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Processo n.º 34/10
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. A fls. 295 dos presentes autos foi proferida a seguinte decisão sumária:
«Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional,
decide-se:
1. O Presidente da Câmara Municipal de Guimarães e o Município de Guimarães
recorrem para o Tribunal Constitucional nos seguintes termos:
[...] Não se conformando com os acórdãos de 23/09/2009 e de 28/10/2009, bem como
com o despacho de 19/11/2009, [vêm] deles interpor recurso de apreciação
concreta da constitucionalidade, para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do
disposto nas normas dos artigos 280º nº 1 alínea b) da Constituição da República
Portuguesa e 70º nº 1 alínea b) da Lei nº 28/82 de 15/11, com os seguintes
fundamentos:
Os recorrentes não se conformam com o facto da norma do artigo 150º nº 1 do CPTA
ter sido interpretada, naquelas decisões, no sentido de que os fundamentos de
admissibilidade do recurso de revista, ali previstos, deverem ser invocados nas
alegações e respectivas conclusões do recurso e não no requerimento de
interposição do mesmo.
Na verdade, no acórdão de 23/09/2009 refere-se que os recorrentes não
fundamentaram a admissibilidade do recurso nos termos do artigo 150.º nº 1 do
CPTA.
Todavia os recorrentes, efectivamente, fundamentaram a admissibilidade do
recurso, dando, assim, cumprimento ao disposto no artigo 150.º nº 1 do CPTA, o
que fizeram no requerimento de interposição do recurso (lugar próprio para serem
alegados os fundamentos de admissibilidade do recurso ordinário de revista).
Assim, não tendo havido pronúncia sobre os fundamentos de admissibilidade do
recurso de revista, invocados pelos recorrentes, estes arguiram a nulidade do
mencionado acórdão, pelo que requereram que a mesma fosse decretada pelo
Tribunal (artigos 95º nº 1 do CPTA e 668º nº 1 alínea d) do Código de Processo
Civil).
Sobre esta matéria foi proferido o acórdão de 28/10/2009 em que se refere que,
das conclusões 9.ª a 12.ª do recurso interposto, nada resulta que permita
concluir pela admissibilidade deste recurso.
O Tribunal a quo entendeu que os fundamentos de admissibilidade do recurso de
revista só poderiam ser invocados nas alegações e respectivas conclusões do
recurso e nunca apenas no requerimento de interposição do recurso.
Daí que, o tribunal recorrido apenas verificou se das conclusões das alegações
do recurso resultava qualquer fundamento de admissibilidade do mesmo, não
apreciando tais fundamentos porque apenas alegados no requerimento de
interposição do recurso (ver parágrafo 2º da 2.ª página do acórdão).
Assim, quanto aos fundamentos de admissibilidade do recurso invocados no
requerimento de interposição de recurso nenhuma pronúncia é feita, pelo que a
nulidade arguida mantém-se.
Os recorrentes pretendem, e têm esse direito, que sejam apreciados os
fundamentos de admissibilidade do recurso que invocaram, o que, até agora, não
sucedeu.
As decisões recorridas limitam-se a referir que o recurso não é admissível, mas
não apreciam os fundamentos invocados pelos recorrentes para tal
admissibilidade.
Em tais decisões confundem-se os fundamentos do recurso (constantes das
respectivas alegações e conclusões) com os fundamentos da admissibilidade deste
(constantes do requerimento de interposição do recurso), os quais, como se viu,
nunca chegaram a ser apreciados.
Aquela interpretação da norma do artigo 150º nº 1 do CPTA implica a
impossibilidade dos recorrentes recorrerem para o Supremo Tribunal
Administrativo e, por isso, viola as garantias destes de acesso ao direito e
tutela jurisdicional efectiva (artigo 20º da CRP).
Os recorrentes entendem que foi cumprida a exigência contida na norma do artigo
70º nº 1 alínea b) da Lei nº 28/82 de 15/11.
De facto, o sentido da exigência legal ali prevista de que a
inconstitucionalidade seja suscitada durante o processo, tem em vista dar
oportunidade ao tribunal recorrido de se pronunciar sobre a questão da
inconstitucionalidade, antes de esgotado o respectivo poder jurisdicional, de
modo que o Tribunal Constitucional venha a decidir em recurso.
Mas, se o recorrente não tiver oportunidade de suscitar a questão da
constitucionalidade durante o processo, tem-se entendido que o recurso de
constitucionalidade é admissível.
Ora, na situação sub judice é de qualificar como “decisão surpresa”, de conteúdo
imprevisível para os recorrentes, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal
Administrativo acima referidas.
