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Processo n.º 636/12
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. No presente processo em que são recorrentes A. e B. e recorrido C., Lda, o relator proferiu a seguinte “decisão sumária”:
«1. Os recorrentes interpõem recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo de requerimento do seguinte teor:
“(…)
O recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a interpretação e aplicação inconstitucional das normas e princípios contidos no artigo 3º-A, do C.P.C. e no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo 14.º/1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, conjugadas entre si, pois entende que, quer o Tribunal da Relação, quer o Tribunal da 1ª instância, fizeram uma leitura não constitucional de tais preceitos.
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Não obstante a questão já ter sido suscitada perante o Douto Supremo Tribunal de Justiça, entendem os Recorrentes que a apreciação efetuada pelo mesmo, mantém as inconstitucionalidades invocadas.
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Os preceitos constitucionais indicados constituem princípios integradores e orientadores das normas do processo civil em causa, não estando a sua aplicação de acordo com a constituição sujeita ao livre arbítrio do julgador. Aliás, a igualdade de aplicação do direito, relaciona-se estreitamente com a vinculação jurídico-material do juiz ao princípio da igualdade, a aplicação de igual direito a casos idênticos e a utilização de um critério de igualdade na utilização pelo juiz dos seus poderes discricionários. (vide CRP anotada, 3ª Edição – Gomes Canotilho e Vital Moreira)
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Verificamos que foram violados princípios estruturantes do processo civil, nomeadamente o Direito ao processo justo, uma vez que, não basta ser assegurado o acesso à justiça, mas também que o processo, a que se acede, apresente garantias de justiça, no que toca à sua estrutura. Este Direito encontra-se consagrado no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo 14.º/1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e no artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Com ele pretende-se o direito a julgamento equitativo, garantindo àquele que recorre aos Tribunais um julgamento por um órgão imparcial, uma plena igualdade das partes, o direito ao contraditório, uma duração razoável da ação, a publicidade do processo e a efetivação do direito à prova. Ora acontece que no acaso em apreço, este direito ao processo justo foi violado, na medida em que a prova documental produzida não foi tida em conta, sem grande relevância prática e a prova testemunhal foi erradamente apreciada.
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No caso em apreço não houve uma igualdade processual das partes, não havendo uma concretização do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, que tem a sua expressão legal no artigo 3.º-A do CPC.
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Termos em que nos Doutamente supridos e nos mais de Direito, devem Vossas Excelências admitir o presente Recurso, com todas as legais consequências.”
2. Como resulta da Constituição (artigo 280.º da CRP) e da Lei (artigo 70.º, n.º 1, da LTC), no sistema português, ao Tribunal Constitucional compete fiscalizar a conformidade à Constituição que tenha por objeto (em sentido material) normas aplicadas (ou, se for o caso, a que tenha sido recusada aplicação) pelos demais tribunais e não a inconstitucionalidade das decisões judiciais, em si mesmas consideradas.
Ora, no caso, a violação de normas e preceitos constitucionais que os recorrentes pretendem que o Tribunal censure é imputada à própria decisão.
Assim, o recurso não pode prosseguir por não ter objeto idóneo, o que imediatamente se decide, ao abrigo do artigo 78.º-A da LTC
3. Decisão
Pelo exposto decide-se não tomar conhecimento do objeto do recurso e condenar os recorrentes nas custas, com 7 UCs de taxa de justiça.»
2. Os recorrentes reclamam para a conferência nos seguintes termos:
“(…)
1.
Contrariamente, ao entendimento sufragado na douta decisão sumária, somos do parecer que os argumentos dos Recorrentes, vão no sentido de o presente recurso ter objeto idóneo, assim dá-se infra como reproduzida toda a argumentação já exposta:
O Recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a interpretação e aplicação inconstitucional das normas e princípios contidos no artigo 3º-A, do C.P.C. e no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo 14.º/1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e artigo 6º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, conjugadas entre si, pois entende que, quer o Tribunal da Relação, quer o Tribunal da 1ª Instância, fizeram uma leitura não constitucional de tais preceitos.
2
Não obstante a questão já ter sido suscitada perante o Douto Supremo Tribunal de Justiça, entendem, os Recorrentes que a apreciação efetuada pelo mesmo, mantém as inconstitucionalidades invocadas.
3
Os preceitos constitucionais indicados constituem princípios integradores e orientadores das normas do processo civil em causa, não estando a sua aplicação de acordo com a constituição sujeita ao livre arbítrio do julgador. Aliás, a igualdade de aplicação do direito, relaciona-se estreitamente com a vinculação jurídico-material do juiz ao princípio da igualdade, a aplicação de igual direito a casos idênticos e a utilização de um critério de igualdade na utilização pelo juiz dos seus poderes discricionários, (vide CRP anotada 3ª Edição – Gomes Canotilho e Vital Moreira).
