de indemnização civil é deduzido pelo lesado, entendendo-se como tal a pessoa que sofreu danos ocasionados pelo crime, ainda que se não tenha constituído ou não possa constituir-se assistente.
2 - A intervenção processual do lesado restringe-se à sustentação e à prova do pedido de indemnização civil, competindo-lhe, correspondentemente, os direitos que a lei confere aos assistentes.
3 - Os demandados e os intervenientes têm posição processual idêntica à do arguido quanto à sustentação e à prova das questões civis julgadas no processo, sendo independente cada uma das defesas. |
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Artigo 75.º (Dever de informação) |
No primeiro acto em que intervier no processo penal pessoa que se saiba ter legitimidade para deduzir pedido de indemnização civil, deve ela ser informada pela autoridade judiciária da possibilidade de o fazer valer no processo penal e das formalidades a observar. |
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Artigo 76.º (Representação) |
1 - Compete ao Ministério Público formular o pedido de indemnização civil relativamente a lesado que lho requeira.
2 - O lesado pode fazer-se representar por advogado.
3 - A representação por advogado faz cessar a intervenção do Ministério Público e implica para o lesado a aceitação dos actos processuais por aquele praticados.
4 - Devem fazer-se representar por advogados os demandados e os intervenientes, mas se o não fizerem são representados por defensor nomeado pelo juiz. |
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Artigo 77.º (Formulação do pedido) |
1 - Quando apresentado pelo Ministério Público ou pelo assistente, o pedido é deduzido na acusação ou no prazo em que esta deve ser formulada.
2 - Fora dos casos previstos no número anterior, o pedido é deduzido, em requerimento articulado, até cinco dias depois de ao arguido ser notificado o despacho de pronúncia ou, se o não houver, o despacho que designa dia para a audiência.
3 - O pedido de indemnização civil é acompanhado de duplicados para os demandados e a secretaria. |
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Artigo 78.º (Contestação) |
1 - A pessoa contra quem for deduzido pedido de indemnização civil é notificada para, querendo, contestar no prazo de dez dias.
2 - A contestação é deduzida por artigos.
3 - A falta de contestação não implica confissão dos factos. |
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1 - As provas são requeridas com os articulados.
2 - Cada requerente, demandado ou interveniente pode arrolar até cinco testemunhas. |
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O lesado, os demandados e os intervenientes são obrigados a comparecer no julgamento apenas quando tiverem de prestar declarações a que não puderem recusar-se. |
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Artigo 81.º (Renúncia, desistência e conversão do pedido) |
O lesado pode, em qualquer altura do processo:
a) Renunciar ao direito de indemnização civil e desistir do pedido formulado;
b) Requerer que o objecto da prestação indemnizatória seja convertido em diferente atribuição patrimonial, desde que prevista na lei. |
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Artigo 82.º (Liquidação em execução de sentença e reenvio para os tribunais civis) |
1 - Se não dispuser de elementos bastantes para fixar a indemnização, o tribunal condena no que se liquidar em execução de sentença. Neste caso, a execução corre perante o tribunal civil, servindo de título executivo a sentença penal.
2 - O tribunal pode, oficiosamente ou a requerimento, remeter as partes para os tribunais civis quando as questões suscitadas pelo pedido de indemnização civil inviabilizarem uma decisão rigorosa ou forem susceptíveis de gerar incidentes que retardem intoleravelmente o processo penal. |
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Artigo 83.º (Exequibilidade provisória) |
A requerimento do lesado, o tribunal pode declarar a condenação em indemnização civil, no todo ou em parte, provisoriamente executiva, nomeadamente sob a forma de pensão. |
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Artigo 84.º (Caso julgado) |
A decisão penal, ainda que absolutória, que conhecer do pedido civil constitui caso julgado nos termos em que a lei atribui eficácia de caso julgado às sentenças civis. |
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LIVRO II
Dos actos processuais
TÍTULO I
Disposições gerais
| Artigo 85.º (Manutenção da ordem nos actos processuais) |
1 - Compete às autoridades judiciárias, às autoridades de polícia criminal e aos funcionários de justiça regular os trabalhos e manter a ordem nos actos processuais a que presidirem ou que dirigirem, tomando as providências necessárias contra quem perturbar o decurso dos actos respectivos.