Na realidade, não era exigível que os recorrentes, aquando da interposição do
recurso, antecipassem a mencionada interpretação e, nessa medida, suscitassem a
inconstitucionalidade da mesma.
A ora invocada inconstitucionalidade não constitui um erro material, nem uma
nulidade, nem obscuridade ou ambiguidade da decisão, pelo que a reclamação
apresentada pelos recorrentes em 08/10/2009 não constituía meio idóneo e
atempado para suscitar a aludida questão de inconstitucionalidade.
Daí que, este é o momento oportuno para suscitar tal inconstitucionalidade
porque os recorrentes não tiveram oportunidade processual para, antes de
esgotado o poder jurisdicional do tribunal recorrido, suscitar a questão.
Este recurso de constitucionalidade é, pois, admissível.
Ver, neste sentido, o acórdão do Tribunal Constitucional de 10/02/2000,
publicado no BMJ n.º 494, pg. 21.
Na situação em apreço não é admissível qualquer outro recurso ordinário (artigo
70º n.º 2 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro).
O recurso sobe imediatamente, nos próprios autos e tem efeito suspensivo da
decisão recorrida (artigos 78.º n.º 3 da Lei n.º 28/82 de 15/11 e 143.º n.º 1 do
Código de Processo dos Tribunais Administrativos).
E por ser legal, ter legitimidade e estar em tempo (ex vi dos artigos 72.º n.º 1
alínea b) e 75.º n.º 1 da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro), deverá ser admitido
o presente recurso.
2. Resulta do transcrito requerimento, em suma, que os recorrentes pretendem
impugnar, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15
de Novembro (LTC), a norma retirada do artigo 150º n.º 1 do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos interpretada no sentido de 'os fundamentos de
admissibilidade do recurso de revista, ali previstos, deverem ser invocados nas
alegações e respectivas conclusões do recurso e não no requerimento de
interposição do mesmo', conforme o Supremo Tribunal Administrativo fizera nos
seus acórdãos de 23 de Setembro de 2009 e de 28 de Outubro de 2009 (a referência
ao 'despacho de 19/11/2009' deve-se, certamente, a manifesto lapso).
Nos termos do invocado artigo 70º n.º 1 alínea b) da LTC cabe recurso para o
Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja
inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, recurso esse que
só pode ser interposto pela parte que haja suscitado a questão da
inconstitucionalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer
(artigo 72º n.º 2 LTC).
O Tribunal tem entendido, uniformemente, que os requisitos a que deve obedecer a
interposição do recurso impõem o entendimento de que as decisões judiciais não
são directamente sindicáveis; o objecto do recurso deve corresponder à norma, ou
normas, aplicadas na decisão recorrida como razão da solução adoptada. Na
verdade, o carácter instrumental do recurso obriga a que a norma submetida a
julgamento de inconstitucionalidade haja sido efectivamente aplicada na decisão
e represente o critério normativo decisivo para a solução adoptada.
Ora, ao pretenderem sindicar uma norma retirada do artigo 150º n.º 1 do Código
de Processo nos Tribunais Administrativos interpretada no sentido de 'os
fundamentos de admissibilidade do recurso de revista, ali previstos, deverem ser
invocados nas alegações e respectivas conclusões do recurso e não no
requerimento de interposição do mesmo', por entenderem 'que sejam apreciados os
fundamentos de admissibilidade do recurso que invocaram, o que, até agora, não
sucedeu', os recorrentes não estão verdadeiramente a pretender sindicar uma
norma, mas o acerto da decisão em si mesmo considerada. Para além disso, o
Supremo Tribunal Administrativo não aplicou tal enunciado como ratio decidendi
do seu aresto, pois, embora salientando a forma deficiente pela qual os
recorrentes substanciaram a sua pretensão, o certo é que o mesmo Tribunal foi
efectivamente verificar se ocorriam os pressupostos que condicionam a apreciação
do recurso 'a partir do litígio tal como está conformado no processo e das
questões de fundo que são suscitadas como objecto da revista', o que evidencia o
carácter não essencial dessa 'norma' na solução.
Finalmente, é absolutamente certo que o ónus de suscitação da questão de
inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido impõe a obrigação de expor,
na primeira oportunidade processual, a questão de inconstitucionalidade, por
forma a que o tribunal a possa conhecer. Se o primeiro acórdão proferido aplicou
inovadoramente uma norma desconforme com a Constituição, conforme alegam os
recorrentes, o aludido ónus impunha que, na reclamação apresentada contra esse
aresto, os recorrentes suscitassem a questão, o que verdadeiramente não fizeram.
Por todas estas razões, não é admissível o presente recurso. [...]»
