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Processo n.º 27/10
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. Notificada do Acórdão n.º 150/2010, de 14.04.2010, no qual foi decidido indeferir a reclamação que interpusera da decisão sumária, na parte em que esta decidiu não conhecer de três questões de constitucionalidade que colocara no recurso de constitucionalidade, a reclamante A. veio arguir a nulidade do acórdão, nos termos seguintes:
«A., recorrente nos autos em epígrafe, tendo sido notificado do teor da decisão proferida, vem
Arguir a nulidade da mesma,
nos termos do disposto nos art.ºs 660.°, n.° 2, 668.°, n.° 1, alíneas b) e d), do CPC, porquanto,
1. Com o devido respeito a decisão proferida não respeita a Lei nem o processo, isto porque o pedido formulado foi de mera aclaração do acórdão proferido, não configurando a mesma um pedido de reclamação para a conferência, nos termos do disposto no art.º 78.°A, n.° 3, da LTC.
2. De facto, e antes mesmo da arguida poder, ou não, formular um tal pedido cumpria perceber as razões porque o Venerando Conselheiro Relator entendia não haver lugar ao esclarecimento requerido, designadamente em relação à interpretação normativa em causa que não configurava uma mera discordância com o decidido.
3. Discordância aliás que vem referida na decisão por “incorporação” da douta pronuncia do Ministério Público,
4. A qual, por sua vez, não foi conhecida da arguida, porquanto não lhe foi notificada, por se ter configurado o pedido de aclaração como de reclamação.
5. Sendo certo que se pedia o controle da lei e os resultados da sua interpretação, desde logo porque não se percebia como sustentar racionalmente a legitimidade constitucional da norma, na interpretação acolhida pelo tribunal recorrido, objecto, aliás, do dissenso entre os próprios julgadores,
6. E ainda porque, como alegado, só no momento da notificação do acórdão condenatório, é que se consumou a impossibilidade de contraditório sobre a última prova carreada para os autos — os relatórios sociais.
7. A aclaração impunha-se ainda porque, permitir-se, com base em subterfúgios de natureza processual, a insindicabilidade de violações flagrantes de normas, quer na sua interpretação quer na sua aplicação, é negar-se um direito e uma garantia constitucional à arguida.
8. Negação essa que consubstancia uma violação do principio da tutela jurisdicional efectiva.
Termos em que,
deve ser declarada a nulidade da decisão proferida e admitida a aclaração porque essencial à compreensão da interpretação normativa requerida.»
2. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal respondeu da seguinte forma:
«1º
O recorrente, notificado de Decisão Sumária de fls 5072 a 5079, que não tomou conhecimento de parte do recurso e negou provimento a outra, apresentou um pedido de aclaração dessa decisão.
2º
Como em tal requerimento não vinha colocada “qualquer questão de inteligibilidade do discurso fundamentador da decisão reclamada”, não sendo invocada qualquer obscuridade ou ambiguidade, antes se limitando a recorrente a discordar do decidido, tal requerimento foi considerado uma reclamação para a conferência.
3º
Na verdade, o uso daquele meio processual só se justifica e tem sentido quando a decisão é obscura e ambígua, cabendo ao reclamante identificar e especificar essas obscuridades e ambiguidades (artigo 669.°,2.°, alínea a) do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 69.° da LTC), não estando o Tribunal, por outro lado, vinculado à forma como as peças são rotuladas pelos recorrentes.
4º
Deste modo — como é entendimento jurisprudencial reiterado (vd. v.g.. Acórdãos n.°s 431/2008 e 222/2009) — nada obsta — e tudo aconselha — a que este Tribunal Constitucional possa qualificar os incidentes pós - decisórios suscitados, como reclamação para a conferência, “transformando” em tal meio impugnatório requerimentos deduzidos perante o relator, particularmente quando os mesmos contêm inidóneos pedidos de aclaração de decisões perfeitamente claras e insusceptíveis de dúvida objectiva.
5º
Deve, pois, indeferir-se o pedido.»
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
3. A requerente invoca a nulidade do Acórdão n.º 150/2010, em síntese, por considerar o requerimento por si formulado consubstanciava um pedido de aclaração (da decisão sumária), que o Acórdão em causa tratou como sendo uma reclamação para a conferência. E termina pedindo que seja declarada a nulidade de tal Acórdão e admitida a aclaração «porque essencial à compreensão da interpretação normativa requerida».
Não tem qualquer razão a reclamante.
Na verdade, a reclamante não apresentou ao Tribunal um verdadeiro pedido de aclaração, pois, como já se escreveu no Acórdão n.º 150/2010, não colocou qualquer questão de inteligibilidade do discurso fundamentador da decisão reclamada, nem apontou qualquer obscuridade ou ambiguidade da fundamentação que careça de ser esclarecida. O que a reclamante fez foi discordar do sentido da decisão sumária quanto ao não conhecimento das questões referidas, fundamentando essa discordância numa errónea comparação entre o recurso de constitucionalidade e os recursos de instância e entre os poderes de conhecimento do Tribunal Constitucional e os poderes dos demais tribunais.
Por isso, como bem decidiu o Acórdão em apreço, não só não estava em causa um pedido de aclaração, em sentido próprio, como também não havia qualquer fundamento para uma reclamação para a conferência, nos termos previstos no artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC.
E como bem salienta o Ministério Público na sua resposta, o Tribunal não só não está vinculado ao “rótulo” que as partes dão às suas peças processuais, como pode (e deve) tratar como reclamação para a conferência um requerimento que é totalmente inidóneo como pedido de aclaração.
Resta dizer que a inexistência de qualquer obscuridade ou ambiguidade da dita decisão sumária que pudesse ser objecto de aclaração é ainda confirmada pelo teor da presente arguição de nulidade, onde a reclamante conclui que a pretensa aclaração se destina à «compreensão da interpretação normativa requerida».
4. Pelo exposto, acordam em julgar não verificada a alegada nulidade do Acórdão n.º 150/2010.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 6 de Outubro de 2010.- Joaquim de Sousa Ribeiro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.