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Processo n.º 240/2010
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do
Supremo Tribunal de Justiça que, embora reduzindo a pena que as instâncias lhe
tinham aplicado, o condenou na pena de 4 anos e 6 meses de prisão, mediante
requerimento do seguinte teor:
“(…)
2º
O Recorrente veio suscitar a inconstitucionalidade do entendimento expresso pelo
Supremo Tribunal de Justiça nos artigos 40.º, n.ºs 1 e 2, 71.º e 72.º do Código
Penal.
3º
O douto acórdão recorrido violou os princípios constitucionais da necessidade e
proporcionalidade, ou da proibição do excesso, consagrado no artigo 18.º da
Constituição da República Portuguesa.
4º
As questões em causa foram, desde logo suscitadas no âmbito do Recurso
interposto, pelo Recorrente para o Supremo Tribunal de Justiça, em 22 de Junho
de 2009, do Acórdão proferido pela 1ª Instância, conforme consta das 17ª e 18ª
Conclusões, oportunamente apresentadas, que a seguir se transcrevem:
‘A despeito da margem de liberdade de que goza o legislador ma fixação do
quantum da pena, o recorrente não se conforma com o critério espelhado da
decisão, revelando-se aquele ofensivo dos princípios da necessidade,
proporcionalidade e adequação das penas’.
‘Por conseguinte a pena aplicada ao recorrente denuncia uma clara violação do
princípio da proporcionalidade das penas, o qual impõe que a gravidade da sanção
deve ser proporcional à gravidade das infracções’.
4º
O Recorrente tinha, à data em que os factos que deram origem à condenação se
iniciaram, 20 anos de idade, o que não foi tomado em linha de conta pelo
Tribunal de 1ª Instância, nem pelo Supremo Tribunal de Justiça, na aplicação da
pena.
(…).”
Foi proferido o seguinte despacho de não admissão do recurso:
“Interpôs-se recurso para o Tribunal Constitucional com base na al. b) do n.º 1
do art. 70.º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro. Ou seja, por ter sido aplicada
norma cuja inconstitucionalidade tiver sido suscitada durante o processo. Ora,
analisados os autos, e concretamente a motivação e conclusões do recurso
interposto para este S.T.J. não se menciona nenhuma norma, em concreto, cuja
constitucionalidade tenha sido posta em crise. O que se deduz de fls. 1299, e
especificamente do teor das conclusões 17.º e 18.º, é que, com a medida da pena
que foi eleita, ocorrera violação do princípio da proporcionalidade das penas. A
nosso ver, tal se mostra claramente insuficiente. Caso contrário, sempre que um
arguido discorde da medida da pena que lhe for aplicada, poderá recorrer para o
Tribunal Constitucional, invocando a violação daquele princípio, ou ainda do da
necessidade e adequação das penas. Estaria pois encontrada a forma de apelar a
mais uma instância de recurso, para além dos tribunais comuns, com o único fito
de sindicar a medida de uma pena que foi aplicada.
Vai, portanto, o requerimento de interposição de recurso, indeferido, nos termos
do art.ºs 70.º, n.º 1 b) e 87.º n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 28/82, de 12 de Novembro,
por manifestamente infundado. Assiste ao recorrente a possibilidade de
reclamação, ao abrigo do n.º 4 do art.º 76.º daquela Lei.”
2. O recorrente reclama deste despacho, ao abrigo do n.º 4 do artigo
76.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, argumentando que, ao contrário do que
foi entendido, suscitou oportunamente a questão que quer ver apreciada,
designadamente nas conclusões 17.ª e 18.ª da motivação do recurso que interpôs
do acórdão da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça.
O Ministério Público responde que na motivação do recurso o que se
diz é que a pena aplicada ao recorrente, violava os princípios da necessidade,
da proporcionalidade e de adequação das penas e que o tribunal não tinha feito
uma “correcta aplicação das normas dos artigos 29.º, n.º 6, da Constituição,
artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e artigos 40.º, n.ºs 1 e
2, 71.º e 72.º, todos do Código Penal”, sendo óbvio que isso não consubstancia a
suscitação de qualquer questão de inconstitucionalidade normativa – única que o
Tribunal Constitucional teria competência para conhecer –, sendo a própria
decisão que vem questionada.
3. Cabe recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea
b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC de decisões dos demais tribunais que apliquem
normas cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada de modo processualmente
adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida (artigo 70.º, n.º
1, alínea b) e artigo 72.º da LTC). O recurso de constitucionalidade há-de
versar sobre a conformidade entre a norma identificada pelo recorrente e a
Constituição e com essa mesma natureza tem a questão de ter sido apresentada ao
tribunal a quo, em termos de este dever saber que está colocado perante a
pretensão de que recuse a aplicação dessa norma (ou de determinado entendimento
normativo) com fundamento em inconstitucionalidade (artigo 204.º da
Constituição).
Ora, como a simples leitura do requerimento de interposição do
recurso torna imediatamente evidente, nenhuma destas condições está preenchida.
No que respeita ao objecto do recurso, o que o recorrente quer ver
apreciado é a “inconstitucionalidade do entendimento expresso pelo Supremo
Tribunal de Justiça dos artigos 40.º, n.ºs 1 e 2, 71.º e 72.º do Código Penal”
que acusa de desrespeitar os princípios da necessidade e da proporcionalidade
ínsitos no artigo 18.º da Constituição ao não considerar os factos provados
relativamente à sua idade e inserção social e familiar para a aplicação de uma
pena suspensa, com regime de prova. É a observância do princípios
constitucionais pela decisão judicial na concreta valoração do caso e não a
norma ou normas do Código Penal, que se pretende ver apreciada pelo Tribunal
Constitucional, o que não cabe na competência deste.
E, do mesmo modo, o que o ora reclamante censurou na motivação do
recurso que interpôs do acórdão da Relação para o Supremo foi o critério seguido
na determinação concreta da pena, por não ter sido respeitados os princípios da
necessidade, da proporcionalidade e da adequação das penas, designadamente por
não se ter feito “correcta aplicação das normas dos artigos 29.º, n.º 6, da
Constituição, artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e artigos
40.º, n.ºs 1 e 2, 71.º e 72.º, todos do Código Penal”.
Assim, não pode considerar-se colocada perante o Supremo Tribunal,
em termos processualmente adequados, uma questão de constitucionalidade
normativa.
4. É, portanto, manifesto que o recurso não pode ser admitido.
Refira-se que não obsta ao imediato indeferimento da reclamação a
circunstância de o despacho reclamado se dizer que o recurso não é admitido por
ser “manifestamente infundado”. Na verdade, a causa efectiva da não admissão do
recurso, patente na motivação do despacho e nas normas invocadas, é a falta de
pressupostos para aceder ao Tribunal Constitucional e não a insubsistência
material de qualquer questão de constitucionalidade normativa. E como tal foi
(bem) entendido pelo reclamante, que procura demonstrar que esses pressupostos
estão reunidos.
5. Decisão
Pelo exposto, o Tribunal decide indeferir a reclamação e condenar o
reclamante nas custas com 20 (vinte) UCs de taxa de justiça.
Lx., 12/4/2010
Vítor Gomes
Ana Maria Guerra Martins
Gil Galvão