4
Verificamos que foram violados princípios estruturantes do processo civil, nomeadamente o Direito ao processo justo, uma vez que, não basta ser assegurado o acesso à justiça, mas também que o processo, a que se acede, apresente garantias de justiça, no que toca à sua estrutura. Este Direito encontra-se consagrado no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo 14º/1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e no artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Com ele pretende-se o direito a julgamento equitativo, garantido àquele que recorre aos Tribunais um julgamento por um órgão imparcial, uma plena igualdade das partes, o direito ao contraditório, uma duração razoável da ação, a publicidade do processo e a efetivação do direito à prova. Ora acontece que no caso em apreço, este direito ao processo justo foi violado, na medida em que a prova documental produzida não foi tida em conta, sem grande relevância prática e a prova testemunhal foi erradamente apreciada.
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No caso em apreço não houve uma igualdade processual das partes, não havendo uma concretização do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, que tem a sua expressão legal no artigo 3.º-A do CPC.
(…).”
A recorrida não contra-alegou.
3. A reclamação é manifestamente destituída de fundamento.
Com efeito, os recorrentes não enunciam uma questão de constitucionalidade normativa. O que pretendem ver apreciado pelo Tribunal Constitucional não é uma norma ou um critério normativo de decisão que se apresente formalmente de fonte heterónoma, relativamente à concreta decisão judicial, mas a (in)observância pelo tribunal da causa, no seu concreto proceder, dos preceitos de direito internacional e dos princípios constitucionais que referem. Que é essa a questão está patente nos nºs 4 e 5 da reclamação, acima transcritos.
Aliás, já como tal, como questão referente à decisão judicial e não como questão de constitucionalidade normativa, foi a questão colocada no recurso perante o Supremo Tribunal de Justiça, em que os recorrentes disseram:
«(…)
X. Assim sendo, verificamos que foram violados princípios estruturantes do processo civil, nomeadamente o Direito ao processo justo, uma vez que, não basta ser assegurado o acesso à justiça, mas também que o processo, a que se acede, apresente garantias de justiça, no que toca à sua estrutura. Este Direito encontra-se consagrado no artigo 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo 14.º/1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e no artigo 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. Com ele pretende-se o direito a julgamento equitativo, garantindo àquele que recorre aos Tribunais um julgamento por um órgão imparcial, uma plena igualdade das partes, o direito ao contraditório, uma duração razoável da ação, a publicidade do processo e a efetivação do direito à prova. Ora acontece que no acaso em apreço, este direito ao processo justo foi violado, na medida em que a prova documental produzida não foi tida em conta, sem grande relevância prática e a prova testemunhal foi erradamente apreciada.
XI. No caso em apreço não houve uma igualdade processual das partes, não havendo uma concretização do princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, que tem a sua expressão legal no artigo 3.º-A do CPC. Mas para além da igualdade das partes a nível processual, também o Tribunal deverá procurar proferir uma decisão de acordo com a realidade das coisas, para isso o direito português concede ao Tribunal certos poderes instrutórios (artigos 535.º/1, 612.º/l e 653.º/1 do CPC) e inquisitórios (artigos 264.º/2 e 265º/3 do CPC), que no caso em apreço não foram tidos em conta para a boa decisão da matéria factual.
XII. Para além da violação de princípios estruturantes da lei processual que aqui se invocam também se verifica a violação da lei substantiva, isto é assim na medida em que de acordo com o consagrado no artigo 346.º do Código Civil e no artigo 516.º/ do CPC, a parte que tenha o ónus da prova, que no caso em apreço era a Exequente, ora Recorrida, tem que fazer prova dos factos alegados, nomeadamente a existência de dívida. Apesar de ser o legalmente previsto e de os Recorrentes e Executada terem apresentado contraprova a respeito dos mesmos factos, destinada a torná-los duvidosos, tendo, no seu modesto entendimento, conseguido e efetivado essa dúvida. E quando isso sucede, salvo o devido respeito, que é muito, outra decisão não poderia ser tomada pela Sra. Juiz a quo que não fosse a procedência pela contraprova no sentido da inexistência de dívida por parte da Executada e dos Recorrentes para com a Recorrida.
XIII. Assim sendo, para além de se ter verificado a não aplicação de alguns preceitos legais de elevado relevo prático para a boa decisão da causa, também se verificou a violação da lei substantiva e adjetiva, nomeadamente a plasmada nos artigos 346.º do CC, 516.º do CPC, 3.º-A do CPC, 13.º da CRP, 535.º/1, 612.º/1 e 653.º/1 do CPC, 264.º/2 e 265º/3 do CPC, 10.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, 14.º/1 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos e 6.º/1 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, o que levaria inevitavelmente à nulidade da sentença.
(…)»
Ora, como se decidiu na decisão sumária e corresponde a jurisprudência constante do Tribunal, no sistema gizado pela Constituição esse não é objeto idóneo do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade a cargo do Tribunal Constitucional.
4. Decisão
Pelo exposto decide-se indeferir a reclamação e condenar os recorrentes nas custas, com 20 UCs de taxa de justiça.
Lisboa, 21 de novembro de 2012.- Vítor Gomes – Catarina Sarmento e Castro – Maria Lúcia Amaral.