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Processo n.º 862/07
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Cadilha
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A Liga Portuguesa de Futebol Profissional, recorrente nos autos, notificada do Acórdão n.º 19/2010, que negou provimento ao recurso de constitucionalidade por si interposto do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Julho de 2007, veio arguir a sua nulidade, invocando, como fundamentos, a falta de declaração do impedimento do juiz Carlos Fernandes Cadilha, relator por vencimento do referido acórdão, por um lado, e o facto de este ter sido lavrado sem o necessário vencimento, por outro.
Pede, ainda, no mesmo requerimento, a reforma da decisão quanto a custas, por não fundamentada e constituir, atento o montante concretamente fixado, uma «restrição ilegítima, desproporcional e irrazoável do direito a uma tutela jurisdicional efectiva».
Julgado não verificado o invocado impedimento, bem como a existência de qualquer nulidade a isso respeitante, pelo Acórdão n.º 207/2010, transitado em julgado, cumpre, pois, conhecer agora da arguição de nulidade do referido Acórdão n.º 19/2010, por alegada falta de vencimento, e do pedido de reforma da decisão quanto a custas, ainda pendentes de decisão.
2.1. Da nulidade do acórdão (por lavrado sem o necessário vencimento)
Sustenta o recorrente, em síntese, reportando-se ao Acórdão n.º 19/2010, que «dois dos Juízes Conselheiros que formaram a maioria apenas votaram favoravelmente a decisão, divergindo, contudo, da fundamentação [nele] acolhida (…)», pelo que, estando a maioria dependente da existência de três votos concordantes, «quer quanto à decisão, quer quanto à fundamentação», o referido acórdão é nulo por não ter o necessário vencimento, tal como previsto no artigo 716º, n.º 1, in fine, do CPC.
Sucede que, sendo efectivamente exigível uma maioria de votos conformes quanto à decisão e seus fundamentos para as decisões que se pronunciem pela inconstitucionalidade, igual exigência não se aplica quando, como é o caso, o Tribunal Constitucional se pronuncia pela não inconstitucionalidade.
Com efeito, se o que se pretende, com o recurso de constitucionalidade, é a apreciação e decisão sobre dada questão de inconstitucionalidade (artigos 280º, n.º 6, da CRP, e 71º, n.º 1, da LTC), o recurso só será procedente se obtida uma maioria de votos dos juízes, quer no que respeita à decisão de inconstitucionalidade, quer no que respeita às razões de direito constitucional que fundamentam tal conclusão decisória.
Na verdade, atentos os efeitos associados ao juízo de inconstitucionalidade, que poderá implicar, mesmo no âmbito dos processos de fiscalização concreta da constitucionalidade, não apenas a concreta reforma da decisão recorrida mas uma verdadeira alteração do quadro do direito vigente (artigos 281º, n.º 3, da CRP, e 82º da LTC), justifica-se que um efeito jurídico de tal relevância só opere se houver maioria de votos e de fundamentação em tal sentido.
Mas não competindo ao Tribunal Constitucional, como é sabido, formular juízos positivos sobre a conformação constitucional das normas jurídicas e sendo destituída de quaisquer efeitos jurídicos a pronúncia de não inconstitucionalidade, naturalmente que não relevam, por inócuas, eventuais divergências sobre as razões por que se decidiu pela não inconstitucionalidade da norma ou interpretação normativa que constitui objecto do recurso (cf., neste sentido, o Acórdão n.º 58/95 do Tribunal Constitucional, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
É que subjacente à norma que o arguente invoca para fundamentar a nulidade em causa (artigo 716º, n.º 1, in fine, do CPC), subsidiariamente aplicável aos processos de fiscalização concreta da constitucionalidade (artigo 69º da LTC), está a ideia fundamental de que a decisão judicial, na medida em que traduz a composição judicial de dado litígio ou, noutra formulação, define o direito no caso concreto, vale pelas razões (de facto e de direito) em que assenta, pelo que, se proferida por um tribunal colectivo, só poderá justificada e convincentemente comportar um tal efeito jurisdicional se reunir não apenas uma maioria decisória, como também, essencialmente, uma maioria de fundamentação.
Ora, adequando uma tal exigência processual à especificidade dos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade, também eles preordenados a expurgar do ordenamento jurídico as soluções normativas que ofendam a Constituição, facilmente se compreende que ela apenas valerá para as decisões que, verdadeiramente, impliquem ou possam implicar um tal juízo de desvalor jurídico; e já não para aquelas que, após verificação, se limitem a concluir pela não inconstitucionalidade das normas que são sujeitas à sua apreciação e, por isso, nenhuma possibilidade de alteração comportam.
Assim sendo, e tendo o Acórdão ora posto em crise concluído pela não inconstitucionalidade da interpretação normativa que integra o objecto do recurso interposto pelo ora arguente, cumpre, sem necessidade de mais considerações, indeferir a presente arguição de nulidade, afigurando-se, pois, desnecessário, por irrelevante, cotejá-lo com as declarações de voto dos juízes que, com o relator, formaram a maioria, em ordem a apurar se houve, de facto, divergência de entendimentos sobre as razões por que se decidiu pela improcedência do recurso.
2.2. Do pedido de reforma da decisão quanto a custas
O requerente invoca, como fundamento do pedido de reforma da decisão que o condenou em custas e fixou a taxa de justiça devida em 25 UC, a nulidade desta, por falta de fundamentação, e o facto de o montante concretamente fixado, a esse título, constituir «uma restrição ilegítima, desproporcional e irrazoável do direito a uma tutela jurisdicional efectiva».
Mas nenhuma das razões invocadas merece acolhimento.
No que respeita à arguida nulidade, cumpre esclarecer que a decisão de condenação em custas é, por expressa imposição legal, consequência do decaimento da acção, incidente ou recurso, pelo que, como sublinhado no Acórdão n.º 303/2010, proferido nos autos, não recaindo «sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo (n.º 1 do artigo 158º do CPC)», «não carece de fundamentação específica, com explicitação autónoma das razões de facto e direito que a justificam», sendo que também na presente arguição de nulidade o recorrente demonstrou conhecer a base legal que presidiu à condenação de custas e os critérios normativos que devem orientar e orientaram, no caso, a fixação da taxa de justiça devida.
Assim sendo, não padece o Acórdão em causa, no segmento decisório atinente a custas, da arguida nulidade.
Por outro lado, e no que se refere à fixação da taxa de justiça, não se afigura que, considerando os seus limites legais mínimo e máximo (10 UC a 50 UC), a fixação de uma taxa de justiça correspondente a metade do valor máximo (25 UC) seja excessiva, irrazoável ou desproporcional à complexidade (mediana) e natureza (recurso de constitucionalidade) do processo, comprometendo, como pretende o requerente, o efectivo exercício do direito a uma tutela jurisdicional efectiva, sendo certo que, além do mais, corresponde àquela que, com sentido de justiça, é habitualmente fixada pelo Tribunal Constitucional em casos de idêntica natureza e complexidade.
Também por isso é de indeferir o presente pedido de reforma do Acórdão quanto a custas.
3. Pelo exposto, decide-se:
Indeferir a arguição de nulidade, por falta de vencimento, do Acórdão n.º 19/2010, proferido nos autos.
Indeferir a sua reforma quanto a custas.
Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 15 unidades de conta.
Lisboa, 9 de Novembro de 2010.- Carlos Fernandes Cadilha – Vítor Gomes – Ana Maria Guerra Martins – Maria Lúcia Amaral – Gil Galvão.