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Procº nº 787/2001.
2ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Notificado do Acórdão nº 46/2002, tirado nestes autos em 5 de Fevereiro de 2002 e por intermédio do qual foi indeferida a reclamação deduzida pelo Licº A, veio este, invocando os artigos 668º e 669º, nº 1, alínea a), ambos do Código de Processo Civil, de uma banda, argui-lo de nulidades, pois que, em seu entender, por um lado, o mesmo não especificou os fundamentos de direito e de facto que justificaram a decisão, por outro, ele alterou a causa de pedir da reclamação e, por outro, ainda, que tal aresto excedeu pronúncia; de outra, solicitar a respectiva reforma quanto a custas.
Rematou o ora peticionante a sua peça processual com as seguintes
«conclusões»:-
'No entender do reclamante, o douto acórdão n.º46/2002 não especifica os fundamentos de direito que justificam a decisão, em desconhecimento do disposto nos artigos 158.º, n.º 1, e 668.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil
1. Com efeito, no douto acórdão n.º 46/2002, lê-se:
‘Efectivamente, o ora reclamante nunca, minimamente, enunciou qual fosse a interpretação que tinha por violadora de normas ou princípios constitucionais, pois que se limitou a dizer que ela era a que subjazia ao 'procedimento que conduziu' ao despacho de 12 de Junho de 2001. Tem, desta arte, que se convir que um tal modo de dizer é, de todo em todo, uma forma processualmente inadequada de suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa reportada a uma dimensão interpretativa de dado ou de dados preceitos jurídicos’ (fls. 7, carregado do reclamante).
2. O douto acórdão n.º 46/2002 não especifica a norma ou o critério legal que legitime o juízo de que o modo de dizer que ‘os artigos 667.º e 668.º, n.º3, do Código de Processo Civil, com a interpretação subjacente ao procedimento que conduziu ao douto despacho de 22 de Maio de 2001, como aos anteriores despachos tempestivamente reclamados, são inconstitucionais por violação dos princípios do contraditório e da igualdade de armas’ é ‘uma forma processualmente inadequada de suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa’.
3. No entender do reclamante, a especificação da norma ou do critério legal em que se apoia tal juízo era exigida pelo dever de fundamentação, tendo em conta os elementos que a seguir se indicam. a) O artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional não subordina a admissibilidade de um recurso para o Tribunal Constitucional à utilização de qualquer fórmula sacramental, bastando que o interessado demonstre que na decisão do tribunal a quo se aplicou a norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. b) O termo ‘subjazer’ é considerado pelos dicionários de português como sinónimo de ‘subentender’ e o termo ‘implícito’ é considerado sinónimo de ‘subentendido’
(v., por exemplo, Dicionário da Língua Portuguesa, Dicionários da Porto Editora,
8.ª edição, pp. 1539, e 906, respectivamente). c) O termo ‘subjazer’ foi utilizado tendo presente a jurisprudência que ensina que, para se mostrar satisfeito o pressuposto de aplicação da norma cuja constitucionalidade se questiona, basta a aplicação dessa norma de forma implícita e que o recurso de constitucionalidade pode ter como objecto ‘normas ou interpretações normativas implicitamente aplicadas’ (v. acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 115/98, de 4 de Fevereiro de 1998, in BMJ n.º 474 - Março -
1998, pp. 31,37, e n.º 612/99, de 10 de Novembro de 1999, in BMJ n.º 491- Dezembro - 1999, pp. 24, 28 e seg., carregado do reclamante). d) O termo ‘procedimento’ foi utilizado tendo presente a jurisprudência segundo a qual num due process of 1aw devem considerar-se ilegítimas ‘quer eventuais normas processuais, quer procedimentos aplicativos delas’ que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa (v., por exemplo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 275/99, de 5 de Maio de 1999, in BMJ n.º 487 - Junho - 1999, pp. 61, 68, carregado do reclamante) e que a actividade jurisdicional se rege por critérios estritamente jurídicos, tal como se depreende do ponto I da reclamação do douto despacho de não admissão do recurso para o Tribunal Constitucional. II Da leitura dos actos de processo apresentados pelo reclamante perante o Tribunal a quo e da reclamação que deu origem ao douto acórdão n.º 46/2002, conclui-se que o Tribunal Constitucional, para tirar esse douto acórdão, alterou a causa de pedir da reclamação do douto despacho de não admissão do recurso de constitucional idade, em violação do artigo 668.º, n.º 1, alínea d), combinado com os artigos 664.º, e 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil
4. No douto acórdão n.º 46/2002 (fls. 7), lê-se:
‘... que o que está em causa (na apreciação de uma reclamação nos termos do artigo 77.º da Lei do Tribunal Constitucional) não é a fundamentação da decisão de inadmissibilidade do recurso, mas sim a admissibilidade ou a inadmissibilidade deste’.
5. Resulta claro desta passagem do douto acórdão reclamado o propósito de alterar o objecto da reclamação apresentada.
6. Ao declarar-se que ‘o que está em causa não é a fundamentação da decisão de inadmissibilidade do recurso, mas sim a admissibilidade ou a inadmissibilidade deste’, olvidou-se que a fundamentação de uma decisão é o único elemento que permite tomar utilmente posição sobre uma decisão de não admissão de um recurso através de reclamação nos termos do artigo 77.º da Lei do Tribunal Constitucional.
7. Esta reclamação tem a natureza de recurso e o seu objecto só poderá ser a decisão proferida no Tribunal a quo com a respectiva fundamentação.
8. No entender do reclamante, o principio geral consignado no artigo 664.º do Código de Processo Civil é aplicável também à fase de recurso de constitucionalidade (v., neste sentido, acórdão do S. T. J. de 27 de Outubro de
1998, in BMJ n.º 480 - Novembro - 1998, pp. 392 e 394).
9. A reclamação do douto despacho de não admissão de recurso para o Tribunal Constitucional proferido pelo Tribunal a quo foi indeferida, segundo se lê no douto acórdão n.º 46/2002 (fls. 7), por a questão de constitucional idade que se pretende ver apreciada não ter sido suscitada de modo processualmente adequado na reclamação para a conferência ‘do despacho antecedentemente proferido em 22 de Maio de 2001 pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça’
10. Para justificar esta conclusão declara-se no douto acórdão ora reclamado:
‘Efectivamente, o ora reclamante nunca, minimamente, enunciou qual fosse a interpretação que tinha por violadora de normas ou princípios constitucionais, pois que se limitou a dizer que ela era a que subjazia ao ‘procedimento que conduziu’ ao despacho de 12 de Junho de 2001 (fls. 7, carregado do reclamante).
... Ora, o reclamante nunca sequer especificou qual a interpretação dos artigos
677.º e 668.º, n.º 3, do Código de Processo Civil que considerava ter sido levada a efeito e, como tal, aplicada no despacho recorrido, limitando-se, como se disse, a remeter para a interpretação que subjazia ao procedimento que conduziu ao proferimento desse despacho’ (fls. 8, carregado do reclamante).
11. À luz do disposto no artigo 664.º do Código de Processo Civil, uma vez que tal facto não foi invocado na decisão do Tribunal a quo, não era licito ao Tribunal Constitucional servir-se dele, na medida em que tal implica uma alteração da fundamentação da decisão reclamada e, por conseguinte, do objecto da reclamação.
12. Nestas condições, o douto acórdão n.º 46/2002 constitui uma decisão-
-surpresa, na medida em que não foi dada ao interessado oportunidade de tomar posição, antes da sua prolação, sobre questões de facto e de direito inteiramente novas, em manifesto desconhecimento do artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
13. Confrontando o texto das conclusões da reclamação para a conferência apresentada em 12 de Junho de 2001 (fls. 22 a 24), com as passagens dessas conclusões reproduzidas no douto acórdão n.º 46/2002 (fls. 3 e 4) conclui-se que o Tribunal Constitucional apenas faz alusão aos títulos das conclusões da reclamação, omitindo qualquer referência às razões de facto e de direito pelas quais o reclamante justificava as afirmações reproduzidas no douto acórdão ora reclamado.
14. Portanto, a conclusão de que o reclamante ‘se limitou a dizer que (a interpretação) era a que subjazia ao procedimento que conduziu ao proferimento desse despacho’ (fls. 8) não se enquadra minimamente no desenvolvimento lógico da factualidade que se depreende dos elementos dos autos, nomeadamente, da citada reclamação para a conferência apresentada em 12 de Junho de 2001.
