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Processo n.º 250/2010
(148/DPR)
Plenário
ACTA
Aos catorze dias do mês de Abril de dois mil e onze, achando-se presentes o Excelentíssimo Conselheiro Presidente Rui Manuel Gens de Moura Ramos e os Exmos. Conselheiros Carlos José Belo Pamplona de Oliveira, Catarina Teresa Rola Sarmento e Castro, Ana Maria Guerra Martins, José Manuel Cardoso Borges Soeiro, Vítor Manuel Gonçalves Gomes, Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Gil Manuel Gonçalves Gomes Galvão, João Eduardo Cura Mariano Esteves, Maria João da Silva Baila Madeira Antunes e Joaquim José Coelho de Sousa Ribeiro, foram trazidos à conferência os presentes autos, para apreciação.
Após debate e votação, foi ditado pelo Excelentíssimo Conselheiro Presidente o seguinte:
ACÓRDÃO N.º 201/2011
I. Relatório.
1. A., B., C., D., E., F. e G. foram notificados na qualidade, o primeiro, de presidente do Conselho de Administração da “Taguspark-Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da área de Lisboa, S.A.”, o segundo, de presidente da respectiva Comissão Executiva, os terceiro e quarto, de vogais da mesma comissão e os três últimos de administradores não executivos da referida sociedade, para, nos termos do n.º 1 do artigo 3.º e da alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, apresentarem no Tribunal Constitucional a respectiva declaração de património, rendimentos e cargos sociais, no prazo de trinta dias, ou, na hipótese de a terem já entregue, fazerem disso prova dentro do mesmo prazo.
2. Na sequência da referida notificação, A., B., C., E., e G. vieram contestar a existência de fundamento legal para a respectiva subordinação ao regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos instituído pela Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, e revisto pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, apresentando, para o efeito, os argumentos seguintes:
i) Os requerentes não são qualificáveis como gestores públicos, nem equiparáveis a tal, o que resulta evidente da interpretação das normas em vigor, nomeadamente das constantes do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 300/2007, da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, e do Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de Março.
ii) O capital social da Taguspark-Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da área de Lisboa, S.A. (doravante, Taguspark S.A) é composto pelas seguintes participações: Município de Oeiras – 19,09%; Instituto Superior Técnico (IST) -12,64%; Banco Português de Investimento (BPI) – 11,03%; Caixa Geral de Depósitos (CGD) – 10%; Millennium BCP – 10%; INESC – 8,44%; Portugal Telecom SGPS (PT) – 5,98%; EDP – 5,06%; Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS) – 4,89%; Universidade Técnica de Lisboa (UTL) – 4,21%; Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) – 3,45%; IAPMEI – 3,45%; Município de Cascais – 1,15%; Fundação Luso-americana para o Desenvolvimento – 1%; Associação Industrial Portuguesa (AIP); Iberopark – 0,92%; e Instituto da Soldadura e da Qualidade (ISQ) – 0,69%.
iii) Nos termos do n.º 1 do art. 3º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 300/2007, consideram-se empresas públicas as sociedades constituídas nos termos da lei comercial nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, influência dominante em virtude da detenção da maioria do capital, dos direitos de voto ou do direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou fiscalização.
iv) O Estado não participa directamente do capital da Taguspark, S.A. e a lista dos respectivos accionistas é integrada por vários elementos que não podem ser considerados entidades públicas estaduais - como sejam os municípios de Oeiras e Cascais, o BPI, o Millenium BCP, INESC, PT, EDP, SIBS, IBEROPARK, EDIFER e ISQ – os quais perfazem a maioria do capital e dos direitos de voto (pelo menos 65,15%), ao que acresce a possibilidade de discutir-se a qualificação da FLAD e da FCT (que somam mais 4,4%).
v) Nos termos do art. 2º, n.º 2, do citado Decreto-Lei n.º 300/2007, a Taguspark, S.A. terá, assim, de ser considerada, no máximo, uma “empresa participada”.
vi) Nos termos do n.º 3 do art. 6º do mesmo Decreto-Lei n.º 300/2007, os membros do órgãos de administração das empresas participadas designados ou propostos pelo Estado, directamente ou através das sociedades de capitais exclusivamente públicos (cfr. art. 10º, n.º 3) ficam sujeitos ao regime aplicável aos gestores públicos. A contrario, os demais membros dos órgãos de administração das empresas participadas não estarão sujeitos a tal regime.
vii) Quer a lei comercial, quer os Estatutos da Taguspark, S.A. não estabelecem a favor do Estado, ou das empresas de capitais exclusivamente públicos que nesta sociedade participem, qualquer direito de nomear ou propor membros para os órgãos do conselho de administração.
viii) Invariavelmente, os membros dos órgãos de administração são propostos livremente em assembleia geral pelos accionistas, em propostas de subscrição conjunta por vários accionistas, e eleitos, por unanimidade ou por maioria dos votos, independentemente da qualidade, quer estadual, municipal, meramente pública ou privada dos accionistas em causa.
ix) Só com os votos de que dispõem, as entidades públicas estaduais em conjunto com as empresas de capitais exclusivamente públicos participantes (que no caso da Taguspark, S.A. será apenas a Caixa Geral de Depósitos) não teriam qualquer possibilidade de fazer eleger qualquer membro para a administração.
x) A extensão estabelecida no n.º 1 do art. 2º do Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, aplica-se apenas aos titulares de órgãos de gestão de empresas participadas pelo Estado, quando designados pelo Estado, o que não é o caso vertente.
xi) A criação da Taguspark, S.A, enquanto entidade gestora do parque de ciência e tecnologia na área metropolitana de Lisboa, foi promovida pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/91 (Diário da República, 1ª Série-B, n.º158, de 15 de Julho de 1991), referindo-se no respectivo n.º 5 que “o sector público deverá ter uma participação não maioritária no capital social das sociedades gestoras”.
xii) Os membros do conselho de administração da Taguspark, S.A. não se encontram, assim, abrangidos pelo elenco estipulado no art. 4º, nem pela equiparação prevista no n.º 3 desse artigo da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, sendo certo que a interpretação das referidas normas deverá ter sempre em conta o princípio constitucional da reserva da vida privada, o qual, em caso de dúvida sobre o âmbito da respectiva aplicação, deverá prevalecer sobre os demais interesses em presença.
3. Na sequência da aludida notificação, D. procedeu à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais, referente ao início de funções em 1 de Junho de 2007 (fls. 75).
4. F. procedeu igualmente à entrega da respectiva declaração de património, rendimentos e cargos sociais, o que fez sem prescindir do esclarecimento das dúvidas que havia suscitado já quanto à existência do correspondente dever de entrega. Invocou, para tanto, o seguinte:
i) De acordo com o estipulado no art. 3º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, na redacção que resulta do Decreto-Lei n.º 300/2007, consideram-se empresas públicas “as sociedades constituídas nos termos da lei comercial nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, influência dominante em virtude da detenção da maioria do capital, dos direitos de voto ou do direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou fiscalização”;
ii) Da composição accionista da Taguspark, S.A. resulta que as entidades públicas estaduais não perfazem a maioria do capital social e dos direitos de voto, pelo que aquela sociedade constitui, no máximo, uma empresa participada.
iii) Os estatutos da Taguspark, S.A. não estabelecem a favor do Estado, ou das empresas de capitais exclusivamente públicos, o direito de nomear, ou propor membros para os órgãos de administração, afastando-se assim, por força do disposto no art. 10º, n.º 1, o regime jurídico aplicável aos gestores públicos.
5. Sob promoção do Ministério Público, a Taguspark – Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da Área de Lisboa, S.A. prestou as informações constantes de fls. 84 a 86 dos autos, tendo procedido ainda à junção de cópia dos respectivos estatutos, bem como das actas das assembleias-gerais no âmbito das quais foram eleitos para os respectivos cargos, quer os destinatários da notificação referida em 1., quer os membros dos órgãos sociais para o triénio de 2010 a 2012.
6. Tendo sido concedida vista Ministério Público, o Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, concluindo no sentido de que todos os requerentes foram 'designados por uma entidade pública (…) em sociedade de economia mista”, para o efeito do disposto na alínea b) do nº 3 do artigo 4º da Lei nº 4/83, na redacção da Lei nº 25/95, de tal facto decorrendo que: i) para todos eles se constituiu a obrigação de apresentar, no Tribunal Constitucional, no prazo de 60 dias, contado do início das respectivas funções, declaração dos seus rendimentos, bem como do seu património e cargos sociais”, nos termos legais (CPRTCP, arts. 1.º); ii) mercê da renúncia aos cargos de administradores, todos deverão apresentar “nova declaração, actualizada, no prazo de 60 dias a contar da cessação de funções” (idem, art. 2.º); iii) o requerente B., enquanto “equiparado a titular de cargo político, com funções executivas”, encontra-se ainda constituído na obrigação de apresentar declaração inicial, por via da eleição de 1 de Junho de 2007, como administrador membro da comissão executiva (idem, art. 1.º) e, mercê dessa sua condição, obrigado ainda, tal como o requerente C., este eleito membro da comissão executiva a 28 de Maio de 2009, a renovar a anualmente a dita declaração.
