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Processo n.º 199/11
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Nos presentes autos foi proferida a Decisão Sumária n.º 179/2011 com o seguinte teor:
«Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, decide-se:
1. A. interpõe recurso do acórdão da Relação de Lisboa, de 9 de Fevereiro de 2011, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional – Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro –, pretendendo ver fiscalizada a norma do artigo 292º do Código Penal, 'cuja inconstitucionalidade havia sido suscitada nas alegações'. Na verdade, o recorrente invocara, perante a Relação, o seguinte:
O art. 292°. do Código Penal consentindo a interpretação que lhe foi dada pela Mma. Juiz a quo na, aliás douta, sentença recorrida, é inconstitucional por violar o princípio da proporcionalidade corolário do Estado de direito democrático consagrado no art. 2°. da Constituição da República Portuguesa de 1976 e objecto de regulação especifica no nº. 2 do art. 18°. da nossa lei fundamental.
Com efeito,
O arguido foi condenado em medida próxima da máxima prevista para a prática do crime em causa, sem que tenham ocorrido circunstâncias (acidente por si provocado, desrespeito por outras normas estradais, ou criação de perigo concreto) susceptíveis de qualificar aquela pena como proporcional à gravidade da infracção.
A desproporção entre a gravidade da infracção e a pena aplicada que aquela norma consente tornam-na inconstitucional por violação do art. 2°. da lei fundamental.
A, aliás douta, sentença recorrida procedeu a errada interpretação e aplicação dos arts. 40°., nº. 1, 43°., nº. 1, 70°., 71°., 58°., nº. 1 e 292°. do Código Penal, sendo que a norma por último citada, ao consentir a interpretação que lhe foi dada pela Mma. Juiz a quo, viola o princípio da proporcionalidade, sendo, por isso, inconstitucional.
O acórdão recorrido aplicou a norma do seguinte modo:
(...) 3. Dispositivo
Perante tudo o exposto fica, acordam os Juízes que compõem a 3ª Secção Criminal do Tribunal da relação de Lisboa:
Em julgar provido o recurso interposto pelo Ministério Público, e parcialmente provido o recurso interposto pelo arguido A. e, consequentemente, revoga-se a sentença recorrida, condenando o arguido A.:
Como autor material de um (1) crime de condução de veiculo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo art. 292º, nº 1 do Código Penal, na pena de 11 (onze) meses de prisão, a cumprir a prisão por dias livres durante 66 (sessenta e seis) períodos (66 períodos x 5 dias = 330 dias) – cada um deles com a duração de 48 (quarenta e oito) horas, equivalendo cada um a 5 (cinco) dias de prisão continua, devendo, em principio, iniciar-se às 21.00 horas de Sexta-Feira e terminar às 21.00 horas de Domingo, e devendo, em principio, iniciar-se a execução no 5º fim-de-semana subsequente ao trânsito em julgado do presente acórdão (cf. arts. 45º, nº 1, 2 e 3 do Código Penal e art. 487º, nº 1 do Código de Processo Penal).(...)
O preceito tem a seguinte redacção:
1 – Quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, com uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 – Na mesma pena incorre quem, pelo menos por negligência, conduzir veículo, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, não estando em condições de o fazer com segurança, por se encontrar sob influência de estupefacientes, substâncias psicotrópicas ou produtos com efeito análogo perturbadores da aptidão física, mental ou psicológica.
A crítica de inconstitucionalidade que é formulada pelo recorrente incide na medida concreta da pena, por alegadamente ser 'próxima da máxima prevista para a prática do crime em causa, sem que tenham ocorrido circunstâncias (acidente por si provocado, desrespeito por outras normas estradais, ou criação de perigo concreto) susceptíveis de qualificar aquela pena como proporcional à gravidade da infracção'. Mas o que resulta desta alegação é que o recorrente acusa o tribunal recorrido de ter feito uma aplicação inconstitucional da norma, o que releva para efeito da sindicância da decisão em si mesmo considerada, mas que é totalmente irrelevante no âmbito do recurso previsto alínea b) do n.º 1 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional, por ser um recurso de carácter normativo, onde não cabe avaliação constitucional da decisão em si mesmo considerada. E a verdade é que a norma, tal como resulta do teor literal do preceito, não é manifestamente inconstitucional.
3. Nestes termos, é de concluir que o Tribunal não pode conhecer do objecto do recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC.»
2. O recorrente A. apresentou requerimento a solicitar que sobre esta decisão recaísse acórdão: «vem reclamar (...) para a conferência, o que faz nos termos do n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional».
3. O representante do Ministério Público no Tribunal foi ouvido e respondeu:
1.º Pela Decisão Sumária nº 179/2011, não se conheceu do objecto do recurso porque o recorrente não enunciou, nem suscitou, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, única que poderia constituir objecto idóneo do recurso de constitucionalidade.
2º Na verdade, como resulta inequivocamente da motivação do recurso para a Relação e do Acórdão dessa Relação (o Acórdão recorrido), o que o recorrente questiona é a medida concreta da pena, considerando-a desproporcionada e violadora dos artigos 18.º, n.º 2 e 2.º da Constituição, face ao disposto no artigo 292.º do Código Penal.
3º O recorrente limitou-se a reclamar da Decisão Sumária para a conferência, nada dizendo sobre as razões porque entende que se devia conhecer do objecto do recurso.
4º Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.
4. Conforme adverte o Ministério Público, a ausência de alegação na reclamação formulada impede o Tribunal de conhecer as razões – processuais e substantivas – da discordância do recorrente quanto à decisão sumária reclamada. Assim, e não se divisando qualquer irregularidade que a afecte, cumpre confirmar tal decisão.
Decide-se, por isso, indeferir a reclamação, confirmando a decisão sumária n.º 179/2011 que decidiu não conhecer do objecto do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 12 de Abril de 2011. – Carlos Pamplona de Oliveira – Maria João Antunes – Gil Galvão.