2 - Se o prevaricador dever ainda intervir ou estar presente no próprio dia, em acto presidido pelo juiz, este ordena, se necessário, que aquele seja detido até à altura da sua intervenção, ou durante o tempo em que a sua presença for indispensável.
3 - Verificando-se, no decurso de um acto processual, a prática de qualquer infracção, a entidade competente, nos termos do n.º 1, levanta ou manda levantar auto e, se for caso disso, detém ou manda deter o agente, para efeito de procedimento.
4 - Para manutenção da ordem nos actos processuais requisita-se, sempre que necessário, o auxílio da força pública, a qual fica submetida, para o efeito, ao poder de direcção da autoridade judiciária que presidir ao acto. |
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Artigo 86.º (Publicidade do processo e segredo de justiça) |
1 - O processo penal é, sob pena de nulidade, público a partir da decisão instrutória ou, se a instrução não tiver lugar, do momento em que já não pode ser requerida, vigorando até qualquer desses momentos o segredo de justiça.
2 - A publicidade do processo implica, nos termos definidos pela lei e, em especial, pelos artigos seguintes, os direitos de:
a) Assistência, pelo público em geral, à realização dos actos processuais;
b) Narração dos actos processuais, ou reprodução dos seus termos, pelos meios de comunicação social;
c) Consulta do auto e obtenção de cópias, extractos e certidões de quaisquer partes dele.
3 - O segredo de justiça vincula todos os participantes processuais, bem como as pessoas que, por qualquer título, tiverem tomado contacto com o processo e conhecimento de elementos a ele pertencentes, e implica as proibições de:
a) Assistência à prática ou tomada de conhecimento do conteúdo de acto processual a que não tenham o direito ou o dever de assistir;
b) Divulgação da ocorrência de acto processual ou dos seus termos, independentemente do motivo que presidir a tal divulgação.
4 - Pode, todavia, a autoridade judiciária que preside à fase processual respectiva dar ou ordenar ou permitir que seja dado conhecimento a determinadas pessoas do conteúdo de acto ou de documento em segredo de justiça, se tal se afigurar conveniente ao esclarecimento da verdade.
5 - As pessoas referidas no número anterior ficam, em todo o caso, vinculadas pelo segredo de justiça.
6 - A autoridade judiciária pode autorizar a passagem de certidão em que seja dado conhecimento do conteúdo do acto ou do documento em segredo de justiça na medida estritamente necessária à dedução em separado de pedido de indemnização civil. |
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Artigo 87.º (Assistência do público a actos processuais) |
1 - Aos actos processuais declarados públicos pela lei, nomeadamente às audiências, pode assistir qualquer pessoa. Oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, do arguido ou do assistente pode, porém, o juiz decidir, por despacho, restringir a livre assistência do público ou que o acto, ou parte dele, decorra com exclusão da publicidade.
2 - O despacho referido na segunda parte do número anterior deve fundar-se em factos ou circunstâncias concretas que façam presumir que a publicidade causaria grave dano à dignidade das pessoas, à moral pública ou ao normal decurso do acto e deve ser revogado logo que cessarem os motivos que lhe deram causa.
3 - Em caso de processo por crime sexual que tenha por ofendido um menor de 16 anos, os actos processuais decorrem em regra com exclusão da publicidade.
4 - Decorrendo o acto com exclusão da publicidade, apenas podem assistir as pessoas que nele tiveram de intervir, bem como outras que o juiz admitir por razões atendíveis, nomeadamente de ordem profissional ou científica.
5 - A exclusão da publicidade não abrange, em caso algum, a leitura da sentença.
6 - Não implica restrição ou exclusão da publicidade, para efeito do disposto nos números anteriores, a proibição, pelo juiz, da assistência de menor de 18 anos ou de quem, pelo seu comportamento, puser em causa a dignidade ou a disciplina do acto. |
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Artigo 88.º (Meios de comunicação social) |
1 - É permitida aos órgãos de comunicação social, dentro dos limites da lei, a narração circunstanciada do teor de actos processuais que se não encontrem cobertos por segredo de justiça ou a cujo decurso for permitida a assistência do público em geral.