II. Fundamentação.7. É sabido que, ao proceder à revisão do regime jurídico do controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos instituído pela Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, a Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, a par de outras alterações produzidas, ampliou o elenco dos cargos cujos titulares se encontram obrigados a apresentar, nos prazos para o efeito estabelecidos, uma “declaração dos seus rendimentos, bem como do seu património e cargos sociais” (cfr. art. 1º).
Em consequência da entrada em vigor da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, o elenco dos sujeitos vinculados pelo dever de apresentação da referida declaração passou a incluir a categoria dos “equiparados a titulares de cargos políticos para efeitos da presente lei” e, no âmbito desta, a contemplar expressamente, de acordo com a previsão do n.º 3 do respectivo do art. 4º, as seguintes figuras:
a) Gestores públicos;
b) Administrador designado por entidade pública em pessoa colectiva de direito público ou em sociedade de capitais públicos ou de economia mista;
c) Director-geral, subdirector-geral e equiparados.
O regime jurídico do controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos instituído pela Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, e revisto pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, foi entretanto alterado pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro, que entrou em vigor no dia 2 de Novembro de 2010 (cfr. art. 3º).
As modificações introduzidas pela Lei n.º 38/2010 no regime jurídico do controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos consistiram na reconfiguração do universo dos sujeitos obrigados à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais (cfr. art. 4º), na ampliação do âmbito objectivo de tal declaração (cfr. art. 1º), bem como na alteração dos pressupostos objectivos e subjectivos do dever de renovação da declaração previamente apresentada fora dos casos de recondução ou reeleição do titular vinculado (cfr. art. 2º).
Quanto à reconfiguração do universo dos sujeitos obrigados à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais, a Lei n.º38/2010 instituiu, a par das categorias dos titulares de cargos políticos e equiparados, a dos titulares de altos cargos públicos (art. 1º), para esta fazendo transitar, para além dos “membros das entidades públicas independentes previstas na Constituição e na lei” até então qualificados como titulares de cargos políticos [art.4º, n.º 1, alínea l) da Lei n.º 25/95], certos dos cargos que, para os mesmos efeitos, constavam da categoria correspondente ao segundo patamar de equiparação [cfr. art. 4º, n.ºs 3, da Lei n.º 25/95].
Reorganizando em tais termos o elenco dos sujeitos vinculados pelo regime do controlo público da riqueza em razão do cargo, a Lei n.º 38/2010 suprimiu o elenco dos cargos equiparados que constava do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 25/95, passando a agrupar, no âmbito da instituída categoria dos “titulares de altos cargos públicos”, os cargos seguintes:
a) Gestores públicos; b) Titulares de órgão de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados por este;c) Membros de órgãos executivos das empresas que integram o sector empresarial local;d) Membros dos órgãos directivos dos institutos públicos;e) Membros das entidades públicas independentes previstas na Constituição ou na lei;f) Titulares de cargos de direcção superior do 1.º grau e equiparados.
8. De acordo com o que dos autos resulta, o acto pelo qual cada um dos requerentes acedeu à sua condição de membro de órgão de administração da “Taguspark – Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da área de Lisboa, S.A.” (doravante “Taguspark, S.A.”) ocorreu na vigência da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão resultante da revisão levada a cabo pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto.
Em reunião da assembleia-geral de accionistas da Taguspark, S.A., realizada a 5 de Maio de 2008, foi aprovada “por unanimidade de 100% dos votos expressos” e sem abstenções a proposta para eleição dos órgãos sociais para o quadriénio de 2008/2011 e, em consequência disso, eleito presidente do Conselho de Administração o requerente A., como membro da Comissão Executiva o requerente B. e como administradores não executivos os requerentes G., F. e E. (fls. 132 e 133).
Em assembleia-geral realizada no dia 1 de Junho de 2007, o requerente B. havia sido já eleito para integrar o Conselho de Administração da (então) Tagusparque, S.A. “pelo período remanescente até ao termo do mandato dos restantes membros do conselho de Administração, ou seja, até 31 de Dezembro de 2007”.
O requerente C., por seu turno, foi eleito membro da Comissão Executiva da Taguspark, S.A. em assembleia-geral realizada em 28 de Maio de 2009, que aprovou por unanimidade a alteração da composição do Conselho de Administração para o quadriénio 2008/2011, preenchendo em tais termos a vaga aí em aberto (fls. 137 e 138).
Em assembleia-geral realizada no dia 8 de Junho de 2010 foi, por último, aprovada por unanimidade a alteração dos estatutos respeitante à redução do mandato dos membros dos órgãos sociais da Taguspark, S.A, de quatro para três anos e, na sequência da renúncia por todos os membros do Conselho de Administração aos respectivos mandatos, eleito administrador não executivo da Taguspark, S.A. “para o novo mandato correspondente ao triénio de 2010 a 2012” o requerente F. (fls.141-142).
9. De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 1º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada pela lei n.º 25/95, de 18 de Agosto – nessa parte não alterado pela Lei 38/2010, de 2 de Setembro – é de “60 dias contado da data de início do exercício das respectivas funções” o prazo para apresentação no Tribunal Constitucional da declaração de património, rendimento e cargos sociais pelos sujeitos abrangidos pelo regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares
Uma vez que a obrigação cujo fundamento se contesta, a ter-se constituído, se reporta a um momento ocorrido no âmbito da vigência da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão resultante da revisão introduzida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, é em torno da definição do âmbito subjectivo de aplicação do regime jurídico do controle público da riqueza dos titulares de cargos políticos a partir das fórmulas normativas constantes do n.º 3 do art. 4º do referido diploma que começa por suscitar-se a dúvida que nos presentes autos importa esclarecer.
10. Em consequência da entrada em vigor da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, o elenco dos sujeitos vinculados pelo dever de apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais passou a incluir a subcategoria dos “equiparados a titulares de cargos políticos para efeitos da presente lei” (cfr. art. 4º, n.ºs 2 e 3) e, no âmbito desta, a contemplar expressamente a figura quer dos “gestores públicos”, quer do “administrador designado por entidade pública em pessoa colectiva de direito público ou em sociedade de capitais públicos ou de economia mista” [cfr. art. 4º, n.º 3, als. a) e b), respectivamente].
Ao contrário do que vem pressuposto pelos requerentes, a fattispecie que concorre para a respectiva subordinação ao regime do controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos é, conforme se passará a demonstrar, não a primeira, mas a segunda.
11. Considerando a previsão correspondente à alínea b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, pode dizer-se que as circunstâncias delimitadoras do universo dos sujeitos vinculados pelo regime do controlo público da riqueza em razão do cargo começam por situar-se no plano da natureza das sociedades em causa: é necessário que se trate de uma “sociedade de capitais públicos” ou de “economia mista”.
O problema da determinação do alcance das formulações legais em presença não é inédito na jurisprudência deste Tribunal.
Tal questão foi objecto de particular reflexão no Acórdão n.º1206/96 (in www.tribunalconstitucional.pt).
Subordinando a integração dos conceitos de “sociedade de capitais públicos” e de “economia mista” à influência do contexto normativo vigente à data da revisão do regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares do cargos políticos decorrente da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, considerou então o Tribunal, a propósito do segundo, o seguinte:
«Também temos nas nossas leis uma noção de “sociedades de economia mista”, que é ainda, do mesmo modo, a do art. 48º – agora do seu n.º 1 – do Decreto-Lei n.º 260/76: trata-se das “sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, em que se associam capitais públicos e privados nacionais ou estrangeiros”.
No seu teor literal ou enunciado linguístico, esta noção não é inteiramente paralela à do n.º 2 (relativo às “sociedades de capitais públicos”): reporta-se agora a natureza pública (ou privada) ao próprio “capital” das sociedades, e não, como naquele outro número, às “entidades” que o detêm. Assumirá esta divergência algum relevo substancial-
Prima facie, dir-se-á que não – já que o capital só pode qualificar-se como “público” ou “privado” em função, justamente, da natureza, sob esse ponto de vista, da entidade que o detém.
Ora, não fará sentido atribuir ao conceito “entidade pública”, para os efeitos do n.º 1 do art. 48º do Decreto-Lei n.º 260/76, um significado ou âmbito mais restrito do que aquele que o n.º 2 do mesmo artigo lhe confere. Concluir-se-á, então, que aí onde, não apenas o Estado ou outra pessoa colectiva de direito público, de carácter territorial ou não, mas também uma empresa pública ou uma sociedade de capitais públicos se associar com uma entidade puramente privada na constituição de uma sociedade, esta assume a natureza de “sociedade de economia mista”».