15. Por outro lado, há que observar que, nas conclusões da reclamação que deu origem ao douto acórdão n.º 46/2000, o reclamante expõe as razões de facto e de direito por que entendia que o recurso para o Tribunal Constitucional devia ser admitido, da seguinte forma:
‘2. Salvo melhor opinião, o entendimento das disposições dos artigos 677.º e
668.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada, serve de suporte jurídico-normativo aos doutos despachos inseridos a fls. 1 das reclamações que precederam o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional. a) Com efeito, nos doutos despachos antes reproduzidos recorre-se às noções de
‘trânsito em julgado’ e de ‘irrecorribilidade’ que remetem, pelo menos implicitamente, para os artigos 677.º e 668.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. b) Os doutos despachos assentam num determinado entendimento dos artigos 677.º e
668.º, n.º 3, do Código de Processo Civil que, na opinião do reclamante, tem por efeito um encurtamento dos meios considerados, pelo legislador, necessários e adequados para as partes poderem fazer vingar as suas teses. c) Caso não tivesse sido perfilhado esse entendimento, procedimento do Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro Relator seria, com toda a probabilidade, diferente’
16. Após leitura do douto acórdão n.º 46/2002 pode concluir-se que, à excepção do que respeita ao carácter tempestivo da interposição do recurso, o contraditório proporcionado pelo artigo 77.º da Lei do Tribunal Constitucional em relação ao douto despacho proferido no Tribunal a quo não encontrou qualquer expressão ou resposta nesse douto aresto.
17. Ignorar os elementos dos autos em que o reclamante expôs as razões de facto e de direito que serviam de suporte aos enunciados das conclusões da reclamação para a conferência apresentada em 12 de Junho de 2001 reproduzidos no douto acórdão n.º 46/2002, e em que se expõem as razões de facto e de direito pelas quais o reclamante considera que estão preenchidos os pressupostos de admissibilidade de recurso para o Tribunal Constitucional, e concluir que ‘o ora reclamante nunca, minimamente, enunciou qual fosse a interpretação que tinha por violadora de normas ou princípios constitucionais’, equivale a dizer que todos os dados do processo estão na disponibilidade do juiz, quando o artigo 664.º do Código de Processo Civil dispõe que o julgador só pode servir-se dos factos articulados pelas partes e dos que resultem da instrução e discussão da causa.
18. No entender do reclamante, da leitura da reclamação para a conferência apresentada em 12 de Junho de 2001 no Tribunal a quo e da reclamação que deu origem ao douto acórdão n.º 46/2002, conclui-se, que o reclamante identifica a interpretação normativa ou o procedimento aplicativo de normas processuais que considera inconstitucional.
19. Não se cingindo aos factos articulados pelas partes nem aos que resultam da instrução e discussão da causa, o Tribunal Constitucional alterou os elementos essenciais da causa de pedir da reclamação que deu origem ao douto acórdão n.º
46/2002.
20. Nestas condições, o Tribunal Constitucional deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar e conheceu de questões de que não podia tomar conhecimento, em violação dos artigos 660.º, n.º 2, 664.º e 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil. III No entender do reclamante, o douto acórdão n .º 46/2002 revela excesso de pronúncia, na medida em que o Tribunal Constitucional, no âmbito da apreciação de uma reclamação de um despacho de não admissão de recurso, se pronuncia sobre o mérito desse recurso
21. Com efeito, no douto acórdão n.º 46/2002 (fls. 8), lê-se:
‘5. A isto acresce que a questão de inconstitucionalidade que o ora reclamante hipoteticamente (e diz-se ‘hipoteticamente’ , pois que tal se concebe tão só para efeitos meramente argumentativos) pretenderia submeter à análise deste Tribunal era manifestamente falha de fundamento, já que, como aliás decorre da jurisprudência que, a propósito, tem sido seguida por este órgão de administração da justiça, estando transitada uma decisão de um Tribunal e, em consequência, esgotado o seu poder de cognição, ao mesmo não é lícito reapreciar questões, pelo que nunca seria censurável, do ponto de vista da sua compatibilidade com a Constituição, a aplicação de normas adjectivas que isso mesmo comandem e que foram suporte jurídico de despachos do jaez do proferido, no caso, pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça’ (carregado no original).