2 - Não é, porém, autorizada, sob pena de desobediência simples:
a) A reprodução de peças processuais ou de documentos incorporados em processos pendentes, salvo se tiverem sido obtidos mediante certidão solicitada com menção do fim a que se destina, ou se para tal tiver havido autorização expressa da autoridade judiciária que presidir à fase em que se encontra o processo no momento da publicação;
b) A transmissão de imagens ou de tomadas de som relativas à prática de qualquer acto processual, nomeadamente da audiência, salvo se a autoridade judiciária referida na alínea anterior, por despacho, a autorizar;
c) A publicação, por qualquer meio, da identidade de vítimas de crimes sexuais, contra a honra ou contra a reserva da vida privada, antes da audiência, ou mesmo depois, se o ofendido for menor de 16 anos.
3 - Até à decisão sobre a publicidade da audiência não é ainda autorizada, sob pena de desobediência simples, a narração de actos processuais anteriores àquela quando o juiz, oficiosamente ou a requerimento, a tiver proibido com fundamento nos factos ou circunstâncias referidos no n.º 2 do artigo anterior. |
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Artigo 89.º (Consulta de auto e obtenção de certidão por sujeitos processuais) |
1 - Para além da entidade que dirigir o processo, do Ministério Público e daqueles que nele intervierem como auxiliares, o arguido, o assistente e as partes civis podem ter acesso a auto, para consulta, na secretaria ou noutro local onde estiver a ser realizada qualquer diligência, bem como obter cópias, extractos e certidões autorizados por despacho, ou independentemente dele para efeito de prepararem a acusação e a defesa dentro dos prazos para tal estipulados pela lei.
2 - Se, porém, o Ministério Público não houver ainda deduzido acusação, o arguido, o assistente e as partes civis só podem ter acesso a auto na parte respeitante a declarações prestadas e a requerimentos e memoriais por eles apresentados, bem como a diligências de prova a que pudessem assistir ou a questões incidentais em que devessem intervir. Para o efeito, as partes referidas do auto ficam avulsas na secretaria, por fotocópia, pelo prazo de três dias, sem prejuízo do andamento do processo. O dever de guardar segredo de justiça persiste para todos.
3 - As pessoas mencionadas no n.º 1 têm, relativamente a processos findos, àqueles em que não puder ou já não puder ter lugar a instrução e àqueles em que tiver havido já decisão instrutória, direito a examiná-los gratuitamente fora da secretaria, desde que o requeiram à autoridade judiciária competente e esta, fixando prazo para tal, autorize a confiança do processo.
4 - São correspondentemente aplicáveis à hipótese prevista no número anterior as disposições da lei do processo civil respeitantes à falta de restituição do processo dentro do prazo; sendo a falta da responsabilidade do Ministério Público, a ocorrência é comunicada ao superior hierárquico. |
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Artigo 90.º (Consulta de auto e obtenção de certidão por outras pessoas) |
1 - Qualquer pessoa que nisso revelar interesse legítimo pode pedir que seja admitida a consultar auto de um processo que se não encontre em segredo de justiça e que lhe seja fornecida, à sua custa, cópia, extracto ou certidão de auto ou de parte dele. Sobre o pedido decide, por despacho, a autoridade judiciária que presidir à fase em que se encontra o processo ou que nele tiver proferido a última decisão.
2 - A permissão de consulta de auto e de obtenção de cópia, extracto ou certidão realiza-se sem prejuízo da proibição, que no caso se verificar, de narração dos actos processuais ou de reprodução dos seus termos através dos meios de comunicação social. |
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Artigo 91.º (Juramento e compromisso) |
1 - As testemunhas prestam o seguinte juramento: 'Juro, por minha honra, dizer toda a verdade e só a verdade.'
2 - Os peritos e os intérpretes prestam, em qualquer fase do processo, o seguinte compromisso: 'Comprometo-me, por minha honra, a desempenhar fielmente as funções que me são confiadas.'
3 - O juramento e o compromisso referidos nos números anteriores são prestados perante a autoridade judiciária competente, a qual adverte previamente quem os dever prestar das sanções em que incorre se os recusar ou a eles faltar.
4 - A recusa a prestar o juramento ou o compromisso equivale à recusa a depor ou a exercer as funções.
