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Processo n.º 930/09
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José Borges Soeiro
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
I ? Relatório
1. A. e Outra, inconformados com a decisão sumária proferida a 18 de Novembro de
2009, vêm dela reclamar dizendo o seguinte:
?- Os recorrentes querem deixar claro o mais profundo respeito que lhes merece a
douta decisão de que ora reclamam, mas não podem deixar de porfiar pelo
entendimento, que também honestamente perfilham, de que a questão de
constitucionalidade que suscitaram nesta lide tem sido objecto dos recursos
interpostos, e que, especificamente, foi objecto exclusivo do recurso de agravo
aqui em apreço.
- Divergindo, assim, com todo o respeito, da douta decisão sumária proferida, o
que fundamentalmente volta a alegar-se agora tem sido sustentado pelos
recorrentes desde a 1.ª Instância, até ao Supremo Tribunal de Justiça,
obviamente sem sucesso, e é o facto de os recorrentes, em todas as decisões
recorridas, terem sido vítimas da repetida violação do princípio da
intangibilidade do caso julgado que se formou sobre o douto despacho de fls. 117
dos autos de procedimento cautelar de arresto, apensos aos autos principais, e
que aqui se dá como reproduzido para todos os legais efeitos.
- Esse douto despacho transitou em julgado nos seus precisos termos, tendo-se
extinto, em consequência, as obrigações de avalistas dos recorrentes, o que
deveria ter conduzido à sua absolvição dos pedidos contra eles formulados pela
recorrida na presente acção.
- Ora, o caso julgado, por si mesmo, tem a protecção constitucional que resulta
do disposto no n° 3 do art. 282° da Constituição, mas que se alicerça igualmente
nos princípios da confiança e da segurança jurídica, inerentes aos princípios
que enformam a própria ideia de Estado de direito ? art. 2° da Constituição.
Essa é, aliás, a posição do Tribunal Constitucional, repetida vezes manifestada,
designadamente no Acórdão n° 61/2003, de 04/02/2003: OR, II, de 22/04/2003.
- Face a esta consagração constitucional dos princípios da intangibilidade do
caso julgado, afigura-se como evidentes para os recorrentes que toda a violação
desse princípio envolve, por si mesma, a inconstitucionalidade de qualquer outra
decisão que viole tal princípio, como inconstitucionais terão de haver-se,
consequentemente, as disposições legais que fundamentem essa decisão, em toda a
medida em que forem interpretadas como tendo semelhante virtualidade.
- Por assim se entender e porque se considera indiscutível que o caso julgado
das decisões se define pelos seus termos, que não pela apreciação do seu maior
ou menor merecimento, se tem vindo a suscitar esta questão em todos os recursos
de agravo interpostos.?
2. A decisão reclamada, e no que ora importa, tem o seguinte teor:
?2. Não obstante o recurso ter sido interposto ao abrigo das alíneas b) e i), do
n.º 1 do artigo 70.º, da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), só foi admitido
no Tribunal a quo ao abrigo da alínea b), como consta do despacho de fls. 1227.
Este é o recurso que cumpre agora apreciar.
3. É de proferir decisão sumária ex vi artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, pelo facto
de não se encontrarem preenchidos os pressupostos essenciais ao conhecimento do
recurso. Como resulta do artigo 280.º, n.º 1, alínea b), da Constituição, e do
artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, para que se possa lançar mão do recurso
de fiscalização concreta da constitucionalidade ali previsto é necessária a
suscitação de uma questão de inconstitucionalidade normativa não cabendo a este
Tribunal apreciar a conformidade da decisão recorrida nem, de qualquer outro
modo, sindicar as decisões proferidas por outros tribunais. Por outro lado, tal
suscitação deve ocorrer durante o processo, isto é, como consta de
jurisprudência constitucional firme e reiterada, antes de esgotado o poder
jurisdicional do tribunal a quo.
Assim, o objecto do recurso de constitucionalidade apenas poderá incidir sobre a
apreciação, à luz das regras jurídico-constitucionais, de um juízo normativo
efectuado pelo tribunal recorrido. Este pressuposto constitui o traço distintivo
do sistema português de fiscalização da constitucionalidade face a outros
modelos como o da queixa constitucional ou recurso de amparo. O Tribunal
Constitucional aprecia normas ou interpretações de normas ? a sua actuação não
versa, directamente, as decisões dos outros tribunais.
3. Ora, nos autos em apreço não ocorreu, durante o processo, sequer, qualquer
suscitação de questão de constitucionalidade, como facilmente se afere pela
consulta das alegações apresentadas junto do STJ. Um tal problema de
inconstitucionalidade vem apenas a ser aflorado, ainda que em termos
insuficientes para preencher o ónus de suscitação adequada previsto no artigo 72.º,
n.º 2, da LTC, no pedido de reforma apresentado após notificação do acórdão do
STJ.
4. Assim sendo, e faltando um dos pressupostos essenciais (a não suscitação de
questão de constitucionalidade normativa durante o processo), impõe-se o não
conhecimento do recurso.?
3. A Reclamada B., CRL, notificada para se pronunciar, nada veio aduzir aos
autos.
Cumpre apreciar e decidir.
II ? Fundamentação
4. A reclamação deduzida carece manifestamente de fundamento. Com efeito, a
argumentação dos Reclamantes em nada abala a fundamentação da decisão sumária
reclamada. O conhecimento de recursos interpostos ao abrigo do artigo 70.º, n.º
1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, como sucede nos autos, depende
da prévia verificação de vários requisitos, nomeadamente a suscitação, pelo
recorrente, de inconstitucionalidade de uma norma durante o processo,
constituindo essa norma fundamento (ratio decidendi) da decisão recorrida, bem
como o prévio esgotamento dos recursos ordinários.
6. Como foi referido na decisão sumária, a questão de constitucionalidade não
foi devidamente invocada. Não houve suscitação de qualquer questão de
constitucionalidade normativa, de modo processualmente adequado. São os próprios
reclamantes que sustentam que o que está em causa é ter transitado em julgado o
despacho de fls. 117. A partir daí, manifestam o seu dissídio no que se refere à
decisão recorrida. No entanto, só no pedido de reforma para o Supremo Tribunal
de Justiça, conforme se refere na decisão sumária é que foi aflorada, porém, em
termos manifestamente inadequados, a questão de constitucionalidade, não tendo
sequer invocado qual o parâmetro constitucional violado.
Reitera-se pois, o já decidido na decisão sumária.
III ? Decisão
5. Assim, e, sem necessidade de maiores considerações, acordam, em conferência,
indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão
reclamada no sentido de não tomar conhecimento do recurso.
Custas pelos Reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 12 de Janeiro de 2010
José Borges Soeiro
Gil Galvão
Rui Manuel Moura Ramos