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Processo n.º 196/10
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em Conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, A. interpôs recurso de constitucionalidade do acórdão de tal Relação, que, julgando parcialmente procedente o seu recurso, a condenou na pena única de oito anos e seis meses de prisão.
O recurso para o Tribunal Constitucional foi interposto, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, com as alterações posteriores (Lei do Tribunal Constitucional, doravante, LTC).
Simultaneamente à apresentação do recurso de constitucionalidade, a ora reclamante veio arguir a nulidade da decisão recorrida e requerer a sua aclaração. Por último, veio, igualmente, interpor recurso da mesma decisão para o Supremo Tribunal de Justiça.
O recurso para o Tribunal Constitucional foi admitido, por despacho de 10 de Fevereiro de 2010, no tribunal a quo.
Na mesma data, relativamente ao recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, foi proferido o seguinte despacho:
“Considerando que o recurso interposto para o STJ é posterior ao interposto para o T. Constitucional, por força do artigo 75.º, n.º 1 da LTC está interrompido o prazo para a sua interposição, razão pela qual, oportunamente, nos pronunciaremos sobre a sua admissibilidade.(…)”
Em 17 de Fevereiro de 2010, foi proferido acórdão, julgando improcedentes os requerimentos de aclaração e de arguição de nulidades.
Após as competentes notificações, os autos subiram ao Tribunal Constitucional, para apreciação do recurso de constitucionalidade.
2. Nessa sequência, foi proferida pela Relatora do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso (fls. 1972 a 1975). Fundamenta-se tal decisão no seguinte:
“3. Nos termos do n.º 2 do artigo 70.º da LTC, a admissibilidade dos recursos previstos na alínea b) do n.º 1 do mesmo – como é o caso do presente – depende do esgotamento dos recursos ordinários.
4. Resulta dos autos que tal requisito não se encontra preenchido.
Na verdade, o pressuposto da prévia exaustão dos recursos ordinários apenas se verifica quando a decisão recorrida já não admita recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados todos os que no caso cabiam, salvo os destinados a uniformização da jurisprudência, entendendo-se que se encontram esgotados todos os recursos ordinários, para este efeito, quando tenha havido renúncia, haja decorrido o respectivo prazo sem a sua interposição ou os recursos interpostos não possam ter seguimento por razões de ordem processual (n.º 4 do artigo 70.º da LTC).
A consagração do requisito de admissibilidade em análise corresponde à adopção do princípio da exaustão das instâncias, que visa restringir o acesso ao Tribunal Constitucional, limitando-o apenas às pretensões que já tenham sido previamente analisadas pela hierarquia judicial correspondente, o que redundará no resultado de o objecto de recurso de constitucionalidade ser circunscrito à decisão definitiva, à última pronúncia dentro da ordem jurisdicional a que pertence o tribunal a quo.
A jurisprudência constitucional tem considerado que a definitividade da decisão recorrida implica a prévia decisão de incidentes pós-decisórios idóneos, cujos pressupostos se encontrem verificados, nomeadamente o pedido de reforma, a arguição de nulidades ou pedido de aclaração (cfr. Acórdãos n.ºs 534/04, 24/06, 286/08 e 331/08, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Aplicando tais considerações ao caso concreto, concluiremos que o Acórdão da Relação de Lisboa, que figura, no caso, como decisão recorrida, não pode ser considerado decisão definitiva, para efeito de recurso para o Tribunal Constitucional.
Na verdade, a recorrente, além de recorrer para o Tribunal Constitucional, veio concomitantemente arguir nulidades, pedir a aclaração e ainda interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o que nos conduz a afirmar que a decisão recorrida não era – no momento da interposição – nem é ainda – estando por decidir a admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – definitiva.
Nestes termos, caso o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça venha a ser admitido, será o Acórdão, resultante da apreciação do recurso, que corresponderá à última decisão proferida no âmbito da ordem jurisdicional respectiva; no caso de não ser admitido, será a partir do momento em que se torne definitiva tal decisão que se contará o prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional.
A prolação do despacho do tribunal a quo que, reportando-se ao disposto no n.º 1 do artigo 75.º da LTC, difere para momento ulterior a apreciação da admissibilidade do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, não teve certamente em consideração o disposto nos n.ºs 2 e 4, conjugados com a alínea b) do n.º 1, do artigo 70.º da LTC.
Face às considerações expendidas, havendo o recurso sido interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC, dependendo a sua admissibilidade, como se referiu, da prévia exaustão dos recursos ordinários, (n.º 2 do artigo 70.º da LTC), conclui-se, in casu, pela não admissão do recurso.”
3. Inconformada com esta decisão, a recorrente apresentou reclamação para a conferência (fls. 1983 a 1984), procedendo a exposição do seguinte teor:
“ O recurso para o Supremo Tribunal de Justiça é por motivos diversos do ora interposto.
A apreciação do presente recurso em prazo razoável tem o efeito útil de produzir Justiça sem mais delongas…
Salvo o devido respeito deve o presente recurso ser já apreciado sob pena de retardar o efeito útil da Decisão…se a mesma for positiva para a recorrente.
Pelo que ao abrigo do art. 78-A-3 da LTC se RECLAMA para a CONFERÊNCIA nos termos exarados.”
4. O Magistrado do Ministério Público, notificado da presente reclamação, veio pugnar pelo indeferimento da mesma, alegando que nada se refere, em tal peça processual, que possa abalar os fundamentos da decisão reclamada.
II - Fundamentos
5. Como resulta do teor da reclamação e do seu confronto com os fundamentos exarados na decisão sumária reclamada, a reclamante não aduziu qualquer argumento que abalasse a correcção do juízo efectuado, relativamente à inadmissibilidade do recurso, limitando-se a referir que o recurso, por si interposto, para o Supremo Tribunal de Justiça, tem fundamentos diversos do presente recurso de constitucionalidade e a requerer a sua apreciação imediata, por forma a não retardar o efeito útil da decisão.
Em face do exposto, reafirmando a fundamentação constante da decisão reclamada, resta apenas concluir pela impossibilidade de conhecer do objecto do recurso e, em consequência, pelo indeferimento da reclamação da decisão sumária, proferida nestes autos a 7 de Setembro de 2010.
III - Decisão
6. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão sumária reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º do mesmo diploma), sem prejuízo do disposto na lei quanto a patrocínio judiciário.
Lisboa, 6 de Outubro de 2010.- Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.