5 - O juramento e o compromisso, uma vez prestados, não necessitam de ser renovados na mesma fase de um mesmo processo.
6 - Não prestam o juramento e o compromisso referidos nos números anteriores:
a) Os menores de 16 anos;
b) Os peritos e os intérpretes que forem funcionários públicos e intervierem no exercício das suas funções. |
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TÍTULO II
Da forma dos actos e da sua documentação
| Artigo 92.º (Língua dos actos e nomeação de intérprete) |
1 - Nos actos processuais, tanto escritos como orais, utiliza-se a língua portuguesa, sob pena de nulidade.
2 - Quando houver de intervir no processo pessoa que não conhecer ou não dominar a língua portuguesa, é nomeado, sem encargo para ela, intérprete idóneo, ainda que a entidade que preside ao acto ou qualquer dos participantes processuais conheçam a língua por aquela utilizada.
3 - É igualmente nomeado intérprete quando se tornar necessário traduzir documento em língua estrangeira e desacompanhado de tradução autenticada.
4 - Ao desempenho da função de intérprete é correspondentemente aplicável o disposto nos artigos 153.º e 162.º |
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Artigo 93.º (Participação de surdo, mudo ou surdo-mudo) |
1 - Quando um surdo, um mudo ou um surdo-mudo deverem prestar declarações, observam-se as regras seguintes:
a) Ao surdo formulam-se as perguntas por escrito, respondendo ele oralmente;
b) Ao mudo formulam-se as perguntas oralmente, respondendo ele por escrito;
c) Ao surdo-mudo formulam-se as perguntas por escrito, respondendo ele também por escrito.
2 - Se o surdo, o mudo ou o surdo-mudo não souberem ler ou escrever, a autoridade competente nomeia intérprete idóneo. O mesmo sucede se as declarações deverem ser prestadas em audiência e o tribunal considerar preferível a intervenção de intérprete.
3 - O disposto nos números anteriores é correspondentemente aplicável aos requerimentos orais e à prestação de juramento. |
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Artigo 94.º (Forma escrita dos actos) |
1 - Os actos processuais que tiverem de praticar-se sob a forma escrita são redigidos de modo perfeitamente legível, não contendo espaços em branco que não sejam inutilizados, nem entrelinhas, rasuras ou emendas que não sejam ressalvadas.
2 - Podem utilizar-se máquinas de escrever ou processadores de texto, caso em que se certifica, antes da assinatura, que o documento foi integralmente revisto e se identifica a entidade que o elaborou.
3 - Podem igualmente utilizar-se fórmulas pré-impressas ou carimbos, a completar com o texto respectivo.
4 - Em caso de manifesta ilegibilidade do documento, qualquer participante processual interessado pode solicitar, sem encargos, a respectiva transcrição dactilográfica.
5 - As abreviaturas a que houver de recorrer-se devem possuir significado inequívoco. As datas e os números podem ser escritos por algarismos, ressalvada a indicação por extenso das penas, montantes indemnizatórios e outros elementos cuja certeza importe acautelar.
6 - É obrigatória a menção do dia, mês e ano da prática do acto, bem como, tratando-se de acto que afecte liberdades fundamentais das pessoas, da hora da sua ocorrência, com referência ao momento do respectivo início e conclusão. O lugar da prática do acto deve ser indicado. |
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1 - O escrito a que houver de reduzir-se um acto processual é no final, e ainda que este deva continuar-se em momento posterior, assinado por quem a ele presidir, por aquelas pessoas que nele tiverem participado e pelo funcionário de justiça que tiver feito a redacção, sendo as folhas que não contiverem assinatura rubricadas pelos que tiverem assinado.
2 - As assinaturas e as rubricas são feitas pelo próprio punho, sendo, para o efeito, proibido o uso de quaisquer meios de reprodução.
3 - No caso de qualquer das pessoas cuja assinatura for obrigatória não puder ou se recusar a prestá-la, a autoridade ou o funcionário presentes declaram no auto essa impossibilidade ou recusa e os motivos que para elas tenham sido dados. |
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Artigo 96.º (Oralidade dos actos) |
1 - Salvo quando a lei dispuser de modo diferente, a prestação de quaisquer declarações processa-se por forma oral, não sendo autorizada a leitura de documentos escritos previamente elaborados para aquele efeito.