22. No entender do reclamante, o Tribunal Constitucional não podia, no douto acórdão n.º 46/2002, pronunciar-se quanto à falta de fundamento do recurso que o reclamante pretende interpor. a) Por um lado, não se descortina como pode legitimar-se a ‘convolação’ de um fundamento explicito de não admissão de um recurso para um fundamento implícito de manifesta falta de fundamento, já que ‘não é possível ao Tribunal Constitucional antecipar, em sede de reclamação, a apreciação do mérito do recurso, procedendo a uma análise circunstanciada dos seus fundamentos’ (v. o citado acórdão do Tribunal Constitucional n.º 115/98, de 4 de Fevereiro de 1998, in BMJ n.º 474 - Março - 1998, pp. 31, 37). b) Por outro lado, no entender do reclamante, não faz sentido o Tribunal Constitucional abstrair da factualidade que se depreende nos elementos dos autos, e recorrer a hipóteses para efeitos meramente argumentativos, quando em toda e qualquer ‘decisão’ judicial vai necessariamente implicada uma apreciação e julgamento de facto’ (acórdão do Tribunal Constitucional n.º 310/94, de 24 de Março de 1994, in BMJ n.º 435 - Abril - 1994, pp. 475, 483) e ‘é próprio da jurisprudência a procura de soluções para casos concretos e não, propriamente, o encontro de uma teorética geral...’ (v. acórdão do S. T. J. de 27 de Maio de
1997, in BMJ n.º 467 - Junho - 1997, pp. 577, 584). c) O conhecimento do mérito de um recurso, no âmbito da apreciação de uma reclamação de um despacho de não admissão de um recurso não se compagina minimamente com as exigências do principio do contraditório tal como consagradas pelo artigo 3.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. d) Ora, no ponto 5 do douto acórdão n.º 46/2002 dá-se já por resolvida a questão de saber se, no caso, há já trânsito em julgado, e se, em consequência, já se esgotou o poder de cognição do Supremo Tribunal de Justiça, quando, tendo em conta a factualidade que decorre dos elementos dos autos, caso não tivesse sido perfilhado o entendimento dos artigos 677.º e 668.º, n.º 3, do Código de Processo Civil considerado, pelo reclamante, inconstitucional, a solução a dar a essas questões seria, com toda a probabilidade diferente. e) É pertinente referir que, segundo a jurisprudência, ‘ ... nunca um juiz, dentro do processo ou fora dele, poderá dar conta, com antecipação, da solução que tem por certa para determinada questão. Esta regra releva, aliás, e em certa medida do principio da imparcialidade (seria suspeito que, antes do momento próprio, porventura, antes mesmo de do processo constarem todos os elementos legalmente exigíveis, estivesse o juiz já a dizer de sua justiça)...’ (acórdão do S. T. J. de 13 de Abril de 1994, in BMJ n.º 436 - Maio - 1994, pp. 308, 310). IV Tendo em conta as circunstâncias antes indicadas, o reclamante não pode deixar de pedir, a titulo subsidiário, a reforma do douto acórdão n.º 46/2002 nos termos do artigo 669.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil
23. A condenação em custas fundamenta-se ‘nos custos de um serviço público e não tem verdadeiramente natureza de sanção ou de prolongamento de uma sanção’
(acórdão do Tribunal Constitucional n.º 606/98, de 21 de Outubro de 1998, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 41.º volume 1998, Setembro a Dezembro, pp.
259, 262).
24. Tendo em conta que o Tribunal Constitucional alterou os elementos essenciais da causa de pedir da reclamação que deu origem ao douto acórdão n.º 46/2002, e se pronunciou sobre situações hipotéticas, é permitido pensar que a fixação da taxa de justiça não corresponde a qualquer prestação de serviço solicitada pelo reclamante.
25. Assim, a condenação do reclamante no pagamento de quinze unidades de conta de taxa de justiça apresenta-se como mera sanção do exercício de um direito fundamental, quando, no entender do reclamante, tendo em conta os elementos dos autos e as disposições legais e constitucionais pertinentes não era exigível, da sua parte, outro comportamento, a menos que renunciasse antecipadamente a outros direitos fundamentais. Nestes termos, e com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve a presente reclamação ser admitida e julgada procedente, e, por conseguinte, depois de reconhecidos os factos, proceder-se ao suprimento das nulidades arguidas ou, caso assim se não entenda, deve proceder-se à reforma do acórdão quanto a custas'.
Cumpre decidir.
2. Não tem a mínima razão de ser a arguição de nulidades agora deduzida.
Efectivamente, no arguido acórdão entendeu-se que na peça processual subordinada ao título 'RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA' e incidente sobre o despacho proferido em 22 de Maio de 2001 pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça não tinha sido suscitada de modo processualmente adequado a questão de inconstitucionalidade reportada à alegada interpretação dos artigos
667º e 668º, nº 3, do Código de Processo Civil, indicando-se, a seguir, os motivos porque se efectuava uma tal asserção.