Considerada a titularidade do capital social que define a respectiva estrutura societária, a Taguspark, S.A. insere-se nesta previsão.
A Taguspark, S.A. é uma sociedade anónima constituída em 1992, tendo como antecedente a Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/91, de 13 de Junho de 1991 (publicada no Diário da República, I Série B de 12 de Julho de 1991), através da qual o Governo se comprometeu a promover “a criação de parques de ciência e tecnologia nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, articulando recursos de origem privada […] com os recursos a disponibilizar através dos programas de apoio ao reforço das infra-estruturas científicas e tecnológicas e de formação […], prevendo-se então que aqueles viessem a assumir “progressivamente” um “papel de relevo preponderante” (art. 1º).
Através da referida Resolução, foram autorizadas a participar no capital social das futuras sociedades gestoras dos parques de ciência e tecnologia de Lisboa e do Porto, a Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica – como representante da administração central (cfr. art. 3º) –, bem como o Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento e as instituições públicas de ensino superior, estas com o apoio do Instituto Nacional de Investigação Científica (art. 4º).
Nos termos ainda da aludida Resolução, o “sector público dever[ia] deter uma participação não maioritária no capital social das sociedades gestoras” (art. 5º).
De acordo com a informação constante dos autos (cfr. fls. 89), o capital social da Taguspark, S.A. é actualmente composto pelas seguintes participações: Município de Oeiras – 17,01%, tendo a fracção de 0,92% resultado da aquisição, em 2009, das acções então detidas pela EDIFER, que deixou assim de ter qualquer participação no capital social da Taguspark, S.A.; Instituto Superior Técnico (IST) -12,64%; Banco Português de Investimento (BPI) – 11,03%; Caixa Geral de Depósitos (CGD) – 10%; Banco Comercial Português (BCP) – 10%; Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (INESC) – 8,44%; Portugal Telecom (PT) – 5,98%; EDP, Electricidade de Portugal – 5,06%; Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS) – 4,89%; Universidade Técnica de Lisboa (UTL) – 4,21%; Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) – 3,45%; Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação (APMEI) – 3,45%; Município de Cascais – 1,15%; Fundação Luso-americana para o Desenvolvimento – 1%; Iberopark – Inovação e Parques Empresariais – 1%, resultante da aquisição, em 2006, das acções então detidas pela AIP – Associação Industrial Portuguesa; e Instituto da Soldadura e da Qualidade (ISQ) – 0,69%.
Embora a Resolução acima referida previsse que o sector público viesse a deter uma participação não maioritária no capital social da Taguspark, S.A. e, em conformidade, que os recursos de origem privada viessem a assumir aí, “progressivamente”, um “papel de relevo preponderante”, a presente estrutura accionista da referida sociedade dá conta de que tal desiderato não foi ainda atingido.
Os Municípios de Oeiras e Cascais, que integram a administração autónoma do Estado, detêm globalmente o equivalente a 18,16% do capital social da Taguspark, S.A.
O Instituto Superior Técnico, “pessoa colectiva de direito público integrada na Universidade Técnica de Lisboa e dotada de autonomia estatutária, científica, cultural, pedagógica, administrativa, financeira e patrimonial (cfr. art. 1º dos respectivos Estatutos, homologados pelo Despacho n.º 7560/2009, publicado no Diário da República, 2.ª série, de 13 de Março de 2009), é titular de 12,64% do capital social da Taguspark, S.A, valor ao qual se soma a fracção de 3,45% detida pelo Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (IAPMEI), que é um “instituto público integrado na administração indirecta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio” (cfr. art. 1º do Decreto-Lei n.º 140/2007, de 27 de Abril).
A Universidade Técnica de Lisboa – entidade tradicionalmente integrada no âmbito da administração estadual indirecta (cfr. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol. I, 2.ª edição, Livraria Almedina, Coimbra, 1994, págs. 352 e 401) mas que a doutrina propende hoje a integrar no âmbito da administração autónoma do Estado (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2006, Tomo I, pg.741) – detém, por seu turno, 4,21%, do capital social da Taguspark, S.A, acrescendo-lhe os 3,45% detidos pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT), instituto público integrado na administração indirecta do Estado, dotado de autonomia administrativa e financeira e património próprio (art.1º do Decreto-Lei n.º 152/2007, de 27 de Abril), que sucedeu à Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica (JNICT).
A Caixa Geral de Depósitos, sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos – o capital social da Caixa Geral de Depósitos é totalmente subscrito pelo Estado (arts. 1º, n.º 1 e 4º, n.º 1 do Decreto – Lei n.º 287/93, de 20 de Agosto) e as acções representativas do mesmo, incluindo aquelas que venham a ser emitidas em futuros aumentos de capital, só poderão pertencer ao Estado, sendo detidas pela Direcção-Geral do Tesouro nos termos previstos no artigo 10º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro (cfr. n.º 2 do art. 4º do Decreto – Lei n.º 287/93, de 20 de Agosto, na redacção conferida pelo Decreto-Lei n.º 106/2007 de 3 de Abril) – detém, por último, acções representativas de 10% do capital social da Taguspark, S.A.
O conjunto das referidas entidades, que representa o agregado das participações do sector público, detém globalmente, de acordo com a actual estrutura societária da Taguspark, S.A., o equivalente a 51,91% do respectivo capital social.
Embora para a formação de tal representação societária concorra a fracção de 17,01% presentemente detida pelo Município de Oeiras e esta haja resultado de um incremento em 0,92% do valor originariamente detido por aquisição realizada em 2009, verifica-se que, mesmo antes da ocorrência de tal incremento, aquela participação era já superior a 50%.
A estrutura societária da Taguspark, S.A. exprime, assim, uma associação entre “pessoas colectivas de direito público”, “sociedades de capitais exclusivamente públicos” e “entidades privadas” na qual as participações públicas vêm permanecendo desde o seu início maioritárias.
A Taguspark, S.A. é, por isso, uma sociedade de economia mista de capitais maioritariamente públicos, o que, do ponto de vista da delimitação do âmbito de aplicação da al. b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, revista pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, dispensa a resolução de uma outra questão, de âmbito mais geral, que consistiria em saber se, para além das situações de associação de entidades privadas com pessoas colectivas de direito público e sociedades de capitais exclusivamente públicos, o universo das sociedades de economia mista ali contemplado abrange ainda as hipóteses de associação de entidades privadas com sociedades que são, elas próprias, de economia mista.
12. A conclusão que deixamos exposta foi alcançada através da densificação do conceito de “sociedade de economia mista” incluído na al. b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, sob incidência do contexto normativo contemporâneo da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto – que aditou tal norma – e, portanto, sob directa influência da previsão do artigo 48º do Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril (Bases do regime das empresas públicas).
O Decreto-Lei n.º 260/76, de 8 de Abril, foi, porém, revogado pelo Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro (cfr. art. 40º, n.º1), que estabeleceu «o regime do sector empresarial do Estado, incluindo as bases gerais do estatuto das empresas públicas do Estado» (cfr. art. 1º). Tal diploma, entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 2000 (cfr. art. 41º), foi subsequentemente alterado pelo Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto.
Conforme resulta do respectivo preâmbulo, o Dec. Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, procurou estabelecer, «na sequência das profundas alterações verificadas na composição e nas regras de funcionamento do sector empresarial do Estado ao longo dos últimos anos, (…) um regime quadro aplicável às entidades que, hoje em dia, mais caracteristicamente integram tal sector (…), procedendo, para tanto (…) à redefinição do conceito de empresa pública, aproximando-o daquele que lhe é fornecido no direito comunitário».
Ainda de acordo com o referido preâmbulo, visou-se proceder à «redefinição do conceito de empresa pública, aproximando-o daquele que lhe é fornecido no direito comunitário», o que, implicando «um significativo aumento do universo das empresas abrangidas», justificou que «se procurasse criar um regime geral que contempl[asse] diversas soluções».
Conforme observado por Eduardo Paz Ferreira (Direito da Economia, 2001, pg. 253), o Dec. Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, afasta-se radicalmente da filosofia do Dec.Lei n.º 260/76 – cujo art. 48º se ocupava, conforme visto já, da definição dos conceitos de sociedades de economia mista e sociedades de capitais públicos” –, orientando-se em três sentidos fundamentais: ampliação do conceito de empresa pública; aplicação do direito privado como regime regra; e criação de melhores condições para o exercício da função accionista do Estado.
A questão que nos ocupa prende-se justamente com a primeira das direcções em que o Dec. Lei n.º 558/99 reviu os princípios centrais da disciplina normativa constante do Dec. Lei n.º 260/76: precisamente a que conduziu à ampliação do conceito de empresa pública.