2. Inconformados com esta decisão, os mesmos recorrentes reclamam, ao abrigo do
disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, nos seguintes termos:
«[...] O recurso interposto pelos reclamantes fundou-se no disposto nos artigos
280º nº 1 alínea b) da CRP e 70º nº 1 alínea b) da LTC.
Os requisitos de admissibilidade deste tipo de recurso de constitucionalidade,
de acordo com uma jurisprudência firme, reiterada e uniforme deste Tribunal, são
os seguintes:
1º) Que a inconstitucionalidade da norma tenha sido previamente suscitada pelo
recorrente durante o processo; e
2º) Que essa norma venha a ser aplicada na decisão, constituindo um dos seus
fundamentos normativos.
Ver, neste sentido, entre outros, o acórdão nº 232/94 deste tribunal.
Na decisão sumária reclamada entendeu-se que nenhum dos aludidos requisitos se
verificaram, pelo que o recurso interposto não é admissível.
Na verdade, refere-se na decisão reclamada que “(...) os recorrentes não estão
verdadeiramente a pretender sindicar uma norma, mas o acerto da decisão em si
mesmo considerada. Para além disso, o Supremo Tribunal Administrativo não
aplicou tal enunciado como ratio decidendi do seu aresto, pois, embora
salientando a forma deficiente pela qual os recorrentes substanciaram a sua
pretensão, o certo é que o mesmo tribunal foi, efectivamente verificar se
ocorriam os pressupostos que condicionam a apreciação do recurso (...) o que
evidencia o carácter não essencial dessa “norma” na solução”.
Refere-se, ainda, na decisão reclamada que é absolutamente certo que o ónus de
suscitação da questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido
impõe a obrigação de expor, na primeira oportunidade processual, a questão de
inconstitucionalidade, por forma a que o tribunal a possa conhecer. Se o
primeiro acórdão proferido aplicou inovadoramente uma norma desconforme com a
Constituição, conforme alegam os recorrentes, o aludido ónus impunha que, na
reclamação apresentada contra esse aresto, os recorrentes suscitassem a questão,
o que verdadeiramente não fizeram”.
Os recorrentes não se conformam com o teor desta decisão sumária pelos seguintes
motivos:
1º) A norma do artigo 150.º nº 1 do CPTA foi, efectivamente, interpretada, nas
decisões em causa, no sentido de que os fundamentos de admissibilidade do
recurso de revista, ali previstos, apenas poderiam ser invocados nas alegações e
respectivas conclusões do recurso e não no requerimento de interposição do
mesmo.
2º) No acórdão do STA de 23/09/2009 refere-se que os recorrentes não
fundamentaram a admissibilidade do recurso nos termos do artigo 150.º nº 1 do
CPTA.
Todavia os recorrentes, efectivamente, fundamentaram a admissibilidade do
recurso, dando, assim, cumprimento ao disposto no artigo 150.º nº 1 do CPTA, o
que fizeram no requerimento de interposição do recurso (lugar próprio para serem
alegados os fundamentos de admissibilidade do recurso ordinário de revista).
Assim, não tendo havido pronúncia sobre os fundamentos de admissibilidade do
recurso de revista, invocados pelos recorrentes, estes arguiram a nulidade do
mencionado acórdão, pelo que requereram que a mesma fosse decretada pelo
Tribunal (artigos 95º nº 1 do CPTA e 668º nº 1 alínea d) do Código de Processo
Civil).
3º) Sobre esta matéria foi proferido o acórdão do STA de 28/10/2009 em que se
refere que, das conclusões 9º a 12.ª do recurso interposto, nada resulta que
permita concluir pela admissibilidade deste recurso.
O Tribunal a quo entendeu que os fundamentos de admissibilidade do recurso de
revista só poderiam ser invocados nas alegações e respectivas conclusões do
recurso e nunca apenas no requerimento de interposição do recurso.
Daí que, o tribunal recorrido apenas verificou se das conclusões das alegações
do recurso resultava qualquer fundamento de admissibilidade o mesmo, não
apreciando tais fundamentos porque apenas alegados no requerimento de
interposição do recurso (ver parágrafo 2º da 2.ª página do acórdão).
Assim, quanto aos fundamentos de admissibilidade do recurso invocados no
requerimento de interposição de recurso nenhuma pronúncia é feita, pelo que a
nulidade arguida mantém-se.
Portanto, não é certo dizer-se na decisão reclamada que o STA “(...) foi,
efectivamente verificar se ocorriam os pressupostos que condicionam a apreciação
do recurso (...) o que evidencia o carácter não essencial dessa norma na
solução.”
O STA não foi verificar quaisquer pressupostos de admissibilidade do recurso,
tendo, isso sim, como daquele acórdão resulta, verificado se das conclusões 9.ª
a 12.ª do recurso interposto, algo resultava que permitisse concluir pela
admissibilidade do recurso.
Os recorrentes pretendem, e têm esse direito, que sejam apreciados os
fundamentos de admissibilidade do recurso que invocaram, o que, até agora, não
sucedeu.
As decisões recorridas limitam-se a referir que o recurso não é admissível, mas
não apreciam os fundamentos invocados pelos recorrentes para tal
admissibilidade.
Quando se diz que das conclusões 9.ª a 12.ª do recurso interposto nada resulta
que permita concluir pela admissibilidade do recurso, confunde-se os fundamentos
do recurso (constantes das respectivas alegações e conclusões) com os
fundamentos da admissibilidade deste (constantes do requerimento de interposição
do recurso), os quais, como se viu, nunca chegaram a ser apreciados.
Portanto, de facto, aquela interpretação da norma do artigo 150.º nº 1 do CPTA
implica a impossibilidade dos recorrentes recorrerem para o Supremo Tribunal
Administrativo e, por isso, viola as garantias destes de acesso ao direito e
tutela jurisdicional efectiva (artigo 20º da CRP).
É, pois, ao contrário do que refere a decisão reclamada, evidente o carácter
essencial da interpretação dada àquela norma na solução encontrada pelo STA.
Por isso, também, ao contrário do que se refere na decisão reclamada, os
recorrentes estão verdadeiramente a pretender sindicar a interpretação que foi
dada àquela norma e não o acerto da decisão que, como se viu, não se pronunciou
sobre os fundamentos de admissibilidade do recurso.
Pronunciar-se sobre os fundamentos do recurso (constantes das respectivas
alegações e conclusões) não é, obviamente, o mesmo que pronunciar-se sobre os
fundamentos da admissibilidade deste (constantes do requerimento de interposição
do recurso).
4º) Os recorrentes entendem que foi cumprida a exigência contida na norma do
artigo 70º nº 1 alínea b) da Lei n.º 28/82 de 15/11.
De facto, o sentido da exigência legal ali prevista de que a
inconstitucionalidade seja suscitada durante o processo, tem em vista dar
oportunidade ao tribunal recorrido de se pronunciar sobre a questão da
inconstitucionalidade, antes de esgotado o respectivo poder jurisdicional, de
modo que o Tribunal Constitucional venha a decidir em recurso.
Mas, se o recorrente não tiver oportunidade de suscitar a questão da
constitucionalidade durante o processo, tem-se entendido que o recurso de
constitucionalidade é admissível.
Ora, na situação sub judice é de qualificar como “decisão surpresa”, de conteúdo
imprevisível para os recorrentes, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal
Administrativo.
Na realidade, não era exigível que os recorrentes, aquando da interposição do
recurso, antecipassem a mencionada interpretação e, nessa medida, suscitassem a
inconstitucionalidade da mesma.
A ora invocada inconstitucionalidade não constitui um erro material, nem uma
nulidade, nem obscuridade ou ambiguidade da decisão, pelo que a reclamação
apresentada pelos recorrentes em 08/10/2009 não constituía meio idóneo e
atempado para suscitar a aludida questão de inconstitucionalidade.
Daí que, este é o momento oportuno para suscitar tal inconstitucionalidade
porque os recorrentes não tiveram oportunidade processual para, antes de
esgotado o poder jurisdicional do tribunal recorrido, suscitar a questão.
A este propósito refere o já mencionado acórdão n.º 232/94 deste tribunal que
“(...) o primeiro dos mencionados requisitos – suscitação «durante o processo» –
por forma a que ele deva ser tomado não num sentido puramente formal – tal que a
inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância –, mas
num sentido funcional – tal que a arguição de inconstitucionalidade deverá
ocorrer num momento em que o tribunal recorrido ainda pudesse conhecer da
questão. Deve, portanto, a questão de constitucionalidade ser suscitada antes de
esgotado o poder jurisdicional do juiz, na medida em que se está perante um
recurso para o Tribunal Constitucional, o que pressupõe a existência de uma
decisão anterior do tribunal a quo sobre a questão de constitucionalidade que é
objecto do recurso.
Uma vez que, em regra, o poder jurisdicional se esgota com a prolação da
sentença e dado que a eventual aplicação de norma inconstitucional não constitui
erro material, não é causa de nulidade da decisão judicial nem a torna obscura
ou ambígua, há-de entender-se que o pedido de aclaração de uma decisão judicial
ou a reclamação da sua nulidade não são já, em princípio, meios idóneos e
atempados para suscitar a questão de constitucionalidade” (sublinhado nosso).
