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Processo n.º 193/11
3.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, A., Lda. reclamou, em 09 de Fevereiro de 2011 (fls. 1 a 8) do despacho proferido pelo Juiz-Relator junto da 1ª Subsecção da 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo, em 26 de Janeiro de 2011 (fls. 10), que rejeitou recurso de constitucionalidade por si interposto, em 12 de Janeiro de 2011 (fls. 13 a 26), relativamente a “douto Acórdão (pág. 1 a 4) de fls… proferido por esse Venerando Tribunal que julgou por não admissível o recurso de revista excepcional interposto – num processo de providência cautelar (por alegada não verificação dos pressupostos exigidos pelo artº 150º nº 1 do CPTA)” (fls. 13).
2. Da reclamação consta o seguinte:
“1º
Salvo o devido respeito não enxerga a Recorrente qual o fundamento válido em que se estriba a decisão de não admissão do recurso interposto, - cuja cópia do respectivo despacho se dá por reproduzido em anexo sob o documento nº1 – ao basear-se num alegado critério interpretativo tão simplista, ilegítimo e abusivamente discricionário do nº1 do artº 150º do CPTA - que faz abortar ilícita e, mais ainda, clamorosamente qualquer controlo de inconstitucionalidade por parte do Venerando Tribunal Constitucional.
Inclusiva e propriamente até o Supremo Tribunal Administrativo com a prolação do douto despacho, ora reclamado, acabou também ele, surpreendentemente, ao aplicar o artº 150º nº1 do CPTA por extrair e infundir norma cuja inconstitucionalidade fere frontalmente os artigos 20º nº4 e 268º nº4 e 5 da Constituição da República Portuguesa, cujos princípios são interpretáveis e integráveis nos termos do artº 16º nº1 e 2, enquanto decorrência da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e Declaração Universal dos Direitos do Homem e com aplicação imediata nos termos do artº 18º do mesmo diploma fundamental.
2º
Contudo, não é de modo algum o vicio de inconstitucionalidade da norma extraída pelo Supremo Tribunal Administrativo, mediante a aplicação do disposto no artº 150º nº1 do CPTA, que “in casu” viola princípios e normas constitucionais que estão a ser sindicados na presente Reclamação.
Trata-se tão só aqui de identificar na presente Reclamação mais um vício de análise de hermenêutica interpretativa cometido pelo Supremo Tribunal Administrativo que denuncia – salvo o devido respeito – uma inadmissível arbitrariedade e opacidade quanto à interpretação e aplicação dos critérios sobre a admissibilidade do recurso, nos termos do estatuído respectivamente, nos artigos 75º (“Prazo”); 75ºA (Interposição do recurso) e 76º nº2 (Decisão sobre a admissibilidade), todos da LOFPTC,
Conforme se pode aquilatar e sindicar do teor da cópia do respectivo Requerimento de Interposição cuja cópia se dá aqui por reproduzida para os devidos e legais efeitos e que se anexa sob o doc. nº2.
3º
É firme convicção da Recorrente de que esta cumpriu escrupulosamente no Recurso apresentado para o Venerando Tribunal Constitucional todos os requisitos de que depende a sua admissibilidade, dando aqui para os devidos e legais efeitos por reproduzidos todos os fundamentos nele alegados, por conformes com as normas que regem os Processos de Fiscalização Concreta (cfr. artº69º e seguintes da LOFPTC).
Estranha manifestamente a Recorrente a metodologia quiçá perfilhada pelo Tribunal “a quo” (STA) ao citar discricionariamente excerto da sua Reclamação de que junta apenas curiosamente a 1ª folha do Requerimento, omitindo qualquer alusão à fundamentação lapidar deduzida pela Recorrente, e ora Reclamante, no seu Requerimento de Recurso justificativo da sua admissibilidade, compaginável com a cópia da respectiva peça processual anexa sob o doc. nº2.
4º
Independentemente de haver, a então Recorrente, e ora Reclamante, preenchido o 1º segmento do Pressuposto do Requerimento de Recurso para o Tribunal Constitucional, conforme o estipulado no nº2 do supra citado artº 75ºA, ao sindicar no item 7.8 do supra mencionado Recurso, a indicação das normas ou princípios constitucionais que considera violados,
Haver, de igual modo, preenchido o 2º segmento do Pressuposto do Requerimento de Recurso para o Tribunal Constitucional previsto no nº2 do supra citado artº 75ºA, tendo feito a então Recorrente, e ora Reclamante, aqui a expressa menção de que a questão da inconstitucionalidade já havia sido suscitada nas Instâncias, concretamente, aquando da apresentação do Recurso e das Alegações no Recurso de Revista interposto para a Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo – do douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul -conforme cópia que se dá aqui por reproduzida para os devidos e legais efeitos e que se anexa sob o doc. nº3 - que negara provimento ao Recurso jurisdicional, confirmando a sentença da 1ª Instância do TAF de Sintra.
5º
É assente por inquestionável, que uma vez que a questão da constitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, - como o foi efectivamente: ie, “(…) tenha sido levada perante as Instâncias, de modo a que estas tenham podido conhecer dela e a tenham resolvido (de forma expressa ou implícita)”,
Que tanto bastará, a partir do preciso “terminus ad quem” em que a 1ª subsecção da 1ª Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo prolatou Acórdão, no recurso ora pendente, - conforme cópia que se dá por reproduzida para os devidos e legais efeitos e que se anexa sob o doc. nº4 - julgando não verificar-se alegadamente os pressupostos de admissão do recurso de revista excepcional previstos no artº 150º nº1 do CPTA,
Que, por mais uma vez, se reafirma o já alegado no item nº 11.1 do Recurso interposto para o Venerando Tribunal Constitucional cuja admissão foi objecto de indeferimento mediante o despacho ora objecto de Reclamação que:
“Consequentemente ao não ter-se admitido a revista, obviamente daí decorre que esgotado todo e qualquer outro recurso ordinário, tanto basta que daí decorra o entendimento lógico-juridico de que a questão da constitucionalidade tenha sido conduzida “ “(…) perante as instâncias de modo que estas tenham podido conhecer dela e a tenham – “in casu” a resolvido de forma implícita, o que tanto basta para se abrir a presente fase de controlo jurídico-constitucional, em sede do presente recurso perante o Tribunal Constitucional”.
(…)
7º
Mais não fosse:
Não existe um “tertium genus” na classificação dos Recursos para além dos Ordinários e Extraordinários sendo que “in casu” o facto de se tratar de um Recurso de Revista Excepcional, não deixa o mesmo de se regular em sede de recurso pelas regras aplicáveis aos Recursos Ordinários, de acordo com o bocardo latino “Ubi lex non distinguit ibi distinguere non debemus”…
8º
Mais, se o Tribunal “a quo” decidiu administrativa e discricionariamente interpretar a seu “belo prazer” o dispositivo previsto nos nº1 a 4 do artº 150º do CPTA, tal conduta não a isenta de ser sujeita ao controlo jurídico-constitucional pelo Venerando Tribunal Constitucional.
9º
“The last but not the least”:
Se, ainda, nos termos do nº6 do artº 70º do LOFPTC: “Se a decisão admitir recurso ordinário, mesmo que para a uniformização de jurisprudência, a não interposição de recurso para o Tribunal Constitucional não faz precludir o direito de interpô-lo de ulterior decisão que confirme a primeira, (…)” por maioria de razão “in casu” estaria sempre aberta a via de recurso para o Tribunal Constitucional para sindicar a inconstitucionalidade arguida. (…)” (fls. 1 a 8).
3. Em sede de vista, o Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência da reclamação ora em apreço, nos seguintes termos:
“1. A. Ld.ª recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo (STA), ao abrigo do disposto no artigo 150.º do CPTA do, Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul (TCA), que confirmou a sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que, por sua vez, julgara improcedente a providência cautelar de suspensão da eficácia de determinada norma do Regulamento do Projecto de Qualificação e Valorização Ambiental do Troço da Costa do Guincho-Guia.
2. O Supremo Tribunal Administrativo, porque entendeu que não se verificavam os pressupostos exigidos pelo artigo 150.º do CPTA, não admitiu a revista.
3. Desta decisão o recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, pretendendo ver apreciadas diversas questões de inconstitucionalidade, todas relacionadas com a matéria apreciada e decidida no TAF e no TCA.
4. O recurso para o Tribunal Constitucional foi, inequívoca e expressamente, interposto do Acórdão do STA que não admitiu a revista.
5. Ora, não tendo a revista sido admitida, parece-nos claro que a decisão recorrida não aplicou, nem podia ter aplicado, os preceitos referidos no requerimento de interposição do recurso.
6. A única norma efectivamente aplicada, foi a do artigo 150.º do CPTA, onde se fixam os pressupostos de admissibilidade daquele recurso excepcional de revista
7. Na reclamação, o reclamante ainda refere que o STA, ao aplicar o artigo 150.º do CPTA, naquelas condições, acabou por aplicar norma inconstitucional.
8. Ora, se o reclamante pretende enunciar qualquer inconstitucionalidade relacionada com o artigo 150.º do CPTA, este já não é o momento processual adequado, pois é com o requerimento de interposição do recurso que se fixa o seu objecto.
9. Por outro lado, o reclamante não enuncia, nesta parte, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.
10. Por último, é o próprio reclamante que, imediatamente a seguir (artigo 2.º da reclamação), desvaloriza aquele entendimento, dizendo que “não é de modo algum o vício de inconstitucionalidade da norma extraída pelo STA mediante a apreciação do disposto no artigo 150.º do CPTA que “in casu” viola os princípios e normas constitucionais.
11. Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.” (fls. 98 e 99)
Cumpre agora apreciar e decidir.
II – Fundamentação
4. O despacho reclamado rejeitou o recurso de constitucionalidade que visava a apreciação da constitucionalidade de norma extraída da conjugação dos artigos 3.º, 201.º, n.ºs 1 e 2, 659.º, n.ºs 1 a 4, 660.º, n.º 2, e 668.º, n.º 1, alínea d), todos do CPC, tal como (alegadamente) interpretada e aplicada por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo.
Após analisado aquele acórdão (fls. 66 a 69), verifica-se, sem margem para dúvidas que, conforme propugnado pela decisão reclamada, nunca foi aplicada a norma jurídica que a ora reclamante elegeu como objecto do seu recurso de constitucionalidade. Com efeito, a decisão recorrida apenas aplicou a norma extraída do n.º 1 do artigo 150º do CPTA.
Em conclusão, confirma-se a decisão reclamada, na medida em que a norma que constituía objecto do recurso de constitucionalidade não foi alvo de aplicação efectiva, conforme exigido pelo artigo 79º-D da LTC, razão pela qual bem andou o tribunal recorrido quando rejeitou a admissão do recurso interposto.
III – Decisão
Nestes termos, pelos fundamentos supra expostos e ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 77º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 24 de Março de 2011.- Ana Maria Guerra Martins – Vítor Gomes – Gil Galvão.