O Dec. Lei n.º 260/76 – revisto e alterado pelo Dec. Lei n.º 29/84, de 20 de Janeiro, e, depois deste, pela Lei n.º 16/90, de 20 de Julho – havia optado por um conceito restritivo de empresa pública, limitando-o, de acordo com a definição constante do n.º 1 do respectivo art. 1º, às “empresas criadas pelo Estado, com capitais próprios ou fornecidos por outras entidades públicas, para exploração de actividades de natureza económica e social (…)”, dotadas de formas de gestão específicas caracterizadas pela tutela económica e financeira exercida pelo Governo (cfr. arts. 12º a 14º).
Excluídas do conceito de “empresas públicas” – e consequentemente do âmbito de aplicação do regime definido pelo Decreto Lei n.º 260/76 – encontravam-se as “sociedades de capitais públicos” – definidas no n.º 2 do respectivo art. 48º como 'sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, associando o Estado e outras entidades públicas dotadas de personalidade de direito público ou de direito privado – e as “sociedades de economia mista” – caracterizadas no n.º 2 do referido preceito como “sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, em que se associam capitais públicos e privados nacionais ou estrangeiros”.
Uma das principais novidades da revisão do regime jurídico do sector empresarial do Estado operada pelo Dec. Lei n.º 558/96 consistiu, precisamente, na ampliação do conceito de empresa pública relativamente à modelação constante do Dec. Lei n.º 260/76.
De acordo com a caracterização constante do art. 1º do Dec. Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro – diploma entretanto alterado pelo Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto –, empresas públicas são hoje, quer as entidades públicas empresariais – que correspondem às antigas empresas públicas stricto senso (cfr. art. 3º, n.º 2 e art. 23º do referido diploma) –, quer “as sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias: a) detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto; b) direito de designar ou de destituir a maioria dos membros do conselho de administração e fiscalização”.
A par das empresas públicas, integram ainda o sector empresarial do Estado as empresas participadas, definindo-se estas, de acordo com a previsão do n.º 2 do art. 2º, como “as organizações empresariais que tenham uma participação permanente do Estado ou de quaisquer outras entidades públicas, de carácter administrativo ou empresarial, por forma directa ou indirecta, desde que o conjunto das participações públicas não origine nenhuma das situações que conduza a uma posição de influência dominante nos termos previstos nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 3º, caso em que passará a tratar-se de uma empresa pública.
Conforme notado pela doutrina, o legislador abandonou a distinção entre participações maioritárias e participações minoritárias – uma vez que a primeira das categorias passou a estar directamente subsumida à noção de empresa pública – e substituiu esta dicotomia pela resultante da contraposição dos conceitos de participações permanentes e participações não permanentes.
De acordo o n.º 3 do art. 2º do Dec. Lei n.º 558/99, participações não permanentes são aquelas que o Estado assegura por razões meramente financeiras, não se prolongando a titularidade das acções por mais de um ano. Todas as outras serão participações permanentes, qualidade que, de resto, se presume em todas as participações superiores a 10% do capital social, com excepção das empresas do sector financeiro por relativamente a estas ter prevalecido a aceitação da ideia de que têm características próprias que justificam uma apreciação mais casuística (cfr. Eduardo Paz Ferreira, ob. cit. pg. 256).
A concatenação do regime jurídico instituído pelo Dec. Lei n.º 558/99 com aquele que vigorou até à revogação do Dec. Lei n.º 260/76 revela, assim, que a noção de empresa pública foi relevantemente expandida por aquele diploma, assim se aproximando do sentido em que tem sido utilizado no direito comunitário e no direito de outros países europeus: por força da modificação operada pelo Dec. Lei n.º 558/99, pode dizer-se que «as empresas públicas são, actualmente, todas as sociedades em “mão estadual”» (António Carlos Santos, Maria Eduarda Gonçalves e Maria Manuel Leitão Marques, Direito Económico, pg. 185, 5.ª ed., Almedina, 2004).
Por força da nova categorização introduzida pelo Dec. Lei n.º 558/99 e sua correspondente nomenclatura, o conceito de “sociedade de economia mista” perdeu a sua definição no texto da lei e deixou mesmo de ser legalmente operativo no contexto do regime jurídico do sector empresarial do Estado.
Todavia, nem por isso se poderá dizer que se tenha tornado substantivamente inexpressivo ou até mesmo indefinível de um ponto de vista material. Até porque, não obstante abandonado pelo Dec. Lei n.º 558/99, o conceito de “sociedades de economia mista” permaneceu em outros sectores do ordenamento jurídico, mesmo na sequência de processos de revisão posteriores a 1999 (v. g. a Lei n.º 98/97, de 26 de Agosto - Lei de Organização e Processo do Tribunal de Contas - revista pela Lei nº 48/2006 de 29 de Agosto de 2006, que, não obstante a revogação das primitivas alíneas d) e e) do n.º 1 do art. 2º, manteve sujeitas à jurisdição daquele Tribunal “as empresas concessionárias da gestão de empresas públicas, de sociedades de capitais públicos ou de sociedades de economia mista controladas” [cfr. al. f) do respectivo n.º 2].
Assim, não obstante a sistematização seguida pelo Dec. Lei n.º 558/99 não incluir, no âmbito das tipologias introduzidas, a categoria autónoma das “sociedades de economia mista”, estas continuam definíveis, de um ponto de vista material, nos termos em que o eram pelo n.º 1 do art. 48º do Dec. Lei n.º 260/76, sendo esta a definição que releva para a densificação da norma da alínea c) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, a Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto. O que se passa é que, de um ponto de vista operativo, estas “sociedades constituídas em conformidade com a lei comercial, em que se associam capitais públicos e privados nacionais ou estrangeiros”, perderam autonomia conceptual no contexto do regime jurídico do sector empresarial do Estado e, ao invés de excluídas de tal sector como sucedia sob a vigência do Dec. Lei n.º 260/76, passam a integrá-lo directamente por via da sua inclusão no conceito de empresas públicas ou de empresas participadas consoante o conjunto das participações estaduais aí origine ou não qualquer uma das situações previstas nas als. a) e b) do n.º 1 do art. 3º do Dec. Lei n.º 558/99.
A mera circunstância de as “sociedades de economia mista” deixarem de ter correspondência num conceito legal formalmente autónomo e de se encontrarem hoje integradas no domínio, mais amplo, do sector empresarial do Estado não só não desmaterializa a realidade que lhes corresponde, como não conduz à alteração do sentido que substantivamente continua a corresponder-lhes, designadamente em termos de tornar problemática a aplicação do alínea b) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão revista pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto.
Condensando-se o essencial da redefinição do regime jurídico do sector empresarial do Estado nos aspectos que deixamos expostos, parece evidente que o novo contexto jurídico emergente do Dec. Lei n.º 558/99 não interfere com a delimitação do âmbito subjectivo de aplicação da norma constante alínea c) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, designadamente pela via da sua restrição em termos que permitissem controverter a inclusão da Taguspark, S.A. no universo das unidades societárias abrangidas pela correspondente fattispecie.
De acordo com a tipologia seguida no Dec. Lei n.º 558/99, a Taguspark, S.A. insere-se no âmbito da previsão constante do n.º 1 do respectivo art. 6º: trata-se de uma empresa participada por diversas entidades públicas – Estado e Autarquias Locais – e privadas, considerando-se integrada no sector empresarial do Estado por ser esta a entidade que, no conjunto das participações do sector público, é titular da maior participação relativa.
Trata-se, com efeito, de uma organização empresarial que, através da intervenção do Instituto Superior Técnico (12,64%), Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento (3,45%), Universidade Técnica de Lisboa (4,21%), Fundação para a Ciência e Tecnologia (3,45%) e Caixa Geral de Depósitos. S.A. (10%) tem uma participação social do “Estado” e de “outras entidades públicas estaduais, de carácter administrativo e empresarial”, globalmente representativa de mais de 10 % do capital social da entidade participada e que se presume por isso permanente (art. 2º, n.º 3, do Dec. Lei n.º 558/99).
Na exacta medida em que tal participação não origina, contudo, mesmo no seu conjunto, a possibilidade de exercício, de forma directa ou indirecta, de uma influência dominante do Estado na entidade participada – por não se verificar a seu favor, nem a maioria do capital ou dos direitos de voto, nem o direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização – a Taguspark, S.A. é qualificável, de acordo com as categorias instituídas pelo Dec. Lei n.º 558/99, como empresa participada do sector empresarial do Estado (cfr. arts. 2º, n.º2, e art. 3º, n.º 1, a contrario).
A Taguspark, S.A. é, assim, “empresa participada” do sector empresarial do Estado nos termos e para os efeitos previstos no Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, e uma “sociedade de economia mista” nos termos e para os efeitos previstos na alínea b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão revista pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto. Ambas as qualificações são normativamente compatíveis, coexistindo no ordenamento jurídico, no âmbito da vigência do regime jurídico do controlo público dos titulares de cargos políticos na versão resultante da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, com relevância em contextos diversos.
13. Concluindo-se, portanto, que a Taguspark, S.A. é uma “sociedade de economia mista” nos termos e para os efeitos previstos na alínea b) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão revista pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, a questão que tenderia a seguir-se seria a da caracterização do título a que a fracção pública do capital social é detida pelas entidades publicas que integram a respectiva estrutura societária.
A relevância de tal questão – que em tais termos foi, de resto, configurada e resolvida no âmbito da aplicação do regime das incompatibilidades e impedimentos de titulares de cargos políticos e equiparados (aprovado pela Lei n.º 64/93 e revisto pelo Decreto-lei n.º 558/99) e aí objecto de extensa reflexão pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República no parecer n.º 2/2000, de 6 de Abril – prende-se com a ideia de que, podendo a participação das entidades públicas no capital social de determinada sociedade «representar uma mera situação de facto, variável em função de operações de compra e venda de acções no […] mercado» ou, pelo contrário, «corresponder a uma situação juridicamente definida», designadamente com apoio em normas legais e/ou estatutárias, só faz sentido, por razões de certeza e segurança na aplicação do Direito, considerar sujeitas ao regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo os administradores de sociedades de economia mista que integrem esta última hipótese.
Por razões próximas daquelas que conduziram a classificar como permanente o conjunto das participações estaduais no capital social da Taguspark, S.A., também deste ponto de vista não se colocam quaisquer obstáculos à respectiva inclusão no âmbito de aplicação da norma da alínea b) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão revista pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto.
A participação pública – estadual e municipal – no capital social da Taguspark, S.A. representa o instrumento de concretização do propósito governamental de promover a criação de um parque de ciência e tecnologia na área metropolitana de Lisboa, articulando recursos de origem privada e, não obstante a previsão de que estes viessem a tornar-se progressivamente prevalecentes (cfr. art.1º da Resolução do Conselho de Ministros n.º 26/91), aquela participação vem subsistindo ininterruptamente maioritária desde a data da constituição da sociedade, o que, do ponto de vista do requisito da estabilidade das posições sociais públicas, exclui quaisquer indicações de sentido contrário à convocação da fattispecie da alínea b) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão revista pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto.
14. O segundo dos pressupostos inerentes ao preenchimento da previsão normativa da alínea b) do n.º 3, do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, diz respeito ao modo de acesso ao cargo.
Com efeito, o universo dos cidadãos pretendidos abranger pela norma sob aplicação é definível, não apenas pela natureza da sociedade de que se trate, mas ainda em função dos termos seguidos pelo acesso ao cargo: é necessário que o administrador da sociedade de economia mista haja sido como tal designado por uma entidade pública.
Neste contexto, a questão que se segue consiste em saber se algum relevo excludente poderá ser atribuído à circunstância os requerentes haverem acedido por eleição, em assembleia-geral, aos cargos cuja titularidade aponta para a respectiva sujeição ao regime jurídico do controlo público da riqueza, em particular perante a circunstância, pelos próprios alegada, de os estatutos da Taguspark, S.A. não estabelecem a favor do Estado, ou das empresas de capitais exclusivamente públicos que nesta sociedade participem, qualquer direito de nomear ou propor membros para os órgãos do conselho de administração.
Esta precisa questão foi objecto de pormenorizada reflexão no Acórdão n.º 1206/96, a que se fez já referência.
Interrogando-se sobre o «sentido desta aparente limitação e o seu alcance», o mencionado aresto desenvolveu a tal propósito o seguinte raciocínio:
«8. O termo 'designação', num contexto como o da expressão em apreço, é susceptível de significado plúrimo: desde logo, tanto pode reportar-se à 'indicação', 'indigitação' ou 'proposta' de alguém para o exercício de certo cargo, como pode ter em vista, antes, o acto jurídico-formal que estabelece e fixa a escolha dessa pessoa para o exercício do mesmo cargo, como também, eventualmente, o 'procedimento' que abranja este acto e aquela indigitação. E, dentro da segunda das alternativas referidas, ainda poderá ser entendido como abrangendo todas as modalidades que tal acto pode assumir (v.g., nomeação, eleição, cooptação) ou (e será porventura esse o seu significado técnico-jurídico mais estrito ou, pelo menos, mais corrente) apenas a modalidade ou as modalidades dele que se contrapõem à 'eleição'.
Por sua vez, afigura-se que – sob pena de incoerência – a expressão 'entidade pública' não poderá deixar de ter, nesse mesmo contexto, um conteúdo e um âmbito idênticos aos que antes vimos corresponder-lhe, para o efeito de caracterizar certas sociedades como de capitais públicos ou de economia mista, em função da natureza das entidades detentoras do respectivo capital. Ou seja: como tais ('entidades públicas') deverão considerar-se, não apenas o Estado e as demais pessoas colectivas de direito público (os chamados 'entes públicos menores'), mas ainda as empresas públicas, as sociedades de capital público e as próprias sociedades de economia mista com maioria de capital público.
Entretanto, e por outro lado, importa recordar que nas sociedades por quotas e nas sociedades anónimas (únicos tipos de sociedades que caberá levar em conta agora, já que não será concebível a existência de sociedades de economia mista 'em nome colectivo' ou 'em comandita'), a regra é a da eleição dos administradores pela assembleia geral ou por deliberação dos sócios, salvo quando sejam designados no próprio contrato de sociedade (cfr. artigos 252º, n.º 2, e 391º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais). Donde que – salvo nesta última hipótese, em que a escolha dos administradores é determinada, afinal, por todos os sócios subscritores do contrato – tal escolha, em princípio, depende, em último termo, da maioria dos votos sociais o que vale dizer, da maioria do capital (cfr. artigos 250º e 384º do Código das Sociedades Comerciais), maioria essa que pode, inclusivamente, ser 'qualificada' (cfr. artigo 391º, n.º 2, do mesmo Código). A lei (o dito Código) admite, porém, quanto às sociedades anónimas, que no contrato de sociedade se estipule, seja a necessidade de uma aprovação complementar (como que uma 'confirmação') dos administradores pela maioria dos votos conferidos a certas acções (artigo 391º, n.º 2), seja a garantia de uma representação das minorias na administração, através de qualquer dos mecanismos descritos nos nºs 1 e 6 do artigo 392º (reserva a grupos de accionistas, com mais de 10% e menos de 20% do capital social, do direito de proposta de candidatos na eleição de um certo número de administradores, no primeiro caso; direito de uma minoria de accionistas, representando pelo menos 10% do capital social, e vencida na eleição da administração, de designar, pelo menos, um dos administradores, no segundo caso). Por outro lado, podem ainda os sócios, através do instrumento do acordo parassocial (artigo 17º do citado Código), obrigar-se a assegurar uma certa 'composição' do órgão de administração da sociedade, v.g., comprometendo-se aqueles que detêm a maioria do capital a votar no sentido de incluir no órgão de administração da sociedade um ou mais administradores indicados pela minoria.
[…]
Pois bem: face a quanto vem de pôr-se em relevo, e tendo presente o sentido, justificação ou razão de ser, antes evidenciada (supra, n.º 7), da cláusula legal ora em apreço, julga-se que no seu âmbito hão-de ter-se por incluídos todos os administradores das sociedades de economia mista (e, evidentemente, das sociedades de capitais públicos) cuja escolha para o exercício de tais funções haja dependido e resultado, em definitivo, da intervenção e da decisão de uma ou mais entidades públicas (tal como acima caracterizadas).
Assim, não contará, em princípio, para tal inclusão (ou, inversamente, para a sua exclusão desse âmbito) que àquela ou àquelas entidades (ou, ao invés, a entidades privadas) haja cabido a correspondente 'proposta' ou 'indigitação'; mas esta circunstância já deverá ter-se por decisiva se a mesma houver sido necessariamente determinante (por força da lei, do estatuto social ou de um acordo parassocial) da escolha do administrador (como acontecerá, nomeadamente, na hipótese do artigo 392º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, ou de um acordo parassocial que garanta à 'minoria' a escolha de um ou mais administradores). Por outro lado, deverá ser indiferente, para o efeito aqui tido em vista, a 'modalidade' ou 'forma' de designação de que se trate: qualquer que ela seja (nomeação, eleição ou outra), desde que a escolha de um administrador ou dos administradores da sociedade, realizada por seu intermédio, haja sido decisivamente condicionada pela intervenção (v.g., pelo voto) de uma entidade pública, aí teremos a 'designação' daquele ou daqueles por esta última.
Em suma: esse termo – 'designação' – no contexto do preceito legal em apreço, não deverá ser tomado naquele seu sentido mais estrito atrás referido – até também porque, reportando-se ele igualmente a sociedades comerciais, e basicamente a sociedades comerciais 'anónimas', seria estranho que o legislador não tivesse desejado abranger na sua previsão justamente o modo mais comum (a eleição) de designação dos respectivos administradores. Há que tomá-lo, sim, (a esse termo) num sentido mais amplo – no sentido 'compósito' que resulta das considerações anteriores, e que abrange, afinal, todo o 'procedimento' da escolha dos administradores, em qualquer dos seus momentos reveladores de uma intervenção determinante de 'entidades públicas' nessa escolha. É esse, decerto, o sentido que melhor corresponde ao desígnio, acima posto em destaque, do preceito legal em causa – ou seja, à 'separação das águas' entre os administradores designados por 'entidades públicas' e os designados por 'entidades privadas'.
Sendo isto assim, haverão de considerar-se como 'designados por uma entidade pública', para o efeito do disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 4º da Lei n.º 4/83, na redacção da Lei n.º 25/95, os seguintes administradores de sociedades:
a) […]
b) […]
c) […]
d) os administradores de “sociedades de economia mista” com maioria do capital público, designados em eleição da respectiva assembleia-geral (…), salvo quando “propostos” pela minoria do capital privado ou por esta eleitos, nos termos, respectivamente, dos n.ºs 1 e 6 do art. 392º do Código das Sociedades Comerciais, ou quando por ela escolhidos e “indicados”, ao abrigo de um acordo parassocial»;
e) os administradores de “sociedades de economia mista” sem maioria do capital público, quando a respectiva “eleição” dependa de uma maioria “qualificada” para cuja formação seja necessário o capital público, ou quando, designados por qualquer dos modos referidos na alínea anterior (eleição ou deliberação dos sócios), devam, todavia, ser ainda aprovados pelos votos correspondentes a acções “privilegiadas”, nos termos da segunda parte do artigo 391º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais, detidas por entidades públicas, ou que, finalmente, sejam “propostos”, “eleitos” ou “indicados” pela minoria do capital público, nos termos ou ao abrigo do referido na parte final da alínea anterior.».
Esta orientação jurisprudencial foi posteriormente reafirmada nos Acórdãos n.º 345/08 e n.º 279/2010.
Segundo neste último se afirmou, «(…) se o legislador [de 1995] optou por colocar sob a mesma previsão normativa as sociedades de capitais exclusivamente públicos – nas quais não pode haver administradores não designados por entidades públicas – e as sociedades de economia mista – em cujo âmbito se incluem também as sociedades de capitais minoritariamente públicos e nas quais pode haver administradores para cuja eleição se não tenha verificado uma intervenção determinante do capital público –, a necessidade de adopção de uma formulação legal compatível com a previsão em simultâneo destas duas categorias era forçosa e evidente.
Em consonância com a técnica legislativa seguida, a tal necessidade respondeu-se justamente através da introdução da fórmula “administradores designados por entidades públicas”, com a qual se delimitou o âmbito normativo da previsão legal da al. b) do n.º 3 do art. 4º nos termos em que se entendeu que tal delimitação deveria ocorrer de acordo com a razão de ser do regime: precisamente a delimitação às hipóteses de participação determinante do capital público no procedimento de acesso ao cargo.
Dirigindo-se a fattispecie da al. b) do n.º 3 do art .4º, não apenas às pessoas colectivas de direito público, mas ainda ao universo societário caracterizado pela presença do Estado ou de outras entidades públicas na estrutura societária, o pressuposto da “designação por entidades públicas” exprime coerentemente certas exigências relativas ao peso do capital público na viabilização do acesso ao cargo por eleição e não […] o simples propósito de incluir no universo dos possíveis designantes por acto distinto da eleição outras entidades públicas para além do Estado.
Que o termo “designação” deverá ser considerado de acordo com o seu significado compósito ou plúrimo, abrangendo todos os procedimentos de escolha dos administradores e, por isso incluindo, quer os casos de 'indicação' ou 'indigitação', quer os casos de “eleição” corresponde, de resto, à interpretação da al. b) do n.º 3 do art. 4º mais sistematicamente apoiada.
Confirmando o postulado hermenêutico segundo o qual as proposições que integram determinado ordenamento jurídico obedecem a um pensamento coerente e unitário e exprimem o uso de uma linguagem comum, certos “lugares paralelos” evidenciam a utilização do conceito de “designação” no sentido que se deixou exposto.
Assim, sob a epígrafe “designação”, o art. 391º, n.º1, do Código das Sociedades Comerciais, integrado no título respeitante às sociedades anónimas, prevê como modalidades possíveis de acesso ao cargo de administrador a “designação no contrato de sociedade” e a “eleição pela assembleia-geral ou constitutiva”.
Também o art. 13º, n.º1, do Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, ao afirmar expressamente que os “gestores públicos são designados por nomeação ou por eleição” constitui, ainda que retrospectivamente, um elemento interpretativo fortemente corroborador do cabimento sistemático da interpretação da norma da al. b) do n.º 3 do art. 4º que atribui um sentido “compósito” ao termo designação e no respectivo âmbito inclui também as hipóteses de eleição.
Esta é também uma orientação doutrinalmente sufragada.
Segundo refere Menezes Cordeiro, “a designação dos administradores pode ocorrer segundo várias fórmulas. Eles podem ser designados: no próprio contrato de sociedade – art. 391º, n.º 1 [do CSC]; por eleição da assembleia-geral – idem e 393º, n.º 1, al. d); por nomeação pelo Estado – art. 392º, n.º 11; por chamada de suplentes – art. 393º, n.º 3, al. a); por cooptação – art. 393º, n.º 3, al. b); por designação feita pelo conselho fiscal ou pela comissão de auditoria – art. 393º, n.º 3, al. c); por nomeação judicial – art. 394º, n.º 1 (Manual de direito das sociedades, Vol. II, Das sociedades em especial, 765, itálico nosso).
[…]
O pressuposto de uma “designação” por “entidade pública” – […] – serve justamente para exprimir a exigência de relevo do capital público na eleição dos administradores.
Onde o capital público haja tido uma intervenção determinante na eleição dos administradores de sociedades de economia mista, estes consideram-se designados por entidade pública».
Os requerentes acederam à condição de membros do conselho de administração da Taguspark, S.A. através de eleição realizada em assembleia-geral de accionistas.
A., B., G., F. e E. foram eleitos membros dos órgãos sociais da Taguspark, S.A. para o quadriénio de 2008/2011 “por unanimidade de 100% dos votos expressos” e sem abstenções em assembleia-geral realizada a 5 de Maio de 2008, na qual se fizeram representar accionistas titulares de acções representativas da totalidade do capital social da empresa (cfr. fls. 128 e ss.).
Idêntica representação ocorreu na assembleia-geral de accionistas realizada a 28 de Maio de 2009 que conduziu à eleição por unanimidade do requerente C. como membro da Comissão Executiva da Taguspark, S.A. para o quadriénio 2008/2011 (fls. 135 e ss.), bem como na assembleia-geral, realizada no dia 8 de Junho de 2010, que aprovou, também por unanimidade, a redução do mandato dos membros dos órgãos sociais da Taguspark, S.A de quatro para três anos e, na sequência da renúncia por todos os membros do conselho de administração aos respectivos mandatos, elegeu administrador não executivo da Taguspark, S.A. “para o novo mandato correspondente ao triénio de 2010 a 2012”, o requerente F. (fls.141 e ss.).
Segundo decorre dos estatutos da Taguspark S.A., as deliberações da assembleia-geral são tomadas por maioria dos votos dos accionistas presentes ou representados (cfr. art. 18º), regra que não é excepcionada para a eleição dos respectivos administradores, ou de certos deles, nos termos previstos no n.º 2 do art. 391º do Código das Sociedades Comerciais.
Daqui resulta que, sempre que a lista proposta seja colocada à votação em assembleia-geral que conte com a representação da totalidade do capital social da empresa – o que sucedeu em qualquer uma das situações em presença –, a eleição dos candidatos aos respectivos órgãos sociais apenas será possível se for viabilizada pelo voto de accionistas representativos de mais de 50% daquele capital.
Uma vez que o conjunto das participações exclusivamente públicas foi sempre representativo de mais de 50% do capital social Taguspark S.A. (vide supra 11.), torna-se, assim, matematicamente insofismável que o agregado das entidades públicas que compõem a estrutura societária da empresa teve uma intervenção determinante na eleição de qualquer um dos requerentes como membro do conselho de administração daquela sociedade.
Nessa medida, os requerentes são qualificáveis, nos termos e para os efeitos previstos na al. b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada pela Lei n.º 25/95, como “administradores designados por entidade pública em sociedade de economia mista”.
15. O regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos foi, conforme referido já, recentemente revisto pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro, em vigor desde 2 de Novembro.
O referido diploma procedeu à reorganização do elenco dos sujeitos obrigados à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais, suprimindo a subcategoria dos cargos que, no n.º 3 do art. 4º daquele regime, a Lei n.º 25/95 equiparava aos cargos políticos para os referidos efeitos e passando a agrupar, no âmbito da instituída categoria dos titulares de altos cargos públicos, entre outros, os cargos seguintes:
a) Gestores públicos; b) Titulares de órgão de gestão de empresa participada pelo Estado, quando designados por este;c) Membros de órgãos executivos das empresas que integram o sector empresarial local;
Quanto à previsão da alínea a), o conceito de gestor público só pode ser agora entendido em termos correspondentes com aqueles que constam do Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março.
O Estatuto dos gestores públicos contemporâneo da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, é aquele que foi aprovado pelo Dec. Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro.
O Dec. Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro, definia como gestores públicos os indivíduos nomeados pelo Governo para os órgãos de gestão das empresas públicas ou para os órgãos de gestão das empresas em que a lei ou os respectivos estatutos conferirem ao Estado essa faculdade (artº 1, n.º 1).
Delimitando negativamente tal categoria, o mesmo diploma estabelecia que não eram considerados gestores públicos: i) os indivíduos designados, ainda que por nomeação do Governo, para o exercício de funções em conselhos gerais, comissões de fiscalização ou outros órgãos a que não caibam funções de gestão, e bem assim os que hajam sido designados em representação de interesses diversos do próprio Estado (art.1º, n.º2); ii) os indivíduos designados por eleição para os órgãos de gestão das sociedades de capitais públicos ou participadas (art. 1º, n.º 3).
Tratava-se, portanto, de um conceito restritivo, do qual se encontravam expressamente excluídos os indivíduos designados por eleição para os órgãos de gestão das sociedades de capitais públicos ou participadas (art. 1º n.º 3, do Dec. Lei n.º 464/82, de 09 de Dezembro).
Em tal contexto, a introdução da alínea b) do n.º 3 do art. 4º resultante da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto – administrador designado por entidade pública em pessoa colectiva de direito público ou em sociedade de capitais públicos ou de economia mista – em simultâneo com a al. a) – gestor público – explica-se pelo propósito de complementar normativamente esta alínea, fazendo ingressar no regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo determinada realidade que, não sendo por esta à data comportada, de outro modo ficaria de fora: precisamente a reportada aos indivíduos designados por eleição para os órgãos de gestão das sociedades de capitais públicos ou participadas sempre que o capital público tivesse tido uma intervenção determinante em tal eleição.
O Estatuto do gestor público aprovado pelo Dec. Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro, vigorou até à entrada em vigor do Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março – que aprovou um novo Estatuto do gestor público, revogando integralmente aquele primeiro diploma [cfr. art. 42º, n.º 1, al. a)] –, tendo resistido à aprovação do novo regime do sector empresarial do Estado pelo Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro.
Apesar de o artigo 15º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 558/99, na sua versão originária, assimilar expressamente as hipóteses de designação e proposta, determinando que os administradores designados ou propostos pelo Estado teriam um estatuto próprio, a definir por legislação especial, o certo é que aquele diploma não alterou a caracterização do gestor público constante Dec. Lei n.º 464/82, de 9 de Dezembro, sendo que nenhum outro diploma o fez até à aprovação do novo estatuto do gestor público pelo Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, entrado em vigor a 27 de Maio de 2007 (cfr. art. 43º).
Segundo passou a resultar do art. 1º do Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, é considerado gestor público, para os efeitos nele previstos, quem seja designado para órgão de gestão ou administração das empresas públicas abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, podendo tal designação ocorrer por nomeação ou por eleição nos termos da lei comercial (art. 13º, n.ºs 1 e 4).
Somente após a entrada em vigor do Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, é que o regime jurídico do sector empresarial do Estado aprovado pelo Dec. Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, foi revisto.
Tal revisão foi operada através do Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto, cujo propósito foi justamente o de «assegurar a harmonia entre aquele regime e o novo estatuto do gestor público», ambos, de resto, aprovados pelo Governo na mesma ocasião (cfr. Preâmbulo do Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto).
Na sequência de tal revisão, passou a dispor-se, no respectivo art. 15º que os membros dos órgãos de administração das empresas públicas, independentemente da respectiva forma jurídica, ficam sujeitos ao estatuto do gestor público.
Cruzando a nomenclatura seguida no âmbito do regime jurídico do sector empresarial do Estado, constante do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, com as alterações resultantes do Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto, e do Estatuto do gestor público, aprovado pelo Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, com as categorias constantes do elenco dos “titulares de altos cargos públicos” introduzido no regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro, em substituição da subcategoria dos “equiparados a titulares de cargos políticos” que constava do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, verifica-se encontrarem-se presentemente obrigados à apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais: i) para além dos gestores das entidades públicas empresariais (arts. 3º, n.º 2, e 15º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, este último na redacção do Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto), quem seja designado por nomeação ou por eleição nos termos da lei comercial para órgão de gestão ou administração de sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude da detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto ou do direito de designar ou de destituir a maioria dos membros do conselho de administração e fiscalização” (art. 4º, n.º 3, al. a) da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro, arts. 3º, n.º 1, e 15º do Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, este último na redacção conferida pelo Dec. Lei n.º 300/2007, de 23 de Agosto, e arts. 1º e art. 13º, ambos do Dec. Lei n.º 71/2007, de 27 de Março); ii) os titulares de órgão de gestão de organizações empresariais que tenham participação social permanente do Estado e outras entidades públicas estaduais, de carácter administrativo e empresarial – o que se presumirá sempre que tal participação for globalmente representativa de mais de 10 % do capital social da entidade participada (art. 2º, n.º 3, do Dec. Lei n.º 558/99) – nas quais tal participação não origina, isoladamente ou no seu conjunto, a possibilidade do exercício, de forma directa ou indirecta, de uma influência dominante do Estado na entidade participada – por não se verificar a seu favor, nem a maioria do capital ou dos direitos de voto, nem o direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização. Tais titulares ficarão sujeitos ao regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo quando tiverem sido designados pelo Estado, o que, em caso de eleição, ocorrerá quando esta houver dependido de uma maioria “qualificada” para cuja formação se haja revelado necessário o capital estadual ou os votos correspondentes a acções “privilegiadas” detidas por entidades públicas nos termos da segunda parte do artigo 391º, n.º 2, do Código das Sociedades Comerciais; ou quando os administradores hajam sido “propostos” pela minoria do capital estadual ou por esta eleitos, nos termos, respectivamente, dos n.ºs 1 e 6 do art. 392º do Código das Sociedades Comerciais, ou quando por ela “propostos”, “eleitos” ou “indicados” ao abrigo de um acordo parassocial.
16. Conforme referido já, a Taguspark, S.A é uma empresa participada inserida no sector empresarial do Estado.
Não se tratando de uma empresa pública, os respectivos administradores não são qualificáveis como gestores públicos nos termos e para os efeitos previstos na al. a) do n.º 3 da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão agora aprovada pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro.
Embora titulares de um órgão de gestão de uma empresa participada, os respectivos administradores também não poderão considerar-se designados pelo Estado no sentido suposto pela previsão da al. b) do n.º 3 da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, uma vez mais na versão resultante da Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro.
O contrato societário da Taguspark S.A., embora preveja que a eleição do conselho de administração seja feita através de lista nominativa subscrita pelo menos por 35% do capital social (cfr. art. 19º, n.º 2), não estabelece a favor do capital estadual qualquer prerrogativa susceptível de influenciar qualificadamente a eleição de certos dos administradores da sociedade nos termos previstos nos n.ºs 1 e 6 do art. 392º do Código das Sociedades Comerciais.
Conforme referido já (vide supra 14.), resulta dos estatutos da Taguspark S.A. que as deliberações da assembleia-geral são tomadas por maioria dos votos dos accionistas presentes ou representados (cfr. art. 18º), regra que se mantém para a eleição da totalidade dos respectivos administradores.
Conforme observado já também (vide supra 14.), qualquer uma das três assembleias-gerais a considerar na situação presente contou com a representação de accionistas titulares de acções representativas da totalidade do capital social da Taguspark, S.A., tendo a eleição a que conduziram ocorrido em todos os casos por unanimidade.
Neste contexto, é fácil de perceber que, embora o conjunto das participações do sector público haja sido permanentemente superior a 50%, a participação do capital público estadual – ou seja, a fracção detida pelo Estado e demais entidades públicas estaduais – isoladamente considerada, não se revelou necessária à formação do quórum deliberativo que conduziu, quer à eleição dos órgãos sociais para o quadriénio de 2008/2011 – o que inclui a posterior alteração da composição do respectivo conselho de administração através do preenchimento de vaga aí em aberto –, quer à eleição do requerente F. para o novo mandato correspondente ao triénio de 2010 a 2012.
No referido contexto, a eleição de qualquer um dos requerentes para os órgãos sociais da Taguspark, S.A. ter-se-ia, com efeito, verificado nos termos estatutariamente exigidos – ou seja, através da maioria dos votos dos accionistas presentes ou representados – ainda que o conjunto das participações detidas pelo Estado e demais entidades públicas estaduais, globalmente representativo de 33,75% do respectivo capital social (por associação das seguintes fracções: Instituto Superior Técnico -12,64%; Caixa Geral de Depósitos – 10%; Universidade Técnica de Lisboa – 4,21%; Fundação para a Ciência e Tecnologia – 3,45%; e Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação) se não tivesse posicionado nesse sentido.
Embora a Taguspark, S.A. subsista qualificável como sociedade mista de capitais maioritariamente públicos (estaduais e municipais), tal categoria foi suprimida do elenco dos sujeitos vinculados pelo regime jurídico do controlo público da riqueza em razão do cargo, dando lugar, no âmbito do sector empresarial público, à trilogia agora composta pelas categorias de (a) gestor público, (b) titular de empresa pública participada quando designado pelo Estado e (c) membro de órgãos executivos das empresas que integram o sector empresarial local (art. 4º, n.º 3, da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, com as alterações resultantes da Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro).
Ao contrário daquela, a densificação de qualquer uma das três categorias agora instituídas supõe a natureza, não apenas pública, mas ainda estadual ou municipal da fracção do capital societário a considerar.
Uma vez que, embora o conjunto das participações públicas (estaduais e municipais) represente mais de 50% do capital social da Taguspark, S.A., a fracção do capital detida pelo Estado e demais entidades públicas estaduais é inferior e não exerceu, além disso, uma intervenção imprescindível à aprovação da deliberação que conduziu à eleição dos titulares dos respectivos órgãos sociais, estes não se encontram abrangidos pelo regime do controlo público da riqueza em razão do cargo na versão resultante da Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro. Nenhum deles é qualificável, para aqueles efeitos, como titular de alto cargo público.
17. Conforme resulta do disposto nos arts. 1º, n.º 1 e 2º, n.º 1, da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, a obrigação de apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais constitui-se por efeito do início e da cessão de funções dos titulares dos cargos abrangidos pelo regime jurídico do controlo público da riqueza, devendo ser por isso estabelecida por função do quadro legal contemporâneo do facto jurídico que determina a existência do dever.
Os requerentes A., B., G., F. e E. foram eleitos para os órgãos sociais da Taguspark, S.A. para o quadriénio de 2008/2011 em assembleia-geral realizada a 5 de Maio de 2008.
O requerente C., por seu turno, foi eleito membro da Comissão Executiva da Taguspark, S.A. em assembleia-geral realizada em 28 de Maio de 2009, que aprovou por unanimidade a alteração da composição do Conselho de Administração, preenchendo em tais termos a vaga aí em aberto.
Em qualquer um dos referidos momentos, vigorava o regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos resultante das alterações introduzidas pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto.
De acordo com este, os requerentes foram, por via dessa eleição, designados administradores por entidade pública em sociedade de economia mista nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b) do n.º 3 do artigo 4º da Lei n.º 4/83, na redacção da Lei n.º 25/95, facto que os vinculou à obrigação de apresentação, nos sessenta dias subsequentes, da declaração de património, rendimentos e cargos sociais a que se refere o respectivo art. 1º.
A cessação das funções em tais termos iniciada ocorreu, por seu turno, por efeito da denúncia dos mandatos atribuídos por via da referida eleição em assembleia-geral realizada no dia 8 de Junho de 2010.
Nessa data, os requerentes, na qualidade – então legalmente contemplada – de administradores designados por entidade pública em sociedade de economia (alínea b) do n.º 3 do artigo 4º da Lei nº 4/83, na redacção da Lei n.º 25/95), constituíram-se no dever de apresentar nova declaração, actualizada, nos termos previstos no n.º 1 do art. 2º da referida lei.
18. Para além das obrigações resultantes do início e da cessação de funções como administradores designados por entidade pública em sociedade de economia mista, os requerentes B. e C., na qualidade de membros da Comissão Executiva da Taguspark, S.A., encontram-se ainda vinculados pelo dever de renovação anual da declaração de património, rendimentos e cargos sociais nos termos previstos no art. 2º, n.º 3, da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, dever esse que subsistiu em tais termos até às alterações introduzidas pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro, no regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares dos cargos políticos.
Tal como sucede com a obrigação de apresentação da declaração de património, rendimentos e cargos sociais por efeito do início e da cessação de funções, também quanto ao dever de actualização anual da declaração previamente entregue constituído no âmbito da vigência do regime jurídico do controlo público da riqueza dos titulares de cargos políticos na versão resultante da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, as alterações introduzidas pela Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro, apenas operam para o futuro, não produzindo retrospectivamente qualquer efeito desonerador.
III. Decisão.
19. Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide que:
a) Enquanto Presidente do Conselho de Administração da “Taguspark – Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da área de Lisboa, S.A.”, o requerente A. encontra-se abrangido pelo disposto na alínea b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, e, consequentemente, sujeito ao dever de apresentação das declarações de rendimentos, património e cargos sociais, previsto nos arts. 1º, n.º 1, e 2º, n.º 1, do referido diploma.
b) Enquanto membros da Comissão Executiva da “Taguspark – Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da área de Lisboa, S.A., os requerentes B. e C. encontram-se abrangidos pelo disposto na alínea b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção conferida pela Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto, e, consequentemente, sujeitos ao dever de apresentação das declarações de rendimentos, património e cargos sociais, previsto nos arts. 1º, n.º 1, e 2º, n.º 1, do referido diploma, bem como ao dever de renovação anual das respectivas declarações, previsto no n.º 3 do mesmo art. 2º.
c) Enquanto administradores não executivos da “Taguspark – Sociedade de Promoção e Desenvolvimento do Parque de Ciência e Tecnologia da área de Lisboa, S.A.”, os requerentes E., F. e G. encontram-se abrangidos pelo disposto na alínea b) do n.º 3 do art. 4º da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na redacção conferida pela Lei n.º25/95, de 18 de Agosto, e, consequentemente, sujeitos ao dever de apresentação das declarações de rendimentos, património e cargos sociais, previsto nos arts. 1º, n.º 1, e 2º, n.º 1, do referido diploma.
Consequentemente, determina-se que os requerentes que não procederam à entrega neste Tribunal das declarações a cuja apresentação se encontram obrigados nos termos referidos nas alíneas a) a c) sejam para tal efeito notificados, nos termos previstos no art. 3º, n.º1, da Lei n.º 4/83, de 2 de Abril, na versão aprovada Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto.- Carlos Pamplona de Oliveira – Catarina Sarmento e Castro – Ana Maria Guerra Martins – José Borges Soeiro – Vítor Gomes – Carlos Fernandes Cadilha – Gil Galvão – João Cura Mariano – Maria João Antunes – Joaquim de Sousa Ribeiro (com declaração de voto) – Rui Manuel Moura Ramos.
DECLARAÇÃO DE VOTO
De acordo com o entendimento que perfilho e já expressei na declaração de voto apensa ao acórdão proferido no processo n.º 144/DPR, quanto ao preenchimento do conceito de “designação “ pelo Estado (alínea b) do n.º 3 do artigo 4.º da Lei n.º 4/83, na versão da Lei n.º 38/2010, de 2 de Setembro) ou por “entidade pública” (mesmo preceito, na versão da Lei n.º 25/95, de 18 de Agosto), sou de parecer que está sujeito a declaração o titular de órgão de gestão eleito, em lista única, em assembleia geral de sociedade participada pelo Estado, quando por este proposto, de forma documentalmente comprovada. Não se exige, pois, contrariamente ao que tem sido a linha de orientação do Tribunal, mantida neste Acórdão, a “participação determinante do capital público no procedimento de acesso ao cargo”. No caso de sociedades de capital estadual minoritário – as únicas que fornecem um campo de aplicação autónomo ao mencionado preceito, pois as sociedades de economia mista com maioria de capital público são empresas públicas, o que faz com que os titulares dos seus órgãos de gestão sejam, para todos os efeitos, e de acordo com o artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de Março, gestores públicos, ficando sujeitos a declaração por força da alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º da Lei n.º 4/83, na versão actual - tal interpretação restringiria a aplicação da alínea b) do mesmo preceito às previsões excepcionais dos n.ºs 1 e 6 do artigo 392.º do CSC, ressalvadas as hipóteses de um acordo parassocial ou da detenção, pelo Estado, de acções privilegiadas. Não creio que esta restrição de domínio aplicativo corresponda à intenção legislativa. - Joaquim de Sousa Ribeiro