Poderá o ora arguente não concordar com eles e, de modo hipotético, para efeitos meramente argumentativos, poderá, inclusivamente, aceitar-se que tais motivos estão, de um ponto de vista jurídico ou doutrinário, menos certos.
Simplesmente, nessa hipótese, então o que ocorreria era um erro de julgamento e não, de todo em todo, uma falta de fundamentação de facto ou de direito passível de gerar nulidade. Só que, para remediar esse hipotético erro de julgamento, não é adequado lançar-se mão da arguição de nulidade estatuída na alínea b) do nº 1 do artº 668º do diploma adjectivo civil.
Refira-se ainda, neste particular, que não corresponde à realidade dizer-se que o acórdão em crise não atendeu ao «teor» da reclamação que o ora arguente pretendeu deduzir do despacho proferido pelo Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, tendo-se unicamente atido ao que, naquela peça processual foi escrito nas suas «conclusões».
É que o discurso empregue no acórdão reporta-se, não unicamente ao que foi escrito nas mencionadas «conclusões», mas sim a toda aquela peça processual, pois que, igualmente, no aludido «teor» não se descortina, de todo, qualquer enunciação sobre qual fosse a dimensão ou o sentido interpretativo que eram, na óptica do então reclamante, contrárias ou desconformes com a Lei Fundamental, e isso porque aí, após indicar que 'os doutos despachos assentam num determinado entendimento dos artigos 677.º e 668.º, n.º 3, do Código de Processo Civil que, na opinião do reclamante, tem por efeito um encurtamento dos meios considerados, pelo legislador, necessários e adequados para as partes poderem fazer vingar as sua teses', nunca explicitou qual fosse esse entendimento.
2.1. Igualmente o acórdão sub iudicio não enferma de nulidade por
«alteração da causa de pedir» ou, se se quiser, por ter decidido para além do pedido formulado na reclamação [alínea d) do nº 1 daquele referido artº 668º].
Na verdade, e, aliás, como se fez notar no mencionado aresto, as reclamações de despachos de não admissão de recurso só devem ser deferidas quando tais despachos indevidamente preteriram o direito dos reclamantes a verem apreciadas pelo Tribunal Constitucional as questões de constitucionalidade decididas em qualquer ordem dos tribunais, pelo que, tendo em conta o disposto no nº 4 do artº 77º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, se, para além das razões invocadas pelos despachos reclamados, outras houver que conduzam a que os recursos de constitucionalidade não devam ser admitidos, deverão elas ser analisadas por este órgão de administração de justiça, independentemente da circunstância de não terem sido ponderadas por aqueles despachos.
E não se esgrima com o facto de esta postura poder ir contra qualquer princípio de contraditório. É que, nas reclamações, o seu objecto é um despacho judicial de inadmissibilidade do recurso intentado interpor e não o rebater de posições de facto e de direito de uma outra «parte» processual, não sendo configurável a dialéctica entre um pedido de reapreciação desse despacho e o dever do Tribunal Constitucional a analisar, por força da mencionada norma
ínsita no nº 4 do citado artº 77º, todos os fundamentos que levariam à aludida inadmissibilidade.
2.3. Esta postura, claramente, leva também a que se tenha de concluir que não houve, por parte do acórdão em apreço, um excesso de pronúncia ao considerar que, de todo o modo, a questão de constitucionalidade pretendida submeter à apreciação deste Tribunal se revelava manifestamente infundada, sabido como é (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82) que o requerimento de interposição de recurso deve ser indeferido quando, tratando-se de recurso estribado na alínea b) do nº 1 do artº 70º, o mesmo for manifestamente infundado.
3. No tocante ao pedido de reforma quanto a custas, não se lobriga que a condenação levada a efeito pelo acórdão sub specie tenha minimamente exorbitado o disposto no artº 84º, nº 4, da Lei nº 28/82 e no artº 7º do Decreto-Lei nº 303/98, de 7 de Outubro.
Tratou-se de uma reclamação que veio a ser objecto de indeferimento, sendo a sujeição a custas o «preço» a pagar pelos custos do serviço público de administração de justiça constitucional de cujo recurso o então reclamante indevidamente lançou mão.
A condenação sofrida não se apresentou, desta arte, como uma sanção pelo exercício de um direito exercido.
4. Em face do exposto, indeferem-se os pedidos de arguição de nulidade e de reforma.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em dez unidades de conta. Lisboa, 17 de Abril de 2002 Bravo Serra Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa