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Processo n.º 210/10
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos e com os fundamentos seguintes:
«(…) notificado do despacho de fls. desse Tribunal, cujo conteúdo se considera insólito e de todo imprevisível, e com ele não se conformando, vem, nos termos da alínea b) do nº 1 do art° 70º da Lei 28/82, de 15/11, e do art° 280°/1-b) da Constituição,
Interpor o presente recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, do n° 4 do art° 13° e no n° 2 do art° 18°, ambos do Código das Custas Judiciais (CCJ), por violação do art° 20º da Constituição,
Nos termos e com os fundamentos seguintes:
1- O impugnante foi oportunamente notificado da conta de custas nos termos da qual o Tribunal “a quo” determinava que a mulher do recorrente deveria proceder ao pagamento da totalidade das custas judiciais, no montante de 511,75 €. Seguidamente,
2- Não se conformando com o teor da referida notificação, o impugnante requereu esclarecimentos formais sobre a questão, invocando para o efeito o nº 4 do art° 13° do CCJ, de modo a que fosse fixada à mulher do impugnante apenas metade das custas devidas, mas não a totalidade, visto que ela não foi abrangida pelo deferimento do pedido de apoio judiciário, mas só o impugnante marido, na modalidade de dispensa de pagamento de custas e demais encargos com o processo (cfr. n° 1 do pedido de esclarecimento). Contudo, na sequência da resposta ao pedido de esclarecimento,
3- O Tribunal notificou o impugnante do despacho proferido em 29/08/2007 através de oficio com data de 01/10/2007, nos termos do qual se reafirma a decisão anteriormente notificada no sentido de que a impugnante mulher tem de proceder ao pagamento integral das custas judiciais (cfr. despacho notificado), confirmando assim a conta de custas antes notificada, sem atender ao facto de ao impugnante marido ter sido concedido o beneficio de apoio judiciário na modalidade de dispensa total de pagamento da taxa de justiça e demais encargos. Assim, e porque não se aceita o sentido da decisão de que ora se recorre, por injusta e inconstitucional,
4- Faz-se ainda uma mera referência no despacho de que ora se recorre aos acórdãos do STA respeitantes aos processos n° 01 386/03, de 15/01/2004, e n° 0 999/06, de 11/04/2007, respectivamente. Contudo, a nosso ver, nenhum dos referidos acórdão responde à questão concreta de saber se o outro sujeito que não beneficia do apoio judiciário concedido deverá pagar metade ou a totalidade da taxa em causa. Assim,
5- Atendendo a que o valor das custas em causa não permite a interposição de recurso de agravo (cfr. art° 62° do CCJ), interpõe-se o presente recurso para o Tribunal Constitucional nos termos supra aludidos. Diga-se que,
6- A perplexidade do recorrente acerca da decisão do Tribunal “a quo” de confirmar a conta sem atender positivamente ao pedido de esclarecimento por ele solicitado assenta no facto de o próprio Tribunal Constitucional, sistematicamente, em casos semelhantes, determinar que as custas judiciais a pagar pelo outro cônjuge que não beneficia do apoio judiciário ser de metade das custas fixadas, e não da totalidade. A título de mero exemplo,
7- Invocam-se os Autos de Recurso n° 960/05, do Tribunal Constitucional, cujo acórdão condenou os recorrentes — marido (com beneficio de apoio judiciário) e mulher — no pagamento de taxa de justiça no montante de sete UC (7 X 89,00 € = 623,00 €), cuja conta notificada determinava que, atendendo ao facto de o recorrente marido gozar de apoio judiciário, cabia à mulher pagar “metade da quantia supra indicada”, correspondente a 311,50 € (cfr. conta n° 35/2006, da 2ª Secção do Tribunal Constitucional). Aliás, face ao teor do art° 13° do CCJ,
8- Não pode ser outra a interpretação senão a do Tribunal Constitucional. Atento ainda o teor do citado art° 13° do CCJ,
9- Refere-se no respectivo no 1 que “a taxa é, para cada parte, a constante da tabela do anexo 1”. Ora,
10- Atendendo a que no caso em apreciação a taxa de justiça do anexo 1 é de 2,5 UC’s (então 222,50 €), entendemos que, como se afirmou no pedido de esclarecimento (cfr. n° 3), a “responsabilidade imediata que recai sobre a impugnante e que lhe advém das regras legalmente estatuídas (cfr. art° 13°/4 do CCJ), não pode desligar-se do facto de a parte ser constituída por dois sujeitos - a impugnante e o seu marido - um dois quais (o seu marido) beneficiando da dispensa de pagamento da taxa de justiça e dos demais encargos (cfr. art° 16°/1 da actual LAJ, e art° 15º/1 da anterior LAJ). Ademais,” diz-se no n° 4 do já citado pedido de esclarecimento,
11- “Nos termos legais, “tendo ficado vencidos vários autores, respondem pelas custas em partes iguais” (cfr. art° 446°/3 do CPC). Por isso,” acrescenta-se no n° 5 do mesmo pedido de esclarecimento,
12- “Afigura-se-nos que, sendo devido certo montante a título de custas judiciais cuja responsabilidade recai — solidariamente - sobre dois sujeitos, tendo um deles sido totalmente isentado (melhor dizendo, dispensado) de pagamento, deverá ao montante em dívida ser deduzida metade da importância em causa, devendo ser essa a importância a pagar pela impugnante. De outro modo, parece-nos que”, refere-se ainda no n° 6 do mesmo pedido de esclarecimento,
13- “Não teria então qualquer sentido o beneficio de apoio judiciário concedido ao marido da impugnante, co-parte nos presentes autos pois que, desse modo, a taxa de justiça devida acabaria por ser paga em dobro (uma parte pela impugnante, e a outra parte igual pelos cofres do Estado, em virtude do apoio judiciário), não parecendo ser essa a letra nem o espírito da lei.”. Contudo,
14- A questão que se coloca é a de saber qual será então a totalidade da dívida que cabe aos responsáveis solidários.
15- Será todo o montante que consta da conta notificada, independentemente do facto de algum dos sujeitos componentes da parte beneficiar do apoio judiciário- Não parece, pois que, nos termos legais,
16- “Tendo ficado vencidos vários autores, (isto é, sendo a parte composta por vários sujeitos), respondem pelas custas em partes iguais” (cfr. art° 446°/3 do CPC) - Então, daqui parece inferir-se que,
17- Se uma parte é constituída por dois sujeitos a quem cabe pagar 100 unidades a titulo de custas judiciais por terem ficado vencidos, respondendo pelas custas em partes iguais (cfr. art° 446°/3 do CPC), e tendo um dos sujeitos beneficiado da dispensa integral do pagamento que lhe cabe — que no caso seria 50 unidades (100 : 2 = 50) - então restará ao outro sujeito pagar o montante das custas em falta (50 unidades, e não 100) para completar o montante em dívida (100 unidades). Do mesmo modo, e pelas mesmas razões,
18- Também em sede de recurso o valor da taxa de justiça deverá ser reduzido a metade do valor fixado (cfr. art° 18°/2, e art° 73°/1-a), ambos do CCJ). De resto,
Da Violação do art° 20° da Constituição.
19- Afigura-se-nos que a posição do Tribunal “a quo” de interpretar o disposto no art° 13°/4 e no jj0 18°/2, ambos do CCJ no sentido de que o sujeito ou sujeitos que na parte não obtiveram apoio judiciário terão que proceder ao pagamento integral da taxa de justiça legalmente determinada sem ter em conta o apoio concedido a outro ou outros sujeitos integrantes da parte,
20- Viola o princípio do direito de acesso aos tribunais (cfr. art° 20°/1 da Constituição), na dimensão de que tal posição é gravosa e condicionadora do respectivo acesso pelos cidadãos que carecem da realização da justiça, além de irrazoável e injusta. Reafirme-se ainda que,
21- A perplexidade do recorrente no tocante à posição do Tribunal “a quo” funda-se no facto de o Tribunal Constitucional, de forma sistemática, adoptar a posição defendida pelo recorrente, como se exemplifica nos artigos 6° e 70 supra».
2. O recurso, apresentado junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, não foi por este tribunal admitido, constando do texto do despacho de indeferimento o seguinte:
«Por requerimento de fls. 147, veio o Impugnante, nos termos da alínea b) do n°1 do artigo 70° da Lei n° 28/82, de 15/11 e da alínea b) do n°1 do artigo 280° da CRP, interpor recurso de fiscalização, concreta da constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, do n°4 do artigo 13° e do nº2 do artigo 18º, ambos do CCJ.
Nos termos do n° 2 do artigo 75°A in fine, da Lei n° 28/82, de 15/11, do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional deve constar, para além da indicação da norma que se considera violada, a indicação da peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade.
Da análise do requerimento supra identificado verifica-se que, o mesmo, é omisso relativamente à indicação da peça processual em que foi suscitada a questão da inconstitucionalidade.
Muito embora o disposto no n°5 do artigo 75°- A da Lei n° 28/82, de 15/11 preveja a hipótese de convite ao aperfeiçoamento, verifica-se que, in casu, tal convite redundaria em diligência inútil, porquanto, compulsados os autos, se constatou não ter sido invocada pelo Impugnante, nos vários articulados apresentados, a questão da inconstitucionalidade do n°4 do artigo 13° e do n°2 do artigo 18°, ambos do CCJ.
De facto, o próprio artigo 280º n°1 b) da CRP exige, como requisito dos recursos para o TC, que as decisões dos tribunais tenham aplicado urna norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
Relativamente ao sentido da expressão “questão suscitada durante o processo” veja-se o que escreveu o Prof. Gomes Canotilho in “Direito Constitucional e Teoria da Constituição “, 7ª Edição, Almedina, pág. 986:
“(...) Suscitar-se a questão da inconstitucionalidade durante o processo não significa que a inconstitucionalidade possa ser suscitada até à extinção da instância, mas sim que essa invocação pode e deve ser feita em momento em que o Tribunal a quo ainda possa conhecer da questão. (...) A inconstitucionalidade terá de suscitar-se antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que a inconstitucionalidade respeita (...) “.
Face ao supra exposto, e atento o preceituado no n°2 do artigo 76º, conjugado com o n°2 do artigo 75°-A, in fine, ambos da Lei n° 28/82, de 15/11, indefere-se o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, a fls. 147».
3. A., reclamou, então, para o Tribunal Constitucional do despacho que não admitiu o recurso de constitucionalidade que pretendera interpor para o Tribunal Constitucional, o que fez nos termos e com os fundamentos seguintes:
«1- A decisão de indeferimento do recurso assenta na consideração de o recorrente não ter suscitado a questão da inconstitucionalidade “durante o processo” (cfr. 1° parágrafo da pág. 2 do despacho em causa), visto que as invocadas inconstitucionalidades não foram referidas “nos vários articulados apresentados” (Ibidem- página 1, penúltimo parágrafo). Contudo,
2- Afigura-se-nos não assistir razão ao Tribunal “a quo”. De facto,
3- A interpretação dada às normas em causa - art° 13°/4 do Código das Custas Judiciais; e art° 512°/ 1 e 2 do Código Civil — era de todo imprevisível, não podendo razoavelmente o reclamante contar com a sua aplicação, pois que o próprio Tribunal Constitucional adopta a posição que ao reclamante se afigura mais adequada à letra e ao espírito da lei[1]. Por isso,
4- Não era exigível ao reclamante prever que essa interpretação viria a ser possível e viesse a ser adoptada na decisão. E assim sendo,
5- O uso inesperado de tal interpretação pelo Tribunal “a quo” levou a que o reclamante não tivesse podido, em momento anterior ao da decisão, representar a possibilidade de aplicação das normas com aquela interpretação. E por isso,
6- Não se mostrava adequado exigir-lhe, no caso em apreciação, um qualquer juízo de prognose relativo a essa aplicação, em termos de se antecipar ao proferimento da decisão, suscitando logo as questões de inconstitucionalidade. Na verdade,
7- Só perante a decisão proferida se viu o reclamante na possibilidade de arguir as inconstitucionalidades em causa, tendo-o feito logo no primeiro momento que se lhe impunha fazê-lo, isto é, no requerimento de interposição de recurso.
Pelo exposto,
Requer-se a V. Ex.cias seja atendida a presente reclamação e, em consequência, seja admitido o recurso»
4. O Ministério Público, notificado da presente reclamação, pronunciou-se no sentido do seu indeferimento, porque:
«1. A. e sua mulher B., notificados da conta de custas, no montante de € 511,75, fizeram o seguinte pedido de esclarecimento: “se sobre a impugnante recai, ou não, o dever de pagar apenas metade das custas devidas e, se não, com que fundamento”.
2. A dúvida dos impugnantes baseava-se no facto de A. litigar com apoio judiciário, na modalidade de dispensa total de custas e de taxa de justiça, que lhe havia sido concedida pela Segurança Social.
3. O Senhor Oficial de Justiça, prestou a informação de que a lei obrigava a que existisse uma solidariedade real em todos os sujeitos processuais que integravam a mesma parte, irrelevando o facto de um, ou vários deles, beneficiarem de apoio judiciário e por isso, não estava contemplada no Código das Custas Judiciais tal “fragmentação” ou qualquer outra redução taxa da taxa de justiça de parte, que não fosse a extraída do seu artigo 15.º.
4. O Senhor Juiz, por decisão de 29 de Agosto de 2007, aderiu à fundamentação da informação, citando, além disso, em seu abono, dois Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo.
5. Foi desta decisão que A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, pretendendo ver apreciada a inconstitucionalidade do artigo 13.°, n.° 4 e 18.°, n.° 2, ambos do Código das Custas Judiciais, interpretados “no sentido de que o sujeito ou sujeitos que na parte não obtiveram apoio judiciário, terão de proceder ao pagamento integral da taxa de justiça legalmente determinada, sem ter em conta o apoio concedido a outro ou outros sujeitos processuais”.
6. Como o recurso não foi admitido, reclamou o recorrente para o Tribunal Constitucional.
7. No recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.° 1, do artigo 70.° da LTC, o recorrente só está dispensado do ónus da suscitação prévia da questão da constitucionalidade, se a interpretação levada a cabo na decisão recorrida se revelar insólita, inesperada ou imprevisível.
8. O reclamante confirma que não suscitou anteriormente a questão da inconstitucionalidade porque a interpretação acolhida na decisão era “de todo imprevisível” não “podendo razoavelmente o reclamante contar com a sua aplicação”.
9. Mas não tem razão.
10. Efectivamente, quando faz o pedido de aclaração (conjuntamente com a sua mulher), na sequência do qual foi proferida a decisão recorrida, o reclamante pôs a hipótese dessa interpretação, criticando-a e dizendo, inclusivamente, que ela não teria qualquer sentido, tendo sido precisamente as dúvidas quanto à interpretação, que o levou a fazer o pedido de aclaração.
11. Portanto, esse tinha sido o momento processual adequado para suscitar a questão da inconstitucionalidade normativa, o que o reclamante não fez, limitando-se a criticar esse possível entendimento, mas não o fazendo do ponto de vista da sua constitucionalidade, não referindo, sequer, qualquer princípio ou preceito constitucional.
12. Por outro lado, num dos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, referidos na decisão recorrida (o proferido em 15 de Janeiro de 2004, no Proc.° n.° 01386/03), perfilha-se exactamente o mesmo entendimento que nestes autos veio a ser acolhido.
13. Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação».
5. Notificado o reclamante do parecer do Ministério Público, por nele se sustentar que, para além dos fundamentos apresentados pelo despacho que rejeitou a admissão de recurso para o Tribunal Constitucional, outros não invocados no despacho reclamado justificariam a não admissão do recurso, veio o mesmo, nomeadamente, dizer o seguinte:
«1- A questão da suscitação da inconstitucionalidade dos artigos 13°/4 e 18°/2 do CCJ só poderia ser suscitada depois de o Tribunal “a quo” ter baseado a sua decisão em tais normativos. Ora,
2- Como resulta dos autos em apreciação, a fundamentação da decisão do Tribunal “a quo” com base em tais normativos é fixada no despacho constante de fls. 142 dos autos, com data de 29/08/2007, ao remeter para a promoção do MP constante de fls. 141 dos autos e, portanto, só a partir desse momento era possível ao reclamante suscitar a sua inconstitucionalidade. Assim sendo,
REQUER-SE:
a)- Se atenda ao facto de ao reclamante ter sido concedido apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, cabendo à impugnante mulher o pagamento de apenas metade do montante em causa, como de resto tem sido prática desse Alto Tribunal em situações similares.».
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
6. O reclamante interpôs recurso, para o Tribunal Constitucional, do despacho do juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que considerou existir uma solidariedade real entre todos os sujeitos processuais que integram a mesma parte, irrelevando o facto de um, ou vários deles, beneficiarem de apoio judiciário e, por isso, não estando contemplada, no Código das Custas Judiciais, a “fragmentação” defendida pelo reclamante ou qualquer outra redução da taxa de justiça de parte, que não fosse a extraída do seu artigo 15.º. No próprio requerimento de interposição de recurso, veio o reclamante sustentar que a decisão fora insólita e imprevisível.
O Ministério Público, junto do tribunal recorrido, constatando a circunstância de o recorrente – ora reclamante – não ter cumprido o disposto no artigo 75.º A, n.º 2, in fine, da LTC, sugeriu que fosse feito um convite ao aperfeiçoamento, para supressão de tal omissão.
O Tribunal a quo, concordando não ter sido indicada a peça processual referida no artigo 75.º A, n.º 2, in fine, da LTC, decidiu, porém, não dirigir ao recorrente qualquer convite ao aperfeiçoamento, por concluir que tal se traduziria numa diligência inútil, indeferindo, desde logo, o pedido “porquanto, compulsados os autos, se constatou não ter sido invocada pelo Impugnante, nos vários articulados apresentados, a questão da inconstitucionalidade do n.º 4 do artigo 13.º e do n.º 2 do artigo 18.º, ambos do CCJ.”
7. O reclamante veio invocar que o tribunal a quo procedeu a uma interpretação-surpresa, pelo que não lhe era exigível a sua previsibilidade, razão pela qual, em momento anterior à decisão, não poderia o reclamante representar a possibilidade de aplicação das normas colocadas em crise, com a interpretação que veio a ser utilizada.
A alegação do reclamante, porém, não colhe.
Na verdade, o tribunal a quo não interpretou, de modo insólito ou imprevisível, o disposto nas normas que vêm impugnadas, pelo que o reclamante estaria em condições de antecipar a questão de constitucionalidade normativa, cumprindo, desse modo, o dever de litigância diligente e prudência técnica na antevisão das possibilidades interpretativas da norma que, previsivelmente, seriam adoptadas na decisão recorrida.
Aliás, o próprio reclamante – conjuntamente com a sua esposa – notificada da conta, veio apresentar um “pedido de esclarecimento”, que corresponde, substancialmente, a uma reclamação da conta. Nessa peça processual, como resulta da sua argumentação, antecipou a possibilidade de interpretação normativa que veio a ser aplicada, tendo impugnado a sua justeza, mas não problematizando a sua constitucionalidade.
Assim, teremos de concluir pela falta de suscitação adequada e, em consequência, julgar improcedente a reclamação apresentada.
IV – Decisão
8. Pelo exposto, indefere-se a reclamação, apresentada por A., da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, datada de 30 de Março de 2009, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta, ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º, do mesmo diploma).
Lisboa, 6 de Outubro de 2010.- Catarina Sarmento e Castro – João Cura Mariano – Rui Manuel Moura Ramos.
[1] Cfr. os Autos de Recurso n° 960/05, do Tribunal Constitucional, cujo acórdão condenou os recorrentes — marido (com beneficio de apoio judiciário) e mulher — no pagamento de taxa de justiça no montante de sete UC (7 X 89,00 = € 623,00 €), cuja conta notificada determinava que, atendendo ao facto de o recorrente marido gozar de apoio judiciário, cabia à mulher pagar “metade da quantia supra indicada”, correspondente a 311,50 € (cfr. conta n° 35/2006, da 2.ª Secção do Tribunal Constitucional).