2 - A entidade que presidir ao acto pode autorizar que o declarante se socorra de apontamentos escritos como adjuvantes da memória, fazendo consignar no auto tal circunstância.
3 - No caso a que se refere o número anterior devem ser tomadas providências para defesa da espontaneidade das declarações feitas, ordenando-se, se for caso disso, a exibição dos apontamentos escritos, sobre cuja origem o declarante será detalhadamente perguntado.
4 - Os despachos e sentenças proferidos oralmente são consignados no auto.
5 - O disposto no presente artigo não prejudica as normas relativas às leituras permitidas e proibidas em audiência. |
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Artigo 97.º (Actos decisórios) |
1 - Os actos decisórios dos juízes tomam a forma de:
a) Sentenças, quando conhecerem a final do objecto do processo;
b) Despachos, quando conhecerem de qualquer questão interlocutória ou quando puserem termo ao processo fora do caso previsto na alínea anterior;
c) Acórdãos, quando se tratar da decisão de um tribunal colegial.
2 - Os actos decisórios do Ministério Público tomam a forma de despachos.
3 - Os actos decisórios referidos nos números anteriores revestem os requisitos formais dos actos escritos ou orais, consoante o caso.4 - Os actos decisórios são sempre fundamentados. |
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Artigo 98.º (Exposições, memoriais e requerimentos) |
1 - O arguido, ainda que em liberdade, pode apresentar exposições, memoriais e requerimentos em qualquer fase do processo, embora não assinados pelo defensor, desde que se contenham dentro do objecto do processo ou tenham por finalidade a salvaguarda dos seus direitos fundamentais. As exposições, memoriais e requerimentos do arguido são sempre integradas nos autos.
2 - Os requerimentos dos outros participantes processuais que se encontrem representados por advogados são assinados por estes, salvo se se verificar impossibilidade de eles o fazerem e o requerimento visar a prática de acto sujeito a prazo de caducidade.
3 - Quando for legalmente admissível a formulação oral de requerimentos, estes são consignados no auto pela entidade que dirigir o processo ou pelo funcionário de justiça que o tiver a seu cargo. |
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1 - O auto é o instrumento destinado a fazer fé quanto aos termos em que se desenrolaram os actos processuais a cuja documentação a lei obrigar e aos quais tiver assistido quem o redige, bem como a recolher as declarações, requerimentos, promoções e actos decisórios orais que tiverem ocorrido perante aquele.
2 - O auto respeitante ao debate instrutório e à audiência denomina-se acta e rege-se complementarmente pelas disposições legais que este Código lhe manda aplicar.
3 - O auto contém, além dos requisitos previstos para os actos escritos, menção dos elementos seguintes:
a) Identificação das pessoas que intervieram no acto;
b) Causas, se conhecidas, da ausência das pessoas cuja intervenção no acto estava prevista;
c) Descrição especificada das operações praticadas, da intervenção de cada um dos participantes processuais, das declarações prestadas, do modo como o foram e das circunstâncias em que o foram, dos documentos apresentados ou recebidos e dos resultados alcançados, de modo a garantir a genuína expressão da ocorrência;
d) Qualquer ocorrência relevante para apreciação da prova ou da regularidade do acto.
4 - É correspondentemente aplicável o disposto no artigo 169.º |
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Artigo 100.º (Redacção do auto) |
1 - A redacção do auto é efectuada pelo funcionário de justiça, ou pelo funcionário de polícia criminal durante o inquérito, sob a direcção da entidade que presidir ao acto.
2 - Sempre que o auto dever ser redigido por súmula, compete à entidade que presidir ao acto velar por que a súmula corresponda ao essencial do que se tiver passado ou das declarações prestadas, podendo para o efeito ditar o conteúdo do auto ou delegar, oficiosamente ou a requerimento, nos participantes processuais ou nos seus representantes.
3 - Em caso de alegada desconformidade entre o teor do que for ditado e o ocorrido, são feitas consignar as declarações relativas à discrepância, com indicação das rectificações a efectuar, após o que a entidade que presidir ao acto profere, ouvidos os participantes processuais interessados que estiverem presentes, decisão definitiva sustentando ou modificando a redacção inicial. |
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