Ver, ainda, neste sentido o acórdão n.º 74/2000 do Tribunal Constitucional.
Assim, ao contrário do que refere a decisão reclamada, não se impunha que, na
reclamação apresentada, os recorrentes suscitassem a questão da
inconstitucionalidade.
Este recurso de constitucionalidade é, pois, admissível.
Termos em que deve a decisão sumária reclamada ser revogada e substituída por
outra que julgue o recurso interposto como admissível.»
3. Não houve resposta à reclamação, importando decidir.
Pretendem os recorrentes, neste recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º
1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC), impugnar, por
inconstitucional, a norma retirada do artigo 150º n.º 1 do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos interpretada no sentido de 'os fundamentos de
admissibilidade do recurso de revista, ali previstos, deverem ser invocados nas
alegações e respectivas conclusões do recurso e não no requerimento de
interposição do mesmo'. O recurso foi admitido no Supremo Tribunal
Administrativo – tribunal que proferiu as decisões recorridas – mas foi
rejeitado no Tribunal Constitucional por se haver entendido, em suma, que não
estavam reunidos os pressupostos a que a lei submete a apreciação destes casos.
Designadamente, considerou-se que o recurso, ao contrário do que permite a lei,
visa sindicar o acerto da própria decisão recorrida; que o Supremo Tribunal
Administrativo não aplicara tal enunciado como ratio decidendi do seu aresto; e
que, por fim, os recorrentes não haviam cumprido o ónus de suscitação da questão
de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido. São estas as razões que
os reclamantes pretendem contrariar na presente reclamação.
Todavia, sem sucesso.
Na realidade, é agora ainda mais claro que o recurso visa questionar
directamente o acórdão recorrido, uma vez que os reclamantes insistem – e
inequivocamente – em identificar a própria decisão como o objecto do litígio.
Na verdade, dizem:
2º) No acórdão do STA de 23/09/2009 refere-se que os recorrentes não
fundamentaram a admissibilidade do recurso nos termos do artigo 150.º n.º 1 do
CPTA.
Todavia os recorrentes, efectivamente, fundamentaram a admissibilidade do
recurso, dando, assim, cumprimento ao disposto no artigo 150.º n.º 1 do CPTA, o
que fizeram no requerimento de interposição do recurso (lugar próprio para serem
alegados os fundamentos de admissibilidade do recurso ordinário de revista).
E ainda:
O STA não foi verificar quaisquer pressupostos de admissibilidade do recurso,
tendo, isso sim, como daquele acórdão resulta, verificado se das conclusões 9.ª
a 12.ª do recurso interposto, algo resultava que permitisse concluir pela
admissibilidade do recurso.
Os recorrentes pretendem, e têm esse direito, que sejam apreciados os
fundamentos de admissibilidade do recurso que invocaram, o que, até agora, não
sucedeu.
As decisões recorridas limitam-se a referir que o recurso não é admissível, mas
não apreciam os fundamentos invocados pelos recorrentes para tal
admissibilidade.
Deve ainda sublinhar-se que a própria formulação da 'norma'
impugnada representa, quando muito, um trecho decisório de subsunção normativa –
aliás, de questionável ocorrência – e não uma regra abstracta extraída do texto
da norma, que, recorde-se tem o seguinte teor:
Artigo 150.o
Recurso de revista
1 — Das decisões proferidas em 2.ª instância pelo Tribunal Central
Administrativo pode haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal
Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua
relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a
admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do
direito.
2 — A revista só pode ter como fundamento a violação de lei substantiva ou
processual.
3 — Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de revista
aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.
4 — O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa
não pode ser objecto de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa
de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a
força de determinado meio de prova.
5 — A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se preenchem os
pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal Administrativo, devendo ser
objecto de apreciação preliminar sumária, a cargo de uma formação constituída
por três juízes de entre os mais antigos da Secção de Contencioso
Administrativo.
É, por isso, bem claro que o recurso não pode prosseguir por lhe
faltar um objecto idóneo.
4. Para além disto, o Tribunal reafirma os demais fundamentos
invocados na decisão sumária em reclamação: o Supremo Tribunal Administrativo
não adoptou a ponderação questionada como fundamento da sua decisão e os
reclamantes não suscitaram qualquer questão de inconstitucionalidade perante o
tribunal recorrido, embora, como se afirmou na decisão sumária, tivessem tido
plena oportunidade de o fazer.
5. Resta, portanto, indeferir a reclamação, mantendo a decisão de
não conhecimento do recurso. Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de
justiça em 20 UC.
Lisboa, 10 de Março de 2010
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão